AS POPULAÇÕES TRADICIONAIS NOS MODELOS DE GESTÃO TERRITORIAL DA AMAZONIA SUL OCIDENTAL: REFLEXÕES SOBRE A REGIONAL ALTO ACRE



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Transcrição:

AS POPULAÇÕES TRADICIONAIS NOS MODELOS DE GESTÃO TERRITORIAL DA AMAZONIA SUL OCIDENTAL: REFLEXÕES SOBRE A REGIONAL ALTO ACRE ALEXSANDE DE OLIVEIRA FRANCO 1 Resumo: A presente pesquisa tem como objetivo analisar os diferentes modelos de gestão territorial implantados no estado do Acre, buscando evidenciar o trato de cada um desses para com as comunidades tradicionais. O recorte espacial da pesquisa é a regional do Alto Acre e o recorte temporal o período de 1990 a 2015. Nessa regional, os modelos de gestão territorial são diversificados. Entre os grupos tradicionais, destacam-se os seringueiros, ribeirinhos, extrativistas e indígenas. Tais grupos possuem uma estreita relação com o seu território. Para operacionalizar a pesquisa, de cunho exploratório, utiliza-se dados secundários com pesquisa bibliográfica. Os resultados apontam desde modelos que expropriam os povos e comunidades tradicionais, até modelos que fortalecem a integração destes. Palavras-chave: População tradicional; Gestão territorial; Amazônia. Abstract: This research aims to analyze the different models of territorial management implemented in the state of Acre, to disclosing the treatment of each of these towards the traditional communities. The spatial area of research is the Regional Alto Acre and the time frame from 1990 to 2015. At regional level, the territorial management models are diversified. Among traditional groups, stand - tappers, riverside, extractive and indigenous. Such groups have a close relationship with its territory. To operationalize the research, exploratory, it uses secondary data with literature. The results point from models expropriate people and traditional communities, even models that strengthen their integration Key-words: Traditional population; Land management; Amazon. 1 Introdução O estado do Acre está localizado na Amazônia sul ocidental, faz fronteira nacional com os estados do Amazonas e Rondônia, e internacional com o Peru e a Bolívia. O Acre possui duas mesorregiões denominadas Vale do Acre e Vale do Juruá. Possui ainda cinco microrregiões: Juruá, Tarauacá/Envira, Purus, Baixo Acre e Alto Acre. (Figura 1). Essa última corresponde à área delimitada para este estudo. 1 - Acadêmico do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual de Ponta Grossa. E-mail de contato: aofrancoufac@hotmail.com 6072

Figura 1 Regionais de Desenvolvimento do Acre e respectivos municípios Fonte: ACRE, 2006 O Acre passou por diferentes formas de ocupação e ordenamento territorial ao longo de sua historia. O presente artigo visa analisar os diferentes modelos de gestão territorial implantados na microrregional do Alto Acre, buscando evidenciar o trato de cada um desses para com os povos e comunidades tradicionais encontrados. 2 Gestão territorial do Acre breve contextualização A região Amazônica sempre suscitou muita discussão, seja pela sua extensão, seja pela complexidade e desafio em sua ocupação. Essa região passou por diferentes fases de apropriação ao longo de dois séculos, no entanto, foi durante os últimos 70 anos que houve nela um apoderamento mais consistente. O estado do Acre enquadra-se nesse contexto. Assim como o restante da Amazônia, o Acre foi apropriado em função do desenvolvimento de atividades econômicas e de incentivos financeiros e fiscais dados pelo poder público. 6073

O processo de ocupação do Acre, para fins deste estudo, pode ser divido em três períodos: 1º.) Até 1945 (fim da Segunda Guerra Mundial), marcado por políticas territoriais voltadas à produção da borracha; 2º.) De 1945 até a década de 1980, a gestão preocupava-se em ocupar a região a qualquer forma, grandes latifúndios formaram-se nesse período e junto modelos territoriais importados do Centro Sul para a Amazônia; e 3º.) Da década de 1990 até a atualidade, centrado na reestruturação e reorganização territorial da região para o grande capital com grandes obras de infraestrutura e também o surgimento de muitas unidades de conservação e demarcação de terras indígenas. Em função da diversificação nas formas de uso e ocupação da terra e dos diferentes atores envolvidos, assiste-se no Acre a uma série de conflitos sociais, culturais, econômicos e ambientais. Com isso, diferentes modalidades de gestão territorial estão sendo adotadas (Figura 2). Figura 2 Gestão Territorial do Acre Fonte: Adaptado de ACRE, 2010. Cada modalidade de gestão possui um objetivo de ocupação e dinâmica regional. As modalidades hoje existentes no Acre são (ACRE, 2010): 1) Unidades de Conservação de Proteção Integral (Parque Nacional, Parque Estadual e Estação 6074

Ecológica); 2) Unidades de Conservação de Uso Sustentável (Reserva Extrativista, Floresta Nacional, Floresta Estadual, Áreas de Relevante Interesse Ecológico); Terras Indígenas e Projetos de Assentamento de diferentes modalidades. Na regional do Alto Acre, a diversidade de modelos de gestão, apontada para o estado, também se faz presente, sobretudo os modelos implementados após a década de 1990. Desta forma, opta-se por estes recortes espacial e temporal para um maior aprofundamento da análise. Propõe-se, assim, refletir sobre a gestão territorial, as transformações no uso e ocupação da terra, bem como, os conflitos territoriais presentes no Acre, mais detidamente nesta regional. Os recortes espacial e temporal da pesquisa se justificam também em função das grandes transformações ocorridas nessa área e nesse período, a saber: pavimentação de estradas, expansão de núcleos urbanos, criação de rotas de exportação, criação de unidades de conservação, delimitação de terras indígenas, implantação de projetos de assentamento, expansão de fazendas de criação de gado e agricultura, além dos constantes conflitos de terra entre posseiros, grileiros e populações tradicionais. 3 Os modelos de gestão no Alto Acre e seus Problemas A forma como uma sociedade conceitua a natureza determina de qual maneira ela vai se relacionar com esta. (SILVA, 2011). As populações tradicionais utilizam e dependem dos recursos naturais da floresta para sobreviverem. Essas comunidades prestam um serviço público na defesa da biodiversidade, por isso merecem o reconhecimento de seus préstimos ao meio ambiente. (GRZEBIELUKA, 2012). É importante mencionar com relação às populações tradicionais na regional Alto Acre, que essas são seringueiros, ribeirinhos, extrativistas e indígenas. Essas populações tradicionais possuem uma estreita relação com o seu território desenvolvendo inter-relações econômicas, sociais, culturais e ambientais. Dessa forma, essas populações enfrentam problemas sociais, econômicos, culturais e ambientais. Uma gestão territorial adequada pelo poder público pode contribuir para amenizar tais problemas. Para Becker (1988), a gestão do território 6075

como prática estratégica do poder no espaço, integra elementos da administração de empresa e elementos da governabilidade. Entre as diversas modalidades de gestão territorial existentes hoje no Acre, grande parte é encontrada na região do Alto Acre: 1 Reserva Extrativista (RESEX), 1 Estação Ecológica (ESEC), 3 Terras indígenas (TI), 1 Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE), 7 Projetos de Assentamento (PA), 1 Projeto de Assentamento Dirigido (PAD), 4 Projetos de Assentamento Agroextrativista (PAE) e 4 Projetos Estaduais de Assentamento - Polos Agroflorestais (PE). A Reserva Extrativista Chico Mendes foi criada no final da década 1980, para amenizar os conflitos na região entre seringueiros e pecuaristas não só na região do Alto Acre, mas também nas regiões do Baixo Acre e Purus. A região do Alto Acre tinha os maiores conflitos principalmente nos municípios de Xapuri e Brasiléia. Esta Resex contribuiu para regularizar a estrutura fundiária do local, tendo como público alvo seringueiros, extrativistas e ribeirinhos. Ela possui uma extensão de 931.000 hectares. (ACRE, 2010). Essa unidade de conservação de uso sustentável enfrenta problemas relacionados à falta de políticas que viabilizem sua economia internamente. A Estação Ecológica do Rio Acre, criada em 02 de junho de 1981, regularizou a situação fundiária de uma área de 77.500 hectares distribuídos nos municípios de Assis Brasil e Sena Madureira. Contribuiu, assim, para resolver a situação fundiária na área de fronteira, proteger as terras indígenas e a bacia do Rio Acre. (ACRE, 2010). Essa unidade de conservação de uso indireto está protegida e preservada, no entanto sofre certa pressão de atividades desenvolvidas em seu entorno, como atividades agropecuárias. Não tem problemas com relação às comunidades tradicionais, pois nela é proibida a moradia. As Terras Indígenas na região são Jaminawa, Mamoadate e Manchinere. A terra Jaminawa possui 78.512 hectares já demarcados e regularizados. Mamoadate, com 313.647 hectares, extrapola as terras da região do Alto Acre passando para a regional do Purus. Trata-se também de uma área demarcada e regularizada. A Manchineri possui terras ainda a demarcar. O objetivo é assegurar a terra a população nativa da região e evitar disputas e destruição. As terras indígenas são pauta das políticas públicas da região em período recente e sempre trouxeram 6076

alinhados interesses de latifundiários, especuladores, pecuaristas e agricultores. (ACRE, 2010). Com relação às terras indígenas nesse local, estas sofrem influência e pressão das atividades agropecuárias adjacentes. As populações indígenas, em muitos casos, são influenciadas pelas práticas do entorno e impactadas ambientalmente. A Área de Relevante Interesse Ecológico Seringal Nova Esperança foi criada através do Decreto s/n de 20/08/1999, com extensão de 2.576 hectares. Sua fitofisionomia é caracterizada por Floresta Ombrófila Densa e pertence à bacia do Rio Madeira, apesar de sua proximidade ao rio Acre. Trata-se de uma área particular (ACRE, 2010). Essa área particular é protegida por lei, no entanto também sofre pressão sobre seus recursos. Alias, toda a região passa por impactos recentes em função da pavimentação da BR 317 e expansão agropecuária. Os Projetos de Assentamento no Alto Acre são encontrados em três municípios da região, totalizando 29.245,28 hectares de área ocupada por 473 famílias assentadas, extrapolando sua capacidade superior que é de 21 famílias. (Quadro 1). Os PAs objetivaram a criação de áreas para realização de reforma agrária pelo Incra ainda na década de 1970. Dessa forma, possibilitaram fixar os migrantes e expropriados de terras no Acre. PA Município Área (hectares) Capacidade Assentados Paraguassu Assis 3.815,76 98 97 Brasil Três Meninas Brasiléia 1.954,49 61 59 Pão de Açúcar Brasiléia 6.279,44 123 120 Princesa Brasiléia 1.063,25 30 21 Fortaleza Brasiléia 9.997,81 40 32 Tupã Xapuri 6.134,53 100 144 Quadro 1 Projetos de Assentamento no Alto Acre Fonte: Adaptado de INCRA, 2015 6077

O Projeto de Assentamento Dirigido Quixadá localiza-se no município de Brasiléia, possui 76.741 hectares e tem capacidade para assentar mais de 1000 famílias. Contribuiu no período 1970 e 1980 para assentar pessoas de outras regiões do país e diminuir as tensões sociais existentes nos municípios. (ACRE, 2010). Para Cavalcanti (1994): Os PAD's foram implementados no Estado do Acre, pelo Governo Federal, em meados da década de 70, objetivando diminuir as tensões sociais existentes e assentar o excesso de pessoas oriundas de outras regiões do país. A implantação dos projetos no Estado é resultado direto de uma política de colonização, voltado para conter o fluxo migratório regional. (CAVALCANTI, 1994, p. 78). Os Projetos de Assentamento Agroextrativista que se encontram no Alto Acre foram criados a partir de 1987 para garantir a reforma agrária diferenciada das populações tradicionais da região. Estes são encontrados em dois municípios da região, totalizando 83.623,12 hectares de área ocupada por 485 famílias assentadas, que suportam ainda 12 famílias. (Quadro 2). PAE Município Área (hectare) Capacidade Assentados Santa Quitéria Brasiléia 43.682,32 300 288 Chico Mendes Epitaciolândia 24.243,61 88 88 Porto Rico Epitaciolândia 7.856,69 73 74 Equador Epitaciolândia 7.840,50 36 35 Quadro 2 Projetos de Assentamento Agroextrativistas no Alto Acre Fonte: Adaptado de INCRA, 2015. Os Projetos Estaduais de Assentamento - Polos Agroflorestais encontrados na região Alto Acre são elencados no Quadro 3. Foram criados pelo Decreto n o. 1.693, de 21 de dezembro de 2005. Estes são encontrados em três municípios da região, totalizando 1.219,71 hectares de área ocupada por 130 famílias assentadas, que suportam ainda 18 famílias. Implantado com o objetivo de assentar exseringueiros e ex-agricultores sem emprego e renda, estes polos se encontram na 6078

periferia das cidades de Epitaciolândia, Brasiléia e Xapuri. O intuito desses projetos foi fomentar o refluxo para a zona rural. Assim, eles são constituídos por pequenas unidades produtivas. PE Município Área (hectares) Capacidade Assentados Brasiléia Brasiléia 520,61 73 60 Epitaciolândia Epitaciolândia 129,95 9 8 Xapuri I Xapuri 342,49 31 28 Xapuri II Xapuri 226,65 35 34 Quadro 3 Projetos Estaduais de Assentamento/ Polos Agroflorestais no Alto Acre Fonte: Adaptado de INCRA, 2015. Dessa forma, na regional Alto Acre encontram-se 16 assentamentos de diferentes modalidades, com uma área ocupada de 243.806,497 hectares e com aproximadamente 15% do número total de famílias assentadas no estado. (ACRE, 2006). Com relação aos projetos de assentamento de forma geral, esses foram fundamentais para equacionar muitos problemas, cada um possui uma demanda e função, no entanto na atualidade enfrentam dificuldades. Entre elas cita-se: a) pressão de agricultores e pecuaristas por suas terras; b) falta de políticas públicas que viabilizem melhor gestão para as comunidades rurais ou tradicionais que vivem no local; c) falta de infraestrutura como ramais, armazenamento e logística; d) falta de assistência técnica as comunidades do local; e) em muitos, a capacidade de absorção de famílias é inferior a permitida; f) falta de financiamento. 4 Considerações Finais Os modelos de gestão territorial implementados no estado do Acre, em especial na regional Alto Acre foram, em grande medida, reflexo das políticas territoriais difundidas na região amazônica ao longo da historia. As politicas públicas resultaram em um mosaico de usos e formas de ocupação que contribuíram para o desenvolvimento de impactos negativos e positivos sobre as populações 6079

tradicionais. Os impactos foram desde aqueles como expropriação de terra das comunidades tradicionais, desmatamento da floresta ate aqueles que contribuíram para amenizar os conflitos pela posse de terra na região e o desenvolvimento econômico local. Nos últimos 25 anos tem-se um novo contexto de ocupação no local com a implementação de unidades de conservação paralelamente as mesmas políticas de desenvolvimento, porém, com novos impactos, negativos e positivos, entre os quais: a) a integração social, cultural e econômica entre os países Brasil, Bolívia e Peru, através da Iniciativa Madre de Dios, Acre e Pando (MAP); b) a pavimentação da BR 317, estrada do pacifico, eixo de integração comercial Brasil Ásia, pelo oceano Pacifico; c) pressão sobre os recursos naturais nas unidades de conservação; entre outros. No entanto para analisar de forma mais profunda e consistente tais modelos territoriais e seus impactos sobre as populações tradicionais que constituem o recorte temático do presente estudo, que tem como objeto a inter-relação entre os modelos territoriais e as populações locais é necessário ampliar a pesquisa e as atividades in loco em campo no local de estudo. 6080

5 Referências ACRE. Governo do Estado do Acre. Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável PTDRS. Documento 2010. Rio Branco, Acre. ACRE. Governo do Estado do Acre. Programa Estadual de Zoneamento Ecologico-Economico do Estado do Acre. Zoneamento Ecológico Econômico do Acre Fase II: Documento Síntese Escala 1:250.000. Rio Branco, Acre. 2006. 365p. BECKER, Bertha K. A geografia e o resgate da geopolítica. Revista Brasileira de Geografia. v. 50, n.2, 1988. p. 99-126. CAVALCANTI, Tristão José da Silveira. Colonização no Acre: Uma análise sócioeconômica do Projeto de Assentamento Dirigido Pedro Peixoto. Fortaleza: UFCE, 1994. 385p. Dissertação (mestrado em Economia)- Universidade Federal do Ceará. GRZEBIELUKA, Douglas. Por uma tipologia das comunidades tradicionais brasileiras. Revista Geografar. v.7, n.1, 2012. p. 116-137. (Revista Eletrônica do Programa de Pós Graduação da UFPR <www.ser.ufpr.br/geografar>.) INCRA. Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agraria. Painel dos Assentamentos. Disponível em http://www.brasilsemmiseria.gov.br/. Acesso em 2 de maio de 2015. SILVA, Simone Rezende da. Proteger a natureza ou os recursos naturais? Implicações para as populações tradicionais. Caderno Prudentino de Geografia. n.33, v.2, p. 42-65, Associação dos Geógrafos Brasileiros Seção Local Presidente Prudente. 2011. 6081