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Transcrição:

Uma publicação do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária NERA. Presidente Prudente, fevereiro de 2011, número 38. ISSN 2177-4463. www.fct.unesp.br/nera ARTIGO DATALUTA CPMI do MST : criminalização contra um determinado modelo de desenvolvimento do campo ARTIGO DO MÊS Agrocombustíveis, soberania alimentar e políticas públicas: as disputas territoriais entre o agronegócio e o campesinato www.fct.unesp.br/nera/artigodomes.php EVENTOS XIX Encontro Nacional dos Estudantes de Geografia - ENEG Vitória Espírito Santo, 6 a 12 de fevereiro de 2011 XIII Encuentro de Geógrafos de América Latina - EGAL San José Costa Rica, 25 a 29 de julho de 2011 V Simpósio Internacional de Geografia Agrária e VI Simpósio Nacional de Geografia Agrária. Belém Pará, 7 a 11 de novembro de 2011 PUBLICAÇÃO Revista NERA 16 Autor: Rede DATALUTA Os artigos deste número da Revista NERA destacam duas temáticas da questão agrária: a primeira é a importância do campesinato para solucionar problemas relativos ao desenvolvimento, fome, pobreza e meio ambiente; a importância da territorialização camponesa através da resistência e das lutas desenvolvidas pelos movimentos sociais contra o modelo neoliberal de desenvolvimento que é a fonte desses problemas. A segunda temática refere-se ao modelo de desenvolvimento do agronegócio, que, sendo insustentável por sua lógica desigual, não consegue solucionar os problemas da fome e da pobreza no mundo, tornando urgente a elaboração de políticas agrárias e agrícolas baseadas no modelo camponês, que pode auxiliar de forma mais eficaz e sustentável no equacionamento da fome e da pobreza. APOIO Elaborado por Rubens dos Santos Romão Souza (bolsista FAPESP) e Danilo Valentin Pereira. Pesquisadores do NERA Coordenação: Francilane Eulália de Souza e Carlos Alberto Feliciano Leia outros números do BOLETIM DATALUTA em www.fct.unesp.br/nera 1

CPMI DO MST : CRIMINALIZAÇÃO CONTRA UM DETERMINADO MODELO DE DESENVOLVIMENTO DO CAMPO Anthony Pahnke Universidade de Minnesota-Twin Cities Estagiário de doutoramento no Programa de Pós Graduação de Geografia UNESP, campus de Presidente prudente pahnk001@umn.edu CPMI do MST não encontra irregularidades. Esta foi a manchete que li no dia 8 de julho de 2010 na Folha do Estado, que em artigo de quatro parágrafos referia-se brevemente a certos assuntos que o relatório do CPMI destacou: a) a má gestão pública e a verdadeira inaplicabilidade da legislação; b) a necessidade de mecanismos de controle mais eficientes; c) uma lei com procedimentos mais claros para os convênios do governo com entidades da sociedade civil. Eu procurei outros artigos para mais informações. Fiquei pensando, foram oito meses de trabalhos nesse inquérito e só tem quatro idéias que podem ser resumidas em quatro parágrafos? Procurei nos sites dos jornais com expressão nacional, como O Globo, Folha de São Paulo, Jornal do Brasil. Mas não encontrei absolutamente nada. Por que, em 2009, quando se tratou do início do inquérito, havia bastante artigos, mas a partir de julho de 2010, não havia quase nada? Eu encontrei algumas coisas nos Blogs e também em jornais de expressão local. Havia manchetes e conteúdo parecido ao que eu encontrei na Folha do Estado: CPMI conclui que não foi desviado recurso público para ocupações (diarioliberdade.org/22-7); Não identificamos um centavo de desvio de recurso público, afirma relator da CPMI do MST (stmetal.org.br/14-7) CPMI do MST não identifica desvio de recursos públicos (correiodobrasil.com.br/13-7).. A mais ampla discussão que encontrei foi o que apareceu no Blog da Reforma Agraria num artigo escrito por Aline Scarso com uma entrevista com Jilmar Tatto (PT-SP) responsável pelo relatório final. Ele comenta que o inquérito foi desnecessário. Ele acrescentou que depois das denúncias vazias... ficou comprovado que essas entidades que fazem um trabalho com os assentados e pequenos proprietários de terra ligados à agricultura familiar e às cooperativas são muito importantes para o Brasil. Ao final da entrevista, encontra-se o relatório final. Em vez de encontrar um relatório breve, de cinco páginas ou algo (o que pensei que acharia pela escassez de reportagens) eu encontrei um trabalho de 352 páginas. Trezentos e cinquenta e duas páginas resumidas em quatro parágrafos? Como pode ser? Eu li o relatório e apresento minha interpretação. Se eu tivesse que recomendar para alguém como se deve ler esse documento, eu diria que deve começar pela página 211. A razão é que a partir daí, se encontram descrições das entidades que estão presentes ao longo do inquérito. São muitas instituições ligadas ao desenvolvimento do campo: INOCAR, ANCA, CONCRAB, ITAC, CEPATEC, FEPAF, MDA, ME, MPA, INCRA, MEC, MS, MDS, MMA, e MTE. Através de convênios e parcerias, todos compõem uma rede que visa projetos de esportes, cultura, alfabetização, contabilidade, reflorestamento, cadastramento, produção para o mercado interno e também externo (A CONCRAB exporta arroz orgânico para os EUA (ver página 217). Alem disso, há a distribuição de sementes, experimentos em agroecologia, programas em educação infantil e também em saúde. Essas entidades foram convocadas para descrever seus papeis e ao longo do inquérito revelam uma diversidade incrível no meio rural. O campo não é simplesmente soja, nem enxada. Adjetivos como complexo ou Disponível em www.fct.unesp.br/nera 2

multidimensional seriam quase eufemismos. Temos na verdade processos incipientes na construção duma sociedade civil que envolve atores diversos que desempenham papeis na produção econômica, cultural e social. O Anexo III do inquérito conta, brevemente, através das descrições dessas entidades, o brotamento de relações diversas entre cidadãos tentando produzir e reproduzir modos de vida no campo a partir de práticas democráticas. Mas elogio não foi o objetivo do inquérito. O motivo do inquérito está na primeira página. Apurar as causas, condições e responsabilidades relacionadas aos desvios e irregularidades verificados em convênios e contratos firmados, era parte do motivo, seguido com a ideia de que o inquérito ia investigar o financiamento clandestino, evasão de recursos para a invasão de terras, analisar e diagnosticar a estrutura fundiária agrária brasileira (p. 1). Esses motivos mostram o que o relator, Jilmar Tatto (PT-SP), descreve como a política de criminalizar os movimentos sociais. Mas como podemos entender as práticas de criminalização dos movimentos sociais não apenas aqui, mas ao longo do documento? Começamos com algumas palavras nas primeiras orações. Em primeiro lugar, a palavra verificado, depois de irregularidades e desvios, é ambígua. Vai ser verificado ou já foi verificado? E do que trata exatamente? As irregularidades e/ou o desvio de verba? No requerimento 29/2009 que iniciou todo esse processo e na ampliação dos motivos para o inquérito (p.7-11), parece que já foram verificadas as irregularidades e os desvios. A ordem das acusações era: irregularidades e desvios ocorridos a partir dos convênios celebrados entre a Superintendência Regional do INCRA em São Paulo com o Instituto de Orientação Comunitária e Assistência Rural (INOCAR) ; irregularidades e desvios a partir dos convênios celebrados entre a Superintendência Regional do INCRA em São Paulo com a Fundação de Estudos e Pesquisas Agrícolas e Florestais (FEPAF (p.8); irregularidades e desvios a partir dos convênios celebrados entre o Ministério do Desenvolvimento Agrário/INCRA e o Centro de Formação e Pesquisa Contestado (CEPATEC) (p.9) ; irregularidades e desvios a partir dos convênios celebrados entre o Ministério do Desenvolvimento Agrário e a Confederação das Cooperativas da Reforma Agrária do Brasil (CONCRAB). irregularidades e desvios a partir dos convênios celebrados entre a Associação Nacional de Cooperação Agrícola (ANCA) e diversos Ministérios, bem como a própria Presidência da República (p.10); irregularidades e desvios a partir dos convênios celebrados entre o Instituto técnico de Estudos Agrários e Cooperativismo (ITAC) e diversos Ministérios, como a própria Presidência da República. (p.11). Esse trecho do documento acaba descrevendo que o inquérito parlamentar ora solicitado tem, assim, como fatos concretos e determinados: irregularidades e desvios cometidos na execução dos mencionados convênios e o consequente financiamento das atividades do MST (p.12). Aqui aparecem certas ambiguidades. A primeira tem a ver com os fatos concretos e determinados: irregularidades de desvios que financiam as atividades do MST. Quais são essas atividades? Por um lado, as acusações indicam que essas atividades só têm a ver com invasões. Pressupõe-se então, como diz o requerimento, que há evidencia disso. Ou seja, já foi verificada em investigações, uma linha direta entre os convênios com entidades do campo e invasões de terra. Mas para estabelecer esse vinculo e pela razão que há definições claras entre invasão e ocupação nas leis brasileiras (vê HC 5.574/STJ 1997; e o Código Penal-artigo 161 acerca de esbulho possessório), dever-se-ia ter discutido essa distinção e apresentar evidência dos acontecimentos em questão. Não aparece nada disso. O pior é que acaba Disponível em www.fct.unesp.br/nera 3

reforçando estereótipos acerca do MST, como se pode ver numa sondagem feito pelo IBOPE acerca de opinião pública com respeito às invasões e o MST ( A imagem do MST/IBOPE 2009). Segundo um dos motivos do inquérito (apurar as responsabilidades relacionadas aos desvios e irregularidades nos convênios), uma dessas responsabilidades tem que ser a apresentação não somente de evidência, mas também de terminologia correta e clara. Em vez de destacar casos de invasões de terra e as irregularidades discutidas ao longo do inquérito com respeito aos convênios entre as entidades no meio rural (o MST incluído) tiveram mais a ver com problemas de informação, capacitação e regularização. O que está no pano fundo de tudo isto, eu penso, é um paradoxo. Para seguir com esta idéia, quero comentar um pouco mais sobre as ideias de irregularidades e criminalização. O que é estranho é que embora o inquérito tivesse o objetivo de esclarecer as atividades do MST, como consta na página 12, o que o inquérito acaba fazendo é uma criminalização não apenas dos movimentos sociais, mas também dos ministérios envolvidos. Segundo a lógica de Kátia Abreu (DEM/TO; suplente no CPMI; presidente da CNA),... não hesito em afirmar que se hoje o processo de reforma agrária não avança no País, a responsabilidade é dessa esquerda fundamentalista, que manobra o MST, consome verbas milionárias do Estado e proclama a criminalização dos movimentos sociais. Não há criminalização: há crimes, com autoria explícita. O MST, braço rural do PT... (25/5, Estadão.com.br/opinião). Primeiro, embora invasão seja crime, o inquérito em vez de mostrar evidência disso, só fez a denúncia sem fatos. Segundo, essas denúncias, os membros do inquérito mais acusaram entidades estatais de irregularidades do que o MST. Há vários exemplos ao longo do inquérito. Escolhendo apenas um, na pagina 111 há uma discussão entre o senador Onyx Lorenzoni (DEM/RS) e Raimundo Pires Silva (Superintendente, INCRA/SP). Lorenzoni pergunta: Senhor Raimundo, a grande maioria dos convênios firmados com o INCRA e com a FEPAF é para recrutamento de pessoal, o senhor sabe disso... eu lhe questiono: Por que não foi feito concurso público nos último três anos, quatro anos? Dava tempo e retempo de contratar pessoas...o senhor fez uma escolha administrativa que eu acho errada, o senhor fez uma escolha administrativa que eu acho que é tendente à corrupção... O alvo da acusação não é apenas o MST, mas também o INCRA e FEPAF. Raimundo Pires da Silva explica: Olha, nós temos que voltar à época, se o senhor me permite, de 2003/2004, onde assumi a gestão do INCRA. Nós estávamos bastante degradados em termos de estrutura, infra-estrutura e mão de obra. Nós tínhamos pouca mão de obra técnica para atender ao que este governo veio fazer, que é recuperar a imagem do INCRA no Estado de São Paulo... Nós temos, hoje, 250, por volta de 250 assentamentos entre assentamentos do estado e assentamentos do Governo Federal... A nossa mão de obra, a estrutura o que INCRA tinha, nós tínhamos seis carros, deputado, e três funcionando; nós tínhamos, se eu não me engano, em torno de nove agrônomos, dois em fase de aposentadoria, dois em cargos de chefia e dois em campo, um cuidando do desenvolvimento e o outro cuidando da obtenção... Então nós precisávamos ter parceiros que nos desse condições claras para que a gente pudesse colocar o INCRA de novo em todas as suas tarefas e ações que são própria lá para o estado. Primeiro, ao INCRA faltam recursos para atender os assentamentos no Estado de São Paulo. São 250 assentamentos no Estado de São Paulo e apenas três carros (que não andam) e nove agrônomos (dois em época de se aposentar)? Então, por causa dessa carência, a entidade tem que procurar parcerias. Mas parecerias não são ilegais. E por que não há recursos? Isto é um problema do orçamento, não só do Disponível em www.fct.unesp.br/nera 4

INCRA, mas também do Governo Federal. Então, essa carência é um problema do Estado. Pedir mais recursos é um tema problemático, como todos sabem. Carência de recursos não só é um problema no meio rural, mas em outras atividades estatais como na infraestrutura no meio urbano, por exemplo. Mas o que acaba acontecendo é que o inquérito criminaliza o INCRA, FEPAF e o MST. O Estado é criminalizado pela idéia equivocada de que a carência de recursos implica em corrupção. Isso mostra um paradoxo. Simplesmente, embora o avanço de uma política agrária dependa muito do Estado, parte do Estado acaba atrapalhando a formação dessa política. Esta parte é a parte que defende os interesses das grandes empresas capitalistas representantes do agronegócio que querem ver minar as políticas públicas para o desenvolvimento do campo da agricultura camponesa. Esse inquérito é um exemplo disto. Mas, além do trecho que apresentei acima, têm outros que também mostram os problemas estatais com respeito ao campo. Por exemplo, os problemas endêmicos de regularização fundiária (p. 26-82). Ao início do inquérito, Plinio Sampaio destaca que o último censo agropecuário usou a categoria de terras ocupadas, que inclui 300 mil hectares, mas não há uma definição clara do que é a categoria chamado terras ocupadas. Ele pergunta, o que é?, mas não recebe uma resposta (p.32). Isto é questãochave; a regularização fundiária é algo sério. Isto implicaria que se o Estado não sabe quem é o dono das propriedades que ocupam 300 mil hectares, o Estado não pode cobrar impostos dessas pessoas. Nessa primeira parte do inquérito destaca a falta de capacidade do Estado em saber a natureza dessas propriedades (que talvez não existam porque pode haver muitas propriedades com títulos falsos, ou seja, são terras griladas). A política agrária precisa do Estado, mas o Estado não está cumprindo seu papel intrínseco: ter o controle efetivo sobre seu território. Além disso, neste trecho (p. 26-82) vale a pena ler, para se ter uma idéia das raízes dos problemas atuais no campo: violência contra os camponeses, carência por parte do Estado com respeito às políticas públicas etc. Ou seja, embora esses problemas sejam os verdadeiros problemas do campo, o relatório não discute esses problemas históricos. Estes aparecem no fim do relatório que tenta abordar dos problemas atuais na forma de projeto da lei. Vale a pena mencionar recomendações, a partir da pagina 145: aperfeiçoamentos na legislação que regula os convênios; continuar realizando auditorias de acompanhamento da execução dos convênios; promover cursos de capacitação voltados para as entidades civis que firmam convênios; envidar esforços no sentido de dotar o INCRA, em especial as Superintendências Regionais, de recursos humanos e materiais necessários; incrementar a implementação da regularização fundiária na Amazônia Legal; agilizar as ações de georreferenciamento; desenvolver programas de recuperação das áreas degradadas; incrementar e aperfeiçoar os órgãos governamentais de mediação de conflitos agrário; rever os índices de produtividade. Mas, não sei se estas recomendações vão evitar outros inquéritos no futuro. No relatório há alguns pontos chaves que indica que temos de esperar pela regularização de terras na Amazônia, se, o INCRA receber mais recursos, e se o georeferenciamento conseguir classificar os 300 mil hectares de terra ocupada. Mas até essas ideias se concretizarem, as irregularidades que os ruralistas vão plantar serão denúncias vazias na terra fértil do discurso do agronegócio. Neste tempo, movimentos e entidades envolvidas na produção econômica, social e cultural no campo, viverão à sombra de conspirações e acusações. Até o próximo inquérito... Disponível em www.fct.unesp.br/nera 5