Perspectivas de mudanças para o BPC

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Transcrição:

Perspectivas de mudanças para o BPC Luciana Jaccoud Brasília, 03 de março de 2017.

Estrutura da apresentação 1) Contextualização e histórico 2) Judicialização e mudanças do BPC Reforma proposta pelo STF 3) A PEC 287/2016 e as mudanças propostas para o BPC Elevação da idade mínima mudança do valor do benefício

1) Contextualização do BPC

Características do BPC Atende pessoas com deficiência (PcD) em qualquer idade e idosos (65 anos ou mais) em situação de extrema pobreza, sendo esta definida pela renda familiar per capita inferior a ¼ de salário mínimo. público caracterizado pela inatividade; em condição de miserabilidade, que comprovem não possuir meios de prover a sua própria subsistência ou tê-la provida por sua família. Direito constitucional que assegura o acesso a uma renda no valor de um salário-mínimo mensal. Regulamentado pela Lei nº 8.742, de 7/12/1993 Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), e começou a ser pago em 1996 Financiado com recurso do Fundo Nacional de Assistência Social FNAS e integra o Sistema Único de Assistência Social - SUAS. Sob gestão do MDSA/SNAS; operacionalizado pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS. Constitui um benefício individual e não vitalício voltado a atender as necessidades básicas dos seus beneficiários.

Nascimento do BPC Emenda Popular 077, fruto de mobilização do movimento das pessoas com deficiência. Subscrito por mais de 48 mil cidadão, foi recebida no dia 13 de agosto de 1987, solicitando à ANC a inclusão na Seção III (Da Assistência Social), do Capítulo II (Da Seguridade Social), do Título IX (Da Ordem Social), de artigo que fixasse o auxílio de um salário mínimo às pessoas portadoras de deficiência, que não tenham condições de se automanter. A Comissão de Sistematização da Constituinte incorporou, no texto relativo à assistência social, a garantia do benefício mensal de um saláriomínimo a toda pessoa portadora de deficiência que comprovasse não possuir meios de prover à sua própria manutenção. A garantia de renda para os idosos que não possuíssem outra fonte de rendimentos já prevista em etapas anteriores do processo constituinte e foi associada àquela dirigida às pessoas com deficiência. Nascia o BPC.

Conceituando o BPC Representou uma inovação naproteção social brasileira. Alterou e ampliou o escopo, finalidade e impacto social da proteção social brasileira. Superamos o modelo estritamente corporativista e uma proteção social ancorada estritamente no princípio contributivo e nos marco do vinculo com o trabalho formal; Superamos a tradicional relegação do tema da pobreza pelas politicas publicas brasileiras; Superamos a relegação da proteção aos segmentos mais pobres e mais vulneráveis ao campo da caridade, da ajuda ou da filantropia. Superamos a relegação da proteção aos segmentos mais pobres e mais vulneráveis ao campo privado e à família.

A relevância do BPC O BPC representou a instituição de: um direito social uma renda de substituição do trabalho uma responsabilidade publica a uma renda digna Em 2015, o BPC acolheu 4,2 milhões de pessoas 2,3 milhões de PcD. 1,9 milhões de idosos Ações complementares: BPC Escola e BPC Trabalho Estudos mostram o impacto positivo na redução da pobreza e da desigualdade de renda e na melhoria qualidade de vida dos beneficiários.

Evolução do BPC: beneficiários e despesa 2006 a 2015 - Quantidade de beneficiários aumentou em 71%: de 2,4 milhões em 2006 para 4,24 milhões em 2015. Despesa com BPC aumentou em 116%: de 19,3 bilhões em 2006 para 41,8 bilhões em 2015 (expansão de beneficiários e política de valorização do SM).

Evolução do BPC por beneficiários

Fatores que contribuíram para expansão dos beneficiários do BPC Parâmetros importantes de acesso - idade e deficiência - foram modificados por diversas políticas e normativas voltadas às pessoas idosas e com deficiência: Estatuto do Idoso, Lei nº 10.741/2003; Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015). Idade mínima: inicialmente fixada em 70 anos, foi reduzida para 67 anos em 1998 e, em 2003, tornou-se 65 anos (Estatuto do Idoso). Conceito de deficiência: LOAS: anomalias ou lesões irreversíveis de natureza hereditária, congênitas ou adquiridas impedidoras ao desempenho das atividades cotidianas e laborais. Decreto 7.617/2011: considera PCD aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Renda per capita abaixo de 1 4 de salário mínimo: critério não sofreu alteração, mas tem sido motivo de controvérsia no Judiciário.

BPC: impactos sobre pobreza e desigualdade Combinando benefícios contributivos, semi-contributivos e nãocontributivos, a proteção social permitiu ampliar o número de idosos protegidos, colocando o Brasil entre os países com mais alto grau de proteção social aos idosos da América Latina. (Nagamine e Ansiliero, 2009) Importância do BPC para o aumento do nível de proteção aos idosos: em 2014, 82% dos idosos (60 anos ou mais) possuíam proteção previdenciária ou assistencial ou da assistência social, ou contribuíam para a Previdência Social. (Fonte: MPS. Informe de Previdência Social, novembro/2015). Pobreza entre idosos é residual no país. Segundo Pnad 2014: 8,76% das pessoas com 65 anos ou mais viviam com renda até 1/2 SM. 0,78% das pessoas com 65 anos ou mais viviam com renda até 1/4 SM. Entre 2002 a 2012, o Índice de Gini caiu de 0,587 para 0,526 em 2012, e foi influenciado, sobretudo, pela renda do trabalho (55%) e pela previdência (21%). Os benefícios assistenciais (BPC e PBF) contribuíram com 18% desta redução.

2) Judicialização e mudanças no BPC

Judicialização do BPC Observa-se crescente judicialização do BPC. De 2012 a 2014, a principal causa de indeferimentos foi a manifestação da perícia médica do INSS sobre o aspecto da incapacidade do requerente para a vida independente e o trabalho: 64,36% das causas de indeferimento (Venturini, 2016). A parcela dos benefícios concedidos via judiciário cresceu de 2,6% (2004) para 18,7% (2015). O índice de concessão judicial tem crescido, alcançando quase um quarto do total dos benefícios para pessoas com deficiência concedidos em 2014. A taxa de concessão judicial para deficientes é significativamente maior que para idosos.

Evolução das concessões judiciais do BPC -2004/2014 (Venturini, 2016)

Decisão do STF O STF foi provocado algumas vezes sobre a constitucionalidade do critério de renda fixado pela LOAS. 1998 e 2004- STF declarou a validade e constitucionalidade do critério de renda Entretanto cidadãos seguiram solicitando - e obtendo- via judiciário o recebimento do BPC com base em outros critérios. Em 2013, decisão da corte suprema admite que a renda familiar per capita poderia ser flexibilizada ante razões excepcionais devidamente comprovadas. O tribunal reconheceu: a insuficiência e não exclusividade do critério de renda; a necessidade de considerar outros elementos para aferir a condição social dos requerentes como haviam feito os juizados especiais nos últimos anos. o critério de renda segue vigente até a aprovação de nova legislação. Lei Brasileira de Inclusão (Estatuto da Pessoa com Deficiência, Lei 13.146/2015) já alterou a LOAS adequando-a à decisão do STF.

Dependência como critério complementar A presença do envelhecimento e da deficiência, se acompanhados por situação de dependência, constrangem a autonomia e a vida ativa, com consequências diversas para o indivíduo e para sua família. No âmbito da renda, pode ampliar ou aprofundar o risco de pobreza para todo grupo familiar. Tais impactos podem se dar: Diretamente sobre o orçamento familiar - gerando o que a literatura especializada denomina gasto catastrófico" Indiretamente sobre a renda familiar, derivados da redução da oferta de trabalho, notadamente das mulheres. Portanto, os conceitos de dependência e autonomia comparecem como referências importantes neste debate, como sugerem as experiências internacionais.

3) A PEC 287/2016 e as mudanças propostas para o BPC

Justificativa da PEC 287/2016 para reforma da previdência Segundo a EM da PEC 287/2016, a reforma da previdência social visa: 1. ampliar a sustentabilidade do sistema de seguridade social, 2. enfrentar duas questões: envelhecimento populacional, que aponta para uma maior quantidade de beneficiários do sistema versus uma menor quantidade de pessoas em idade contributiva; as distorções e inconsistências do atual modelo de seguridade social : o financiamento dos benefícios rurais, os critérios inadequados da idade mínima de acesso e do valor dos benefícios assistenciais, a persistência de regimes específicos para algumas categorias e a disparidade das regras que regem o RGPS e RPPS.

Elevação da idade mínima e mudança do valor do benefício A PEC 287/2016 altera as regras para acesso ao BPC nos seguintes termos: mudanças no valor do benefício, desvinculando-o do salário mínimo (com impactos tanto para o BPC PcD como para o BPC Idoso); elevação na idade mínima de acesso ao benefício, que passaria de 65 para 70 anos (impacto no BPC Idoso). Tais mudanças, segundo a EM da PEC 287/2016, corrigem duas distorções provocadas pelo BPC: o valor do BPC ser igual ao do piso do benefício previdenciário. a idade mínima requerida para o BPC ser igual à da aposentadoria por idade, no caso de homens; Estes dois fatores promoveriam desincentivos para a contribuição à previdência social e forçando uma migração do sistema previdenciário (que exige contribuições) para um assistencial (não contributivo).

Avaliando a proposta de reforma I) Sobre o valor similar de benefícios contributivos e nãocontributivos A concessão do BPC: é independente de contribuições prévias, tem fundamento no princípio da solidariedade social É finalidade do BPC garantir : a) uma renda de subsistência em substituição à renda do trabalho: público caracterizado como incapaz de garantir sua própria sobrevivência por meio do trabalho remunerado. b) que esta população não esteja submetida à condição de extrema pobreza ou de pobreza. O BPC tem seu valor correspondente ao piso constitucional garantido aos trabalhadores - salário mínimo dado sua finalidade de atendimento das necessidades básicas de subsistência. Garantia de um salário mínimo mostra-se ainda mais relevante face à situação específica de vulnerabilidade das pessoas com deficiência e dos idosos. Renda distinta daquela propiciada pelo Programa Bolsa Família.

II) Sobre o desincentivo à contribuição previdenciária Há diferenças expressivas entre a proteção previdenciária e a proporcionada pelo BPC: A proteção assistencial operada pelo BPC é destinada aos idosos em situação de extrema pobreza. A proteção previdenciária garante proteção frente a um largo espectro de riscos, inclusive durante a vida economicamente ativa: doença, invalidez, maternidade, entre outros. A proteção previdenciária protege ao longo de toda a vida laboral do trabalhador, e a possibilidade de estar protegido na velhice por um benefício assistencial parece pouco atrativo - inclusive porque o acesso futuro ao BPC não é uma certeza, e sim uma possibilidade cuja efetivação depende de um nível de renda familiar bastante baixo. A proteção previdenciária protege não apenas o trabalhador em sua vida laboral como protege a sua família: pensão por morte, auxilio reclusão, maternidade, entre outros. O público idoso atendido pelo BPC advém da parcela considerável da PIA e PEA sem filiação previdenciária, não participantes do mercado de trabalho ou participantes de um mercado de trabalho com fortes características de informalidade e rotatividade. Determinantes do mercado de trabalho explicam o aumento da cobertura previdenciária da PEA em cerca de 12 pontos percentuais (de 52% para 63,9%) entre 2003 a 2012. O baixo nível de filiação previdenciária desses trabalhadores é menos resultado de uma escolha racional e mais uma consequência da baixa capacidade contributiva desses trabalhadores: precariedade de vínculos e de remuneração. Em 2014, 43,1% dos trabalhadores socialmente desprotegidos (sem filiação previdenciária), possuíam rendimento inferior ao valor do salário mínimo e, portanto, sem capacidade contributiva (Informe da Previdência Social v. 27 n. 11, MTPS, 2015).

III) Sobre a vulnerabilidade social dos beneficiários O BPC contempla um público : Em situação de extrema pobreza; De pessoas com deficiência, cuja possibilidade de exercício do trabalho esteja prejudicada; De idosos, cuja trajetória no mercado de trabalho foi marcada por forte precariedade. A perda de autonomia, decorrente tanto a deficiência como do envelhecimento, é um agravante da situação especifica de vulnerabilidade para acesso ao BPC. A presença de um membro com autonomia restrita aumenta a vulnerabilidade da família à pobreza, quando não agrava contextos de pobreza, uma vez que tais famílias são afetadas tanto nos seus rendimentos quanto nos seus gastos. a oferta de trabalho pode ser reduzida: demandas de cuidado podem retirar um adulto economicamente ativo do mercado de trabalho, notadamente das mulheres. os gastos familiares também podem ser afetados por demandas específicas, cujo impacto direto sob o orçamento familiar tem potencial de conduzir ou aprofundar o contexto de pobreza familiar (Silveira et al, 2016).

III) Sobre a vulnerabilidade social dos beneficiários (cont.) A discussão sobre o valor do BPC não pode desconsiderar a situação peculiar de vulnerabilidade das famílias que possuem pessoas com deficiência e/ou idosos, e cujos rendimentos mínimos (1/4 SM per capita) são afetados: pela ampliação de gastos pela menor capacidade de obter renda no mercado de trabalho. Em contexto de rápida mudança na dinâmica, tamanho e composição das familias Importância do BPC para estas famílias: garante uma estabilidade de renda imprescindível para fazer frente às necessidades de serviços, insumos e cuidados; em média, a renda proveniente do BPC representa 79% do orçamento dessas famílias e; em 47% dos casos, ela é a única renda da família (Brasil, 2010). Portanto, a proposta de redução deste valor significará a iminência do retorno destas famílias à misérias.

iv) Sobre a alteração no valor do beneficio A PEC propõe o fim da vinculação do valor do BPC ao salário mínimo, sem apresentar referência para as novas regras do valor do benefício. Sinaliza para: a) redução do valor do beneficio; b) instabilidade da regra que fixa o montante do beneficio. Cabe ressaltar a superioridade do BPC em relação a seus congêneres nos países da América Latina: na região, observou-se importante ampliação da presença de benefícios não contributivos favoreceu a ampliação da cobertura, baixos valores dos benefícios pagos não promovem a superação da linha da pobreza por parte de seus beneficiários.

V) Sobre os impactos do aumento da idade de acesso ao benefício Redução do público de idosos beneficarios do BPC e aumento da taxa de pobreza entre idosos: Beneficiários idosos de 2015 = 1.922.373 milhão 27% tinham idade entre 65 e 69 anos (MDS. Boletim BPC, 2015) Se a idade mínima de elegibilidade fosse 70 anos em 2015, 520 mil idosos não seriam beneficiários do BPC. Nos primeiros 5 anos de implementação da nova idade mínima (2018-2022), a cada ano em media, 143 mil idosos não seriam elegíveis para receber o BPC, acumulando 716 mil idosos desprotegidos no período, representando uma desproteção de 29% face ao cenário onde não haja reforma. (TD O Benefício de Prestação Continuada (BPC) na Reforma da Previdência: contribuições para o debate, no prelo). A elevação da idade de acesso ao BPC deve ser ponderada diante das reconhecidas dificuldades de inserção dos idosos no mercado de trabalho. Isto é ainda mais relevante para os trabalhadores menos qualificados, potencialmente beneficiários do BPC.

vi) Sobre a pressão provocada pelo aumento da expectativa de sobrevida Aumento da expectativa de sobrevida é um fator de pressão sobre o orçamento do BPC. A tábua de mortalidade do IBGE em 2014 apontou para uma expectativa de sobrevida aos 65 anos de 18,3 anos. Entretanto, as condições socioeconômicas podem influenciar as expectativas de sobrevida da população. Neste grupo específico, que apresentam características de extrema vulnerabilidade social, a expectativa de sobrevida, tende a ser bem menor que o da população em geral, conforme sugerem informações de registros administrativos (AEPS, 2014): Idade média de concessão do benefício (2014): 66,5 anos Cessações por morte (2014): correspondem a 84% Duração média do BPC Idoso (2014): 7,9 anos (proxy da expectativa de sobrevida dos beneficiários do BPC aos 66,5 anos) Expectativa de sobrevida da população aos 66 anos: 17,6 anos (IBGE)

Considerações Finais O BPC garante uma renda de substituição a um público em situação de grande vulnerabilidade social. O beneficio vem proporcionando inegável melhoria do bem estar aos beneficiários e contribuiu expressivamente para redução da miséria e da desigualdade no país nas últimas décadas. A desvinculação do valor do beneficio ao salário mínimo repercutirá negativamente nas condições de vida da população beneficiada, assim como nos indicadores de pobreza e de desigualdade do país. Sem clareza quanto à novas regras sobre o valor do benefício, abre-se espaço à insegurança sobre o futuro desta garantia de renda. A proposta de redução da idade de acesso implicará em importante redução no numero de idosos cobertos pelo BPC, com ampliação da vulnerabilidade deste grupo. Os termos atuais da proposta de reforma do BPC enfraquece a Seguridade Social em sua capacidade protetiva, impacto distributivo e garantia de condições dignas de vida a pessoas com deficiência e idosos em situação de miseria. O BPC é pilar essencial de proteção social, em especial em um país ainda marcado por fortes desigualdades sociais.