XIV 1. Aspectos preliminares: A literatura portuguesa recebeu em suas origens uma forte influência provençal. Provença, uma região do sul da França, teve uma intensa vida cultural na Baixa Idade Média. (Panorama da literatura portuguesa) Em Portugal, os textos literários mais antigos datam do século XII ( 1189 ou 1198 Cantiga da Ribeirinha de Paio Soares de Taveirós). Língua: galego-português.
XIV 2. O Trovadorismo: Oralidade: por ser de mais fácil memorização e transmissão, a poesia surgiu em Portugal antes da prosa como tem ocorrido em quase todo o mundo. E surgiu diretamente ligada a outras formas de expressão artísticas populares: a música, o canto e a dança. (Panorama da literatura portuguesa). Arte palaciana x arte popular. Composições: cantigas. Compilações: cancioneiros. Artistas: trovador, segrel, jogral e soldadeira.
XIV 3. Artistas: Trovador (trouvère norte da França; troubadour sul da França): membro da nobreza ou do clero, era o autor da letra e da música das composições que executava para o seleto público das cortes. Segrel: era um nobre da escala mais baixa, um escudeiro. Não tendo recursos para ascender a cavaleiro, sobrevivia percorrendo as cortes ou acompanhando o exército real nas lutas contra os árabes.
XIV Jogral: cantor de origem popular, raramente compunha, limitando-se a executar composições dos trovadores. Soldadeiras: mulheres que cantavam e dançavam durante as apresentações e, por isso, tinham má reputação.
XIV 4. Cantigas: Líricas (ou lírico-amorosas): cantigas de amor / cantigas de amigo. Satíricas: cantigas de escárnio / cantigas de maldizer.
XIV a) Cantigas de amor: Têm raízes na poesia provençal. Quem se manifesta no poema é um homem, que, por sua vez, dirige-se a uma mulher da nobreza, geralmente casada (a senhor). O amor se torna tema central do texto poético. Esse amor se torna impraticável pela situação da mulher. Segundo o homem, sua amada seria a perfeição e incomparável a nenhuma outra. O homem sofre interiormente, coloca-se em posição de servo da mulher amada (vassalagem amorosa).
XIV Ele cultiva esse amor em segredo, sem revelar o nome da dama, já que o homem é proibido de falar diretamente sobre seus sentimentos por ela (de acordo com as regras do amor cortês). Nesse tipo de cantiga há presença de refrão (ou estribilho) que insiste na idéia central, o enamorado não acha palavras muito variadas, tão intenso e maciço é o sofrimento que o tortura (coita, i.e, sofrimento amoroso). São cantigas que expõem a vida na corte por meio de forte abstração e linguagem refinada. RESUMO: eu lírico masculino, convencionalismo amoroso, idealização, vassalagem amorosa, expressão da coita. Origem provençal
Vós mi defendestes, senhor, que nunca vos dissesse ren de quanto mal mi por vós ven; mais fazede-me sabedor, por Deus, senhor, a quen direy quam muito mal [lev e] levey por vós, se non a vós, senhor? defendestes: proibistes. ren: nada.
Ou a quen direy o meu mal, se o eu a vós non disser, pois calar-me non m'é mester e dizer-vo-lo non m'er val. E pois tanto mal sofr'assy, se convosco non falar hi, por quen saberedes meu mal? Non m é mester: não é meu objetivo. Non m er val: também não me adianta.
Ou a quen direy o pesar que mi vos fazedes sofrer, se o a vós non fôr dizer, que podedes conselh'i dar? E por en, se Deus vos perdon, coita deste meu coraçon, a quem direy o meu pesar? Conselh i: conselho sobre isso.
XIV b) Cantigas de amigo: O trovador coloca como personagem central uma mulher da classe popular, procurando expressar o sentimento feminino por meio de tristes situações da vida amorosa das donzelas. Pela boca do trovador, ela canta a ausência do amigo (amado ou namorado) e desabafa o desgosto de amar e ser abandonada, em geral, por causa da guerra.
XIV Nesse tipo de poema, a moça conversa e desabafa seus sentimentos de amor com a mãe, as amigas, as árvores, as fontes, o mar, os rios, etc. É de caráter narrativo e descritivo e constituem um vivo retrato da vida campestre e do cotidiano das aldeias medievais na região. Observe esta cantiga de D. Dinis que expressa o lamento da moça cujo namorado partiu:
Ai flores, ai flores do verde pῖo, se sabedes novas do meu amigo! ai Deus, e u é? Ai flores, ai flores do verde ramo, se sabedes novas do meu amado! ai Deus, e u é? Se sabedes novas do meu amigo, aquel que mentiu do que pôs comigo! ai Deus, e u é? Se sabedes novas do meu amado, aquel que mentiu do que mi há jurado! ai Deus, e u é?
TROVADORISMO SÉC. XII - XIV Paralelismo de par de estrofes (setas azuis): consiste na repetição de duas estrofes com ligeira diferença entre os versos. Leixa-pren (setas amarelas): repetição envolvendo versos pares com ímpares. (2º verso da primeira estrofe com 1º verso da terceira; 2º verso da segunda estrofe com 1º da quarta). Refrão: repetição constante. RESUMO: eu lírico feminino, tratamento dado ao namorado: amigo, expressão da vida campesina e urbana, amor realizado ou possível - sofrimento amoroso, simplicidade - pequenos quadros sentimentais, paralelismo e refrão, origem popular e autóctone (isto é, na própria Península
TROVADORISMO SÉC. XII - XIV c) Cantigas de escárnio: Buscam, primeiramente, o riso. No entanto, por serem sátiras, têm aspecto moralista. São dotadas de cáustica crítica, cheias de sarcasmo e ironia, feitas de modo indireto, algumas usam palavras de duplo sentido, para que, não se entenda o sentido real. RESUMO: apresenta ambiguidades, ironia, e valem-se da retórica do equívoco
TROVADORISMO SÉC. XII - XIV Ua dona, non digu eu qual, non agùirou ogano mal polas oitavas de Natal: ia por sa missa oir, e [ouv ] um corvo carnaçal, e non quis da casa sair. A dona, mui de coraçon, oíra sa missa, enton, e foi por oir o sarmon, e vedes que lho foi partir: ouve sig un corv acaron, e non quis da casa sair.
TROVADORISMO SÉC. XII - XIV A dona disse: - Que será? E i clérigu está já revestid e maldizer-m -á, se me na igreja non vir. E diss e o corvo: quá, [a] cá, e non quis da casa sair. Nunca taes agoiros vi, des aquel dia que naci; com aquest ano ouv aqui; e ela quis provar de s ir, e ouv um corvo sobre si, e non quis da casa sair. (Joan Airas de Santiago)
TROVADORISMO SÉC. XII - XIV Deus! Com ora perdeu Joam Simiom três bestas nom vi maior cajom, nem perdudas nunca tam sem razom: ca, teendo-as sããs e vivas e bem sangradas com [boa] sazom, morrerom-lhi todas com olivas. Dês aquel[e] dia em que naci nunca bestas assi perdudas vi, ca as fez ant el sangrar ante si; e ante que saíssem daquel mês, per com eu a Joam Simiom oí, com olivas morrerom todas três.
TROVADORISMO SÉC. XII - XIV Ben as cuidara de morte guardar todas três, quand as fez[o] sangrar; mais havia-lhas o Dem a levar, pois se par [a]tal cajom perderom; E Joam Simiom quer-s ora matar porque lhi com olivas morrerom. (D. Dinis)
TROVADORISMO SÉC. XII - XIV d) Cantigas de maldizer: Utilizam uma linguagem mais vulgar, referindo-se diretamente a suas personagens, com agressividade e com duras palavras, que denotam o mal. São diretas, não há como interpretá-las de modo diferente.
TROVADORISMO SÉC. XII - XIV "Ai dona fea! Foste-vos queixar Que vos nunca louv'en meu trobar Mais ora quero fazer un cantar En que vos loarei toda via; E vedes como vos quero loar: Dona fea, velha e sandia! Ai dona fea! Se Deus mi pardon! E pois havedes tan gran coraçon Que vos eu loe en esta razon, Vos quero já loar toda via; E vedes qual será a loaçon: Dona fea, velha e sandia!
TROVADORISMO SÉC. XII - XIV Dona fea, nunca vos eu loei En meu trobar, pero muito trobei; Mais ora já en bom cantar farei En que vos loarei toda via; E direi-vos como vos loarei: Dona fea, velha e sandia! (João Garcia de Guilhade)
TROVADORISMO SÉC. XII - XIV 5. Cancioneiros: a) Cancioneiro da Ajuda: o mais antigo, compilado provavelmente no século XIII; b) Cancioneiro da Vaticana: provavelmente compilado no século XV; c) Cancioneiro da Biblioteca Nacional (Colocci-Brancutti): compilado provavelmente no século XIV.
TROVADORISMO SÉC. XII - XIV A PROSA AS NOVELAS DE CAVALARIA - Surgiram derivadas de canções de gesta e de poemas épicos medievais. Refletiam os ideais da nobreza feudal: o espírito cavalheiresco, a fidelidade, a coragem, o amor servil, mas estavam também impregnadas de elementos da mitologia céltica. A história mais conhecida é A Demanda do Santo Graal, a qual reúne dois elementos fundamentais da Idade Média quando coloca a Cavalaria a serviço da Religiosidade.
SEGUNDA ÉPOCA MEDIEVAL OU HUMANISMO SÉC. XV Depois de quase um século de estagnação cultural, desde o desaparecimento dos trovadores, as cortes portuguesas revivem no século XV um período de reflorescimento cultural, que marca a transição entre o Trovadorismo e o grande Renascimento do século XVI. Portugal amadurece como povo, Estado, língua, enfim, como nação.
SEGUNDA ÉPOCA MEDIEVAL OU HUMANISMO SÉC. XV Prosa e teatro ganham o primeiro plano, sendo seguidos pela poesia palaciana. A imprensa de Gutemberg (séc. XV) impulsionou a transmissão de textos em prosa. TEATRO VICENTINO: RETRATO E CRÍTICA Tinha na corte a função de organizador de festas palacianas. Do plano de vista técnico, a dramaturgia de Gil Vicente era rústica e primitiva. Gil Vicente preocupa-se essencialmente
SEGUNDA ÉPOCA MEDIEVAL OU HUMANISMO SÉC. XV os costumes e tendo em vista reformá-los. Trata-se, portanto, de uma obra com missão moralizante e reformadora. Destaque: autos (mais famoso, Auto da barca do inferno).
EXERCÍCIOS 1. Assinale a alternativa INCORRETA a respeito das cantigas de amor. a) O ambiente é rural ou familiar. b) O trovador assume o eu-lírico masculino: é o homem quem fala. c) Têm origem provençal. d) Expressam a "coita" amorosa do trovador, por amar uma dama inacessível. e) A mulher é um ser superior, normalmente pertencente a uma categoria social mais elevada que a do trovador.
EXERCÍCIOS 2. Sobre a poesia trovadoresca em Portugal, é INCORRETO afirmar que: a) refletiu o pensamento da época, marcada pelo teocentrismo, o feudalismo e valores altamente moralistas. b) representou um claro apelo popular à arte, que passou a ser representada por setores mais baixos da sociedade. c) pode ser dividida em lírica e satírica. d) em boa parte de sua realização, teve influência provençal. e) as cantigas de amigo, apesar de escritas por trovadores, expressam o eulírico feminino.
EXERCÍCIOS 3. O teatro de Gil Vicente caracteriza-se por ser fundamentalmente popular. E essa característica manifesta-se, particularmente, em sua linguagem poética, como ocorre no trecho a seguir, de "O Auto da Barca do Inferno". Ó Cavaleiros de Deus, A vós estou esperando, Que morrestes pelejando Por Cristo, Senhor dos Céus! Sois livres de todo o mal, Mártires da Madre Igreja, Que quem morre em tal peleja Merece paz eternal.
EXERCÍCIOS No texto, fala final do Anjo, temos no conjunto dos versos a) variação de ritmo e quebra de rimas. b) ausência de ritmo e igualdade de rimas. c) alternância de redondilha maior e menor e simetria de rimas. d) redondilha menor e rimas opostas e emparelhadas. e) igualdade de métrica e de esquemas das palavras que rimam.
EXERCÍCIOS 4. Mandad ei comigo, ca ven meu amigo: e irei, madr, a Vigo Comigu ei mandado, ca ven meu amado: e irei, madr, a Vigo Ca ven meu amigo e vem san e vivo: e irei, madr, a Vigo
EXERCÍCIOS a) Quem é o eu lírico, isto é, o emissor da mensagem do texto? b) Com quem fala e de que fala o eu lírico? c) Pelo ponto de vista formal, quais técnicas foram utilizadas? d) Essa cantiga pertence a que gênero?