Treinamentos de olericultores para Segurança e Uso Correto e Seguro no trabalho com defensivos agrícolas.



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LABINAS AM; GONDIM HG; SANTIAGO TMD; RIBEIRO CC. 2010. Treinamentos de olericultores para Segurança Treinamentos de olericultores para Segurança e Uso Correto e Seguro no trabalho com defensivos agrícolas. e Uso Correto e Seguro no trabalho com defensivos agrícolas. 2010. Horticultura Brasileira 28: S517-S523. Treinamentos de olericultores para Segurança e Uso Correto e Seguro no trabalho com defensivos agrícolas. Adriana M. Labinas 1,3 ; Helio G.Gondim 1 ; Thais M.D.Santiago 2 ; Celso C.Ribeiro 3 1 Universidade de Taubaté, Departamento de Ciências Agrárias, Estr. Dr. José Luiz Cembranelli, 5000, Taubaté SP, Cep.: 12081-010, e-mail alabinas@uol.com.br; helioggondim@hotmail.com; 2 Associação Nacional de Defesa Vegetal ANDEF, Rua Cap. Antonio Rosa, 376, Jardim Paulistano, São Paulo SP, Cep 01443-010, e-mail thaismdsantiago@gmail.com ; 3 Faculdade Integral Cantareira, Rua Marcos Arruda, 729, Belenzinho, São Paulo SP, Cep 03020-000, e-mail celsolabento@gmail.com. RESUMO O objetivo deste trabalho foi treinar olericultores, trabalhadores rurais, para o uso correto e seguro dos defensivos agrícolas. Para isso selecionaram-se trabalhadores de propriedades rurais da região de Ibiúna-SP, que realizavam aplicações rotineiras de agrotóxicos. A seleção dos trabalhadores foi feita mediante entrevistas (pré-testes) aplicadas aos proprietários e funcionários. Após o pré-teste, iniciaram-se os treinamentos de Saúde e Segurança e Uso Correto e Seguro de Agrotóxicos. Em seguida, repetiu-se o questionário aos trabalhadores (pós-teste). Os dados mostraram que no pré-teste 37% dos proprietários usavam EPI, no pós-teste 79%. Dos funcionários 62,50% liam o rótulo e a bula no pré-teste, já no pós-teste esse número passou para 88%. Os dados indicaram que, após a participação nos treinamentos, houve mudança de comportamento na realização de tarefas que envolvem a utilização de defensivos agrícolas. Palavras-chave: capacitação de mão-deobra, NR-31, agrotóxico. ABSTRACT Horticultural Trainings about Health and Correct and Safety Use on pesticide applications The main propose of this research was to train rural workers to the correct and safety use of pesticides. These workers are from Ibiúna region (São Paulo State) that use to apply pesticides during their daily work. They were also selected by interviews (first step) and grouped in 2 categories: workers land owners. After the first step, the training program was started to workers health and safety and correct and safety use of pesticides. After the training program, the same questions of the first step were repeated to the same workers and owners. While 37% of the owners used equipments for idividual protection (EIP) before training, after training 79% started use EIP. From workers, 62,50% use to read the labels before training; after, this number increased to 88%. Because of these percentages, it can be assumed that training programs can change workers and land owners aptitudes in relation to pesticide application. Keywords: training program, NR-31, agrochemical. Os agrotóxicos são substâncias cada vez mais utilizadas na agricultura, porém podem oferecer perigo para o homem, dependendo da toxicidade, do grau e do tempo de exposição durante sua aplicação. Uma das formas de se evitar os problemas de saúde ocupacional é prevenir. Essa prevenção pode ser feita de maneira a orientar os trabalhadores para que eles tenham conhecimento sobre os riscos associados às substâncias químicas as quais estão expostos. Hortic. bras., v. 28, n. 2 (Suplemento - CD Rom), julho 2010 S 517

Moreira et al. (2002), constatou que entre os trabalhadores rurais adultos de Nova Friburgo, RJ, apenas 47,8% receberam algum treinamento para manipulação de agrotóxicos, 37,7% usavam EPI e 98,6% mantinham contato do agrotóxico com a pele. Tais dados revelam a falta de treinamento e orientação dos trabalhadores rurais brasileiros para lidar com os produtos fitossanitários. No Brasil, o nível de escolaridade do trabalhador rural é, em média, o Ensino Fundamental Incompleto (Soares et al., 2003). Diante dessa situação é necessário se fazer campanhas educativas que considerem o nível educacional e intelectual dos trabalhadores rurais. Araújo et al. (2000), afirmaram em pesquisa realizada no município de Camocim de São Félix, PE, que 41% dos trabalhadores rurais da plantação de tomate de mesa eram analfabetos e outros 41% possuíam o Ensino Fundamental Incompleto. Além da necessidade de se trabalhar com o nível de escolaridade dos trabalhadores, é necessário orientá-los na aplicação de técnicas de manejo integrado para reduzir a incidência de doenças e a infestação de pragas nas lavouras, de forma a mudar a visão do produtor rural e viabilizar o uso de agrtóxicos. Muitos agricultores acreditam que não há alternativa ao uso do agrotóxico. Ouve-se, frequentemente, durante os treinamentos Se não aplicar veneno, não colhe. Em diversos paises, principalmente nos em desenvolvimento, entre eles o Brasil, o uso indiscriminado de agrotóxicos tem chamado a atenção do governo e das agências de proteção ao meio ambiente e do trabalhador. Em 2003, segundo dados do Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (SINITOX), os pesticidas de uso agrícola foram responsáveis por 5.945 intoxicações e 164 óbitos no Brasil. Agrupando estes casos com aqueles causados por pesticidas de uso doméstico, produtos veterinários e raticidas, os pesticidas se tornam responsáveis por 14064 intoxicações e 238 óbitos. Porém, tais dados são apenas a parte visível do problema dos agrotóxicos, referindo-se quase sempre aos episódios mais graves. Castelo-Branco (2003), revelou que na região de Vargem Bonita-DF, 41% dos trabalhadores rurais entrevistados liam o rótulo buscando informações sobre os EPI necessários para aplicação do inseticida, porém apontavam para os EPI que estavam desenhados na faixa do produto. Isso quer dizer que eles não liam o rótulo propriamente dito e sim, compreendiam as instruções através das figuras. Dentre os entrevistados apenas 13% usavam o EPI indicado completo. Segundo mostraram Manjabosco et al (2004), em estudo realizado na cidade de Cruz Alta, RS, 60% dos trabalhadores rurais apresentavam limiares auditivos alterados; destes, 92% tinham perdas auditivas ocupacionais induzidas pelo ruído (17%) e por ototóxicos (83%). Por um lado, Silva et al (2001), em seu trabalho onde avaliou a exposição de um grupo de trabalhadores rurais do Estado do Rio de Janeiro a agrotóxicos, revelou que, do grupo em estudo, apenas 63% recebia assistência técnica especializada por entidades estaduais de assistência ao agricultor. Por outro lado, os trabalhadores rurais, na maioria das vezes, relatam uma grande dificuldade de entendimento das informações e figuras contidas nos rótulos dos produtos. No entanto, medidas devem ser tomadas para evitar esse tipo de situação, uma vez que o rótulo é uma ótima fonte de informação quando explorado Hortic. bras., v. 28, n. 2 (Suplemento - CD Rom), julho 2010 S 518

de maneira adequada. Neste contexto, propôs-se o projeto Hortaliça: Alimento Seguro e Saudável como uma tentativa de proporcionar treinamentos em Saúde e Segurança e Uso Correto e Seguro de defensivos agrícolas na região de Ibiúna (SP). MATERIAL E MÉTODOS A região do trabalho compreendeu os municípios de Ibiúna, São Roque, Piedade, Vargem Grande Paulista, Mairinque e Cotia. O projeto teve inicio no mês de junho de 2007, quando foram selecionados os participantes do projeto: trabalhadores rurais, responsáveis por realizar aplicações de defensivos agrícolas, entre proprietários e/ou funcionários. A primeira etapa do projeto, denominada pré-teste (Pereira, 2004), consistiu em entrevistas dirigidas aos trabalhadores rurais, feitas por estagiários e técnicos, devidamente treinados. Nas entrevistas aplicou-se um questionário padrão para os proprietários rurais e outro para os funcionários aplicadores de defensivos, com objetivo de obter informações sobre o seu conhecimento a respeito do uso correto e seguro dos defensivos agrícolas. Após concluídas as entrevistas, transferiu-se as informações coletadas para uma planilha eletrônica, dando início ao banco de dados do projeto, com o qual foi possível estabelecer os assuntos mais relevantes para serem abordados durante a realização dos treinamentos. A segunda etapa do projeto correspondeu aos treinamentos direcionados à Saúde e Segurança e Uso Correto e Seguro de Defensivos Agrícolas, buscando atender a Norma Regulamentadora nº 31 (NR-31), de segurança e saúde no trabalho na agricultura, pecuária, silvicultura, exploração florestal e aquicultura, que exige que trabalhadores expostos diretamente aos agrotóxicos, devem ser capacitados de acordo com um programa estabelecido e carga horária mínima de 20 horas. Os treinamentos, dos quais participaram 267 pessoas, foram realizados em propriedades rurais, cedidas pelos próprios produtores, buscando-se a adequação ao ambiente de trabalho dos trabalhadores rurais e proporcionando-lhes maior bem-estar. Após o término dos treinamentos teve início a terceira etapa do projeto, o pós-teste, que se constituiu na aplicação dos mesmos questionários do pré-teste àqueles trabalhadores rurais que foram entrevistados na primeira etapa. Com isso obtiveram-se respostas que representaram a mudança de comportamento dos trabalhadores rurais após a participação nos treinamentos. Os dados obtidos foram transferidos para o banco de dados, onde foi possível comparar as diferenças entre o pré-teste e o pós-teste. RESULTADOS E DICUSSÃO Analisando os dados (Tabela 1), verificou-se a situação socioeconômica dos proprietários rurais no pré-teste e no pós-teste. A análise dos dados permitiu observar que o proprietário e o trabalhador rural é em sua maioria casado (79%) e com nível de escolaridade crescente. Outra observação feita durante o projeto foi a dificuldade que os trabalhadores rurais tinham em saber o significado das faixas coloridas nos rótulos dos produtos, indicadoras do nível de toxicidade. Inicialmente 66,00% sabiam o significado das faixas coloridas nos rótulos, no entanto, após os treinamentos, 99,00% souberam dizer qual era o significado. Hortic. bras., v. 28, n. 2 (Suplemento - CD Rom), julho 2010 S 519

No pré-teste quando perguntados sobre qual era a cor que representava o maior risco a saúde do aplicador, 67,00% responderam vermelho, já no pós-teste 100,00% responderam corretamente. Com relação à leitura do rótulo e da bula, no primeiro instante (pré-teste) 63,00% afirmaram ler, desses 8,00% buscavam informações a respeito da dose, por exemplo. Ao se aplicar o pós-teste verificou-se que 94,00% dos entrevistados liam o rótulo e a bula e que 44,00% estavam buscando informações sobre a dose correta. Quando questionados sobre a utilização do EPI (equipamento de proteção individual), e quais as partes do EPI são usadas, obtiveram-se os dados apresentados na tabela 2. Apesar de ter sido verificado um aumento de 114% em relação ao uso do EPI por parte dos trabalhadores rurais que se encontravam expostos aos defensivos agrícolas após os treinamentos, no entanto, verificou-se que nem todos aderiram ao uso de EPI. Durante o pré-teste, verificou-se que 32,00% dos entrevistados utilizavam o EPI desde o preparo da calda até o final da aplicação. Quando questionados sobre o mesmo assunto no pós-teste 85,00% afirmaram usar o EPI desde o preparo da calda até o final da aplicação. Em relação à lavagem do EPI, inicialmente, apenas 36,00% diziam lavá-los; após os treinamentos, 100,00% dos entrevistados disseram lavar o EPI. Porém, desses 100%, 90,00% lavavam após cada aplicação, os demais lavavam uma vez por semana ou somente quando necessário. Outra questão levantada junto aos trabalhadores rurais, foi o motivo pelo qual alguns não usavam o EPI (Tabela 3). Verificou-se que a maioria não tem motivo concreto para não utilizar o EPI e sim, na maioria das vezes, falta vontade do trabalhador rural usá-lo. Ao se analisar o questionário respondido pelos funcionários aplicadores, verificou-se que o nível de escolaridade no Ensino Médio, aumentou 14 pontos percentuais, passando de 10,00% para 24,00%. Obviamente que isto não foi em decorrência dos treinamentos propostos pelo projeto, mas sim, do empenho de muitos destes trabalhadores que, apoiados por diversas instituições que trabalham para a alfabetização rural, retomaram ou iniciaram os estudos. Em alguns casos, os trabalhadores chegaram a lembrar ao entrevistador a respeito dessa questão, acrescentando que a resposta, daquela vez, seria diferente. Os que liam o rótulo e a bula eram 62,50% no pré-teste, sendo que desses, nenhum procurava informações sobre uso correto e seguro. No entanto, no pós-teste esse número saltou para 88,00% em relação à leitura do rótulo e da bula, sendo que desses, 16,00% buscavam informações sobre o uso correto e seguro dos defensivos agrícolas. Sobre em que momento os aplicadores de defensivos usavam o EPI, no pré-teste, 62,50% afirmaram usar desde o preparo da calda até o final da aplicação, já no pós-teste esse número passou para 91,00%. Outras observações relevantes foram verificadas, como por exemplo: 100,00% dos funcionários aplicadores entrevistados passaram a reconhecer a importância da realização da tríplice lavagem e conhecer a necessidade de utilização de luvas de nitrila. O Projeto Hortaliças: Alimento Seguro e Saudável mostrou que a realização de treinamentos bem dimensionados à realidade do trabalhador rural promove significativos incrementos no aprendizado das questões relacionadas aos agrotóxicos e com eles alavanca a qualidade das atividades realizadas no campo. Hortic. bras., v. 28, n. 2 (Suplemento - CD Rom), julho 2010 S 520

REFERÊNCIAS ARAÚJO ACP; NOGUEIRA DP; AUGUSTO LGS. 2000. Impacto dos praguicidas na saúde: estudo da cultura do tomate. Revista de Saúde Pública, São Paulo. 34(3):309-13. CASTELO-BRANCO M. 2003. Avaliação do conhecimento do rótulo dos inseticidas por agricultores em área agrícola do Distrito Federal. Horticultura Brasileira, Brasília. 21(3):570-573. FARIA NMX; FACCHINI LA; FASSA AG; TOMASI E. 2000. Processo de produção rural e saúde na Serra Gaúcha: um estudo descritivo. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro. 16(1):115-128. MANJABOSCO CW; MORATA TC; MARQUES JM. 2004. Perfil audiométrico de trabalhadores agrícolas. Arq. Otorrinolaringol., São Paulo, v.8, n.4, p. 285-295. MOREIRA JC; JACOB JS; PERES F; LIMA JS; MEYER A; OLIVEIRA-SILVA JJ; SARCINELLI PN; BATISTA DF; EGLER M; FARIA MVC; ARAÚJO AJ; KUBOTA AH; SOARES MO; ALVES SR; MOURA CM; CURY R. 2002. Avaliação integrada do impacto do uso de agrotóxicos sobre a saúde humana em uma comunidade agrícola de Nova Friburgo, RJ. Ciência e Saúde Coletiva, Rio de Janeiro. 7(2):299-311. OLIVEIRA-SILVA JJ; ALVES SR; MEYER A; PEREZ F; SARCINELLI PN; MATTOS RCOC; MOREIRA JC. 2001. Influência de fatores socioeconômicos na contaminação por agrotóxicos. Revista de Saúde Pública, São Paulo. 35(2):130-135. PEREIRA REA. 2004. Método de treinamento visando a mudança de comportamento dos agricultores em relação ao uso de agrotóxicos: método FAFRAM. Nucleus, Ituverava. 2: 35-38. SINITOX. Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas. Casos registrados de intoxicação humana e envenenamento. Brasil, 2009. Disponível em: http://www.fiocruz.br/ sinitox/. Acesso em 08/04/2009. SOARES W; ALMEIDA RMVR; MORO S. 2003. Trabalho rural e fatores de risco associados ao regime de uso de agrotóxicos em Minas Gerais, Brasil. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro. 19(4):1117-1127. YAMASHITA MGN. Análise de rótulos e bulas de agrotóxicos segundo dados exigidos pela legislação federal de agrotóxicos e afins e de acordo com parâmetros de legibilidade tipográfica. Bauru, 2008. Dissertação apresentada ao Programa de Pós Graduação em Desenho Industrial da UNESP/FAAC. Hortic. bras., v. 28, n. 2 (Suplemento - CD Rom), julho 2010 S 521

Tabela 1. Dados socioeconômicos dos proprietários rurais dos diferentes municípios da região de Ibiúna. Característica Dados Pré-teste Dados Pós-teste Estado Civil Casado 54,00% 79,00% Solteiro 11,00% 15,00% Divorciado 0,00% 0,00% Viúvo 1,00% 1,00% Idade Média 41 anos 40 anos Nível de Escolaridade Não Alfabetizado 0,00% 0,00% Primeiro Grau 41,00% 56,00% Segundo Grau 22,00% 34,00% Superior 3,00% 5,00% Tabela 2. Utilização do EPI (e suas partes) pelos proprietários rurais nos diferentes municípios da região de Ibiúna Pré-teste Pós-teste Usa EPI Sim 37,00% 79,00% Não 63,00% 21,00% Quais as partes do EPI são usadas Bota 36,00% 95,00% Luva 36,00% 97,00% Máscara 30,00% 97,00% Boné 33,00% 90,00% Camisa 32,00% 90,00% Calça 32,00% 90,00% Avental 29,00% 90,00% Viseira 19,00% 95,00% Hortic. bras., v. 28, n. 2 (Suplemento - CD Rom), julho 2010 S 522

Tabela 3. Motivos alegados para a não utilização dos EPI nos diferentes municípios da região de Ibiúna. Pré-teste Pós-teste Motivo alegado pelos que não usam EPI É desconfortável 5,00% 33,00% Não quer 10,00% 58,00% É quente 22,00% 8,00% Questão financeira 3,00% 0,00% O proprietário não fornece 2,00% 0,00% Hortic. bras., v. 28, n. 2 (Suplemento - CD Rom), julho 2010 S 523