ESTRUTURA E COMPOSIÇÃO DA ICTIOFAUNA DO MÉDIO RIO CASCA, BACIA DO (ALTO) RIO DOCE, MINAS GERAIS, BRASIL Siqueira, R.C.; Oliveira Júnior, P.R.; Silveira, V.C; Melo, R S.; Teixeira, T.M.; Guedes, E.A; Sousa, V. M. Resumo: Estudos para a avaliação de impactos ambientais em rios são, tradicionalmente, focados em espécies de peixes de importância econômica ou migradoras. Este procedimento equivocado tem contribuído para o declínio de peixes nativos, em grande parte de pequeno porte, que requerem ambientes lóticos, mas que, não necessariamente, realizam longas migrações ou apresentam importância econômica. O presente trabalho teve por objetivo descrever os padrões de espaço temporal da diversidade da ictiofauna do médio rio Casca ao longo de quatro unidades geográficas do trecho longitudinal da drenagem, bem como realizar um inventário das espécies presentes na região. As campanhas de estudo da ictiofauna foram realizadas trimestralmente durante um ano, em quatro pontos do médio rio Casca. Os peixes foram coletados com redes de emalhar de malhas 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10 e 12 cm entre nós opostos e os dados obtidos foram tratados através dos índices: Shannon Wiener, Pielou, Jackknife 1ª Ordem, Sorensen e Jaccard. Foram coletados na região 184 indivíduos distribuídos em quatorze espécies, dez famílias e quatro ordens, totalizando 37.65Kg de biomassa. Palavras-Chave: peixes; redes-de-emalhar; migrações; inventário. Introdução: O Brasil é considerado um país megadiverso em relação à fauna de peixes de água doce, fato relacionado à grande diversidade e ao tamanho de suas bacias hidrográficas. Além do grande número de espécies, muitas delas são endêmicas. Apesar de o país possuir uma vasta diversidade de peixes, várias regiões vêm apresentando uma significativa redução na diversidade de peixes nativos, principalmente pela degradação dos habitats, a pesca predatória e a introdução de espécies exóticas, que juntos provocam a desestruturação das comunidades ou até mesmo a extinção local de algumas espécies. Estudos para a avaliação de impactos ambientais em rios são, tradicionalmente, focados em espécies de peixes de importância econômica ou migradoras. Este procedimento equivocado tem contribuído para o declínio de peixes nativos, em grande parte de pequeno porte, que requerem ambientes lóticos, mas que, não necessariamente, realizam longas migrações ou apresentam importância econômica. O resultado desta visão simplificada tem sido o empobrecimento progressivo da ictiofauna em diversas bacias brasileiras, o que não tem se mostrado diferente na bacia do rio Doce (PIRH DOCE, 2007). Minas Gerais, pela sua posição geográfica, possui um sistema hidrográfico que abrange a maior parte das bacias brasileiras. Ao todo, são quinze bacias, das quais apenas duas (Paraíba do Sul e Tietê) não possuem suas nascentes dentro dos limites estaduais (DRUMOND et al., 2005). O estado abriga uma ictiofauna nativa estimada em 354 espécies, o que representa quase 7,9% das 4.475 espécies de peixes de água doce encontradas no Brasil (REIS et al., 2003). Por representar 18% da capacidade geradora de energia elétrica no Brasil, Minas Gerais deve ter especial atenção no que se refere aos impactos ambientais ocasionados por esses empreendimentos (BRAGA & REZENDE, 2007). Dentre esses impactos, destacamse aqueles sobre a fauna aquática, em especial sobre a ictiofauna (COMASE, 1994).
A Bacia Hidrográfica do rio Doce apresenta uma significativa extensão territorial, abrangendo cerca de 83.400 km², dos quais 86% pertencem ao estado de Minas Gerais e, o restante, ao estado do Espírito Santo, alcançando, total ou parcialmente, áreas de 228 municípios, sendo 202 em Minas Gerais e 26 no Espírito Santo (ANA, 2009). O rio Casca, objeto de estudo deste trabalho, possui suas nascentes nos municípios de Cajuri, Coimbra e Ervália, e é afluente pela margem direita do alto rio Doce. O principal objetivo deste estudo foi descrever os padrões espaço temporais da diversidade da ictiofauna do médio rio Casca ao longo de quatro unidades geográficas do trecho longitudinal da drenagem, bem como realizar um inventário das espécies presentes na região. Metodologia: As Campanhas de estudo da Ictiofauna foram realizadas trimestralmente durante um ano, em quatro pontos do médio rio Casca (Figura 01), a fim de se completar um ciclo hidrológico completo. As amostragens foram realizadas nos meses de Janeiro, Abril, Julho e Outubro de 2009. Nas quatro estações especificadas anteriormente, os peixes foram coletados com redes de emalhar de malhas 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10 e 12 cm entre nós opostos. Esta amostragem é aqui definida como quantitativa. Nestas amostragens, as redes de emalhar foram armadas ao entardecer e retiradas na manhã do dia seguinte. O esforço (m² de redes) utilizado em cada estação foi padronizado, de modo a permitir comparações, tanto durante o estudo quanto futuramente. Foram empregados como forma qualitativa de obtenção de dados, outros artefatos de pesca (tarrafas, redes tipo picaré, redes de arrasto e peneiras). Os peixes capturados foram acondicionados em sacos plásticos, etiquetados, separados por estação, tipo de ambiente, artefato de pesca e malhas. Após este procedimento, todos os exemplares foram acondicionados em recipientes apropriados e fixados em formalina 10%. Em laboratório, todo o material foi lavado e conservado em solução de álcool etílico a 70 GL. Todos os exemplares capturados, através das redes de espera, foram identificados, etiquetados, pesados e medidos (comprimento padrão). Resultados e Discussão: Figura 01 Área de estudo Foram coletados na região 184 indivíduos, totalizando 37.65Kg de biomassa (tabela 01). Os peixes amostrados estão distribuídos em quatorze espécies, dez famílias e quatro ordens (Tabela 02), totalizando 21,87% das 64 espécies inventariadas para a porção mineira do Rio Doce. (DRUMMOND, 2005).
Tabela 01. Número de indivíduos e biomassa amostrados por campanha e por ponto. Número de Indivíduos por campanha/ponto Janeiro Abril Julho Outubro Total Peso Ponto 1 12 10 10 6 38 12.94 Ponto 2 18 16 14 14 62 13.67 Ponto 3 11 1 15 6 33 5.96 Ponto 4 13 5 9 24 51 5.08 Total 54 32 48 50 184 37.65 Tabela 02. Lista de espécies de peixes registrados nas áreas amostradas. Ordem, família, espécie, nomes populares das espécies, área do registro (A1, A2, A3 e A4), registro que permitiu identificá-las, status nas listas vermelhas. Ordem Família Espécie Nome Popular A1 A2 A3 A4 Registro Status Characiformes Anostomidae Leporinus copelandi Piau Vermelho X X X X Coleta Não Ameaçado Characidae Astyanax bimaculatus Lambari X X X X Coleta Não Ameaçado Oligosarcus argenteus Bocarra X Coleta Não Ameaçado Erythrinidae Hoplias malabaricus Traíra X X X X Coleta Não Ameaçado Gymnotiformes Gymnotidae Gymnotus carapo Sarapó X X Coleta Não Ameaçado Siluriformes Auchenipteridae Parauchenipterus striatulus Cumbaca X Coleta Não Ameaçado Callichthyidae Hoplosternum littorale Tamboatá X Coleta Não Ameaçado Clariidae Clarias gariepinus Bagre Africano X Coleta Exótico Heptapteridae Rhamdia quelen Bagre X X X X Coleta Não Ameaçado Loricariidae Hypostomus affinis Cascudo X X X X Coleta Não Ameaçado Delturus carinotus Cascudo Laje X X Coleta Não Ameaçado Loricariichthys castaneus Cascudo viola X X X Coleta Não Ameaçado Perciformes Cichlidae Geophagus brasiliensis Acará X X X X Coleta Não Ameaçado Tilapia rendalli Tilápia X X Coleta Exótico As espécies mais abundantes foram Astyanax bimaculatus (Lambari), Hypostomus affinis (Cascudo) e Hoplias malabaricus (Traíra), (Figura 04). As duas espécies exóticas inventariadas na área de estudo não tiveram número significativo de indivíduos, sendo: Clarias gariepinus (Bagre Africano) e Tilapia rendalli (Tilápia) com 2 indivíduos cada, coletados na campanha 4, no mês de outubro. A família Loricaridae foi a que apresentou maior riqueza de espécies, 21% do total de espécies, seguida das famílias Characidae e Cichlidae, ambas com 14%.
Figura 02 Amostra dos exemplares coletados A comparação da similaridade mostrou que os pontos 1 e 2 apresentam maior similaridade. Os menores índices foram observados no ponto 4. O gráfico 01 mostra uma comparação entre o S-observado (curva do coletor) e o S- estimado (índice de Jackknife 1ª ordem) para cada amostra, formando a curva da eficiência amostral. A diversidade de espécies na região variou entre 1,4 e 1,99 (gráfico 02). O ponto 1 apresentou maior diversidade (1,99), e o ponto 4 (1,4) a menor. Gráfico 01 Curva do coletor Gráfico 02 Índice de Shannon-Wiener Gráfico 03 Índice de Equabilidade de Pielou Gráfico 02 Índices de Similaridade de Jaccard e Sorensen
Conclusão: As comparações entre as áreas amostrais, no que diz respeito à similaridade, diversidade e equabilidade, mostraram que o ponto (4) apresentou os menores valores, quando comparado com os demais pontos. Isso pode ser explicado pelo fato deste ponto estar inserido logo após os vilarejos de Águas Férreas e Vista Alegre, onde esses animais estão susceptíveis a poluição pelo esgoto doméstico, bem como à prática da pesca predatória. Os dados obtidos não podem ser considerados como o total da ictiofauna do rio Casca, por se tratar apenas de um ciclo hidrológico e ter sido amostrado somente um trecho do rio Casca. Esse número representa apenas o total das espécies estimadas para a metodologia e o esforço amostral utilizado. Agradecimentos: Agradeço a Deus por estar sempre presente em minha vida e aos meus colegas de trabalho da Vert Ambiental Consultoria e Projetos pelo apoio recebido. Referências: ANA Agência Nacional das Águas. Disponível em http://www.ana.gov.br/cbhriodoce/bacia/caracterizacao.asp Acessado em 11 de janeiro de 2010 às 15:00. BRAGA, V. M. & REZENDE, J. L. P. Proteção legal das áreas de preservação permanente no entorno de hidrelétricas no Estado de Minas Gerais. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Lavras, Lavras, 87 p. 2007. COMASE. Seminário Sobre Fauna Aquática e o Setor Elétrico Brasileiro: Reuniões Temáticas e Preparatórias. Comitê Coordenador das Atividades de Meio Ambiente do Setor Elétrico, Rio de Janeiro: Eletrobrás, 4 cadernos. 1994. DRUMOND, M. M. et al,. Morfologia gonadal de piranhas e pirambebas (Characiformes, Serrasalminae) da represa de Três Marias, MG. In: XIX Jornada de Biologia. Resumos, Belo Horizonte: PUC Minas. 2005. PIRH DOCE. Plano Integrado de Recursos Hídricos da Bacia do Rio Doce e dos Planos de Ações de Recursos Hídricos para as Unidades de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos no Âmbito da Bacia do Rio Doce CONSÓRCIO ECOPLAN LUME. 2007 REIS, R. E. et al. Check list of the freshwater fishes of South and Central America. EDIPUCRS, Porto Alegre. 1-729p. 2003.