SITUAÇÕES SINÓTICAS ASSOCIADAS ÀS DIFERENÇAS NAS PROPRIEDADES ÓPTICAS DA ATMOSFERA EM AMBIENTE URBANO Luciene Natali 1 Willians Bini 2 Edmilson Dias de Freitas 3 RESUMO: Neste trabalho é feita uma investigação entre a correlação da espessura óptica de aerossol (AOT) obtida via sensoriamento remoto (MODIS) e a concentração de material particulado medido próximo à superfície (PM 10 ) sendo associados às condições atmosféricas da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). Para os dias que apresentavam AOT MIN, AOT MED e AOT MAX, entre 35 dias analisados em 19 pontos de monitoramento na RMSP, foram feitas análises dos campos meteorológicos fornecidos pelo modelo BRAMS, verificando a situação atmosférica, para observar a influência dessas variáveis meteorológicas em escala sinótica sobre a AOT e as concentrações de PM 10. Obteve-se para a AOT MIN, uma situação pós-frontal com instabilidade atmosférica antecedida por fortes chuvas. Para a AOT MED verificou-se uma atmosfera estável e para a AOT MAX uma atmosfera relativamente seca, quente e estável com penetração de brisa marítima na tarde do dia anterior, o que pode causar uma re-circulação do ar poluído da cidade. ABSTRACT: In this work the correlation between the aerosol optical thickness (AOT), obtained by remote sensing (MODIS) and the concentration of the particulate mater (PM 10 ) at the surface are analyzed and associated to some atmospheric conditions over the Metropolitan Area of São Paulo (MASP). Based on 35 days in 19 monitoring stations over MASP, three days were selected and it were defined three different conditions for the aerosol optical thickness, AOT MIN, AOT MEA and AOT MAX. After this definition it was made a synoptic analysis, using BRAMS model fields, in order to identify the atmospheric situation and its influence over AOT and PM 10 concentrations. It was observed that the AOT MIN was associated with atmospheric instability with a post-frontal situation preceded by heavy rains. For the AOT MEA a stable atmosphere was found and for the AOT MAX a dry, hot and stable atmosphere was found with see-breeze penetration, which can cause a recirculation of polluted air over the city. Palavras-Chave: Aerossol, AOT, Análise Sinótica. INTRODUÇÃO A qualidade do ar na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) é determinada por um complexo sistema de fontes móveis (veículos automotores) e fixas (indústrias) e o seu 1 Departamento de Ciências Atmosféricas IAG/USP Rua do Matão, 1226, Cidade Universitária São Paulo SP CEP 05508-090 Fone: +55 (11) 3091-2837. Email: lunatali@model.iag.usp.br 2 SOMAR Meteorologia Rua Afrânio Peixoto, 262, Butantã São Paulo SP CEP 05507-000 - Fone/Fax: +55 (11) 3816 2888. Email: willians@met.com.br 3 Departamento de Ciências Atmosféricas IAG/USP Rua do Matão, 1226, Cidade Universitária São Paulo SP CEP 05508-090 Fone: +55(11) 3091-2812. Email: efreitas@model.iag.usp.br
monitoramento é de extrema importância no fornecimento de informações sobre impactos no meio ambiente e verificação de limites de poluentes para a saúde da população (CETESB, 2005/2006). O sensoriamento remoto via sensores em satélites tem tido grandes avanços no desenvolvimento tecnológico e cientifico no que diz respeito a estimativas de concentração de poluentes atmosféricos. Essas estimativas podem ser de grande utilidade, uma vez que podem complementar as medidas realizadas em superfície, principalmente em regiões em que as observações são esparsas ou mesmo inexistentes. Hutchison et al. (2005) realizaram comparações entre medidas de espessura ópticas de aerossol, obtidas pelo MODIS (The Moderate Resolution Imaging Spectroradiometer), e medidas de concentração de PM 2,5 feitas próximas à superfície, verificando que existe uma boa relação entre esses parâmetros. A relação entre espessura óptica de aerossol (AOT Aerosol optical thickness) e a concentração de material particulado inalável (PM 10 ) na RMSP apresenta uma grande variabilidade. Em alguns casos verifica-se uma boa relação, mas, na maioria das vezes, parece não existir correlação entre AOT e PM 10. Esse fato pode ser uma conseqüência do transporte horizontal e vertical dos aerossóis na atmosfera. Uma análise sinótica pode fornecer uma idéia de como as condições atmosféricas podem interferir nessa relação. Sendo assim, este trabalho busca analisar situações distintas da relação entre espessura óptica e concentração de PM 10 em superfície, identificando a situação sinótica em cada uma delas, ou seja, em quais condições atmosféricas as medidas de espessura óptica podem ser utilizadas para uma estimativa da concentração de poluentes próximo à superfície. MATERIAL E MÉTODOS Fez-se um estudo para 35 dias dos anos de 2002 e 2003 entre a correlação da concentração de material particulado (PM 10 ) e a espessura óptica de aerossol (AOT). A concentração de material particulado foi obtida a partir das estações automáticas de monitoramento da CETESB (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental) e a espessura óptica de aerossol a partir de medidas de refletância do MODIS calculadas pela metodologia proposta por CASTANHO (2005). O valor da AOT é uma média em uma área de 5 x 5 km centrada nos mesmos pontos geográficos das estações de medida do PM 10. Explorou-se a variação da espessura óptica de aerossol com uma análise da situação sinótica na região, sendo a análise feita para três dias com diferentes AOTs (mínima, média e máxima) com base nos 35 dias e em 19 pontos de medida do PM 10 sobre a RMSP. Para a análise sinótica nos dias de AOT MIN, AOT MED e AOT MAX foram utilizadas observações, imagens de satélite e saídas numéricas do modelo regional BRAMS (Brazilian Regional Atmospheric Modeling System). Dentre as variáveis utilizadas destaca-se o uso de medidas observadas nos aeroportos da cidade de São Paulo: Congonhas e Campo de Marte.
O BRAMS foi rodado com uma grade de 30 x 30 pontos, com resolução de 15 km e iniciado 24 horas antes dos dias estudados, dando tempo ao modelo para se ajustar às condições atmosféricas. RESULTADOS Os resultados das correlações em todas as estações nos dias 25/05/2003 (AOT mínima), 25/07/2002 (AOT média) e 22/08/2003 (AOT máxima) são apresentados na Figura 1 (a, b e c), nas quais cada ponto representa uma estação de monitoramento. Os valores médios de PM 10 e AOT para esses dias são apresentados na tabela 1. Verificamos nas figuras que as diferentes situações apresentam correlações relativamente baixas. Entretanto, podemos verificar que as situações em que foram obtidos os maiores valores médios correspondem aos valores mais altos de correlação. Outro aspecto importante é que valores baixos de concentração de PM 10 correspondem aos valores mais baixos de espessura óptica, apesar da baixa correlação. Figura 1: Correlação entre AOT e PM 10 para dias com AOT MIN, AOT MED e AOT MAX, onde cada ponto representa uma estação de monitoramento. Tabela 1: Comportamento das concentrações médias de material particulado e AOT para os dias selecionados AOT PM10 (μg/m 3 ) AOT MIN 0,20 17,81 AOT MED 0,24 126,59 AOT MAX 0,46 142,21
A figura 2 mostra as imagens de satélite para cada dia de AOT MIN, AOT MED e AOT MAX, incluindo o dia anterior, visando analisar as condições anteriores a cada situação de AOT. AOT MIN AOT MED AOT MAX Dia anterior (-1) Dia corrente Figura 2: Imagens de satélite para os dias com AOT MIN, AOT MED e AOT MAX no dia corrente e dia anterior. Para o caso de AOT MIN pode-se notar a passagem de uma frente fria no dia anterior, e uma segunda-frente fria se aproximando de São Paulo no dia corrente. Para o AOT MED nota-se uma frente fria entre MG e o Sul da Bahia, sendo que SP se encontra com condições de tempo mais estáveis. Já para AOT MAX, uma massa de ar mais seco predomina sobre a região central do Brasil. A figura 3 mostra a variação de temperatura e umidade para o Aeroporto de Congonhas durante o dia anterior e corrente, para a AOT MIN, AOT MED e AOT MAX, respectivamente. Figura 3: Variação horária de Temperatura e Umidade para o Aeroporto de Congonhas Para a AOT MIN, informações anteriores mostravam que houve chuvas e trovoadas na passagem da frente fria no dia 23/05/03 (dois dias antes) e com isso as temperaturas entraram em declínio. Dados observados de vento mostraram maior variação, com ventos constantes variando
entre 10 a 20 km/h. Já para a AOT MED e AOT MAX os ventos estavam calmos. Na AOT MED as temperaturas estavam mais amenas, comparadas à situação de AOT MAX, porém, no dia corrente a máxima chegou a 28 graus devido ao aquecimento pré-frontal. Para a AOT MAX as temperaturas estavam elevadas e o tempo bastante seco, com umidade relativa chegando a 18%. A simulação feita com o modelo BRAMS mostrou os padrões sinóticos associados a cada uma das AOTs. Para a AOT MIN os índices de instabilidade estavam mais elevados, indicando uma situação pós-frontal, com ventos mais intensos e turbulência. A figura 4 mostra o campo de vento na superfície para cada uma das AOTs para o período da manhã (12Z). As figuras mostram um campo mais homogêneo para a AOT MIN, com ventos mais intensos. Na AOT MED os ventos são do quadrante norte, associado com uma situação pré-frontal e na AOT MAX os ventos sopram de NW, o que mantém também as temperaturas mais elevadas. Os resultados da simulação e dos dados observados mostraram uma forte penetração da brisa marítima na tarde anterior à AOT MAX, que se repetiu no dia corrente. Os resultados mostraram ainda uma componente ascendente durante a AOT MIN, e valores elevados de índice K. No geral, a AOT MIN apresentou padrões de tempo mais instável, com ventos mais fortes e temperaturas mais amenas comparado com as demais AOTs. Para a AOT MAX o tempo estava extremamente quente e seco, com forte atuação da brisa marítima já no período da tarde. Na AOT MED, as temperaturas estavam altas devido à aproximação de uma frente fria, porém menos seco que a AOT MAX. A tabela 2 resume as diferenças entre as AOT. AOT- MIN AOT- MED AOT- MAX Figura 4: Circulação na superfície para os casos de AOT-MIN, AOT-MED e AOT-MAX.
Tabela 2: Diferenças de padrões atmosféricos entre AOT-MIN, AOT-MED e AOT-MAX Situação sinótica Circulação AOT MIN intensidade (NW) - pós-frontal (instável) - ventos homogêneos de forte - turbulência - pré-frontal (estável) - quadrante N AOT- MED - ventos fracos AOT- MAX - massa de ar quente e seco (estável) - forte penetração da brisa marítima - ventos fracos CONCLUSÕES Após a análise sinótica percebe-se que para AOT MIN tivemos fortes chuvas dois dias antes e a passagem de uma frente fria no dia anterior que gerou instabilidade e ventos fortes fazendo assim com que a atmosfera estivesse favorável a uma maior dispersão dos poluentes. Já na AOT MED não se observa nenhuma característica sinótica marcante que justifique uma alteração na espessura óptica de aerossol e sim uma condição estável sem muitos ventos, o que deixaria a região com sua AOT numa condição característica da região. Para a AOT MAX temos as condições sinóticas estáveis com uma massa de ar seco e quente, ventos fracos e a penetração da brisa marítima na tarde anterior a esse máximo; isso pode nos indicar uma situação de concentração de poluentes devido à estabilidade do sistema, um transporte de aerossol trazido pela brisa marítima e causando ressuspensão de solo ou até uma re-circulação do ar poluído da cidade, fatores esses que aumentam a concentração de poluentes na atmosfera. A análise sinótica pôde mostrar a influência das variáveis meteorológicas na concentração de material particulado e no valor da AOT o que pode ajudar a evidenciar a grande importância de estudos de variáveis meteorológicas para o transporte e a dispersão de poluentes na atmosfera. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS CASTANHO, A. D. A.; Propriedades ópticas das partículas de aerossol e uma nova metodologia para a obtenção de espessura óptica via satélite sobre São Paulo. São Paulo, 2005. Tese de doutoramento do Instituto de Física da Universidade de São Paulo. CETESB. Relatório de qualidade do ar em São Paulo, 2004 e 2005 (disponível em www.cetesb.sp.gov.br). HUTCHISON, K. D.; SMITH, S.; FARUQUI, S. J. Correlating MODIS aerosol optical thickness data with ground-based PM 2,5 observations across Texas for use in a real-time air quality prediction system. Atmos. Env., 39 (37), 7190-7203, 2005