Avaliação de Danos Estruturais em Elementos de Fundações com Embasamento de Alvenaria Resistente



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Transcrição:

Avaliação de Danos Estruturais em Elementos de Fundações com Embasamento de Alvenaria Resistente Jason William Correia Maia Santiago Programa de Pós-graduação em Engenharia Civil, UNICAP Recife /PE Brasil gerberltda@yahoo.com.br Romilde Almeida de Oliveira Programa de Pós-graduação em Engenharia Civil, UNICAP Recife /PE Brasil romildealmeida@gmail.com Silvio Romero de Melo Ferreira Programa de Pós-graduação em Engenharia Civil, UNICAP Recife /PE Brasil - sr.mf@hotmail.com RESUMO: O artigo apresenta uma análise dos desabamentos dos edifícios Aquarela, Serrambi, Éricka e Ijuí, localizados na Região Metropolitana do Recife. Estas edificações foram executadas com um sistema construtivo comumente empregado em edifícios até quatro pavimentos, a alvenaria resistente e são regionalmente conhecidos como Prédios Caixão. Todos apresentaram como causas para os colapsos, a ruptura brusca por esmagamento das alvenarias dos embasamentos. Em virtude dos acidentes ocorridos e do grande número das manifestações patológicas constatadas, foi criada uma lei Municipal proibindo o uso desta técnica construtiva. As novas edificações deste porte passaram a ser construídas com a técnica de alvenaria estrutural racionalizada, obedecendo às normas brasileiras específicas existentes, que seguem padrões internacionais. PALAVRAS-CHAVE: Alvenaria, Alvenaria Resistente, Alvenaria Estrutural, Embasamento de Fundação, Deterioração, Acidentes. 1 INTRODUÇÃO No Brasil, o fim da década de 60 foi criado o Banco Nacional de Habitação (BNH) que passou a financiar construções populares em larga escala. Não houve uma preparação prévia acerca do tipo de construção a ser adotado. Na região metropolitana do Recife foram adpatados para edifício de até quatro pavimentos, os processos construtivos adotados para construções de um ou dois pavimentos, para os quais eram utilizados blocos cerâmicos ou de concreto destinados a alvenaria de vedação, usando no entanto com função estrutural. Todos estes edifícios nasceram, portanto, com um problema congênito. Some-se a este fato, a falta de controle de qualidade de produção dos blocos e do processo construtivo e se tem as condições suficientes para o quadro atualmente instalado. Além disto, a decadência dos salários no período inflacionário correspondente aos períodos das sucessivas crises econômicas ocorridas a partir do início da década de 80, houve a redução das áreas das unidades residenciais e, na tentativa de viabilizar as vendas, foram sacrificados elementos estruturais importantes tais como cintas, vergas, contravergas e coxins. No caso dos terrenos onde se tinha forte declividade, com o objetivo de reduzir custos e tempo de execução foi criado o denominado caixão perdido como solução para as fundações. As paredes de fundações, os embasamentos, eram constituídas de alvenaria, geralmente situadas sobre sapatas corridas com seções transversais em forma de T invertido. Estas paredes eram geralmente prolongamentos das paredes que definiam os ambientes das edificações. Os porões formados 1

pelos embasamentos e limitados pelo terreno natural e pela própria laje de piso, quase sempre ficam preenchidos com água proveniente de chuvas ou do próprio lençol frático. As paredes externas dos embasamentos funcionam como muro de contenção e, internamente estão em contato com a água com nível oscilante de sua superfície. Esta condição a que estão submetidas são causas de diversos tipos de manifestações patológicas que resultaram em 12 desabamentos espontâneos, 13 demolições e dezenas de edifícios interditados por não oferecerem condições de segurança suficientes para continuarem em operação. Alguns incidentes em Pernambuco merecem destaque tais como os que ocorreram com os edifícios Aquarela e Ijuí, em Jaboatão dos Guararapes, e os edifícios Éricka e Bloco B do conjunto Enseada de Serrambi, em Olinda. Os laudos periciais realizados após os colapsos nestes edifícios promovidos pelo CREA-PE nos dois primeiros casos e pela CODECIPE - Cordenação de Defesa Cvil de Pernambuco noa dois últimos apontaram como causas dos colapsos as rupturas bruscas decorrentes dos esmagamentos das alvenarias de embasamento. Diante de tais fatos, esta pesquisa teve como objetivo realizar uma análise das patologias que causaram os colapsos destes quatro edifícios. Teve ainda o objetivo de discutir a influência de itens como vícios construtivos, de projetos, baixa qualidade dos materiais empregados nessas edificações, a influência do nível de água do subsolo em contato com as fundações e os esforços adicionais atuantes sobre os embasamentos devido ao solo por eles arrimado. 2 HISTÓRICO DOS EDIFÍCIOS SINISTRADOS 2.1 Edifício Aquarela Em 1997 o Edifício Aquarela ruiu, após um pouco mais de dez anos de sua construção (Oliveira, 1997). Sua fundação era composta por uma sapata corrida, em concreto armado, no formato de uma viga T invertida. Entre o solo de fundação e a laje de piso do andar térreo da superestrutura foi deixado um espaço vazio com 1,0 m de altura, constituindo um caixão perdido ou caixão vazio (Figura 1). Figura 1. Embasamento de prédio tipo caixão. O embasamento era constituído por alvenaria singela de blocos cerâmicos de seis furos, assentados ao chato, com argamassa de cimento e areia, sem revestimentos. Ensaios efetuados nos blocos cerâmicos mostraram que os valores de expansão por umidade (EPU) foram superiores ao limite citado nas normas internacionais que é de 0,3 mm/m. Foi constatada uma queda de resistência mecânica dos blocos da alvenaria de embasamento, ao longo do tempo, superiores a 20%. Esta redução de resistência teve a colaboração da água retida no interior do caixão perdido e da camada de aterro e da umidade presente no material de aterro arrimado pelas paredse externas do embasamento. Houve ainda a contribuição acentuada do empuxo lateral proveniente das terras arrimadas pelas alvenarias de embasamento externas, pois assim como nos outros edifícios que serão mencionados adiante, definia um caixão perdido em sua fundação. Esses fatores fragilizaram a alvenaria de embasamento, contribuindo para o seu colapso, causando um afundamento generalizado em todo o pavimento térreo dos dois módulos que constituíam o edifício. O afundamento de cerca de 1,35 m de maneira uniforme, sem que ocorresse o desmoronamento generalizado, praticamente mantendo a horizontalidade dos pavimentos 2

pode ser explicado pela presença de cintas externas de 100 mm x 300 mm e internas de 100 mm x 200 mm na ligação das lajes com as paredes. Havia ainda um cinta no topo dos embasamentos, em concreto armado, com altura de 15 cm. Na Figura 2 pode-se observar o afundamento sofrido pelo Ed. Aquarela, após o colapso. Figura 3. Edifício Éricka. Figura 2. Edifício Aquarela - afundamento após o colapso. 2.2 Edifício Éricka Em 1987 foi construído o edifício Éricka que após 12 anos desabou. Tal episódio teve grande repercussão tanto no meio técnico quanto na sociedade recifense, pois acarretou a perda de quatro vidas. Ao analisar a execução deste edifício observou-se que no embasamento foram empregados blocos de concreto com dimensões variadas: 140 mm x 190 mm x 390 mm e 140 mm x 190 mm x 190 mm e tijolos cerâmicos nas dimensões de 90 mm x 90 mm x 20 mm. Ainda observando a Figura 3 verifica-se que parte da edificação foi mantida, apesar de fortemente fissurada, em virtude dos esforços sobre ela atuantes no processo de colapso. Neste caso, o esmagamento ocorreu devido à perda de resistência dos blocos de concreto do embasamento externo que se deteriorou ao longo do tempo em decorrência do ataque de sulfatos, presentes na água do subsolo, com teor médio superior a 650 mg/l (Ávila et al., 2000). Este valor segundo a Norma CETESB L1007 é considerado alto e com grau de agressividade forte. O nível de água do terreno encontrava-se a uma profundidade aproximada de 1,80 m, coincidindo com o nível de embasamento. Este nível do lençol freático está ainda sujeito às variações sazonais, como ocorre em toda a planície costeira do Recife. O colapso do embasamento foi devido também ao sistema construtivo inadequado, onde o contato permanente do solo com os blocos de concreto de alta porosidade, utilizados no embasamento externo, com uma das faces sujeita à umidade e tendo a outra face livre para evaporação, favoreceu o processo químico com a formação de Etringita. Este mineral é resultante da reação química entre os sulfatos e os componentes do cimento hidratado, com características deletérias ocasionando a degradação do concreto. Ainda um fato que merece referir é a presença de lixiviação do hidróxido de cálcio presente no concreto, decorrente da infiltração de água sob pressão, o que acarretou perda de resistência à compressão dos blocos do embasamento. Outro fenômeno também verificado foi o EPU, com perda de resistência dos tijolos cerâmicos presentes em pequena proporção, nos embasamentos da parte da edificação onde se deu o colapso, embora não tivesse contribuido de forma decisiva. 3

2.3 Bloco B do Conjunto Enseada de Serrambi O Bloco B do Conjunto Enseada de Serrambi, com apenas nove anos de construído, desabou de forma generalizada (Pires Sobrinho et al., 2000a). O edifício também possuía caixão perdido com aproximadamente 1 m de altura entre o nível do terreno e a primeira laje de piso. A EPU total que variou de 1,06 mm/m a 1,41 mm/m para as amostras do embasamento e foi de 1,18 mm/m para as amostras dos pavimentos superiores, também foi apontanda como um dos processos aceleradores do sinistro. Tal fato está associado ao nível de água presente na camada de aterro do subsolo. Os blocos cerâmicos utilizados nas fundações apresentaram espessura de 87 mm nos embasamentos assentados a galga (alvenaria singela). Os embasamentos não foram revestidos. Foi constatado também que o concreto armado existente no trecho correspondente à escada e reservatório superior era poroso e de baixa qualidade nos pilares ao nível do embasamento. Estas evidências foram constatadas, por meio dos ensaios de difratometria de Raio-X realizados, tendo sido verificando o fenômeno de carbonatação do concreto. A Figura 4 mostra a situação da edificação após o colapso. Conforme Pires Sobrinho e Oliveira (2002), o Edifício Ijui desabou após seis anos da sua execução. A edificação estava apoiada em fundação constituída de embasamentos de blocos de concreto definindo um caixão vazio. A alvenaria com blocos de concreto de vedação com dimensões de 90 mm x 390 mm x 190 mm, assentes sobre uma sapata corrida de concreto armado em forma de T invertido. A Figura 5 mostra o desabamento do bloco posterior. Em alguns trechos da fundação foi observado, onde ocorreu o início do colapso, o solapamento da base da sapata, decorrente da percolação da água e conseqüente lixiviação do terreno de sustentação. Figura 5. Edifício Ijuí Desabamento do bloco posterior. 3 RESULTADOS Figura 4. Ed. Serrambi Outras falhas construtivas podem ter contribuído da fundação. Foram detectadas as ausências de alguns elementos construtivos indicados no projeto estrutural. 2.4 Edifício Ijuí Como já foi mencionado anteriormente, as paredes externas do embasamento do edifício Éricka funcionavam como muro de contenção, devido à presença de um aterro na parte externa do caixão perdido; enquanto que a parte interna se encontrava no nível do terreno natural (Oliveira et al., 2000). Essa situação favoreceu à aceleração do processo de deterioração dos materiais de fundação e representou uma contribuição significativa no aumento de tensão de compressão sobre o embasamento. Verifica-se que as tensões verticais de compressão provenientes do empuxo podem chegar a valores da ordem de grandeza das produzidas 4

pelas cargas verticais decorrentes das lajes de piso e paredes. Foi efetuado o cálculo das tensões de compressão resultantes do empuxo proveniente do aterro e da água sobre o embasamento combinado com as correspondentes devidas às cargas verticais oriundas das ações permanentes (peso próprio, revestimentos) e das sobrecargas atuantes sobre o edifício, Figura 6. Utilizou-se a Teoria de Coulomb para a determinação do empuxo. Na aplicação da teoria de Coulomb aos solos coesivos, além das forças R (atrito) e P (peso da cunha) foram consideras as forças de coesão (S), ao longo da superfície de deslizamento e de adesão (T) entre o terrapleno e a parede. Na soma do carregamento vertical que incide sobre o embasamento tomou-se como referência a parede exposta à maior solicitação. Nos cálculos, foi levado em consideração o carregamento das lajes pré-moldadas e os pesos das paredes executadas em alvenaria singela, correspondentes à super-estrutura. A tensão devida ao empuxo nestes casos representa um acréscimo na tensão atuante na alvenaria do embasamento de até 70% no edifício Éricka que possuia espessura do embasamento de 0,14 m, altura de 1,80 m e distância da cota terreno até a laje de piso do andar térreo igual a 0,30 m, como mostra a Tabela 1. Tabela 1. Tensões atuantes devidas ao empuxo e ao carregamento vertical. Blocos Aquarela Ens. de Éricka Ijuí Serrambi h 0 (m)* 0,15 0,30 0,30 0,60 h (m)** 0,90 1,25 1,80 1,20 Espessura do embasamento (m) 0,11 0,09 0,14 0,09 Tensão do Carregamento vertical (tf/m 2 ) Tensão devida ao empuxo máximo (tf/m 2 ) Relação tensão horizontal/ tensão vertical 98,90 125,19 79,13 121,0 0 11,18 15,80 55,22 11,82 0,113 0,126 0,698 0,098 * h 0 = Distância entre a parte superior do aterro externo do caixão perdido até a parte inferior da laje de piso do andar térreo; ** h= Altura arrimada pelo embasa. Figura 6. Detalhae esquemático das fundações. Os blocos cerâmicos ou de concreto empregados nas edificações construídas em alvenaria resistente, em geral, não ultrapassam a resistência à compressão 30 kgf/cm 2 (3 MPa). Desta maneira, os valores das tensões resultantes na alvenaria são bastantes superiores às tensões máximas de compressão calculadas de acordo com norma NBR 10 837 (1989). Verifica-se que para grandes alturas dos embasamentos externos (da ordem de 1,75 m), com alvenaria singela, em que a face externa da parede se encontra em contato com o solo e a interna é livre (caso de caixão perdido), as tensões provocadas pelas ações dos empuxos podem chegar à mesma ordem de grandeza dos valores provenientes das cargas verticais (Figura 7). 4 CONCLUSÕES Os acidentes ocorridos e as inúmeras patologias em diversos prédios nesta região indicam a inviabilidade desta técnica construtiva. Fato preocupante é que patologias provenientes do contato direto da água com a alvenaria constituída de blocos de baixa qualidade sejam cerâmicos ou de concreto, têm conseqüências irreversíveis para a estrutura. Os blocos cerâmicos ou de concreto empregados nas edificações construídas em alvenaria resistente, em geral, não ultrapassam a resistência à compressão 30 kgf/cm 2 (3 MPa). Desta maneira, os valores das tensões 5

COBRAMSEG 2010: ENGENHARIA GEOTÉCNICA PARA O DESENVOLVIMENTO, INOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE. 2010 ABMS. Pires Sobrinho, C.W.A e Oliveira, R.A. Causas do desabamento do Bloco Posterior do Edifício Ijuí, Piedade, Jaboatão dos Guararapes PE. Laudo Técnico, Comissão Municipal de Defesa Civil do Município do Jaboatão dos Guararapes COMDEC, (2002). resultantes na alvenaria são bastantes superiores às tensões máximas de compressão resistentes. Figura 7. Relação entre tensões devidas ao empuxo e ao carregamento vertical, em função da altura do embasamento (h). REFERÊNCIAS Alves, F.S. Análise do comportamento estrutural de um conjunto de edifícios construídos com alvenaria resistente submetidos á ação de recalques. Recife/PE, 2006. Dissertação (Mestrado) Universidade Federal de Pernambuco, 150p. Ávila, J.I.S.L., Figueiroa, J.P., Melo, L.V., Oliveira, R.A. e Pires Sobrinho, C.W.A. Degradação de elementos de concretos porosos submetidos à ação de águas agressivas na planície costeira da Região Metropolitana do Recife. Anais do IV EPUSP, São Paulo, versão em CD-ROM, agosto, 2000. Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental CETESB. Determinação do grau de agressividade do meio aquoso ao concreto. CETESB L 1007. São Paulo, 1988. NBR 10837/89. Projeto e cálculo de alvenaria estrutural de blocos vazados de concreto Procedimento, (1989).. Oliveira, R.A. Causas do desabamento do Edifício Aquarela. Laudo Técnico, CREA/PE, Recife. Oliveira, R. A. et al. (2000). Laudo Técnico Causas do desabamento do edifício Éricka, Jardim Fragoso. Olinda PE. Pires Sobrinho, C.W.A, Melo, L.V. e Oliveira, R.A. Causas do desabamento do Bloco B do Conjunto Residencial Enseada de Serrambí, Bultrins, Olinda PE. Laudo Técnico, Comissão de Defesa Civil de Pernambuco CODECIPE, (2000a).. Pires Sobrinho, C.W.A., Ávila, J.I.S.L., Figueiroa, J.P., Melo, L.V. e Oliveira, R.A.. Causas do desabamento do Edifício Ericka, Jardim Fragoso, Olinda PE. Laudo Técnico, Comissão de Defesa Civil de Pernambuco CODECIPE, (2000b). 6