Quando Leo Brouwer fez uma homenagem a Villa-Lobos

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Transcrição:

Quando Leo Brouwer fez uma homenagem a Villa-Lobos Fabricio Ferreira da Silva Escola de Música, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil Dr. Ezequias Oliveira Lira Escola de Música, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil Resumo: Este trabalho visa mostrar a homenagem feita pelo compositor cubano Leo Brouwer (1939) a Heitor Villa-Lobos (1887-1959), em seus Nuevos Estudios Sencillos (2001), reconhecendo assim o valor histórico de sua obra e influência, colocando o brasileiro ao lado de nomes como Debussy, Stravinsky, Prokofief, entre outros nomes homenageados. Os dados estão fundamentados em uma análise preliminar do Estudio Sencillo 8 Ommaggio a Villa-Lobos e são balizados em autores diversos, tais como Prada (2015), Zanon (2004). Amorim (2015), entre outros. Palavras-chave: Leo Brouwer; Homenagem; Heitor Villa-Lobos. Abstract: This work aims to present a tribute made by the Cuban composer Leo Brouwe (1939) to Heitor Villa- Lobos (1887-1959), in his Nuevos Estudios Sencillos (2001), recognizing the historical value and the influency of the Brazilian composer, placing him side by side of great names as Debussy, Stravinsky, Prokofief and other honoured composers. The research data are based on a preliminary analysis of Estudio Sencillo 8 - Ommaggio a Villa-Lobos and are labeled in various authors, such as Prada (2015), Zacko (2004). Amorim (2015), among others. Key words: Leo Brouwer; Tribute Heitor Villa-Lobos É recorrente na história da música um compositor homenagear outro. Esta homenagem pode acontecer de diversas formas, com a grafia À maneira de, Variações sobre um tema de, através de recursos composicionais como a intertextualidade, colagens, modelagem sistemática, arranjos, transcrições, regravações etc., ou com uma dedicatória geralmente grafada após o título, forma utilizada por Brouwer em seus Nuevos Estudios Sencillos. Colaborando com esta perspectiva, Cattin (1987, p. 16) afirma: Sabemos que existe uma tradição da homenagem na Música essa cultura musical existe há muito tempo, em formas diversas, por empréstimo de ideias musicais, desde os primeiros hinos cristãos até os motetos medievais, usando um tema de outro compositor. Tendo como ponto de partida o Estudio Sencillo 8 Ommaggio a Villa-Lobos da série Nuevos Estudios, este artigo busca tratar da homenagem em uma obra musical, afirmando a importância do nome homenageado, o que, de certa forma, influencia a interpretação da obra, pois o intérprete irá buscar referenciais estéticos do homenageado. Sobre isso, a autora Teresinha Prada comenta: Em geral, o título de uma obra já por si sugere imagens para quem procura uma interpretação em sintonia com o mundo do compositor, e no caso das homenagens exerce uma influência mais forte na maneira de abordá-la, já na escuta. Está assim criada uma expectativa entre audição inicial da obra em comparação com o discurso musical prévio, apreendido da poética do compositor homenageado, ou seja, entre o que se ouve e o que se espera ouvir. O caminho da escuta é um jogo tenso em que o eu-intérprete considerará como fator relevante e este apoiará as escolhas interpretativas (PRADA, 2015, p. 03).

Leo Brouwer, Villa-Lobos e o violão Juan Leovigildo Brouwer Mesquida nasceu em Havana, em 1º de março de 1939, começou a estudar violão aos 13 anos por influência de seu pai, médico e violonista amador. Em seguida, passou a ser aluno do mestre cubano Isaac Nicola i. Segundo Fraga (2005), com a idade de 17 anos começou sua carreira como concertista dando seus primeiros recitais públicos ao mesmo tempo em que escrevia suas primeiras composições, influenciadas por Bartók, Falla e Stravinsky. Leo Brouwer já é citado por diversos autores como um dos grandes compositores da história do violão (Cooper, 1985, p. 13; Dudeque, 1994, p. 98; Zanon, 2004). E Heitor Villa-Lobos dispensa apresentações. Sobre a importância de sua obra para violão, o pesquisador Humberto Amorim comenta: O violão esteve presente de forma significativa na vida de Heitor Villa-Lobos. Sua produção é numerosa e perpassa momentos distintos de suas aspirações artísticas e sociais. O conjunto dessas peças é reconhecido como um dos mais relevantes legados ao instrumento no século XX, fato corroborado pela inclusão do repertório em importantes cursos de violão mundiais e por gravações de ilustres intérpretes nas últimas décadas (Amorim, 2015, p. 15). A aproximação de Brouwer com a obra de Villa-Lobos se dá ainda na infância, através de seu pai. Meu pai foi um aficionado que me ensinou a tocar de ouvido por três ou quatro meses. Em vez de tocar violão pop, ele era aficionado por Tárrega, Villa-Lobos e Granados, e ele tocou essas coisas perfeitamente mesmo de ouvido. Sua técnica era muito boa. Com ele, aprendi alguns choros e alguns prelúdios de Villa-Lobos (Mckenna,1988, p. 10). Já como concertista profissional, segundo sua esposa Isabelle Hernández, Leo Brouwer foi um dos primeiros violonistas no mundo a executar as obras de Villa-Lobos. Há notícias de concertos seus tocando a obra do carioca já em 1955 ii (Hernández, 2000, p. 13-14 [tradução nossa]). Colaborando com esta ideia, a pesquisadora Teresinha Prada comenta: O Cine Club Visión foi responsável pela realização do primeiro evento no mundo a levar o nome de Villa-Lobos: em 12 de dezembro de 1956 aconteceu o Festival Villa-Lobos, com uma palestra de José del Campos Valdés intitulada Villa-Lobos, cantor de um pueblo Depois da palestra, Leo Brouwer tocou quatro Estudos de Villa-Lobos e Jesus Ortega tocou dois Prelúdios e os Choros n.º 1. Brouwer estava com 17 anos e Ortega, 21 (Prada, 2001, p. 89). Os Estudios Sencillos Ao longo da sua carreira como compositor, Leo Brouwer tem dedicado parte da sua criatividade, inspiração e talento à composição de obras com objetivos didáticos. Compôs, até a presente data, 30 estudos para violão divididos da seguinte forma: Entre 1960 e 1961, compôs as duas primeiras séries de estudos (Cadernos I e II), editados pela Max Eschig. 1ª Série de Estudos Simples (Estudios Sencillos): Caderno I: 1-5 2ª Série de Estudos Simples (Estudios Sencillos): Caderno II: 6-10 Em 1981, compôs e concluiu as terceira e quarta séries (Cadernos III e IV), editados em 1983 também pela mesma editora. 3ª Série de Estudos Simples (Estudios Sencillos): Caderno III: 11-15 4ª Série de Estudos Simples (Estudios Sencillos): Caderno IV: 16-20

Em 2001, Brouwer escreve os Nuevos Estudios Sencillos, editados no mesmo ano pela londrina Chester Music. Estes novos estudos estão inseridos na corrente chamada nova simplicidade, ou o que alguns teóricos identificariam como de contexto pós-moderno. Sobre essa fase composicional, o próprio Brouwer comenta: Por um lado, eu acredito que nunca haverá um ponto final na estética, mas, por outro, a composição sempre fará uso de fatores conhecidos da história da música, apenas trabalhando-os de uma outra maneira (Brouwer, como citado em Molina, 2001, p. 107). Com seus Nuevos Estudios Sencillos, Brouwer faz homenagens a dez compositores, colocando Villa-Lobos ao lado de grandes nomes da história da música. Estudio Sencillo 1 Omaggio a Debussy Estudio Sencillo 2 Ommaggio a Mangoré Estudio Sencillo 3 Ommaggio a Caturla 3 Estudio Sencillo 4 Ommaggio a Prokofief Estudio Sencillo 5 Ommaggio a Tárrega Estudio Sencillo 6 Ommaggio a Sor Estudio Sencillo 7 Ommaggio a Piazzolla Estudio Sencillo 8 Ommaggio a Villa-Lobos Estudio Sencillo 9 Ommaggio a Szymanovsky Estudio Sencillo 10 Ommaggio a Stravinsky Sobre os novos estudos, Tiago Emanuel Cassola Marques comenta: Vinte anos após as suas duas últimas séries de Estudos, Leo Brouwer compõe e edita uma nova colecção de dez pequenos estudos para guitarra, ampliando a sua obra didática. Opta novamente por breves peças dirigidas a jovens estudantes, mas ao invés dos anteriores estudos, desta vez a colecção apresenta uma ordem de dificuldade crescente de estudo em estudo (Marques, 2012, p. 40). Estudio Sencillo 8 Ommaggio a Villa-Lobos O Nuevo Estudio Sencillo nº 8, Ommaggio a Villa-Lobos é o estudo mais longo da série com uma introdução, duas partes contrastantes, em forma AB, ligadas por uma ponte, e uma codetta. Apresentando as seguintes demandas técnicas: Introdução aos harmônicos naturais. Mudanças de posição. Emprego de meia pestana nas casas II, IV e V. Apresentações longitudinal e transversal. Acordes com ritmo sincopado. A introdução é construída com blocos de acordes com ritmo sincopado, que se alternam com uma melodia em harmônicos.

Figura 1. Introdução. A procura de traços composicionais de Villa-Lobos neste estudo, compreendemos que melodias em harmônicos foram usadas por Villa-Lobos em algumas de suas peças mais relevantes para violão, tais como o Estudo 1, o Prelúdio 4 e na cadência do Concerto para violão e pequena orquestra. Figura 2. Trecho do prelúdio IV de Heitor Villa-Lobos. Fonte: Villa-Lobos. A parte A também consiste em uma melodia em acordes que apresenta uma mudança de andamento em relação à introdução. Figura 3. Parte A acordes com ritmo sincopado. A parte B apresenta uma melodia acompanhada por arpejos.

Figura 4. Parte B de caráter lírico e cantábile. Recurso este utilizado por Villa-Lobos em seu estudo Nº 7. gura 5. Trecho do estudo VII de caráter lírico e cantábile. Fonte: Villa-Lobos (1953). Fi igura 6. Codetta com a retomada dos harmônicos. F O estudo se encerra com a indicação do próprio compositor mostrando as técnicas utilizadas para a sua execução deste estudo, bem como algumas pistas ou sugestões sobre a abordagem técnica e musical que deverá ser tomada em conta. A presença de um texto deixando claro os objetivos e conteúdos técnicos e expressivos de cada estudo permite ao aluno conhecer com maior clareza as intenções do compositor. Figura 7. Demandas técnicas do estudo.

Conclusão Concluímos que as muitas homenagens que Villa-Lobos recebeu ao longo da história por seus pares compositores, seja através da intertextualidade, colagens, modelagem sistemática, arranjos, transcrições ou mesmo dedicatória, atestam a sua influência e poder criativo. Para o violão, em especial, Villa-Lobos ocupa um lugar central na formação da literatura do instrumento. Fabio Zanon e Abel Carlevaro afirmam o seguinte sobre a obra para violão de Villa-Lobos: Tanto uma benção como um peso para os compositores da geração posterior, afinal, seus prelúdios e estudos são as obras mais populares do violão no século XX, tocadas por todos os violonistas de qualquer nível de excelência, e gravados centenas de vezes (Zanon, 2006: p. 80). Com ele (Villa-Lobos), um novo violão surgia, um violão verdadeiramente sul-americano, não apenas por causa dos elementos harmônicos, melódicos e rítmicos empregados, mas também por causa da técnica demandada (Carlevaro, 1987). Este artigo, portanto, é uma pequena demonstração do valor intangível da obra para violão de Villa-Lobos e da inspiração que seus estudos e prelúdios exercem em seus pares compositores. O recorte dentro da obra de caráter didático de Leo Brouwer é apenas um exemplo desta influência. Brouwer coloca Villa-Lobos ao lado de nomes como Claude Debussy (1862-1918), Agustín Barrios Mangoré (1885-1944), Alejandro García Caturla (1906-1940), Serguei Prokofiev (1891-1953), Francisco Tárrega (1852-1909), Fernando Sor (1778-1839), Astor Piazzolla (1921-1992), Karol Szymanowski (1882-1937) e Igor Stravinsky (1882-1971). Reconhecendo assim a genialidade de Villa-Lobos através desta homenagem. Referências Amorim, H. (2009). Heitor Villa-Lobos e o Violão. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Música. Carlevaro, A. (1987). Guitar Masterclass, Tecnigue, analyses and interpretations of: the guitar worhs of Heitor Villa-lobos. 2. United kingdom: Chanterelle. Cattin, G. (1987). Historia de la música. 2. El Medioevo - primera parte. Madri: Turner Musica. Cooper, C. (1985). Chanson de Geste: Leo Brouwer and the New Romanticism. Classical Guitar, Londres. Dudeque, N. (1994). História do Violão. Curitiba: Editora da UFPR. Hernández, I. (2000). Leo Brouwer. Havana: Editora Musical de Cuba. Molina, S. (2001). O Som da Revolução. Revista Bravo!, ano 5, (51), São Paulo. Prada, T. (2008). Violão: de Villa-Lobos a Leo Brouwer. São Paulo: Terceira Margem. Prada, T. (2015). As homenagens em Nuevos Estudios Sencillos de Leo Brouwer ouvirouver Uberlândia, 11(1), p. 198-217. Prada, T. (2001). A obra violonística de Heitor Villa-lobos (Brasil) e Leo Brouwer (Cuba): a sensibilidade americana e a aventura intelectual. (Dissertação de mestrado). Universidade de São Paulo, São Paulo.

Marques, T. E. C. (2012). Projecto educativo Leo Brouwer contributos para a pedagogia guitarrística. (Tese de doutorado). Universidade de Aveiro, Aveiro. Páginas de internet consultadas A Arte do Violão. 2004. (2017, Outubro 10). Disponível em <http://aadv.co.nf/zanon_aadv- 14.html>. Partituras Brouwer, L. (2001). Nuevos Estudios Sencillos. London: Chester Music. 12 Estudos para Violão (MS Max Eschig) (1928). Rio de Janeiro: Museu VillaLobos (ms. P.200.1.2.A).

i Alejandro Evelio García Caturla. Foi advogado e compositor de música cubana contemporânea. ii Leo Brouwer fue uno de los primeros guitarristas en el mundo en ejecutar sus obras de Villa-lobos. Hay noticias de conciertos su tocando la obra del carioca ya en 1955.