ESTUDO DA INFLUÊNCIA DA UTILIZAÇÃO DE CINZA DE CALDEIRA A COQUE COMO ESTABILIZANTE DE SOLOS EM CAMADA DE PAVIMENTOS



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Transcrição:

ESTUDO DA INFLUÊNCIA DA UTILIZAÇÃO DE CINZA DE CALDEIRA A COQUE COMO ESTABILIZANTE DE SOLOS EM CAMADA DE PAVIMENTOS Virlene Leite Silveira Instituto Militar de Engenharia Seção de Fortificação e Construção Kíssyla Ávila Costa Instituto Militar de Engenharia Seção de Fortificação e Construção Claudeny Simone Alves Santana Instituto Militar de Engenharia Seção de Fortificação e Construção Antônio Carlos Rodrigues Guimarães Instituto Militar de Engenharia Seção de Fortificação e Construção RESUMO No presente trabalho foram avaliadas as características físicas, químicas e microestruturais de um resíduo sólido proveniente da indústria de beneficiamento do Níquel (Ni), denominada de cinza de caldeira a coque, mais especificamente cinza volante, visando à possibilidade de seu uso como estabilizante de solos em camadas de pavimentação. Devido à crescente preocupação da sociedade com as questões ambientais, torna-se necessário o estudo do tratamento, disposição e reaproveitamento de resíduos sólidos. Dessa forma a cinza de caldeira a coque, mais especificamente denominada cinza volante, possui potencial como agente efetivo para estabilização química ou mecânica de solos, principalmente em bases e sub-bases de pavimentação. As cinzas volantes podem aumentar a resistência e o dessecamento do solo e controlar a sua contração ou expansão. Neste contexto, estudar as características e o comportamento da cinza volante como componente em misturas para estabilização de base e sub-base é uma alternativa para se mitigar o passivo ambiental e contribuir para o estudo de material alternativo em pavimentação. São apresentados os resultados dos ensaios de caracterização da cinza volante, como sua estrutura superficial pelo Microscópio Eletrônico de Varredura (MEV) e composição química através da Espectroscopia de Energia Dispersiva (EDS). São divulgados ainda os resultados de ensaios de expansão de uma mistura de solo, com cinza volante, em teores de 20 e 30%, visando determinar o grau de expansão do solo estabilizado com a cinza volante. Com os resultados encontrados concluiu-se que a cinza atuou de forma cimentante na mistura solo-cinza, devido à diminuição das trincas, e é uma alternativa para diminuição do passivo ambiental. Palavras-chave: cinza de caldeira a coque; passivo ambiental; estabilização. ABSTRACT In this work we evaluate the physical, chemical and microstructural properties of a solid residue from the processing industry of Nickel (Ni), called ash coke boiler, specifically fly ash, seeking the possibility of its use as a soil stabilizer layered paving. Due to growing public concern about environmental issues, it is necessary to study treatment, disposal and reuse of solid waste. Thus, the boiler ash coke, more specifically referred to as fly ash, has potential as an effective agent for chemical or mechanical stabilization of soils, particularly bases and sub-bases flooring. Fly ash can increase the resistance and soil desiccation and control its expansion and contraction. In this context, studying the characteristics and behavior of fly ash as a component in mixtures for stabilizing base and sub-base is an alternative to mitigate the environmental damage and contribute to the study of alternative materials in pavement. Presents the results of laboratory characterization of fly ash as a surface structure by Scanning Electron Microscope (SEM) and chemical composition by Energy Dispersive Spectroscopy (EDS). Are also disclosed test results of expansion of a mixture of soil, fly ash, in amounts of 20 and 30%, in order to determine the degree of expansion of soil stabilized with fly ash. Based on the results it was concluded that the ash acted in mixing cement-gray soil, due to the decrease of cracks, and is an alternative to reducing the environmental liability. Keywords: boiler ash coke; environmental liabilities; stabilization.

1. INTRODUÇÃO Um dos principais indicadores do desenvolvimento econômico de uma comunidade e/ou país consiste nas condições que seus habitantes têm de se locomover de um ponto ao outro, seja para deslocamento próprio, ou integração das áreas de produção e consumo no mercado interno e externo, dentre outras inúmeras atividades. Portanto, a disponibilidade de infraestrutura com logística adequada dos diversos tipos de modais de transporte é extremamente relevante para a economia mundial (LOPES, 2011). A demanda por materiais de infra-estrutura viária é enorme e se restringe muitas vezes às jazidas de materiais primários (brita, solo, areia, etc). Sendo assim, pode-se dizer que a oferta de materiais de infraestrutura, gera modificações nas avaliações de viabilidade econômica de materiais ditos alternativos. Tratando de materiais residuais destaca-se a chamada cinza de caldeira a coque ou mais especificamente cinza volante. De acordo com Netto (2006) e Leandro e Fabbri (2001) as cinzas já vêm sendo reutilizadas desde os anos trinta, quando estas começaram a estar disponíveis em quantidades significativas, sendo inicialmente matéria prima incorporada na fabricação de concretos e cimento Portland pozolânico. De acordo com Vasconcellos et al (2004), as cinzas são geradas a partir da queima do carvão em caldeiras de carvão pulverizado, onde aproximadamente três quartos da cinza produzida é leve o bastante para ser arrastada com os gases de combustão, são as chamadas cinzas leves ou cinzas volantes e em sua maior parte é coletada por equipamentos de retenção, como precipitadores eletrostáticos e as cinzas remanescentes são densas o suficiente para não serem emitidas para a atmosfera e caem, no fundo da caldeira, fundidas em partículas maiores, chamadas de cinzas pesadas ou residuais. As cinzas volantes se encontram no grupo de rejeitos industriais gerados em grande volume anualmente e são muitas vezes descartadas de forma inadequada no meio ambiente, sem nenhum critério técnico, ou demandam custos elevados relativos à estocagem e destinação final, fato que para uma usina se torna um problema, pois passa a ter que se preocupar com a adoção de práticas de disposição em áreas adequadas e medidas de proteção necessárias. Como forma de gestão, entre outras maneiras de reutilização, tem-se desenvolvido diversos estudos de modo a introduzir a cinza de caldeira a coque também como estabilizante de solo em camadas de pavimentos. VOGT (1971) define a estabilização como todo método que visa aumentar, de maneira durável, durante todas as estações do ano, a resistência de um material aos esforços desenvolvidos pelo tráfego e aos efeitos destruidores exercidos pelas intempéries, através da alteração de qualquer uma de suas propriedades, de forma a melhorar seu comportamento sob o ponto de vista da engenharia. Constituindo, portanto alternativa possivelmente viável em termos técnicos e econômicos. Neste contexto, define-se como objetivo deste trabalho o estudo da reutilização deste tipo de rejeito da indústria siderúrgica na estabilização de solos em camadas de pavimentos, buscando contribuir para diminuir os grandes volumes ocupados em pátios de resíduos, como uma alternativa para se mitigar o passivo ambiental e contribuir para o estudo de material alternativo na pavimentação.

2. MATERIAIS E MÉTODOS A Cinza volante e o solo foram recebidos pelo Laboratório de Ligantes e Misturas Betuminosas do Instituto Militar de Engenharia - IME (FIGURA 1a e 1b). A cinza é proveniente de uma siderurgia de beneficiamento de Níquel e o solo utilizado na mistura solocinza tem origem de uma jazida localizada em Carajás PA. Figura 1: Solo (a) e cinza volante (b) recebidos pelo laboratório de Ligantes e Misturas Betuminosas do Instituto Militar de Engenharia IME. A cinza volante e o solo foram caracterizados também por meio de ensaios de caracterização microestrutural por meio de Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) e caracterização química por meio da Espectroscopia de Energia Dispersiva (EDS) utilizando 3 diferentes pontos de uma mesma amostra para tornar os resultados representativos. Os ensaios de caracterização do solo envolveram os ensaios de análise granulométrica por sedimentação para caracterização da parte fina e por peneiramento (DNER-ME 051/94), limites de Liquidez (DNER-ME122-94) e Limites de Plasticidade (DNER-ME 082/63), determinação do teor de umidade higroscópica (DNER-ME 051/94) e MCT expedito proposto por Nogami e Villibor (1981). A mistura solo-cinza foi ensaiada de forma visual por meio de uma adaptação ao método do MCT expedito, onde se analisou o fator expansão/inchamento utilizando teores de 20 e 30% de cinza volante. Na mistura de 20 e 30% foram utilizados 350g de solo juntamente com 150g de cinza e 400g de solo com 100g de cinza respectivamente. O método consistiu em submeter à mistura à condição plástica e a uma sequência de procedimentos: acondicionamento por 8 horas em almofariz, retirada do excesso de água e molde em pastilhas, acondicionamento em estufa a 100ºC, submissão à medição de contração e em seguida à condição de absorção de umidade por 2 horas e finalmente a verificação de expansão/inchamento.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES 3.1 Caracterização do solo A primeira característica que diferencia os solos é o tamanho das partículas que os compõe, não sendo fácil identificar o tamanho das partículas pelo simples manuseio do solo, portanto faz-se necessário a caracterização granulométrica do solo, e esta segue apresentada pela Figura 2. Figura 2: Distribuição granulométrica. De acordo com a Figura 2, é possível a determinação da percentagem em peso que cada faixa especificada de tamanho de partículas representa na massa total ensaiada. Foi possível então observar, por meio de análise granulométrica por sedimentação para caracterização das partículas finas e peneiramento, que grande parte do material, cerca de 63% se encontra na faixa entre 4,8mm a 3, caracterizando um material pedregulhoso. Através deste ensaio é possível a construção da curva de distribuição granulométrica, esta que é de tamanha importância para a classificação dos solos bem como a estimativa de parâmetros para filtros, bases estabilizadas, permeabilidade, capilaridade etc., podendo ser feita apenas por peneiramento como neste caso ou por peneiramento e sedimentação, se necessário. Os ensaios para determinação dos limites de Atterberg foi feito calculando os limites de liquidez - LL por meio do aparelho Casagrande e de plasticidade LP (Figura 2a e 2b), O índice de plasticidade é definido pela diferença entre os dois limites: IP: Índice de Plasticidade LL: Limite de Liquidez LP: Limite de Plasticidade IP = LL LP (1) Este índice determina o caráter de plasticidade de um solo, assim, quando maior o IP, tanto mais plástico será o solo. O solo em estudo apresentou IP igual a 3,5% caracterizando um solo pouco plástico. O que representa as características de comportamento do material analisado

O índice de plasticidade em pavimentação primária é de fundamental importância, pois o solo deve apresentar um índice de plasticidade médio. Se for baixo demais o solo não apresentará uma boa coesão, se for alto demais ocasionará muita dificuldade ao processo de compactação. Se tratando de Base, Sub Base, objeto desta pesquisa, esta característica é menos relevante, pois o objetivo é de se alcançar um grau de compactação acima do que se poderia esperar utilizando-se apenas água e a análise dos Limites implicará apenas à necessidade ou não de adição e, de que tipos de agregados, para correção desta característica. Umidade higroscópica representa a máxima quantidade de água, em percentagem, que o solo é capaz de adsorver da atmosfera, em forma de vapor, e manter em equilíbrio com o ambiente, é a água perdida por uma amostra de solo seca ao ar, quando aquecida a 105-110ºC, por 24 horas, em uma estufa. Através do ensaio o valor encontrado para umidade higroscópica foi de 5,9%. Por meio do método MCT expedito, foi possível observar que o solo se enquadra na classificação LA -LG ou seja, possui características de solos arenosos lateríticos e argilosos lateríticos, com penetração média de 0,14mm e contração diametral média de 1mm. Conforme Figura 3a observou-se também que houve a presença de trincas em todas as pastilhas. Ao submeter as pastilhas em uma pedra porosa afim de observar a amostra às condições de alta umidade verificou-se que o solo não apresenta características de expansão/inchamento como apresentado na Figura 3b. Figura 3: Pastilhas com amostras de solo apresentando trincas (a) pastilhas em pedra porosa para verificação de expansão/ inchamento (b). De acordo com a Figura 3 a presença de trincas representa uma característica típica de solos lateríticos, tais trincas proporcionam maior resistência a cada bloco trincado individualmente quando comparado ao bloco como um todo. Em uma das pastilhas na Figura 3ª não houve trincamento em apenas uma dos lados. A caracterização microestrutural da amostra de solo feita por meio do MEV e apresentada pela Figura 4 e sua caracterização química por meio de EDS pela Tabela 1.

Figura 4: Imagem de alta resolução do solo com aumento de 400x (a) e 200x (b) A Figura 4 apresenta uma fração fina do solo utilizada no ensaio de MEV e EDS. Por meio dela pode-se observar que o solo possui seixos arredondados e partículas porosas. A caracterização química, realizada por meio de EDS, do solo estudado é descrita através da Tabela 1 Tabela 1: Composição química do solo por meio do EDS. Amostra 01 Amostra 02 Amostra 03 Composição Porcentagem Composição Porcentagem Composição Porcentagem Al 2 O 3 40,80 Al 2 O 3 42,8 Al 2 O 3 45.28 SiO 2 43,06 SiO 2 43,37 SiO 2 42.15 TiO 2 3,69 TiO 2 2,04 TiO 2 1.56 FeO 12,45 FeO 11,78 FeO 11.01 Na tabela 1 são listados os principais componentes do solo tais como Al 2 O 3, SiO 2, TiO 2 e FeO. Sendo que os maiores constituintes são o Al 2 O 3 e SiO 2, com porcentagens médias de 42,96% e 42,86% respectivamente. 3.2 Caracterização da cinza A caracterização microestrutural da cinza volante utilizada no presente estudo, realizada pelo MEV, é apresentada na Figura 5. Figura 5: Imagem de alta resolução do cinza com aumento de 400x (a) e 300x (b)

Conforme a Figuras 5 apresentada foi possível observar que a cinza possui pequena granulometria e estrutura porosa, o que induz seu uso como material fino em camadas de pavimentos. A cinza ensaiada na Figura 5, considerada uma amostra representativa do material, serviu também para a realização da caracterização química por meio do EDS e seus resultados estão apresentados na Tabela 2. Tabela 2: Composição química da cinza volante por meio do EDS. Amostra 01 Amostra 02 Amostra 03 Composição Porcentagem Composição Porcentagem Composição Porcentagem MgO 2,86 MgO 3,11 MgO 0,6 Al 2 O 3 3,84 Al 2 O 3 1,89 Al 2 O 3 3,92 SiO 2 9,38 SiO 2 3,60 SiO 2 1,82 SO 3 16,27 SO 3 17,60 SO 3 12,77 K 2 O 0,24 K 2 O 0,40 K 2 O 0,47 CaO 56,65 CaO 71,12 CaO 79,63 V 6,84 V 0,49 V 0,48 FeO 2,12 FeO 1,58 FeO 0,31 NiO 1,8 NiO - NiO - Cu - Cu 0,21 Cu - Os principais componentes da cinza tal como listado na Tabela 2 são: como SO 3 e CaO, com porcentagens médias de 15,54% e 69,13 respectivamente. Os elementos apresentados pela tabela são esperados em cinzas provenientes do beneficiamento de níquel. É importante ressaltar a ausência de contaminantes em sua composição, acentuando ainda mais o seu possível uso em camadas da pavimentação. 3.3 Caracterização da mistura solo-cinza A mistura solo-cinza ensaiada por meio de uma adaptação ao método do MCT expedito é apresentada pela Figura 6. Figura 6: Mistura solo-cinza com 20% de cinza (a) e 30% de cinza (b) Ambas as misturas de solo-cinza não apresentaram nenhum padrão de inchamento/expansão, foi observado um pequeno grau de contração, isso pode ser devido à presença da cinza que gerou uma ação cimentante com as partículas do solo, o mesmo pode ser observado pela ausência de trincas na mistura comparado às amostras de solo natural.

4. RECOMENDAÇÕES FINAIS No presente trabalho mostrou-se que o solo estudado possui características de um solo arenoso laterítico e argiloso laterítico, tal solo apresentou trincas, quando submetido ao método MCT, o que corrobora ser um solo tropical. O índice de plasticidade do solo foi de 3,5%, atendendo assim a norma para sua utilização em obras de pavimentação. A composição química do solo também reafirma a proposição de ser um solo tropical, uma vez que apresenta em sua composição Sílica e Ferro, elementos predominantes nestes tipos de solo. A composição química da cinza mostrou a ausência de contaminantes ao meio ambiente. O padrão de trincamento típico de solos lateríticos, observado no solo em estudo, foi relevante para a pesquisa, pois tanto para os teores de 20% e 30% não houve presença de trincamentos enquanto a amostra de solo natural apresentou trincas significantes, verificando a ação cimentante da cinza volante. O presente estudo é base para procedimentos futuros a fim de se determinar a melhoria da qualidade de misturas solo-cinza a serem empregados em obras de pavimentação como base e sub-base. Contudo o estudo é de extrema importância no que se refere a destinação de um resíduo sólido, uma vez que a cinza volante pode se tornar um passivo ambiental demandando de grandes áreas e/ou custos com tratamento para disposição final.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DNER (1994): Método de ensaio 051 Solos Análise granulométrica. Departamento Nacional de Estradas de Rodagem. DNER (1994): Método de ensaio 122 Solos Determinação do limite de Liquidez método de referência e método expedito. Departamento Nacional de Estradas de Rodagem. DNER (1994): Método de ensaio 082 Solos Determinação do limite de Plasticidade método de referência e método expedito. Departamento Nacional de Estradas de Rodagem. LOPES, L. S. E. (2011). Análise do Comportamento Mecânico e Ambiental de Misturas Solo-Cinzas de Carvão mineral para Camadas de Base de Pavimento. Dissertação de Mestrado. PUC-Rio. Rio de Janeiro LEANDRO, R. P. FABBRI, G. T. P., Aproveitamento da cinza pesada de carvão, mineral na construção de bases e sub-bases de pavimentos flexíveis. P 1-8 São Carlos, São Paulo, 2001. VASCONCELLOS, C. B. O Aproveitamento da cinza de caldeira na construção civil. VÉRTICES, v. 6, n. 1, jan./abr. Campos dos Goytacazes, 2004. NETTO, R. M. Materiais pozolânicos. Monografia. Escola de Engenharia da UFMG. Belo Horizonte, 2006 VOGT, J. C. Estabilização Betuminosa. In: 7º Simpósio sobre pesquisas rodoviárias. Rio de Janeiro, 1971. NOGAMI, J. S. VILLIBOR, D. F. Uma nova classificação de solos para finalidades rodoviárias. IN: Simpósio Brasileiro de Solos Tropicais. Anais..., Rio de Janeiro/ RJ: COPPE/ABMS, 1981. p. 30-40 Virlene Leite Silveira. End.: Rua Voluntários da Pátria, Número 01, Apartamento 711, Botafogo, Rio de Janeiro, Brasil. Contatos: (21)8431-1158; virlene_cea@hotmail.com Kíssyla Ávila Costa. End.: Rua Voluntários da Pátria, Número 01, Apartamento 711, Botafogo, Rio de Janeiro, Brasil. Contatos: (21)8877-4413; kissyla_avila@hotmail.com Claudeny Simone Alves Santana. Voluntários da Pátria, Número 01, Apartamento 711, Botafogo, Rio de Janeiro, Brasil. Contatos: (21) 8425-6304; cl_deny@yahoo.com.br Antônio Carlos Rodrigues Guimarães. End.: Rua Artur Bernardes, Número 21, Apartamento 204, Catete, Rio de Janeiro, Brasil. Contatos: (21)8671-3118; guimaraes@ime.eb.br