XXVI Encontro Nacional de Tratamento de Minérios e Metalurgia Extrativa Poços de Caldas-MG, 18 a 22 de Outubro 2015

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Transcrição:

PRODUÇÃO DE COAGULANTE CLORETO FÉRRICO A PARTIR DE ÓXIDO DE FERRO III GERADO NO PROCESSO DE USTULAÇÃO DA PIRITA PRESENTE EM REJEITOS DE MINERAÇÃO DE CARVÃO LOPES, F.A. 1, MIOTELLI, H. 2, SCHNEIDER, I.A.H. 3, MENEZES, J.C.S.S. 4 1,3 Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Minas, Metalurgia e Materiais (PPG3M), Laboratório de Tecnologia Mineral e Ambiental (LTM), e-mail: ivo.andre@ufrgs.br 2,4 Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC), Programa de Pós-Graduação em Ciência e Biotecnologia, Laboratório de Estudos e Monitoramento Ambiental (LEMA), e-mail: jeancarlomenezes@gmail.com RESUMO A Indústria Carboquímica Catarinense, ICC, entrou em operação em 1979 com o processo de ustulação da pirita e conseguinte produção de ácido sulfúrico e ácido fosfórico, ambos matéria-prima básica para a produção de fertilizantes. No processo de ustulação, a ICC consumiu em treze anos mais de 2,3 milhões de toneladas de pirita. Com o fechamento da ICC, todo o resíduo sólido rico em pirita gerado devido a mineração e beneficiamento de carvão deixou de ter uma utilização industrial no Brasil e ainda restou 1,5 milhão de toneladas de Fe2O3, rejeito do processo de ustulação da pirita. Neste trabalho foi utilizado o Fe2O3 proveniente das operações da antiga ICC para a produção de coagulantes a base de ferro. O trabalho está em sintonia com os princípios atuais no que diz respeito ao desenvolvimento sustentável e aos programas de resíduo zero. PALAVRAS-CHAVE: DAM; óxido férrico; FeCl3; coagulante. ABSTRACT The Industry Carboquímica Santa Catarina, ICC, began its operations back to 1979 by roasting pyrite for producing sulphuric and phosphoric acids, both raw materials for the production of fertilizers. In the roasting process, the ICC consumed in thirteen years more than 2.3 million tons of pyrite. As the ICC was closed, all the solid waste generated due to coal mining and processing has lost its industrial application, remaining still 1.5 million tons of Fe2O3 as waste from the pyrite roasting process. This work used Fe2O3 from operations of the former ICC for producing the iron-based coagulants. The work is in agreement with sustainable development and zero-waste programs. KEYWORDS: AMD; ferric oxide; FeCl3; coagulant.

Lopes, F.A.; Miotelli, H.; Schneider, I.A.H.; Menezes, J.C.S.S. 1. INTRODUÇÃO Os empreendimentos do setor mineral trazem benefícios sociais e econômicos para a comunidade na qual o mesmo se localiza. No entanto, também podem acarretar sérios danos se conduzidos de forma inadequada e sem as devidas precauções no que se refere ao controle da poluição ambiental (Monteiro, 2004). Os rejeitos do beneficiamento do carvão, por conterem um alto teor de pirita, são geradores da drenagem ácida de minas (DAM). A DAM é considerada um problema ambiental grave, pela sua natureza, amplitude e dificuldade de resolução do problema. Os rios afetados por este tipo de contaminação caracterizam-se por sua alta acidez, assim como elevadas concentrações de sulfato, ferro, alumínio, manganês e outros metais (Kontopoulos, 1998). A geração de drenagem ácida de mina (DAM) é considerada um problema ambiental grave principalmente devido a difícil resolução prática deste problema. As águas superficiais e subterrâneas atingidas pela DAM apresentam alta acidez, altas concentrações de metais e elevadas concentrações de sulfato. (Barros et al., 2012). A geração da DAM ocorre através de uma série de reações, envolvendo etapas químicas e biológicas. A exposição natural da pirita ao ar e água provoca o início do processo, através de uma série de reações químicas, dando origem a formação de ácido sulfúrico, a oxidação do Fe 2+ a Fe 3+, que catalisa a reação de oxidação da pirita aumentando, ainda mais, a velocidade da geração de acidez no meio. O baixo ph promove a solubilização de outros metais existentes no meio, agravando ainda mais o impacto ambiental (Kontopoulos, 1998). No mundo são vários os exemplos de contaminação por DAM. Existem casos de ocorrência de DAM no complexo mineiro da Iron Mountain, na Califórnia (EUA), onde o processo de geração da DAM é natural em função da composição mineral daquela área, sendo a DAM nesta região classificada como hiperácida, uma vez que foram medidos valores negativos de ph (Barros et al., 2012). A bacia dos Rios Tinto e Odiel (Espanha), no cinturão pirítico da península Ibérica. Neste local, a DAM já ocorria naturalmente, mas foi agravada por vários empreendimentos de mineração (Ferris et al., 2004). No Brasil, o problema da geração de DAM não é menos grave, principalmente na região carbonífera de Santa Catarina, onde há um comprometimento significativo dos recursos hídricos. Os cursos d água apresentam elevada acidez, altos valores de ferro e sulfato, íons dissolvidos, resultando na destruição da biota aquática e eliminando as possibilidades de uso da água para as comunidades ribeirinhas (Menezes e Schneider, 2008; Centro de Ecologia, 2000). O controle da DAM pode ser realizado por métodos preventivos, de contenção e de remediação (Kontopoulos, 1998). Porém, poucos estudos têm levado em conta as possibilidades de uso da DAM para algo positivo. Nesse sentido, destacam-se os trabalhos de Rao et al., (1992), que abrem a possibilidade do uso direto da DAM na coagulação de efluentes e de (Menezes e Schneider, 2008) que sugerem a produção de coagulantes a base de ferro por processos de lixiviação de rejeitos

concentrados de pirita. (Buzin et al., 2014) produziram sulfato ferroso a partir de resíduo da produção de aço. Em Santa Catarina em 1979 entrou em operação a Indústria Carboquímica Catarinense (ICC), que aproveitava o rejeito piritoso produzido nas minas da região carbonífera catarinense, com alto teor de enxofre, e o transformava em ácido sulfúrico, que era adicionado ao ácido fosfórico, destinado à indústria de fertilizantes. Como a ICC necessitava de rejeito piritoso, para a região das minas era interessante porque reduzia as áreas de rejeito, mas para Imbituba, onde estava localizada a planta da empresa, a ICC era um desastre ambiental. Além da maldição do pó vermelho, decorrente de um projeto industrial com problemas estruturais, a ICC deixou depositado como rejeito na cidade 4,3 milhões de toneladas de gesso e 1,4 milhão de óxido de ferro (Moraes, 2004). Assim, o presente trabalho visa contribuir para uma destinação do resíduo rico Fe2O3 deixado como passivo por este empreendimento industrial. O objetivo foi produzir o coagulante cloreto férrico para uso no tratamento de água. 2. EXPERIMENTAL 2.1. Caracterização dos materiais As matérias-primas utilizadas na realização deste trabalho foram o óxido de ferro proveniente da ustulação da pirita pela empresa ICC e Ácido Clorídrico comercial. A amostra do resíduo proveniente do processo de ustulação da pirita foi coletada de acordo com a NBR 10007 que normatiza os procedimentos de amostragens de rejeitos no Brasil. No material coletado foram realizadas as seguintes análises visando a caracterização: determinação da distribuição granulométrica, difração de raios-x e fluorescência de raios-x. 2.2. Produção do Coagulante Cloreto Férrico (FeCl3) O coagulante Cloreto Férrico foi obtido pela reação direta do Óxido de Ferro III resultante do processo de ustulação dos rejeitos piritosos de carvão, com Ácido Clorídrico Comercial. Pelo fato da hematita ser o estado mais oxidado do óxido de ferro, contendo próximo de 70 % de ferro e 30 % de oxigênio, o produto desta reação é o cloreto férrico e não o cloreto ferroso, conforme segue (Leprevost, 1975): Fe2O3 + 6HCl H2O + FeCl3 (1) Na produção do coagulante a reação acima foi conduzida utilizando uma concentração de ferro acima da estequiométrica, visando consumir todo o Ácido Clorídrico utilizado no processo reacional. A reação foi conduzida em um reator aberto, temperatura de 80 o C por um período de duas horas. O coagulante produzido foi resfriado à temperatura ambiente e depois filtrado para remoção de material sólido não consumido durante a reação de produção do coagulante.

Lopes, F.A.; Miotelli, H.; Schneider, I.A.H.; Menezes, J.C.S.S. 2.3. Análise química dos coagulantes produzidos O coagulante Cloreto Férrico (FeCl3) produzido foi filtrado e analisado em relação aos parâmetros de interesse para fornecimento do produto para uso em uma companhia pública de saneamento (SANASA,2011). Os parâmetros analisados foram ferro, como concentração de FeCl3, Arsênio, Cádmio, Cromo, Mercúrio, Prata e Selênio. Ainda, mediu-se o percentual de resíduo insolúvel e densidade do coagulante produzido. Essas análises seguiram os procedimentos descritos no Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater (AWWA, 2005). Essas análises tiveram como objetivo avaliar a qualidade do coagulante gerado, quanto aos parâmetros acima descritos. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO A seguir são apresentados os resultados obtidos na caracterização do Óxido Férrico proveniente da ustulação do rejeito piritoso da mineração de carvão, da qualidade do coagulante Cloreto Férrico obtido em comparação com os requisitos de qualidade exigidos por uma tradicional empresa brasileira de saneamento para aquisição de Cloreto Férrico para suas estações de tratamento de água (ETA). 3.1. Caracterização do rejeito de ustulação da pirita O material inicialmente foi caracterizado quanto à sua distribuição granulométrica empregando um medidor a laser do tamanho de partículas, modelo Silas. A distribuição granulométrica é apresentada na Figura 1 e alguns parâmetros granulométricos estão listados na Tabela 1. Figura 1. Distribuição Granulométrica do Óxido Férrico. Tabela 1. Distribuição Granulométrica das Partículas. Parâmetros Resultados Diâmetro a 10% (µm) 0,84 Diâmetro a 50% (µm) 4,94 Diâmetro a 90% (µm) 22,24 Diâmetro médio (µm) 8,85

Como se esperava, obteve-se uma granulometria fina do material analisado, isso em virtude da pirita ser moída para então ser ustulada visando à produção de Ácido Sulfúrico. Os resultados obtidos apontam que o material apresenta um diâmetro médio de 8,85 µm. Uma granulometria fina facilita o processo de reação de formação do coagulante e diminui o tempo reacional em virtude da área de contato ser maior que um material com granulometria maior. Com o objetivo de determinar as fases majoritárias presentes no resíduo utilizado neste trabalho para produzir coagulante Cloreto Férrico, foi realizada uma difração de raios-x. O difratograma do material analisado é apresentado na figura 2. UST 900 800 700 600 Lin (Counts) 500 400 Hematita 300 Quartzo d=2.696 d=2.514 200 100 d=3.675 d=3.337 d=2.204 d=1.840 d=1.817 d=1.693 d=1.599 d=1.485 d=1.453 0 2 10 20 30 40 50 60 70 2-Theta - Scale UST - File: UST.RAW - Type: 2Th/Th locked - Start: 2.000 - End: 72.000 - Step: 0.020 - Step time: 1. s - Temp.: 25 C (Room) - Time Started: 2 s - 2-Theta: 2.000 - Theta: 1.000 - Phi: 0.00 - Aux1: 0.0 - Aux2: 0.0 - Aux Operations: Import 01-086-0550 (C) - Hematite - synthetic - Fe2O3 - Y: 9.02 % - d x by: 1. - WL: 1.5406 - Rhombo.R.axes - I/Ic PDF 3.3 - S-Q 83.6 % - 01-079-1910 (C) - Quartz - SiO2 - Y: 1.66 % - d x by: 1. - WL: 1.5406 - Hexagonal - I/Ic PDF 3.1 - S-Q 16.4 % - Figura 2. Difração de Raios-X do Óxido Férrico. Pode-se perceber a presença de Hematita (Fe2O3) como fase majoritária no material analisado e ainda a presença de um pico de quartzo (SiO2). Isso indica que o material é potencial matéria prima para a produção de Cloreto Férrico. Esse material foi submetido ainda, a uma análise por fluorescência de raios-x visando identificar os elementos presentes no material amostrado. Os resultados são apresentados na Tabela 2. O material analisado apresentou como elemento majoritário o Ferro (Fe) totalizando aproximadamente 87% do conteúdo elementar. Ainda há uma quantidade significativa de Alumínio (Al), Silício (Si) e Enxofre (S) e outros elementos em baixos teores. Os metais tóxicos como Mercúrio (Hg) e Cromo (Cr) tiveram uma resposta baixa o que é interessante para a produção do coagulante produzido neste trabalho.

Lopes, F.A.; Miotelli, H.; Schneider, I.A.H.; Menezes, J.C.S.S. Tabela 2. Fluorescência de Raios-x da Amostra de Rejeito da Ustulação de Pirita de Carvão Mineral em Termos de Massa Elementar Percentual. Elemento Massa (%) Al 2,026 As 0,016 Ca 0,822 Cd 0,346 Co 0,255 Cr 0,019 Cu 0,026 Fe 87,002 Hg 0,001 K 0,297 Mg ND Mn 0,050 Na ND Ni 0,019 P 0,188 Pb 0,173 S 1,984 Si 6,743 Zn 0,033 Total 100 *ND=Não detectado. 3.2. Caracterização do coagulante Cloreto Férrico produzido O coagulante produzido foi caracterizado levando em conta os requisitos da empresa SANASA utilizados em suas licitações. Uma imagem do coagulante produzido é apresentada na Figura 3. A Tabela 3 mostra os resultados das análises químicas do Cloreto Férrico. Figura 3. Cloreto Férrico Produzido Com Resíduo Rico em Óxido de Ferro III da ICC.

Tabela 3. Características Químicas do Coagulante Produzido e do Cloreto Férrico Comercial. Cloreto Férrico Especificação da SANASA para Cloreto Parâmetros Pirita Férrico Fe (%FeCl3) 41,66 >38 Resíduo Insolúvel (%massa) <0,1 < 0,1 Ferro Ferroso (% massa) 0 < 2,50 Acidez Livre (% massa) 0,80 <1,0 Ag (mg. kg -1 ) <0,005 <50,0 As (mg. kg -1 ) <0,0015 < 50,0 Cd (mg. kg -1 ) <0,005 < 10,00 Cr (mg. kg -1 ) 26,90 < 50,00 Hg (mg. kg -1 ) <0,05 <2,00 Se (mg. kg -1 ) <0,002 < 10,00 Densidade (g. cm -3 ) 1,4 >1,4 Os resultados das análises realizadas no coagulante produzido indicam que o mesmo atende aos requisitos comumente utilizados nas licitações das empresas públicas de saneamento para compra de Cloreto Férrico. O coagulante produzido tem uma concentração de Ferro como FeCl3 maior que o requesito mínimo, baixa concentração de sólidos insolúveis, ausência de Fe 2+ e baixa acidez livre. Também, não se observou a presença em quantidades substanciais de nenhum metal tóxico que possa impedir a comercialização do Cloreto Férrico para operações de coagulação em estações de tratamento de água. 4. CONCLUSÕES Através dos resultados obtidos no presente trabalho foi possível concluir que: É necessário que seja dada uma destinação adequada ao material residual do processo de produção de ácido sulfúrico pela empresa ICC, material este que hoje se encontra disposto no ambiente de forma inadequada, causando problemas como geração de poeiras e lixiviação de metais para o lençol freático e corpos hídricos da região no local onde o material está depositado; É possível, através do processo utilizado na produção do coagulante Cloreto Férrico, utilizando como fonte de Ferro o resíduo resultante do processo da ustulação de rejeitos piritosos da mineração de carvão e obter um produto com padrões de qualidade aceitáveis pelo mercado de coagulantes para uso em tratamento de água ou efluentes líquidos; A aplicação da metodologia proposta pode atribuir valor econômico à um rejeito industrial hoje considerado um problema ambiental da Cidade de Imbituba no Estado de Santa Catarina. O que vai de encontro com as modernas teorias de produção mais limpa e desenvolvimento sustentável.

Lopes, F.A.; Miotelli, H.; Schneider, I.A.H.; Menezes, J.C.S.S. 5. AGRADECIMENTOS UFRGS, Rede de Pesquisa de Carvão Mineral e CNPq. 6. REFERÊNCIAS ABNT (2004). NBR 10007- Amostragem de Resíduos Sólidos. Associação Brasileira de Normas Técnicas. Rio de Janeiro, 25p. AWWA-APHA-WEF, Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater. Editado por Eaton, A.D.; Clesceri, L.S.; Rice, E.W.; Greenberg, A.E. 21th Edition. Washington: American Public Health Association, 2005. BARROS, C.A. Métodos Para Tratamento Biológico de Drenagem Ácida de Mina- DAM. Rio de Janeiro: CETEM/MCTI, 2012. 39p. (Série Tecnologia Ambiental, 65). BUZIN, P.J.W.K.; VIGÂNICO, E.M.; SILVA, R.A.; HECK, N.C.; SCHNEIDER, I.A.H.; MENEZES, J.C.S.S. Prodution of Ferrous Sulfate From Steelmaking Mill Scale. International Journal of Scientific & Engineering Research, Volume 5, Issue 3, March-2014. FERRIS, F.G.; HALLBECK, L.; KENNEDY, C.D.; PEDERSEN, K. Geochemistry of Acidic Rio Tinto Headwaters and Role of Bacteria in Solid Phase Metal Partitioning. Chemical Geology Volume 212, Issues 3 4, 1 December 2004, Pages 291 300. KONTOPOULOS, A. Acid mine drainage control. In: Effluent Treatment in the Mining Industry. Castro, S.H.; Vergara, F.; Sánchez, M.A.; (Eds.). University of Concepción, 1998. LEPREVOST, A., Química Analítica dos minerais. Livros técnicos e Científicos Editora Ltda., Rio de Janeiro. Universidade Federal do Paraná, Curitiba. p. 393. 1975. MENEZES, J.C.S.M.; SCHNEIDER, I.A.H. Produção do Coagulante - Fe2(SO4)3 - para o Tratamento de Águas e Efluentes a Partir da Pirita Presente em Rejeitos de Carvão. In: XXII Encontro Nacional de Tratamento de Minérios e Metalurgia Extrativa, 2007, Ouro Preto. Anais. Ouro Preto: UFOP/UFMG/CDTN, v.ii, p. 393-399, 2007. MONTEIRO, K.V. (Coordenadora). Carvão: O Combustível de Ontem Porto Alegre: Núcleo Amigos da Terra Brasil, 2004. MORAES, F.F. de. A. Indústria Carboquímica Catarinense (ICC): uma solução ou um problema. In: GOULARTI FILHO, A. Memória e Cultura do Carvão em Santa Catarina. Florianópolis: Cidade Futura, 2004. NIU, X., LI, X., ZHAO, J., REN, Y., YANG, Y. Preparation and coagulation efficiency of polyaluminium ferric silicate chloride composite coagulant from wastewater of high-

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