AVALIAÇÃO DAS PROPRIEDADES REOLÓGICAS E TÉRMICAS DO POLIPROPILENO EM FUNÇÃO DO REPROCESSAMENTO Bárbara M. Tisott, Vitória B. Zampieri, Lídia K. Lazzari, Camila Baldasso Universidade de Caxias do Sul Área do Conhecimento de Ciências Exatas e Engenharias Caxias do Sul, RS, Brasil. E-mail: bmtisott@ucs.br RESUMO O polipropileno (PP) é um polímero hidrofóbico que pode ser aplicado em mantas para sorção em derramamentos de óleo. Para essa finalidade, atualmente, as mantas são produzidas a partir do PP virgem, causando um novo impacto ambiental. Uma das alternativas é a reciclagem primária do PP, o reprocessamento, por isso, o presente trabalho tem como objetivo caracterizar o reprocessamento do PP. Para isto, o PP foi reprocessado em uma extrusora dupla-rosca 1, 3, 5 e 8 vezes, avaliando suas propriedades térmicas e reológicas visando estudar a variação destas com o reprocessamento. Em função do número de reprocessamentos o índice de fluidez aumenta, consequentemente há a diminuição da viscosidade do fluído e também da cristalinidade do PP. Com isso, pode-se verificar que há possibilidade de utilização deste PP reprocessado, sem a perda significativa de propriedades. Palavras-chave: polipropileno, reprocessamento, extrusão, reologia. 1. INTRODUÇÃO O PP derivado do gás propeno, tem excelentes propriedades elétricas e isolantes, inércia química e resistência à umidade típica de polímeros de hidrocarbonetos não polares. Ele é resistente a uma variedade de produtos químicos 7961
a temperatura relativamente elevada e praticamente insolúvel em todos os solventes orgânicos à temperatura ambiente (1). Para atingir a viscosidade de fusão, o PP por ser um fluido pseudoplástico requer temperaturas de processamento relativamente altas para processamento em extrusoras ou injetoras, este comportamento do polipropileno é analisado por uma ciência chamada reologia (2). Através da reologia também é possível verificar se a reciclagem pode promover a degradação do material. Calor, tensão e radiação ultravioleta são fatores que modificam a estrutura morfológica do material. No caso do polipropileno, este fenômeno é agravado devido à instabilidade gerada pela presença de um carbono terciário na cadeia deste polímero (3). A reciclagem primária, também chamada de reciclagem pré-consumo ou reprocessamento, é efetuada na própria indústria geradora do resíduo, ou por outras empresas transformadoras, com materiais termoplásticos provenientes dos resíduos industriais, que são de fácil identificação e já estão limpos, livres de impurezas. Estes resíduos são praticamente todos reciclados e a qualidade dos artefatos produzidos com esse material é essencialmente a mesma daquela obtida com a utilização de resinas virgens (1). Como sorvente, o PP possui um caráter apolar, o que faz com que o mesmo seja um bom sorvente de sorvatos apolares, como óleos. A sorção pelo PP aumenta com o aumento da temperatura e diminuição de polaridade (4). Para esta aplicação é utilizado o material virgem, a utilização do material reprocessado seria uma alternativa industrial, tanto por motivos de impacto ambiental quanto pelo custo que o material virgem agrega. Diante disto, o presente trabalho tem como objetivo avaliar e comparar as propriedades físicas do polipropileno (PP), do polipropileno reprocessado e do polipropileno com adição de cargas. 2. MATERIAIS E MÉTODOS 2.1. Amostras Para a realização desta pesquisa, foi utilizado o polipropileno (H107), fornecido pela empresa Braskem S.A. A Tabela 1 apresenta as propriedades desta matériaprima de acordo com a ficha técnica do fabricante. 7962
Tabela 1- Ficha técnica do polipropileno H107. Propriedade Método ASTM Valores Unidade Índice de Fluidez (230ºC.2,16-1 Kg -1 ) D1238 80 g.10-1.min -1 Densidade D792A 0,905 g.cm -3 Módulo de flexão secante a 1% D790A 1550 MPa Resistência à tração no escoamento D638 38 MPa Alongamento no escoamento D638 8 % Dureza Rockwell D785 106 Escala R Resistência ao impacto izod a 23ºC D256A 20 J.m -1 Temperatura de deflexão térmica D648 110 ºC Fonte: BRASKEM (5). 2.2. Preparo das amostras O PP virgem foi reprocessado oito vezes, em extrusora duplarosca da marca MH modelo COR-20-32-LAB, com L/D: 46,5, diâmetro de rosca de 20 mm e 200 rpm. Inicialmente foram introduzidos 10 kg do PP virgem no funil de alimentação para a extrusão do mesmo. A extrusora operou com perfil de temperatura iniciando em 155ºC e finalizando em 180ºC. Após a extrusão, os perfis foram processados em uma pelletizadora ADL modelo BR200 e secos por 4 horas antes de uma nova extrusão. Antes dessa moagem, retirou-se aproximadamente 2 metros de amostra para as análises, sendo denominadas PPpuro, rpp1, rpp3, rpp5, rpp8. Estas denominações se referem ao PP puro e reprocessado uma, três, cinco e oito vezes, respectivamente. 2.3. Calorimetria diferencial de varredura (DSC) As amostras foram avaliadas em duplicata por ensaio de calorimetria exploratória diferencial (DSC) em um equipamento DSC 50 da Shimadzu (ASTM D- 3418-08). Cada ensaio foi executado com uma amostra de 7 mg com taxa constante de aquecimento e de resfriamento de. ¹ 10ºC.min As amostras foram submetidas, sob atmosfera de nitrogênio, ao aquecimento até 200ºC, mantendo-se nesta 7963
temperatura por 5 minutos. Em seguida, a amostra foi resfriada até 25ºC na mesma taxa. Posteriormente, o ciclo foi repetido. A cristalinidade dos polímeros foi determinada por DSC empregando-se a Equação A: (A) sendo: em J.kg -1 é o calor de fusão da amostra, = 138 J.kg -1 é o calor de fusão de um polímero hipoteticamente 100% cristalino (6). 2.4. Reometria A análise reológica das amostras, em triplicata, foi realizada em um reômetro de placas paralelas da marca Anton Paar, modelo Physica MCR301. A temperatura de ensaio foi de 180ºC com uma faixa de frequência de 0,01 a 100 rad.s -1. 2.5 Índice de fluidez (MFI) O índice de fluidez das amostras foi obtido através do equipamento da marca Kayeness, modelo D4001HV. A temperatura de ensaio foi de 190ºC e uma carga de 2,16 Kgf. Este ensaio foi realizado 7 vezes em cada amostra. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Como pode ser verificado na Figura 1, as medidas do índice de fluidez aumentam quando comparado o PP puro e o material reprocessado. 7964
Figura 1 - Índice de fluidez para múltiplas extrusões do PP. No presente trabalho, foram realizadas sete medidas para cada amostra utilizada, sendo que o desvio padrão obtido variou de 0,29 a 1,70. Houve o aumento do índice fluidez de 22,012 g.10-1.min -1 do PPpuro para 30,581 g.10-1.min -1 do rpp8. O aumento do índice mostra que ao longo do reprocessamento o material sofre degradação o que leva à quebra de cadeias. Além disso, há a diminuição do peso molecular do polímero e consequentemente, a viscosidade, aumentando assim o índice de fluidez. Segundo Martins e De Paoli (7), o índice de fluidez aumentou com o número de ciclos. Nos 13 ciclos de extrusão trabalhados obtiveram um aumento no MFI em relação ao PP puro. Comparando-se os valores, o aumento obtido por estes autores até o sétimo ciclo foi cerca de 30%, e para os treze ciclos chegou a 95%. Segundo González-González, Neira-Velásquez e Gangulo-Sánchez (6), houve um aumento do índice de fluidez (MFI), que segundo os autores, é mais significativo para temperaturas mais elevadas da matriz. O índice de fluidez apresentado nas tabelas de propriedades fornecidas pelo fabricante (Tabela 1) é muito diferente do que encontrado pelos testes realizados. Um dos motivos deste resultado ter ocorrido é que as propriedades que o fornecedor apresenta em suas tabelas são obtidas através de testes com os parâmetros padrões descritos na ASTM D 1238 (230ºC, 2,16 Kgf) os testes realizados neste trabalho são obtidos com temperatura de 190ºC e carga de 2,16 Kgf devido à baixa viscosidade do material. 7965
Como a viscosidade é inversamente proporcional com o índice de fluidez estes resultados estão de acordo com os resultados da análise de viscosidade relacionada à frequência, quanto mais processos o material é submetido, menor será a sua viscosidade, conforme Figura 2. A maior viscosidade de cisalhamento obtida é de 500 Pa.s para o PP sem ser extrusado, para o rpp8 a viscosidade obtida foi de 280 Pa.s. O gráfico viscosidade de cisalhamento versus frequência, apresenta um comportamento pseudoplástico do material, ou seja, a viscosidade diminui quando a frequência aumenta. Figura 2 - Viscosidade de cisalhamento versus frequência Resultado semelhante foi obtido por Lima (8) onde é relatado que há uma redução da viscosidade complexa em baixas frequências nos materiais reprocessados em comparação ao processado uma única vez, isso se deve a possível degradação da matriz polimérica ocasionado pelo aumento do cisalhamento e tempo de residência. Pesquisadores vinculam a redução da viscosidade complexa em baixas frequências com a degradação da matriz polimérica, explicando a redução desta propriedade com o aumento do cisalhamento e do tempo de residência. Para Incarnato, Scarfato e Aciernol (9), a redução da viscosidade complexa em baixa frequência nos materiais reprocessadas está ligada com a perda de peso molecular. A baixas tensões de cisalhamento, a viscosidade se aproxima de uma 7966
constante (viscosidade newtoniana) e com temperatura constante também, o estado viscoso do material dependerá somente do peso molecular. A primeira corrida de aquecimento foi proposta de maneira a eliminar o histórico térmico da amostra ao passo que a segunda corrida de aquecimento/resfriamento foi realizada para detectar os valores da temperatura de fusão cristalina (Tm), temperatura de cristalização (Tc), entalpia de fusão (ΔHf) e grau de cristalinidade (Xc). Através dos dados obtidos pelo DSC, verifica-se que o índice de cristalinidade também é inversamente proporcional as modificações do índice de fluidez, conforme Tabela 2. Tabela 2 - Propriedades térmicas do PP reprocessado determinada via DSC Tm ( C) Tc ( C) ΔHf (J.g -1 ) Xc (%) PP puro 165,90 113,93 89,99 65,21 rpp1 166,80 115,76 132,56 96,05 rpp3 165,28 116,71 85,77 62,15 rpp8 163,90 116,97 72,60 52,61 Nota: Como o resultado para a análise do rpp5 não foi satisfatório, mesmo havendo triplicata do teste, este foi ocultado dos resultados. Os valores de entalpia de fusão variam de 89,99 J.g -1 para o PP puro, aumentam para o rpp1 em 132,56 J.g -1, diminuindo novamente para 85,77 J.g -1 e 72,60 J.g -1 para o rpp3 e rpp8 respectivamente. O grau de cristalinidade calculado através da entalpia de fusão do material será diretamente proporcional ao índice de fluidez, relacionando uma possível degradação do material à medida que os reprocessamentos aumentam. Segundo Otaguro et al. (10), as amostras analisadas apresentaram valores de entalpia de fusão e, consequentemente, do índice de cristalinidades superiores ao polímero puro, o que era de se esperar dado à existência do processo de degradação. Conforme Martins e De Paoli (7), os ensaios térmicos demonstraram que extrusões sucessivas deslocam as entalpias de cristalização do sistema para valores superiores aqueles encontrados para o polímero puro. Os valores de entalpia de fusão acompanham essa mesma variação. Esses resultados sugerem que o processo de cristalização é afetado pelo número de processamentos sofridos pelo material. 7967
4.CONCLUSÃO O PP possui um comportamento pseudoplástico, pois diminui a viscosidade a medida que é aplicada uma deformação sobre ele. Sua amostra PPpuro revela um alto Xc, em torno 65,21% e seu índice de fluidez possibilita ao material ser processado por extrusão a temperaturas em torno de 155 ºC e 180ºC, criando perfis que poderão ser utilizados em diversas aplicações Quanto ao material reprocessado pode-se concluir que houve uma pequena variação nas propriedades conforme o ciclo de processamento. Houve uma diminuição na viscosidade do material, estabilidade térmica assim como no grau de cristalização. Com o aumento dos reprocessamentos também podemos verificar um aumento no índice de fluidez, este aumento pode demonstrar uma degradação do material, porém não impossibilitando a utilização de materiais reprocessados para diversas aplicações. Assim, pode-se verificar que há possibilidade de utilização destes materiais reprocessados, sem a perda de muitas propriedades, em aplicações diversas. Diminuindo a utilização do material virgem, o impacto ambiental diminui proporcionalmente. 5. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem a Universidade de Caxias do Sul (UCS). 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS (1) STRAPASSON, Reinaldo. Valorização do polipropileno através de sua mistura e reciclagem. 2004. 94 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Engenharia Mecânica, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2004. (2) EBEWELE, R. O. Polymer science and technology. Benin City: CRC Press LLC, 2000. (3) KARGER-KOCSIS, J. Polypropylene: structure, blends and composites. London: Chapman & Hall, 1995. 3 v. (4) ZARO, M. Capacidade de sorção e cinética de sorção e dessorção de óleos em mantas não tecidas de polipropileno. 2014. 107f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Processos e Tecnologias) Universidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul, 2014. (5) BRASKEM. Disponível em <www.braskem.com.br>. Acesso em: 02 de maio de 2017. (6) GONZÁLEZ-GONZÁLEZ, VA; NEIRA-VELÁZQUEZ; GANGULO-SÁNCHEZ JL. Polypropylene Chain scissions and molecular weight changes in multiple extrusions. Polymer Degradation and Stability, vol. 60,1998, p. 33-42. (7) MARTINS, M.H.; DE PAOLI, M. A. Polypropylene compounding with post-consumer material: II. Reprocessing. Polymer Degradation and Stability, 78: 491-495, 2002a. 7968
(8) LIMA, Leandro Soares de. A influência das variáveis de processamento e de diferentes tipos de nanocargas nas propriedades dos compósitos de polipropileno. 2015. 77 f. Dissertação (Mestrado) - Universidade de Caxias do Sul, Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Processos e Tecnologias, 2015. (9) INCARNATO, L; SCARFATO, P; ACIERNO, D. Rheologial and mechanical properties of recycled polypropylene. Polymer Engineering and Science, 39 (4): 749-755, 1999. (10) OTAGURO, HARUMI, ARTEL, BEATRIZ W. H., PARRA, DUCLERC F., CARDOSO, ELIZABETH C. L., LIMA, LUIS F. C. P., LUGÃO, ADEMAR B. Comportamento do polipropileno em presença de monômeros trifuncionais no estado fundido e sua influência na morfologia. Polímeros: Ciência e Tecnologia. São Carlos, v. 14, n. 2, p. 99-104, June 2004. EVALUATION OF THE RHEOLOGICAL AND THERMAL PROPERTIES OF POLYPROPYLENE IN AS FUNCTION OF THE REPROCESSING AND ADDITION OF LOADS ABSTRACT Polypropylene (PP) is a hydrophobic polymer that can be applied to blankets for sorption in oil spills. To this end, currently, as blankets are produced from virgin PP, causing a new environmental impact. One of the alternatives is a primary recycling of the PP, reprocessing, therefore, the present work aims to characterize the reprocessing of the PP. For this, the PP was reprocessed in a double-screw extruder 1, 3, 5 and 8 times, evaluating its thermal and rheological properties in order to study the variation with reprocessing. Due to the number of reprocessing the fluidity index, consequently, there is a decrease of the viscosity of the fluid and also of the crystalline of the PP. With this, it can be verified that there is possibility of using reprocessed PP, without loss of agent. Key words: polypropylene, reprocessing, extrusion, rheology. 7969