Parecer 05/2019 Ementa: ORDEM JUDICIAIS EFETIVAÇÃO DE MATRÍCULAS - ESCOLA DE EDUCAÇÃO BÁSICA NA MODALIDADE DE EDUCAÇÃO ESPECIAL - A procuradoria jurídica foi instada a se manifestar sobre a obrigatoriedade do cumprimento de ordem judicial dada no bojo de ação judicial movida em face do Estado do Paraná para admissão de novas matrículas nas APAES. Normalmente as ações são direcionadas em face do Estado ou do Município enquanto pessoas jurídicas de direito público interno, as quais tem o dever constitucional de ofertar a educação, logo as APAES não são partes na demanda, não estando obrigadas a cumprir ordem judicial que a elas não se dirige, mas ao ente público. De início importa sempre ressaltar que a atividade fim da APAE no que se refere à educação é, segundo art. 9, III, é para com as pessoas com deficiência intelectual e múltipla. Excluem-se do âmbito de atuação desordens psiquiátricas e desvios comportamentais. Uma vez atestada a deficiência intelectual a APAE está legitimada a atuar porque detém o credenciamento estatal para ofertar essa escolarização. A princípio, a matrícula deve ser garantida ou pelo Estado ou pelo Município então bastaria que o ente público efetuasse a matricula da PcD em alguma das escolas de rede pública, a depender do grau de escolarização. A educação é direito social previsto no caput do art. 6º da Constituição Federal, sendo determinado pelo art. 23 a competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios de proporcionar os meios para o seu acesso: Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desemparados, na forma desta Constituição. Muito embora haja a competência comum, há uma divisão entre os entes federados, cabendo aos Municípios manter programas de educação infantil e de ensino fundamental que, nos termos do art. 21 da Lei nº. 9394/96, compõe a educação básica. É essa a inteligência do art. 30, VI e do 2º do art. 221 da Constituição Federal, e 3º do art. 179 da Constituição do Estado do Paraná:
Art. 30. Compete aos Municípios: VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; Art. 221. 2º. Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil. Art. 179, 5º. Os municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil. Com relação ao provimento da educação básica pelo Estado, o art. 208 da Constituição Federal expressa a obrigatoriedade de tal medida, inclusive àqueles que não tiveram acesso na idade própria: Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: I - Educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria; 1º - O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo. 2º - O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente. Especificamente com relação às crianças e adolescentes, tem-se como prioridade absoluta por parte do Estado assegurar o direito à educação. É isto o que determina o art. 227 da Constituição Federal: Art. 21. A educação escolar compõe-se de: I - Educação básica, formada pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio; Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Não obstante o artigo 208, inciso I da Carta Magna assegure a obrigatoriedade e gratuidade da educação básica às crianças e adolescentes (dos 4 (quatro) aos 17
(dezessete), o Decreto nº. 7.611 de 17 de novembro de 2011 (doc. 07), que dispõe sobre a Educação Especial, o atendimento educacional especializado e dá outras providências, assim estabelece: Art. 1º. O dever do Estado com a educação das pessoas público-alvo da educação especial será efetivado de acordo com as seguintes diretrizes: I (...) II aprendizado ao longo de toda a vida; (...) A Lei de Diretrizes e Bases da Educação sofreu recente alteração pela lei 13.632/2018 que justamente reconhece o direito da educação ao longo da vida. Confira-se a nova redação dada ao artigo 37 da LDB: Art. 37. A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos nos ensinos fundamental e médio na idade própria e constituirá instrumento para a educação e a aprendizagem ao longo da vida. Restou estabelecido que o dever do Estado para com a educação das pessoas público-alvo da educação especial deve ser ao longo de toda a vida. Ora, a educação é direito de todos, dever do Estado e da família, e será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (art. 205, da Constituição Federal). O art. 206 do texto constitucional aponta os princípios a serem seguidos no ensino, dentre os quais se destacam os seguintes: Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; Essa igualdade de condições é também princípio apresentado pela Constituição do Estado do Paraná: Art. 178. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condição para acesso e permanência na escola, vedada qualquer forma de discriminação e segregação;
Como se observa, a igualdade de condições para acesso e permanência à escola deve ser preservada. Entretanto, isso deve ser feito igualitariamente, na medida das desigualdades existentes, de maneira a preservar as especificidades, em especial as dos portadores de necessidades especiais. Nesse sentido, a legislação brasileira aponta para o dever do Estado em garantir a acessibilidade à educação às pessoas com deficiência. O texto constitucional é claro: Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; O mesmo acontece na Constituição do Estado do Paraná, conforme previsão do art. 17, VI, art. 173, caput, e art. 179, IV: Art. 17. Compete aos Municípios: VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação pré-escolar, de educação especial e de ensino fundamental; Art. 173. O Estado e os Municípios assegurarão, no âmbito de suas competências, a proteção e a assistência à família, especialmente à maternidade, à infância, à adolescência, e à velhice, bem como a educação do excepcional, na forma da Constituição Federal. Art. 179. O dever do Poder Público, dentro das atribuições que lhe forem conferidas, será cumprido mediante a garantia de: IV - atendimento educacional especializado gratuito aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; Este, também, o entendimento da Lei 9394/96, a Lei de Diretrizes e Bases Nacional: Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; III - atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino;
Ocorre que no Estado do Paraná, a educação básica na modalidade de educação especial é ofertada em sua avassaladora maioria pelas entidades. O Estado optou por valerse das entidades, com as quais estabelece instrumentos de parceria, e através dela presta o serviço público. A Constituição Federal e a Lei assim permite. Com o objetivo de concretizar a oferta de escolarização e educação a jovens, adultos e idosos com deficiência intelectual e ou múltiplas deficiências que, independentemente das causas ou motivos apresentem necessidades educacionais especiais, intensa e continuas requerendo interdisciplinaridade e intersetorialidade nas práticas do contexto de ensino-aprendizagem, a Secretaria da Educação do Paraná, pelo então Departamento de Educação Especial e Inclusão Educacional materializou a intenção. A Resolução nº 3600/2011 da Secretaria de Estado da Educação (SEED) que reconhece a APAE como Educação Básica, na modalidade de Educação Especial, com oferta de Educação infantil e Ensino Fundamental. Passaram as APAEs, portanto, a integrar o Sistema Estadual de Ensino, ofertando a escolarização e garantindo a certificação aos seus alunos, com a garantia de transporte escolar adequado e com as adaptações necessárias, considerando suas necessidades específicas: RESOLUÇÃO N.º 3600/2011 GS/SEED O Secretário de Estado da Educação, no uso das atribuições que lhe foram delegadas pelo Decreto n.º 02, de 01/01/2011, e, considerando o disposto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n.º 9394/1996, nas Deliberações n.º 02/2003 e 02/2010, e no Parecer n.º 108/2010, todos do Conselho Estadual de Educação, RESOLVE Art. 1.º Autorizar a alteração na denominação das Escolas de Educação Especial para Escolas de Educação Básica, na modalidade de Educação Especial, com oferta de Educação infantil, Ensino Fundamental anos iniciais, Educação de Jovens e Adultos Fase I, e Educação Profissional/Formação inicial, a partir do início do ano letivo de 2011. À resolução 3600/2011 da SEED-PR seguiu-se a instrução 012/11 SUED SEED com a alteração da denominação de escola de educação especial para ESCOLA DE EDUCAÇÃO BÁSICA NA MODALIDADE DE EDUCAÇÃO ESPECIAL, a fim de levar ao conhecimento de todos os cidadãos, em especial à antiga Escola Especial Nossa Escola as alterações e procedimentos a serem tomados pelas Escolas em virtude da Resolução.
Conforme a Instrução nº 012/2011 SUED/SEED, a SEED expediria ato oficial de credenciamento, às Escolas, para oferta de Educação Básica na Modalidade de Educação Especial e a autorização de funcionamento da Educação Infantil, Ensino Fundamental Anos Iniciais e Educação de Jovens e Adultos Fase I, cessando, voluntária e definitivamente as Escolas de Educação Especial. Ficou definido, ainda, que a partir da expedição do ato oficial de credenciamento e autorização de funcionamento das Escolas de Educação Básica na Modalidade de Educação Especial ESTAS PASSARÃO A INTEGRAR O SISTEMA ESTADUAL DE ENSINO ofertando a escolarização e garantindo a certificação aos seus alunos. E mais, foi determinado que as Escolas de Educação Básica na Modalidade de Educação Especial mantidas por entidades que comprovarem finalidade não lucrativa e conveniadas com a SEED terão garantido TRATAMENTO IGUAL ao dispensado às demais escolas da Rede pública, conforme critérios estabelecidos pela SEED. E não foi apenas isso. A partir do item 12 da Instrução nº 012/2011 SUED/SEED, ficou estabelecido que os alunos das escolas de educação básica, na Modalidade Educação Especial, terão ACESSO E GARANTIA DE TRANSPORTE ESCOLAR ADEQUADO E COM AS ADAPTAÇÕES NECESSÁRIAS, considerando suas necessidades específicas. Como se observa, a partir da Proposta elaborada pela SEED (doc. 04), que resultou na Resolução nº 3600/2011 (doc. 05) e na Instrução nº 012/2011 SUED/SEED (doc. 06), o Estado do Paraná concretizou no cenário nacional uma necessidade que há muito já estava em pauta, qual seja a de garantir as crianças, jovens, adultos e idosos com necessidades especiais, as mesmas garantias de ensino em Escolas de Educação básica adaptadas para o ensino adequado destes indivíduos. Por fim, a Resolução nº. 4962/11 da SEED e o Parecer nº. 1461/2011 da SEED (doc. 06.2), veio credenciar e autorizar o funcionamento da ESCOLA JOSÉ DUDA JÚNIOR EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL, NA MODALIDADE EDUCAÇÃO ESPECIAL para a oferta da Educação Básica. Com isso, comprovado restou que referida escola, de Educação Especial, e que realiza ensino fundamental na modalidade de educação básica, DEVE SER INCLUÍDA NA POLÍTICA PÚBLICA MUNICIPAL DO TRANSPORTE ESCOLAR. Referida Resolução Estadual vem de encontro ao Decreto de nº 7.611, promulgado em 17 de novembro de 2011. A partir do recente Decreto, ficou estabelecido o dever do Estado em garantir ao público-alvo da educação especial o aprendizado por toda a vida, dentre outras diretrizes a serem seguidas: Art. 1º O dever do Estado com a educação das pessoas público-alvo da educação especial será efetivado de acordo com as seguintes diretrizes: I - garantia de um sistema educacional inclusivo em todos os níveis, sem discriminação e com base na igualdade de oportunidades; II - aprendizado ao longo de toda a vida; III - não exclusão do sistema educacional geral sob alegação de deficiência;
IV - garantia de ensino fundamental gratuito e compulsório, asseguradas adaptações razoáveis de acordo com as necessidades individuais; V - oferta de apoio necessário, no âmbito do sistema educacional geral, com vistas a facilitar sua efetiva educação; VI - adoção de medidas de apoio individualizadas e efetivas, em ambientes que maximizem o desenvolvimento acadêmico e social, de acordo com a meta de inclusão plena; VII - oferta de educação especial preferencialmente na rede regular de ensino; e VIII - apoio técnico e financeiro pelo Poder Público às instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação exclusiva em educação especial. Contudo, as APAES mesmo estando credenciadas para a oferta da educação básica não perdem a natureza jurídica de pessoas jurídicas de direito privado. Quando as partes, entidade e ente público, firmam o termo de parceria o número de alunos está delimitado, o número de professores e servidores cedidos é estabelecido igualmente pelo Estado e o valor pago em espécie também. O plano de trabalho detalha o valor, o cronograma, as etapas, as fases, o número de alunos, para a execução do objeto que é a oferta de Educação Básica na Modalidade de Educação Especial para alunos com deficiência e transtornos globais do desenvolvimento. O valor da parceria leva em consideração o número de alunos e o custo do serviço, e o número de servidores a serem cedidos a depender do porte. Portanto, se a entidade é compelida a receber novos alunos inicialmente não previstos no instrumento de parceria para atender a pedido da SEED que, por sua vez, se vê obrigada em virtude de ordem judicial é justo que o plano de trabalho seja revisto. A instrução normativa 08/2018 -SUED-SEED atribui ao Estado do Paraná a obrigação de aprovar o plano de trabalho. trabalho: A lei 13.019/14 que fundamenta a parceria permite a alteração do plano de Art. 57. O plano de trabalho da parceria poderá ser revisto para alteração de valores ou de metas, mediante termo aditivo ou por apostila ao plano de trabalho original. (Redação dada pela Lei nº 13.204, de 2015)
O equilíbrio econômico-financeiro da pareceria precisa ser equacionado, nos casos de alteração do plano de trabalho quando a alteração onerar financeiramente a entidade ou resultar em alteração do porte da escola. Portanto, forçoso concluir que em sendo do interesse do ente público cumprir a ordem judicial que implica em alteração do plano de trabalho, o mesmo deve ser objeto de aditivo, sob pena de prejuízo para a entidade. SMJ, é o parecer. Curitiba, 02 de abril de 2019. Rosangela Wolff Moro Procuradora Jurídica