SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL E CONSERVAÇÃO DA ÁGUA EM PROJETOS DE EDIFÍCIOS PARA HABITAÇÃO

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Transcrição:

SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL E CONSERVAÇÃO DA ÁGUA EM PROJETOS DE EDIFÍCIOS PARA HABITAÇÃO Andreza KALBUSCH M.Sc., Eng., Doutorando em Engenharia Civil pela UFSC. Rua João Pio Duarte Silva, s/n - Córrego Grande - CEP: 88040-970 - Florianópolis (SC) Brasil - Correio eletrônico: andreza@joinville.udesc.br Enedir GHISI Ph.D., Eng. Rua João Pio Duarte Silva, s/n - Córrego Grande - CEP: 88040-970 - Florianópolis (SC) Brasil - Correio eletrônico: enedir@labeee.ufsc.br Roberto de OLIVEIRA Ph.D., Eng. Rua João Pio Duarte Silva, s/n - Córrego Grande - CEP: 88040-970 - Florianópolis (SC) Brasil - Correio eletrônico: ecv1rdo@ecv.ufsc.br RESUMO World Commission on Environment and Development define desenvolvimento sustentável como um desenvolvimento econômico e social capaz de atender as necessidades desta geração, sem comprometer o atendimento das necessidades das gerações futuras. Alguns autores apontam, além das dimensões ambiental, econômica e social, as dimensões cultural, geográfica e política do desenvolvimento sustentável. O presente trabalho visa contemplar a dimensão ambiental da sustentabilidade no projeto de edifícios para a habitação, com ênfase em conservação da água. Para isso são detalhados dois métodos de avaliação de sustentabilidade ambiental de projetos de habitações: o Building Research Establishment Assessment Method, do Reino Unido e Leadership in Energy and Environmental Design, com aplicação nos Estados Unidos. Os requisitos de projeto avaliados pelos referidos métodos são detalhados, comparados e discutidos com base na documentação técnica e normalização brasileira consultadas. Com isso pretende-se contribuir para a conservação da água em habitações através da aplicação dos conceitos de sustentabilidade no ambiente construído. Palavras-chaves: sustentabilidade ambiental, conservação da água, habitação 1. INTRODUÇÃO Segundo Florim e Quelhas (2004), a habitação é um instrumento para o equilíbrio social e para a estabilidade política, representando uma das mais importantes aspirações dos cidadãos. Os autores mencionam a importância de que esta necessidade seja satisfeita levando em consideração os impactos no meio ambiente. Daí a importância da aplicação do conceito de sustentabilidade ambiental em projetos de habitações. O conceito de desenvolvimento sustentável é resultado de um processo de reavaliação da relação entre a sociedade e o meio ambiente. A preocupação com o ambiente e sua excessiva exploração pelo homem fez com que surgissem discussões a respeito e com que pesquisas cada vez mais aprofundadas começassem a ser realizadas. Estas discussões e pesquisas também começaram a ocorrer na indústria da construção civil. A Agenda 21 on Sustainable Construction (CIB, 1999) apontou a indústria da construção e o ambiente construído como os maiores consumidores de recursos. A sua criação, porém, não teve o intuito apenas de diagnosticar este fato, mas de encorajar a aplicação do conceito global de desenvolvimento sustentável no setor da construção civil. Existem atualmente várias iniciativas no que diz respeito à avaliação de sustentabilidade de edifícios, porém o presente trabalho se limita à comparação de critérios relacionados à conservação da água

propostos pelos métodos do Building Research Establishment (BRE) e do U. S. Green Building Council (USGBC) para habitação. Os dois métodos têm o objetivo de disseminação de práticas sustentáveis no setor da construção civil em seus respectivos países, além de servirem de base para o desenvolvimento de outros métodos de avaliação de edifícios. O presente trabalho pretende, desta maneira, incentivar práticas de conservação da água associadas ao projeto de habitações e, assim, contribuir para a aplicação do conceito de desenvolvimento sustentável na construção civil. 2. HABITAÇÃO: MÉTODOS DE AVALIAÇÃO DE SUSTENTABILIDADE DE PROJETOS A necessidade da avaliação do desempenho ambiental de edifícios surgiu quando se constatou que era necessário comprovar se os edifícios intitulados sustentáveis, de fato o eram. Segundo Silva (2003), quando se começou a investigar tais práticas, foi comprovado que muitos dos edifícios que supostamente utilizavam os conceitos de construção ambientalmente sustentável, freqüentemente consumiam mais recursos que aqueles resultantes de práticas comuns de projeto e execução. Com isso, surgiram os primeiros métodos de avaliação de sustentabilidade de edifícios, que utilizaram conceitos da avaliação de impactos ambientais empregada em produtos industrializados. O Building Research Establishment Assessment Method (BREEAM) foi lançado em 1990, no Reino Unido, por pesquisadores do BRE e do setor privado. O método para avaliação de projetos de habitação é o BREEAM EcoHomes. O EcoHomes 2006 apresenta uma lista de verificação dividida em oito categorias principais: uso de energia; transporte; poluição; uso de materiais; uso da água; uso do solo e ecologia; saúde e conforto; e gestão. Dentro destas categorias há critérios específicos a serem cumpridos para a obtenção de créditos. Estes créditos são posteriormente ponderados, possibilitando o enquadramento do projeto da habitação em uma das classes de desempenho. Todo o processo é sempre realizado por avaliadores credenciados pelo BRE, órgão responsável pela especificação dos critérios e por assegurar a qualidade do processo de avaliação (BRE, 2006). O Leadership in Energy and Environmental Design (LEED) foi desenvolvido pelo USGBC com o objetivo de disseminar os conceitos de construção ambientalmente sustentável para o mercado da construção civil nos Estados Unidos. Segundo Silva (2003), este método de avaliação de sustentabilidade de edifícios é baseado em especificações de desempenho, com referência em princípios ambientais e de uso de energia consolidados em normas e recomendações de organismos de terceira parte com credibilidade reconhecida. O método do USGBC para avaliação de sustentabilidade de habitações é o LEED for Homes. A versão 1.11a do LEED for Homes apresenta uma lista de verificação e o critério mínimo é o cumprimento de dezoito pré-requisitos. Após esta etapa, a edificação pode ser avaliada em oito categorias principais: inovação e processo de projeto; localização; sítios sustentáveis; uso eficiente da água; energia e atmosfera; materiais e recursos; qualidade do ambiente interno; e conscientização e educação. Dentro destas categorias principais há critérios específicos a serem cumpridos para a obtenção de créditos (USGBC, 2007). A seguir são detalhados e analisados os critérios de avaliação de sustentabilidade ambiental de habitações relacionados à conservação da água propostos pelos dois métodos. 3. HABITAÇÃO: SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL E CONSERVAÇÃO DA ÁGUA 3.1 Uso Racional da Água Uso racional da água, segundo Gonçalves (2002), é a otimização em busca do menor consumo de água possível, mantidas (em qualidade e quantidade) as atividades consumidoras. Esta otimização do consumo de água pode ser alcançada com o planejamento e implementação de ações para redução de desperdícios que estejam de acordo com as necessidades e exigências dos usuários. Com o objetivo de reduzir o consumo de água potável na habitação, o EcoHomes sugere faixas de consumo de água admissíveis e pontua o projeto da habitação com diferentes valores de créditos. Os créditos disponíveis para o atendimento deste critério de avaliação têm relação com o consumo de água, em m 3 /usuário/ano, conforme tabela 1 (BRE, 2006).

Créditos Consumo de água (m 3 /usuário/ano) Consumo de água (litros/usuário/dia) 1 <52 <142 2 47 128 3 42 115 4 37 101 5 32 87 Tabela 1. Créditos obtidos com relação ao consumo de água previsto para a habitação. Fonte: adaptado de BREEAM (2006). O EcoHomes demonstra a metodologia proposta para cálculo do consumo de água, quando há ou não o uso de fontes alternativas de água. O método ainda exige, como forma de economizar água potável, que a pressão nos sistemas prediais hidráulicos seja adequada, sugerindo o valor máximo de 0,3 MPa (aproximadamente 30 m.c.a.) a 37ºC. No Brasil, a ABNT (1998) estabelece o valor máximo de 0,4 MPa (aproximadamente 40 m.c.a.) para pressão estática nos sistemas prediais hidráulicos em edificações. O LEED for Homes sugere a redução do consumo interno de água através da especificação de equipamentos economizadores, com restrição de vazões máximas para torneiras e chuveiros (aproximadamente 7,57 litros por minuto) e bacias sanitárias (aproximadamente 4,92 litros por descarga). Para irrigação, o método premia projetos em que haja a instalação de sistema de irrigação de alta eficiência, incentivando ainda a utilização de espécies regionais no projeto paisagístico de modo a reduzir a necessidade de irrigação (USGBC, 2007). A ABNT (2004a) propõe que os sistemas prediais hidráulicos e sanitários sejam projetados de modo a minimizarem o consumo de água, reduzindo a demanda de água da rede pública de abastecimento e o volume de esgoto a ser tratado. Para isso, sugere o emprego de equipamentos economizadores e dispositivos de alta eficiência. A referida norma cita como alternativas o emprego de bacias sanitárias de volume de descarga reduzido, o emprego de torneiras de lavatório e pia dotadas de arejadores e a limitação da vazão em chuveiros a um valor máximo igual a 9 litros por minuto. 3.2 Uso de fontes alternativas de abastecimento de água O que se pretende, primeiramente, com a utilização de fontes alternativas de abastecimento de água, é a redução do consumo de água potável. Isso é possível através da utilização de água não potável para usos que não requerem água com tal qualidade. O LEED for Homes sugere a instalação de um sistema de captação e utilização de água pluvial para irrigação ou usos internos na habitação. O método sugere ainda que seja executado um sistema de reúso de água que capte águas cinzas (pelo menos da máquina de lavar roupas) para utilização em irrigação ou usos internos (USGBC, 2007). O EcoHomes também sugere a utilização de água pluvial com o objetivo de reduzir o uso de água potável para irrigação (BRE, 2006). O uso de fontes alternativas para o abastecimento de água depende da qualidade requerida para o uso final. Ou seja, é possível utilizar água com qualidade diferente dependendo do emprego que se dará a esta água (HESPANHOL, 2002). Alguns órgãos, agências e associações definiram parâmetros para a água de reúso nos diferentes países. No Brasil, a ABNT (1997) prevê a possibilidade de reutilização e indica os parâmetros que a água deve ter, conforme o tipo de uso final. A referida norma divide a água de reúso em classes, de acordo com seus parâmetros (como turbidez, coliformes fecais, ph, sólidos dissolvidos totais e cloro residual), indicando o uso possível. O que se pretende com o emprego de fontes alternativas de abastecimento é a otimização do uso da água através da utilização do conceito de substituição de fontes que, segundo Hespanhol (2002) é a alternativa mais plausível para atender a demandas menos restritivas. Ainda, segundo o referido autor, esta prática permite que as águas de melhor qualidade sejam empregadas para fins mais nobres. Tanto para o aproveitamento de águas pluviais como para o reúso de águas, além da economia de água potável, há a vantagem da retirada de carga dos sistemas de drenagem urbana e de coleta e tratamento de esgotos sanitários, respectivamente. 3.3 Especificação de materiais O EcoHomes sugere a especificação de materiais de isolamento nos sistemas de distribuição de água quente que evitem o uso de substâncias com potencial de aquecimento global. O potencial

de aquecimento global é definido como o dano potencial que um produto químico tem em comparação a uma unidade de dióxido de carbono (CO 2 ). O manual do EcoHomes 2006 cita exemplos de materiais a serem utilizados. O método sugere ainda o emprego de sistemas de aquecimento de água que emitam uma quantidade reduzida de NO x para a atmosfera (BRE, 2006). O LEED for Homes lista estratégias para promover a durabilidade e alto desempenho da habitação. Entre estas estratégias, a utilização de pisos específicos em áreas molhadas, além da instalação de sistema apropriado de drenagem em áreas que contenham máquinas de lavar e aquecedores de água, por exemplo. O método sugere ainda que o sistema predial de água quente apresente isolamento da tubulação e que seja projetado de modo a reduzir distâncias e assim evitar perdas de calor. O objetivo é a redução do consumo de energia em sistemas prediais de água quente. O método incentiva também a utilização de produtos locais para minimização de necessidades de transporte (USGBC, 2007). A NBR 7198 (ABNT, 1993) recomenda que o projeto e execução do sistema predial de água quente sejam realizados de modo a racionalizar o consumo. E que seja realizada a análise das perdas de calor em função dos materiais empregados e das técnicas de isolamento térmico. Quanto à vida útil dos sistemas prediais hidráulicos e sanitários, ABNT (2004a) recomenda que a qualidade do projeto e da execução deve garantir sua durabilidade no que se refere à manutenção das funções essenciais durante a vida útil, em condições normais de uso e operação. Segundo Ramos (2001), o impacto ambiental de um produto pode ser devido ao uso de recursos não-renováveis; ao método de extração de materiais que compõem o produto; ao consumo de energia e geração de emissões e resíduos na fase de fabricação, distribuição e transporte; às emissões durante a fase de utilização e à contaminação do solo após descarte. O referido autor incentiva a utilização de análise do ciclo de vida para escolha de produtos, porém a reconhece como uma metodologia cara e complexa, que carece de desenvolvimento. Segundo CIB (1999), a escolha dos materiais deve ser feita com base no desempenho ambiental do material, em sua vida útil e em suas conseqüências à saúde humana. ABNT (2004b) recomenda a utilização de materiais que causem menor impacto ambiental, considerando desde a exploração dos recursos naturais até o destino final do material. A decisão, através do conhecimento do impacto ambiental, deve estar pautada na análise do ciclo de vida de cada produto, a ser disponibilizado pelos respectivos fabricantes. 3.4 Escolha do terreno: preocupação com o fator água O EcoHomes propõe um critério de avaliação relacionado ao fator água na escolha do terreno. O objetivo é desencorajar o uso de terrenos com valor ecológico, como por exemplo, áreas que apresentem rios, lagos ou partes inundadas (BRE, 2006). O LEED sugere a escolha do terreno de modo a encorajar a ocupação de áreas com baixo risco de inundação, e distância mínima de aproximadamente 30 metros de qualquer área inundada. O método ainda estimula a escolha de terrenos em que haja infra-estrutura urbana instalada, como sistema público de distribuição de água e de coleta de esgotos sanitários (USGBC, 2007). No Brasil, as Leis Federais n o 4.771 (BRASIL, 1965) e 7.803 (BRASIL, 1989) consideram áreas de preservação permanente as faixas de terra situadas ao longo dos rios ou de qualquer curso d água (desde o seu nível mais alto), com a largura mínima da faixa marginal variando de acordo com a largura do curso d água, conforme tabela 2. Largura curso d água (m) Largura mínima da faixa de preservação (m) até 10 30 10 a 50 50 50 a 200 100 200 a 600 200 maior que 600 500 Tabela 2. Largura da faixa marginal de preservação permanente em função da largura do curso d água. Fonte: BRASIL (1989). 3.5 Disposição da água pluvial no terreno Com o objetivo de reduzir e retardar o escoamento superficial para o sistema de drenagem pluvial e para cursos d água, o EcoHomes propõe faixas de redução de acordo com a área em que a habitação será alocada. O nível mínimo de redução é de 50% para áreas com baixa probabilidade de inundação, chegando a 100% para áreas com alta probabilidade de inundação. Também é encorajado o uso de áreas com baixo risco de inundação ou a tomada de medidas que impeçam

ou reduzam o impacto na eventualidade de uma inundação em áreas de maior risco. O método define áreas com baixa, média e alta probabilidade de inundação no Reino Unido (BRE, 2006). O LEED for Homes incentiva uma série de medidas para minimização de danos ambientais de longo prazo. Entre estas medidas, está o controle da velocidade de escoamento superficial de modo a evitar erosão do solo e um sistema adequado de drenagem de águas pluviais no terreno. O método encoraja ainda a redução do escoamento superficial, garantindo a permeabilidade do solo (pelo menos 70%). Este objetivo deve ser alcançado através da previsão de espaços verdes e da utilização de pavimentos permeáveis. A vegetação deve ser disposta de modo a retardar o escoamento superficial e evitar a erosão do solo (USGBC, 2007). Fendrich (2002) relata a necessidade da detenção temporária de águas pluviais para promoção de retardamento do escoamento superficial, contribuindo assim para o abatimento dos níveis de enchentes urbanas. Tucci (2003) também apresenta os reservatórios de águas pluviais implantados no terreno como uma das medidas de controle de inundações. Segundo Agra (2001), as principais medidas de infiltração da água pluvial no solo para controle de inundações são execução de trincheiras de infiltração, valas de infiltração, poços de infiltração e utilização de pavimentos permeáveis. Algumas vantagens da infiltração, segundo Urbonas e Stahre apud Tucci (2003), são o aumento da recarga do aqüífero, redução da poluição transportada para rios e redução de vazões máximas a jusante. Gonçalves (2004) propõe a utilização da água armazenada para fins diversos, como irrigação paisagística, lavagem de superfícies e outros fins não-potáveis, o que também vai ao encontro de outro critério de avaliação de sustentabilidade proposto, que é o uso de fontes alternativas de abastecimento de água. 3.6 Esforços para treinamento e conscientização dos usuários O EcoHomes sugere a disponibilização de um manual para o usuário da habitação. Este guia deve conter, entre outras informações, o detalhamento dos equipamentos economizadores de água (como torneiras dotadas de arejadores, bacias sanitárias com volume reduzido de descarga, chuveiros economizadores). O manual deve conter também informações sobre a importância do uso racional e da utilização de fontes alternativas (BRE, 2006). O LEED for Homes também incentiva práticas de educação dos usuários. O método sugere a promoção de um programa de educação pós-ocupação para treinamento sobre operação e manutenção dos equipamentos da habitação, além da distribuição de um manual com informações sobre a utilização dos sistemas prediais e sobre conservação de água (USGBC, 2007). ABNT (2004a) propõe que seja desenvolvido um manual que especifique todas as condições de uso, operação e manutenção dos sistemas prediais hidráulicos e sanitários e de seus componentes. Esse manual deve conter recomendações sobre a utilização dos componentes dos sistemas prediais, processos de desobstrução, limpeza e conservação, periodicidade de inspeções, além de técnicas, processos e equipamentos necessários para manutenção. Segundo Prado et al. (2000), deve ser disponibilizado um manual que estabeleça os procedimentos de uso e manutenção (preventiva, corretiva ou de urgência) compatíveis com os sistemas prediais hidráulicos e sanitários. O treinamento dos usuários trará segurança, na medida em que evitará acidentes e contaminações ocasionados pelo mau uso; e conforto, já que propicia a completa utilização das funções dos sistemas prediais. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS O ambiente construído está relacionado a uma grande parcela do impacto no meio ambiente, já que, além das necessidades materiais na etapa de construção (e posterior demolição), o ser humano desenvolve nestes espaços diversas atividades que consomem recursos. A habitação é um destes espaços e é importante que as atividades aí desenvolvidas possam ocorrer levando em consideração o conceito de sustentabilidade no ambiente construído. A disponibilidade hídrica é fator-chave para o desenvolvimento de qualquer região e, para a manutenção desta disponibilidade, torna-se necessário o gerenciamento do uso desse insumo. A gestão do uso da água, no que se refere ao ambiente construído, está diretamente ligada a práticas de conservação da água e aos sistemas prediais hidráulicos e sanitários. Daí a importância da utilização dos conceitos de sustentabilidade ambiental quando do projeto e execução de tais sistemas. O presente trabalho se propôs a apresentar e comparar critérios de avaliação relacionados à

conservação da água em projetos para habitação. Para isso os critérios propostos pelos métodos BREEAM EcoHomes e LEED for Homes foram detalhados e comparados com requisitos apresentados pela normalização brasileira e bibliografia consultadas. Com isso pretende-se incentivar práticas de conservação da água associadas ao projeto de habitações e, desta maneira, contribuir para a aplicação do conceito de desenvolvimento sustentável na construção civil no Brasil. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGRA, S. G. Estudo Experimental de Micro-reservatórios para Controle do Escoamento Superficial. Dissertação (Mestrado) Instituto de Pesquisas Hidráulicas. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2001. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS - ABNT. NBR 5626: Instalações prediais de água fria. Rio de Janeiro, 1998. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS - ABNT. NBR 7198: Projeto e execução de instalações prediais de água quente. Rio de Janeiro, 1993. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS - ABNT. NBR 13969: Tanques Sépticos Unidades de Tratamento Complementar e Disposição Final dos Efluentes Líquidos Projeto, Construção e Operação. Rio de Janeiro, 1997. ASSOCIACAO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS ABNT/CB-02. Desempenho de Edifícios Habitacionais de até cinco Pavimentos Parte 6: Sistemas Hidrossanitários. Projeto 02:136.01.008, Rio de Janeiro, 2004a. ASSOCIACAO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS ABNT/CB-02. Desempenho de Edifícios Habitacionais de até cinco Pavimentos Parte 1: Requisitos Gerais. Projeto 02:136.01.008, Rio de Janeiro, 2004b. BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução n o 004 de 18 de setembro de 1985. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 1985. BRASIL. Lei n o 4.771 de 15 de setembro de 1965. Institui o Novo Código Florestal. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 1965. BRASIL. Lei n o 7.803 de 15 de julho de 1989. Altera a redação da Lei n o 4.771, de 15 de setembro de 1965, e revoga as Leis n o 6.535, de 15 de julho de 1978 e 7.511, de 7 de julho de 1986. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 1989. BUILDING RESEARCH ESTABLISHMENT - BRE. EcoHomes 2006 The Environmental Rating for Homes: The Guidance 2006. Garston, 2006. 166 p. FENDRICH, R. Aplicabilidade do Armazenamento, Utilização e Infiltração das Águas Pluviais na Drenagem Urbana. Tese (Doutorado) em Geologia. Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2002. FLORIM, L. C.; QUELHAS, O. L. G. Contribuição para a Construção Sustentável: Características de um Projeto Habitacional Eco-Eficiente. ENGEVISTA, Rio de Janeiro, v. 3, n. 3p.121-132, dez. 2004. GONÇALVES, J. A. S. Planejamento Urbano e a Drenagem Urbana com melhoria de qualidade de vida em Ribeirao Preto SP. Programa de Pós-Graduação em Engenharia Urbana. Universidade Federal de São Carlos. 2004. GONÇALVES, O. M. Uso Racional da Água nos Edifícios. Disponível em http://pcc5100.pcc.usp.br/05_agua/uso%20racional%20agua-25-03-2002.pdf. São Paulo, 2002. Acesso em 20 de outubro de 2005. HESPANHOL, I. Potencial de Reúso de Água no Brasil: Agricultra, Indústria, Município e Recarga de Aqüíferos. In: SANTOS, H. F.; MANCUSO, P. C. S. (org). Reúso de Água. Editora Manole. São Paulo, 2002. INTERNATIONAL COUNCIL FOR RESEARCH AND INNOVATION IN BUILDING AND CONSTRUCTION - CIB. Agenda 21 on Sustainable Construction. CIB, [S.L.], 1999. PRADO, R. T. A. (org.) et al. Execução e Manutenção de Sistemas Hidráulicos Prediais. Pini, São Paulo, 2000. RAMOS, J. Alternativas para o Projeto Ecológico de Produtos. Tese (Doutorado) Engenharia de Produção. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2001. SILVA, V. G. Avaliação da Sustentabilidade de Edifícios de Escritórios Brasileiros: Diretrizes e Base Metodológica. 2003. Tese (Doutorado em Engenharia) Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003. TUCCI, C. E. M. Inundações e Drenagem Urbana. In: TUCCI, C. E. M.; BERTONI, J. C. (org.). Inundações Urbanas na América do Sul. Porto Alegre: Editora da Associação Brasileira de Recursos Hídricos, 2003. p.45-150. UNITED STATES GREEN BUILDING COUNCIL USGBC. LEED for Homes Program - Pilot Rating System: version 1.11a. San Francisco, 2007. 184 p.