Embargos de Declaração n. 0003248-03.2016.8.24.0023/50000, da Capital Relator: Desembargador Getúlio Corrêa 1 PROCESSO PENAL EMBARGOS DE DECLARAÇÃO APELAÇÃO CRIMINAL CRIME DE AMEAÇA (CP, ART. 147, CAPUT) E CONTRAVENÇÃO PENAL DE VIAS DE FATO (DECRETO-LEI N. 3.688/41, ART. 21), NO ÂMBITO DOMÉSTICO E FAMILIAR (LEI N. 11.340/06) ALEGADA OMISSÃO INDIRETA ANTE O NÃO AFASTAMENTO, DE OFÍCIO, DA MAJORANTE PREVISTA NO ART. 61, II, "F", DO CP APLICAÇÃO DA AGRAVANTE EM CONJUNTO COM O ART. 17 DA LEI MARIA DA PENHA - OFENSA AO PRINCÍPIO DO NON BIS IN IDEM NÃO ACOLHIMENTO MATÉRIA NÃO SUSCITADA EM SEDE DE APELAÇÃO MANIFESTA IRRESIGNAÇÃO COM O RESULTADO DO JULGAMENTO. "É inviável a apreciação de matéria que não foi alegada no momento processual adequado, pois é vedado à parte inovar quando da oposição de embargos de declaração" (STJ, Min. Maria Thereza de Assis Moura). ADEMAIS, DISPOSITIVO QUE NÃO CONSTITUI ELEMENTAR DO INJUSTO PENAL CUMULAÇÃO DE PENALIZAÇÃO NÃO EVIDENCIADA. A lei n. 11.340/06 trata de institutos não penalizadores stricto sensu, tal como as medidas protetivas, razão porque sua incidência ocorre em momento diverso ao do agravamento da pena. Por isso, não há sobreposição nem cumulação de penalidade. EMBARGOS REJEITADOS. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos de Declaração n. 0003248-03.2016.8.24.0023/50000, da comarca da Capital (Juizado de Violência Doméstica contra a Mulher) em que é Embargante: V. G. e
Embargado: Ministério Público do Estado de Santa Catarina. 2 A Terceira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, rejeitar os embargos de declaração. Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Ernani Guetten de Almeida (Presidente) e Leopoldo Augusto Brüggemann. Funcionou como representante do Ministério Público o Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Gercino Gerson Gomes Neto. Florianópolis, 8 de maio de 2018. Desembargador Getúlio Corrêa Relator
RELATÓRIO 3 Cuida-se de embargos de declaração opostos por V. G. contra acórdão (fls. 227-241) prolatado por esta Câmara que, por votação unânime, conheceu do recurso e negou-lhe provimento, para manter a condenação do acusado pelo crime de ameaça e pela contravenção penal de vias de fato, fixando a reprimenda em 04 (quatro) meses e 05 (cinco) dias de detenção, em regime aberto, e 17 (dezessete) dias de prisão simples, respectivamente (CP, art. 147, caput, e Decreto-Lei n. 3.688/41, art. 21). Consta na ementa de lavra do Desembargador Sérgio Izidoro Heil: "APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE AMEAÇA E CONTRAVENÇÃO PENAL DE VIAS DE FATO PRATICADOS EM ÂMBITO DOMÉSTICO (ART. 147 DO CÓDIGO PENAL E ART. 21 DO DECRETO-LEI N. 3.688/41). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. AMEAÇA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO PELA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS E ATIPICIDADE DA CONDUTA. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA DO DELITO DEMONSTRADAS. PALAVRAS HARMÔNICAS E COERENTES DA VÍTIMA EM AMBAS AS FASES PROCESSUAIS. DEPOIMENTO DA OFENDIDA QUE, EM DELITOS DESTA NATUREZA, POSSUI ESPECIAL VALOR PROBANTE. INTENÇÃO DE INTIMIDAR EVIDENCIADA. MAL INJUSTO E GRAVE CONFIGURADO. PRECEDENTES DESTA CORTE. CONTRAVENÇÃO PENAL DE VIAS DE FATO. AVENTADA INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. DECLARAÇÕES DO OFENDIDO CORROBORADA PELOS DEMAIS ELEMENTOS DOS AUTOS. PRESCINDIBILIDADE DE LAUDO PERICIAL. PRECEDENTES. AVENTADA AUSÊNCIA DE DOLO. ESTADO DE EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA QUE NÃO AFASTA A RESPONSABILIDADE DO AGENTE. EXEGESE DO ART. 28, II, DO CP. CONDENAÇÃO MANTIDA. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. POSSIBILIDADE. SENTENÇA CONDENATÓRIA CONFIRMADA POR ESTE. PRECLUSÃO DA MATÉRIA FÁTICA. NOVA ORIENTAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (HC N. 126.292/SP) ADOTADA POR ESTA CÂMARA CRIMINAL. IMEDIATO CUMPRIMENTO DAS CONDIÇÕES DO SURSIS QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. '[...] a palavra da vítima é de fundamental importância para a devida elucidação dos fatos, constituindo elemento hábil a fundamentar um veredito condenatório, quando firme e coerente, máxime quando corroborada pelos demais elementos de prova encontrados nos autos' (AC n. 0008196-92.2014.8.24.0011, Des. Paulo Roberto Sartorato, j. Em 4/10/2016) (AC n.
4 0034119-84.2014.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Moacyr de Moraes Lima Filho, j. 24/10/2017)". Sustentou, em suas razões (fls. 01-08), haver omissão indireta, consistente na ofensa ao princípio do non bis in idem decorrente da aplicação da agravante prevista no art. 61, II, "f" do CP, em conjunto com a Lei 11.340/06, no que tange à dosimetria das sanções referentes ao crime tipificado no respectivo art. 147, caput, e à contravenção penal descrita no art. 21 do Decreto- Lei 3.688/41.
VOTO 5 1. Nos termos do art. 619 do CPP "poderão ser opostos embargos de declaração, no prazo de dois dias contados da sua publicação, quando houver na sentença ambigüidade, obscuridade, contradição ou omissão". Trata-se, portanto, de recurso de natureza vinculada, ou seja, restrita às hipóteses elencadas no dispositivo legal, não sendo possível discutirse o acerto ou o desacerto da decisão impugnada, mormente porque os aclaratórios "não têm como objeto uniformizar a jurisprudência nem revisar o que decidido" (Informativo n. 448 do STF). 2. O embargante alegou omissão indireta no acórdão proferido, pois o Órgão Julgador deixou de reconhecer, de ofício, ilegalidade na sentença, porquanto à agravante prevista no art. 61, II, "f", do CP, é inaplicável aos casos regidos pela Lei Maria da Penha, representando notável bis in idem. De fato, tal argumento não foi objeto da decisão, uma vez que isso não integrou as razões do apelo, nada obstante também terem sido ofertadas pela Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina. Inexistindo provocação, não se pode exigir que o órgão julgador exponha, além das razões que justificam seu posicionamento, aquelas pelas quais ele deixou de atuar de ofício. Por isso, com respaldo jurisprudencial, entende-se não ser omisso o acórdão: "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HABEAS CORPUS. OMISSÃO E OBSCURIDADE. NÃO-OCORRÊNCIA. EMBARGOS REJEITADOS. [...] É inviável a apreciação de matéria que não foi alegada no momento processual adequado, pois é vedado à parte inovar quando da oposição de embargos de declaração" (STJ, ED no HC n. 288875, Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 03.02.2015). "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CRIMINAL. OMISSÃO
6 INDIRETA. TESE NÃO FORMULADA NO RECLAMO. 2. PEDIDO DE PREQUESTIONAMENTO NÃO FORMULADO. Não é omisso o acórdão que não analisa determinada tese se ela não foi ventilada no recurso" (TJSC, ED n. 0004781-22.2011.8.24.0039, Des. Sérgio Antônio Rizelo, j. 12.04.2016). 3. De qualquer forma, não obstante os argumentos da Defensoria Pública, a aplicação da agravante prevista no art. 61, II, "f", do CP, nos crimes praticados sobre a guarida da Lei Maria da Penha, não implica no reconhecimento de bis in idem. É que na Lei Maria da Penha não há norma sancionatória propriamente dita, o que está previsto somente no Código Penal. A lei especial trata de outros institutos não penalizadores stricto sensu, tal como as medidas protetivas, razão porque sua incidência ocorre em momento diverso ao do agravamento da pena. Por isso, não há sobreposição nem cumulação de penalidade. Além disso, ao contrário do que ocorre com o crime capitulado no art. 129, 9º, do CP, em que a violência doméstica é qualificadora do delito, na ameaça a condição da mulher não é preceito secundário do tipo penal. Logo, quando praticada no âmbito das relações domésticas, incide a agravante prevista no art. 61, II, "f", do CP. Nesse sentido: "APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A LIBERDADE PESSOAL. AMEAÇA REALIZADA NO ÂMBITO DOMÉSTICO E FAMILIAR (ART. 147, CAPUT, C/C O ART. 61, INCISO II, ALÍNEA 'F', AMBOS DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO. DOSIMETRIA DA PENA. MATERIALIDADE E AUTORIA INCONTROVERSAS. REQUERIDO O AFASTAMENTO DA AGRAVANTE PREVISTA NO ART. 61, INCISO II, ALÍNEA 'F', DO CÓDIGO PENAL. DESCABIMENTO. MAJORANTE RECONHECIDA SEMPRE QUE A VIOLÊNCIA É BASEADA NO GÊNERO DA VÍTIMA E QUE IMPLICA EM RELAÇÃO DE CONVIVÊNCIA ÍNTIMA, ATUAL OU PRETÉRITA E
7 INDEPENDENTEMENTE DE COABITAÇÃO. EXEGESE DO ART. 5º, INCISO III, DA LEI N. 11.340/06 QUE ESTABELECE DISPOSITIVOS PROTETIVOS E PROCEDIMENTAIS. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM PELA INCIDÊNCIA DOS INSTITUTOS DA LEI MARIA DA PENHA E DA AGRAVANTE. PLEITEADA A REDUÇÃO DA PENA NA SEGUNDA ETAPA DOSIMÉTRICA. POSSIBILIDADE. PENA-BASE ESTABELECIDA EM 1 (UM) MÊS DE DETENÇÃO. NA SEGUNDA ETAPA, REALIZADO O AUMENTO DE MAIS 1 (UM) MÊS, EM VIRTUDE DA AGRAVANTE DO ART. 61, INCISO II, ALÍNEA 'F', DO CÓDIGO PENAL. EXASPERAÇÃO DESARRAZOADA. ADEQUAÇÃO QUE SE IMPÕE. [...] RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO" (ACrim n. 0009456-86.2015.8.24.0039, Des. Ernani Guetten de Almeida, j. 23.01.2018, destacou-se). Com efeito, não se desconhece que a vedação prevista no art. 17 da Lei Maria da Penha - a qual impossibilita a aplicação de pena de multa isoladamente -, endurece a punição inicial aos crimes praticados sob a égide da aludida norma. Contudo, diferentemente do que quer fazer entender o embargante não serve como justificativa para afastar a agravante prevista no art. 61, II, "f", do CP, por se equiparar a uma qualificadora, notadamente porque não se trata de elementar dos injustos penais cometidas no âmbito da violência doméstica e familiar. Ao contrário, tal vedação busca afastar a sensação de impunidade, vindo ao encontro da natureza afirmativa e protetiva da Lei n. 11.340/06. declaratórios. 3. À vista do exposto, vota-se pela rejeição dos embargos