O regime fiscal da cisão de sociedades

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Transcrição:

O regime fiscal da cisão de sociedades Por Óscar Veloso Membro estagiário A operação de cisão enquadra-se numa série de operações de concentração e reestruturação empresarial. A cisão é utilizada quando se pretende separar ou dividir partes do património de uma sociedade, para com elas constituir novas sociedades ou agrupar a sociedades já existentes. A cisão de sociedades revela-se de extrema utilidade quando se tem como objectivo separar partes do património de uma empresa por ramos de actividade, permitindo uma maior especialização produtiva ou funcional ou quando se pretende alienar apenas uma ou algumas unidades de negócio. Pode também ser usada, como forma de repartição do património em caso de sucessão o que, dado o carácter familiar do sector empresarial português, pode revelar-se, casuisticamente de utilidade estratégica. A utilização da cisão como operação de reorganização empresarial pode ser conjugada com outros tipos de operação, tais como a fusão, a entrada de activos ou a permuta de partes sociais. A decisão do tipo ou da conjugação dos tipos de operação a utilizar deve ser estudada previamente, para que os objectivos das entidades intervenientes na operação de concentração e reestruturação empresarial sejam atingidos. O principal objectivo deste artigo é expor o regime fiscal aplicável às sociedades intervenientes numa operação de cisão, bem como aos sócios da sociedade cindida. De início será abordado o regime jurídico aplicável às operações de cisão de sociedades, dando particular atenção às várias modalidades de cisão previstas na lei e às consequências da cisão na esfera sócios da sociedade cindida e dos credores das sociedades intervenientes na operação. De seguida será abordada a questão fiscal, abrangendo os impostos sobre o rendimento, o imposto sobre o valor acrescentado e o imposto municipal na transmissão onerosa de imóveis, numa operação de cisão, nomeadamente o regime especial aplicável às cisões e os seus efeitos nas sociedades intervenientes e nos sócios da sociedade cindida. Será feita, também, referência aos benefícios fiscais aplicáveis numa operação de cisão previstos no Decreto-Lei 404/90 de 21 de Dezembro. Enquadramento jurídico Conceito e modalidades da cisão A cisão pode ser definida como a operação pela qual uma sociedade separa do seu património alguns ou a totalidade dos seus elementos activos e/ou passivos, para integrar no património de outra ou outras sociedades já constituídas ou a constituir. Quando é destacado parte do património da sociedade cindida, temos uma cisão-parcial, que se materializa na cisão- -simples ou na cisão parcial-fusão. Neste caso não há dissolução da sociedade cindida. No caso de ser destacada a totalidade do património, temos uma cisão-total, podendo ser uma cisão-dissolução ou uma cisão total-fusão, com a inerente dissolução da sociedade cindida. O conceito jurídico de cisão da legislação comunitária não coincidia totalmente com o conceito da legislação nacional, até à publicação da Directiva 2005/19/CE de 17 de Fevereiro que alterou a Directiva 90/ /434/CEE de 23 de Julho. A Directiva 90/434/CEE, no seu art.2º 50 Revisores & Empresas > Abril /Junho 2006

considerava a cisão a operação pela qual uma sociedade transfere, na sequência e por ocasião da sua dissolução sem liquidação, o conjunto do activo e do passivo que integra o seu património para duas ou mais sociedades já existentes ou novas, mediante a atribuição aos seus sócios, de acordo com uma regra de proporcionalidade, de títulos representativos do capital das sociedades beneficiárias da entrada, e, eventualmente, de uma quantia em dinheiro não superior a 10% do valor nominal ou, na ausência de valor nominal, do valor contabilístico desses títulos. Com base nesta directiva, e ao contrário da legislação nacional, o destaque de partes do património sem a dissolução da sociedade cindida não era considerado como uma operação de cisão. Esta situação foi alterada com a Directiva 2005/19/CE que passou a considerar como uma operação de cisão, além da prevista na directiva anterior, o destaque parcial do património sem a dissolução da sociedade cindida. Esta directiva define a cisão-parcial como uma operação pela qual uma sociedade transfere, sem ser dissolvida, um ou mais ramos da sua actividade para uma ou mais sociedades já existentes ou novas, deixando no mínimo um dos ramos de actividade na sociedade contribuidora, mediante a atribuição aos seus sócios, de acordo com uma regra de proporcionalidade, de títulos representativos do capital social das sociedades beneficiárias dos elementos do activo e do passivo e, eventualmente, de um pagamento em numerário não superior a 10% do valor nominal ou, na ausência de valor nominal, do valor contabilístico desses títulos. Com esta directiva o conceito jurídico de cisão da legislação comunitária aproximou-se do conceito da legislação nacional. O enquadramento jurídico nacional da Cisão de Sociedades encontra-se nos artigos 118º a 129º do Código das Sociedades Comerciais (CSC) aprovado pelo Decreto-Lei 262/86 de 2 de Setembro. O art.118º nº1 do CSC prevê três modalidades de cisão: Cisão-simples: uma sociedade destaca parte do seu património para com ele constituir outra sociedade; Cisão-dissolução: uma sociedade dissolve-se, dividindo o seu património, sendo cada uma das partes destinada a constituir uma nova sociedade; Cisão-fusão: uma sociedade destaca parte do seu património ou dissolve-se, dividindo o seu património em duas ou mais partes, para as fundir com sociedades já existentes ou com partes do património de outras sociedades, separadas por idênticos processos e com igual finalidade. Cisão-simples A concretização da cisão-simples depende da verificação de certos requisitos por parte da sociedade que vai destacar o património. Nos termos do art.123º do CSC a cisão não é permitida, por via do princípio da conservação do capital social, se o valor do património da sociedade cindida, em consequência da cisão, se tornar inferior à soma do capital social e da reserva legal, soma essa, que nas sociedades por quotas, inclui o valor das prestações suplementares não reembolsadas. Além disto, não será permitida a cisão se o capital social da sociedade a cindir não estiver totalmente liberado. O principal objectivo deste artigo é expor o regime fiscal aplicável às sociedades intervenientes numa operação de cisão, bem como aos sócios da sociedade cindida. Os elementos que podem ser destacados numa cisão-simples são, por força do art.124º do CSC, participações financeiras noutras sociedades para a formação de nova sociedade cujo objecto consista na gestão de participações sociais e bens que no património da sociedade a cindir estejam agrupados, de modo a constituírem uma unidade económica autónoma. Neste último caso podem transferir-se, também, as dívidas que economicamente se relacionem com a constituição ou o funcionamento dessa unidade económica. Cisão-dissolução Nos termos do art.126º nº1 do CSC, esta modalidade tem que abranger todo o património social, não restando quaisquer bens para partilha pelos sócios. Cisão-fusão A cisão-fusão pode ser decomposta em várias submodalidades, caso exista ou não a extinção da sociedade cindida ou a fusão das partes implique a sua incorporação noutra sociedade ou a constituição de nova sociedade. Deste modo teremos as hipóteses de a sociedade cindida (1) : a) Destacar parte do seu património, sem dissolução, para fundir essa parte com uma sociedade já existente (cisão parcial-fusão por incorporação); b) Destacar parte do seu património, sem dissolução, para a fundir com parte do património de outra ou outras socieda des, separadas por idêntico processo e com igual finalidade (cisão parcial-fusão por constituição de nova sociedade); c) Dissolver-se, dividindo o seu património em duas ou mais partes para as fundir com sociedades já existentes (cisão total- -fusão por incorporação); d) Dissolver-se, dividindo o seu patrimó nio em duas ou mais partes para as fundir com partes do património de outras sociedades, separadas por idêntico processo e com igual finalidade (cisão total- -fusão por constituição de nova sociedade). Responsabilidade por dívidas na cisão Uma operação de cisão pode implicar, como já foi referido, a transferência de dívidas da sociedade cindida para a sociedade incorporante ou para a nova sociedade. As garantias que asseguravam o cumprimento das obrigações da sociedade cindida mantêm-se após a cisão, já que, nos termos do art.121º do CSC, a atribuição de dívidas da sociedade cindida à sociedade incorporante ou à nova sociedade não importa novação. A lei estabelece, também, no art.122º do CSC que a sociedade cindida, se não for dissolvida, responde solidariamente pelas dívidas que, por força da cisão, tenham sido atribuídas à sociedade incorporante ou à nova sociedade. As sociedades beneficiárias das entradas resultantes da cisão respondem solidariamente, até ao valor dessas entradas, pelas dívidas da sociedade cindida. Neste último caso pode convencionar-se que a responsabilidade é meramente conjunta. No caso de haver dissolução da sociedade cindida, por força do art.126º nº2 do CSC, as novas sociedades são solidariamente responsáveis pelas dívidas anteriores à cisão. Os dispositivos referidos garantem a protecção dos credores através da responsabilidade solidária de todas as sociedades intervenientes na cisão. Sócios da sociedade cindida Na legislação nacional, ao contrário da legislação comunitária, não é referida expressamente qual a contraprestação a entregar aos sócios da sociedade cindida pela cisão. Revisores & Empresas > Abril /Junho 2006 51

Por força do art. 119º alínea f) do CSC, que estabelece que no projecto de cisão devem constar as partes, quotas ou acções da sociedade incorporante ou da nova sociedade e, se for caso disso, as quantias em dinheiro que serão atribuídas aos sócios da sociedade a cindir, e pela remissão prevista no art. 120º do CSC, que torna válido o que se dispõe a propósito da fusão, os sócios da sociedade cindida tornam-se sócios da(s) sociedade(s) incorporante(s) e/ou da(s) nova(s) sociedade(s) (art.112º alínea b) do CSC) e podem receber uma importância em dinheiro que não pode ultrapassar 10% do valor nominal das participações que lhes foram atribuídas (art. 97º nº5 do CSC). A distribuição das novas participações sociais pelos sócios da sociedade cindida é feita com base numa regra de proporcionalidade. Deste modo, os sócios da sociedade cindida recebem participações sociais na sociedade incorporante ou na nova sociedade na mesma proporção em que os mesmos participavam na sociedade cindida à data da cisão, mantendo-se a igualdade entre os sócios. No entanto, no caso da cisão-dissolução, a lei permite que, por acordo de todos os sócios, seja deliberada uma forma de atribuição diferente (art.127º do CSC). No caso de constituição de novas sociedades, a participação dos sócios da sociedade cindida não pode ser superior ao valor líquido dos bens destacados (art.129º nº2 do CSC). A atribuição das participações sociais da sociedade incorporante ou da nova sociedade é feita directamente aos sócios por via da cisão da sociedade, pelo que não entram as participações primeiro na titularidade da sociedade cindida, nem ficam os sócios em momento algum detentores de partes do património cindido. Intervenção do Revisor Oficial de Contas A operação de cisão deve ser precedida de um projecto de cisão que deve respeitar o disposto no art.119º do CSC. Pela remissão do art.120º do CSC deverá aplicar-se o art.99º do CSC quanto à fiscalização do projecto. Se as sociedades intervenientes na cisão tiverem órgão de fiscalização, este deve emitir um parecer sobre a operação. Caso alguma sociedade não possua órgão de fiscalização, deve promover a exame do projecto de cisão por um Revisor Oficial de Contas ou Sociedade de Revisores Oficiais de Contas independente de todas as sociedades intervenientes. Se todas ou algumas das sociedades partici- pantes na cisão assim o desejarem, a fiscalização ao projecto pode ser feita, quanto a todas elas ou quanto às que nisso tiverem acordado, pelo mesmo Revisor ou Sociedade de Revisores Oficiais de Contas, que neste caso, deve ser designado, a solicitação conjunta das sociedade interessadas, pela Ordem dos Revisores Oficiais de Contas. Com as alterações introduzidas ao CSC pelo Decreto-Lei 76-A/2006 de 29 de Março, o exame ao projecto de cisão pode ser dispensado por acordo de todos os sócios de cada uma das sociedades que participam na cisão. A fiscalização do projecto de cisão enquadra-se nas competências exclusivas de interesse público dos Revisores Oficiais de Contas. O normativo que deve reger a intervenção do Revisor Oficial de Contas é a Directriz de Revisão/Auditoria 842 aplicável à fusão de sociedades, que deve ser aplicado por analogia à cisão de sociedades. A intervenção do Revisor Oficial de Contas tem como objectivo garantir uma equitativa relação de troca das participações sociais e verificar se as garantias dos credores das sociedades intervenientes não são postas em causa em consequência da cisão. Regime Fiscal da cisão Uma cisão envolve a transmissão de activos e passivos da sociedade cindida para a sociedade incorporante ou para a nova sociedade, a troca de participações sociais ao nível dos sócios da sociedade cindida e um conjunto de actos jurídicos. Estas operações produzem efeitos nos seguintes impostos (2) : Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC); Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS); Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA); Imposto Municipal sobre a Transmissão Onerosa de Imóveis (IMT); De seguida analisaremos cada um dos impostos acima referidos numa cisão e os benefícios fiscais existentes à concentração e reestruturação empresarial, nomeadamente o Decreto-Lei 404/90 de 21 de Dezembro. Impostos sobre o Rendimento O CIRC prevê, nos artigos 67º a 72º, um regime especial aplicável às fusões, cisões, entrada de activos e permutas de parte sociais. Este regime, por força do art.67º nº7, aplica-se às operações de cisão em que intervenham sociedades com sede ou direcção efectiva em território português sujeitas e não isentas de IRC, cujo lucro tributável não seja determinado pelo regime simplificado e sociedades de outros Estados membros da União Europeia, desde que todas as sociedades se encontrem nas condições estabelecidas no artigo 3º da Directiva 90/434/CEE de 23 de Julho (3). Sempre que intervenha na operação de cisão pelo menos uma sociedade não residente num Estado membro, aplica-se o regime geral de tributação. O regime especial não se aplica sempre que, por virtude da cisão, sejam transmitidos navios ou aeronaves, ou bens móveis afectos à sua exploração, para uma entidade de navegação marítima ou área internacional não residente em território português (art.67º nº8 CIRC). O art.67º nº10 prevê uma norma antiabuso, estabelecendo que o regime especial não se aplica sempre que as operações tiveram como principal objectivo a evasão fiscal e não tenham sido realizadas por razões económicas válidas, tais 52 Revisores & Empresas > Abril /Junho 2006

como a reestruturação ou a racionalização das sociedades que nelas participam. O objectivo do regime especial é, se se verificarem os seus requisitos, garantir a neutralidade fiscal, evitando onerar fiscalmente as sociedades intervenientes e os sócios da sociedade cindida nos processos de concentração e reestruturação empresarial. Regime fiscal aplicável às sociedades cindidas e às sociedades beneficiárias residentes em território naciona (l4) Quando estamos perante a dissolução da sociedade cindida (na cisão-dissolução e na cisão total-fusão) há lugar a cessação da actividade, sendo necessário o apuramento dos resultados entre a data de início do exercício até à data da cisão (art. 8º nº4 alínea b) e nº5 alínea a); art. 73º nº2 alínea a) e art. 112º nº3 do CIRC). A aplicação do regime especial referido anteriormente está dependente da verificação dos seguintes requisitos por parte da sociedade beneficiária (art.68º nº3 do CIRC): o património transferido deve ser contabilizado na sociedade beneficiária pelo mesmo valor que apresentava na sociedade cindida; o valor do património transferido deve resultar da aplicação das disposições do CIRC ou de reavaliações feitas ao abrigo da legislação fiscal5. Verificados os requisitos, na determinação do lucro tributável da sociedade cindida, não é considerado qualquer resultado derivado da transferência do património, nem são considerados como proveitos as anulações das provisões constituídas e aceites como custos fiscais, em consequência da cisão6. O regime especial permite a transferência das provisões para a sociedade beneficiária sem que sejam consideradas como proveito fiscal na sociedade cindida, na medida em que a primeira é continuadora da segunda, pois é aquela que deverá fazer face aos riscos que foram transferidos em consequência da cisão. Verificados os requisitos enumerados acima, na determinação do lucro tributável da sociedade beneficiária deve ter-se em conta que o apuramento dos resultados respeitantes aos elementos patrimoniais transferidos é feito como se não tivesse havido cisão, que as amortizações sobre os elementos de activo imobilizado transferidos são efectuadas de acordo com o regime que vinha sendo seguindo nas sociedades cindidas e que as provisões transferidas têm, para efeitos fiscais, o regime que lhes era aplicável nas sociedades cindidas (art. 68º nº4 do CIRC). O regime especial aplicável às cisões consiste, fundamentalmente, no diferimento da tributação. A transferência de património por via da cisão não dá origem a qualquer tributação em sede de IRC na sociedade cindida, as mais-valias, a existirem, são potenciais, e serão tributadas no seio da sociedade beneficiária se esta proceder, posteriormente, à alienação do património recebido em virtude da cisão. Além disto, e caso a sociedade beneficiária detenha uma participação social na sociedade cindida, não concorre para o lucro tributável a mais-valia ou a menos-valia eventualmente resultante da anulação das partes de capital detidas naquela sociedade em consequência da cisão (art. 68º nº6 do CIRC). Em caso de dissolução da sociedade cindida, o regime especial prevê a transmissibilidade dos seus prejuízos fiscais7, que serão distribuídos proporcionalmente por cada uma das sociedades beneficiárias de acordo com o valor do património recebido por cada uma delas (art. 69º nº3 alínea a) do CIRC). A transmissão dos prejuízos depende de autorização prévia do Ministro das Finanças, mediante requerimento dos interessados, que será dada se se demonstrar que a cisão é realizada por razões económicas válidas e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial com efeitos positivos na estrutura produtiva (art.69º nº1 e 2 do CIRC). Os prejuízos fiscais poderão ser deduzidos aos lucros tributáveis das sociedades beneficiárias até sexto exercício seguinte àquele em que os prejuízos tenham sido obtidos (art.47º nº1 do CIRC).8 Para além dos limites à dedução dos prejuízos fiscais previstos em despacho, a introdução do artigo 86º do CIRC pelo Orçamento de Estado para 2005 (Lei nº55-b/2004 de 30 de Dezembro), introduziu uma nova limitação ao aproveitamento dos prejuízos fiscais transmitidos em consequência da cisão. Deste modo, o imposto liquidado com a utilização dos prejuízos fiscais (e outros benefícios fiscais) não pode ser inferior a 60% do imposto que seria liquidado sem a utilização dos prejuízos fiscais transmitidos (e outros benefícios fiscais). Regime fiscal aplicável às sociedades cindidas e às sociedades beneficiárias não residentes em território nacional O regime especial de tributação numa operação de cisão apenas se aplica se as sociedades intervenientes não residentes forem residentes num Estado-membro da União Europeia, tal como definido no art.3º da Directiva 90/434/CEE. Se na operação intervier, pelo menos, uma sociedade residente num país terceiro (9), aplica-se o regime geral de tributação, isto é, não pode aplicar-se o regime de neutralidade fiscal previsto no regime especial aplicável às cisões. O objectivo da legislação nacional e comunitária relativamente às operações entre sociedades de outros Estados-membros foi garantir o regime de neutralidade fiscal para as sociedades intervenientes e para os sócios da sociedade cindida, bem como salvaguardar os direitos de tributação do Estado da sociedade cindida. Assim, o regime especial aplicar-se-á se, em consequência da cisão, for transferido um património afecto a um estabelecimento estável10 de uma sociedade residente num Estado membro para uma sociedade residente noutro Estado-membro, esta continue a afectar o património transferido a um estabelecimento estável situado no Estado-membro da sociedade cindida (art. 68º nº1 alíneas a), b) e c) do CIRC). Revisores & Empresas > Abril /Junho 2006 53

Se, verificados os requisitos enunciados, nas operações de cisão em que intervenham sociedades residentes noutros Estados-membros aplica-se, tal como nas operações com sociedades residentes em território português, o princípio do diferimento da tributação, com as seguintes particularidades: é considerado proveito fiscal a anulação das provisões que respeitam a estabelecimentos estáveis situados fora do território português quando estes são transferidos para entidades não residentes (art. 68º nº1 do CIRC); a sociedade beneficiária, relativamente à determinação do lucro tributável do estabelecimento estável ao qual foi afecto o património transferido, deve aplicar o princípio da continuidade, tal como definido no art. 68º nº4 do CIRC; só são transmissíveis os prejuízos fiscais imputáveis ao estabelecimento estável e a transmissão é feita relativamente ao estabelecimento estável para o qual o património foi transmitido (art. 69º nº3 alínea c)). Se, em consequência da cisão, houver transferência de um estabelecimento estável situado num Estado-membro de uma sociedade residente em Portugal para outro Estado-membro, não se aplica, relativamente a esse estabelecimento estável, o regime especial. Neste caso, a sociedade residente em Portugal será, eventualmente, tributada pela transmissão do estabelecimento estável e poderá deduzir o imposto estrangeiro que, na falta das disposições da Directiva 90/434/CEE, seria aplicável no Estado em que se situa o estabelecimento estável, sendo essa dedução feita do mesmo modo e pelo mesmo montante a que haveria lugar se aquele imposto tivesse sido efectivamente liquidado e pago (art. 68º nº2 do CIRC)11. Regime fiscal aplicável aos sócios da sociedade cindida Numa operação de cisão assiste-se ao destaque de partes ou da totalidade do património de uma sociedade, e com ele constituem-se novas sociedades ou incorpora-se em sociedades já existentes ou a constituir. Deste modo, as participações sociais que os sócios detinham na sociedade cindida vão ser substituídas totalmente, no caso de uma operação de cisão que implique a dissolução da sociedade cindida, por participações na(s) sociedade(s) beneficiária(s) e, no caso de uma operação cisão que não implique a dissolução da sociedade cindida, os seus sócios irão acrescentar às participações na sociedade cindida as participações da(s) sociedade(s) beneficiária(s). Também relativamente aos sócios da sociedade cindida (quer sejam pessoas colectivas quer sejam pessoas singulares) está previsto um regime de neutralidade fiscal, não havendo apuramento de ganhos ou perdas fiscais em consequência de uma cisão, se os sócios da sociedade cindida continuarem a valorizar as novas participações sociais pelo valor das antigas (art. 70º do CIRC e art. 10º nº10 do CIRS), que no caso das pessoas colectivas, essa valorização tem que ter tradução contabilística. Em qualquer um dos casos, se houver recebimento de importâncias em dinheiro em consequência da cisão há lugar a tributação. Se, em consequência da cisão, houver lugar à troca de participações sociais (12) e for atribuído às participações na(s) nova(s) sociedade(s) um valor superior ao da participação na sociedade cindida, haverá lugar a tributação de mais-valias e, neste caso, deverá ter-se em conta o seguinte: se os sócios da sociedade cindida forem pessoas singulares, estes só serão tributados se as acções da sociedade cindida forem detidas há menos de um ano (art. 10º nº2 alínea a) do CIRS); se as participações da sociedade cindida foram adquiridas antes da entrada em vigor do CIRS e do CIRC, quer para as pessoas singulares quer para as pessoas colectivas, não haverá tributação das mais-valias (art. 5º do Decreto-Lei nº442-a/88 de 30 de Novembro e art.18º-a do Decreto-Lei nº442-b/88 de 30 de Novembro); se o sócio da sociedade cindida for uma Sociedade Gestora de Participações Sociais e se se verificarem os requisitos previstos no art.31º nº2 do Estatuto dos Benefícios Fiscais, não haverá tributação das mais-valias; se os sócios da sociedade cindida forem não residentes, quer sejam pessoas singulares quer sejam pessoas colectivas, e se se verificarem os requisitos previstos no art.26º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, não haverá tributação das mais- -valias. Se os sócios da sociedade cindida procederem posteriormente à alienação das participações sociais na sociedade beneficiária e aplicaram o regime especial das cisões, considera-se como data de aquisição dessas participações a que corresponder à data de aquisição das participações na sociedade cindida. (art.44º nº3 do CIRC; art.43º nº4 alínea f); art. 5º nº3 do Decreto-Lei nº442-a/88 de 30 de Novembro e art.18º-a nº3 do Decreto-Lei nº442-b/88 de 30 de Novembro) No caso em que não há troca de participações sociais13, se à soma dos títulos recebidos com os detidos no capital da 54 Revisores & Empresas > Abril /Junho 2006

sociedade cindida for atribuído um valor superior àquele que estes últimos tinham imediatamente antes da cisão14, o acréscimo é considerado distribuição de dividendos, à qual deve ser dado o tratamento fiscal adequado em sede de IRS e de IRC, consoante os sócios da sociedade cindida sejam pessoas singulares ou pessoas colectivas, respectivamente. Nesta situação, para efeitos de apuramento de eventuais mais-valias fiscais com a alienação das participações da sociedade beneficiária e da sociedade cindida, considera-se que a primeira foi recebida pelo valor zero e que segunda mantém o valor antes da cisão. Outros aspectos fiscais da cisão A sociedade cindida tem como obrigação, manter no seu processo de documentação fiscal uma declaração passada pela sociedade beneficiária em que esta se compromete a dar cumprimento ao disposto nos nºs 3 e 4 do art.68º do CIRC e sempre que participem na cisão sociedades não residentes no território português, declarações comprovativas dessas sociedades, confirmadas e autenticadas pelas autoridades fiscais do respectivo Estado-membro da União Europeia, de que se encontram nas condições estabelecidas no art.3º da Directiva 90/434/CEE. No caso referido no nº 2 do art.68º do CIRC, além das declarações referidas, a sociedade cindida deve manter no seu processo de documentação fiscal um documento passado pelas autoridades fiscais do Estado-membro da União Europeia onde se situa o estabelecimento estável em que se declare o imposto que aí seria devido na falta das disposições da Directiva 90/434/CEE. Relativamente aos sócios da sociedade cindida, estes devem manter no seu processo de documentação fiscal uma declaração donde conste a data, identificação da operação realizada e das entidades intervenientes, número e valor nominal das partes sociais entregues e recebidas, valor por que se encontravam registadas na contabilidade as partes sociais entregues e respectivas datas de aquisição, quantia em dinheiro eventualmente recebida, nível percentual da participação detida antes e após a operação de cisão (art.72º do CIRC). Imposto sobre o Valor Acrescentado A cisão de sociedades poderá implicar a transmissão de bens, que nos termos do art.3º do CIVA estarão sujeitas a IVA. No entanto, por força do disposto do nº4 do art.3º do CIVA não são consideradas transmissões de bens as cessões a título oneroso da totalidade ou parte de um património, que seja susceptível de constituir um ramo de actividade independente, quando o adquirente seja, ou venha a ser, pelo facto da aquisição, um sujeito passivo de IVA. Se assim não fosse, a sociedade cindida teria que liquidar IVA relativamente aos bens transferidos sujeitos a IVA e a sociedade beneficiária poderia deduzir o IVA suportado pelo recebimento dos bens. Esta situação não resultaria em qualquer benefício para o Estado, implicando apenas um maior esforço financeiro para a(s) sociedade(s) resultante(s) da cisão. Imposto Municipal sobre a Transmissão Onerosa de Imóveis Uma operação de cisão pode envolver a transmissão de imóveis, que nos termos do art.2º nº5 alínea g) do CIMT, está sujeita a IMT à taxa de 5% ou 6,5%, para os prédios rústicos ou para os prédios urbanos e outras aquisições onerosas, respectivamente (art.17ºdo CIMT). O IMT recai sobre o valor por que esses bens entrarem para o activo das sociedades beneficiárias ou sobre o valor patrimonial tributário dos imóveis, consoante o maior (art.12º nº13 do CIMT). O valor patrimonial tributário dos imóveis deve ser calculado nos termos estabelecidos no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (art.14º do CIMT). No caso em que o valor pelo qual os imóveis são transferidos seja inferior ou seu valor patrimonial tributário, o art. 58º-A do CIRC não tem aplicabilidade, já que não estamos perante uma verdadeira alienação dos imóveis (15). Os imóveis transferidos devem ser contabilizados na sociedade beneficiária pelo valor que figuravam na contabilidade da sociedade cindida. O apuramento de eventuais resultados com a transmissão dos imóveis será feito na sociedade beneficiária. Desta forma garante-se, relativamente à transmissão de imóveis verificada em consequência da cisão, o regime de neutralidade fiscal. Decreto-Lei 404/90 de 21 de Dezembro. O DL 404/90 prevê alguns benefícios fiscais para as operações de concentração e reestruturação empresarial. Esses benefícios fiscais abrangem o IMT, o Imposto do Selo relativamente à transmissão dos imóveis e à constituição ou aumento de capital e os emolumentos e outros encargos legais necessários à concentração e reestruturação (art.1º do DL 404/90). No entanto, no caso de uma operação de cisão, o aproveitamento dos benefícios fiscais só é possível na modalidade de cisão-fusão (art.2º nº1 alínea c) do DL 404/90). A concessão dos benefícios está dependente da verificação de alguns requisitos, Revisores & Empresas > Abril /Junho 2006 55

nomeadamente, que a operação não ponha em causa a concorrência no mercado, que as sociedade envolvidas na cisão exerçam a mesma actividade económica ou actividades económicas integradas na mesma cadeia de produção ou distribuição e que o património transmitido constitua uma unidade económica autónoma (art.3º do DL 404/90). Os benefícios são concedidos por despacho do Ministro das Finanças, mediante requerimento dos interessados, precedido de informação da DGCI. Antes do Orçamento de Estado para 2005, se a sociedade que requeria os benefícios não recebesse uma posição da Administração Fiscal no prazo de 30 dias, o pedido de concessão dos benefícios considerava-se tacitamente deferido. Com a aprovação do Orçamento de Estado para 2005, o deferimento tácito acabou, estando, agora a concessão dos benefícios dependente de autorização expressa pela Administração Fiscal. Deste modo, se no prazo de seis sociedade beneficiária e os sócios da sociedade cindida apenas serão tributados pelas operações realizadas após à cisão e como se ela não tivesse existido. O principal objectivo do regime é evitar os custos fiscais inerentes a uma operação de concentração ou reestruturação empresarial, bem como assegurar que as reestruturações empresariais não deixam de se realizar por questões fiscais. No caso em que na operação de cisão intervêm sociedades residentes noutros Estados-membros da União Europeia, o objectivo do regime é assegurar, além da neutralidade fiscal para as sociedades intervenientes e para os sócios da sociedade cindida, os direitos de tributação do Estado onde se situa a sociedade cindida. Relativamente aos outros impostos, verificamos que uma operação de cisão não implica qualquer efeito em IVA, já que não é considerada uma transmissão de bens. Se a operação de cisão implicar a transmissão de imóveis, haverá lugar a Decreto-Lei nº394-b/84 de 26 de Dezembro Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado. Decreto-Lei nº262/86 de 2 de Setembro Código das Sociedades Comerciais. Decreto-Lei nº442-a/88 de 30 de Novembro Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares. Decreto-Lei nº442-b/88 de 30 de Novembro Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas. Decreto-Lei nº215/89 de 1 de Julho Estatuto dos Benefícios Fiscais. Decreto-Lei 404/90 de 21 de Dezembro. Decreto-Lei nº198/2001 de 3 de Julho Revê o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas e Estatuto dos Benefícios Fiscais. Decreto-Lei nº287/2003 de 12 de Novembro Código do Imposto Muni-... verificamos que os benefícios fiscais previstos no DL 404/90 são limitados à modalidade de cisão-fusão e que se procedeu, com o Orçamento de Estado para 2005, a uma alteração quanto ao procedimento de pedido da concessão dos benefícios, tornando a aplicação do regime mais restritiva.. meses a Administração Fiscal não se pronunciar sobre o pedido de concessão de benefícios, presume-se o indeferimento tácito do pedido para efeitos de recurso hierárquico, recurso contencioso ou impugnação judicial (art.54º nº1 alínea d) e art.57º da Lei Geral Tributária). Conclusão Ao longo do desenvolvimento do trabalho verificamos que uma operação de cisão produz efeitos numa série de impostos, dos quais se destacam os impostos sobre o rendimento, nomeadamente o IRC. Relativamente ao IRC e IRS verificámos que existe um regime especial aplicável às operações de cisões que consiste, se verificados os seus requisitos, em assegurar um regime de neutralidade fiscal quer para as sociedades intervenientes quer para os sócios da sociedade cindida e que a aplicação do regime especial implica um diferimento da tributação. A tributação de IMT. Neste caso é importante referir que foi salvaguardada a neutralidade fiscal, garantindo que o valor patrimonial tributário é apenas relevante para efeitos de IMT e IMI, mas que não produz efeitos ao nível do IRC. Finalmente, relativamente aos benefícios fiscais previstos no DL 404/90 verificamos que são limitados à modalidade de cisão-fusão e que se procedeu, com o Orçamento de Estado para 2005, a uma alteração quanto ao procedimento de pedido da concessão dos benefícios, tornando a aplicação do regime mais restritiva. Referências normativas Circular nº6/2002 da Direcção de Serviços do IRC de 2 de Abril de 2002 - Transmissibilidade de prejuízos em casos de fusão, cisão e entrada de activos. Circular nº8/2004 da Direcção de Serviços do IRC de 30 de Março de 2004 Contagem dos prazos de detenção das participações Regime de Neutralidade. 56 Revisores & Empresas > Abril /Junho 2006

cipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis. Decreto-Lei nº398/98 de 17 de Dezembro Lei Geral Tributária. Decreto-Lei nº76-a/2006 de 29 de Março Altera o Código das Sociedades Comerciais. Despacho nº154/2002 de 15 de Março da Direcção de Serviços do IRC Princípio da Identidade Fiscal nas Fusões. Despacho nº532/2002 de 14 de Março do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais Dedução de prejuízos requisitos. Despacho nº677/2002 de 25 de Março do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais Dedução de prejuízos fiscais no regime especial das fusões e das cisões. Despacho nº1588/2004 de 21 de Julho do Subdirector-Geral do IR Correcções ao valor de transmissão de direitos reais sobre bens imóveis em operações de fusão, cisão, entrada de activos e permutas de partes sociais. Directiva 90/434/CEE do Conselho das Comunidades Europeias de 23 de Julho Regime fiscal comum aplicável às fusões, cisões, entradas de activos e permutas de acções entre sociedades de Estados- -membros diferentes. Directiva 2005/19/CE do Conselho da União Europeia de 17 de Fevereiro Altera a Directiva 90/434/CEE. Bibliografia BILAU, José Jacinto Tratamento Fiscal das Fusões de Sociedades. Jornal Técnico de Contas e da Empresa, nº 363, pp: 301 a 303, Dezembro de 1995 e nº364, pp: 16 a 22, Janeiro de 1996. BORGES, António; CABRITA, Pedro Mais e Menos Valias Tributação e Reinvestimento. Áreas Editoras, 2ª ed. 2002. MONTES, José António López- Santacruz Memento Práctico Fusiones (2005-2006); Francis Lefebvre, Madrid, 2004. PEREIRA, Manuel H. de Freitas Consequências fiscais ao nível nacional e internacional das cisões e operações similares; Ciência e Técnica Fiscal nº375, pp: 81 a 99, 1994. PEREIRA, Manuel H. de Freitas A Directiva Comunitária Relativa ao Regime Fiscal Comum Aplicável a Fusões, Cisões, Entradas de Activos e Permutas de Acções; Revista Fisco nº47, pp: 3 a 14, 1992. PINTO, José Alberto Pinheiro Fiscalidade; Areal Editores, 3ªed. 2003. VARELA, Maria Avelina Besteiro, ARROYO, Gil Sánchez Contabilidad financiera y de sociedades II, Ediciones Piramide, 4ª ed. 2004. VENTURA, Raul Fusão, Cisão e Transformação de Sociedades, Livraria Almedina, 1990. Notas (1) VENTURA, Raul, Fusão, Cisão e Transformação de Sociedades, pág. 336 e ss. (2) E também no imposto do selo e nos emolumentos notariais e registrais, que não serão aqui abordados. (3) Devem verificar-se 3 condições: a sociedade deve apresentar uma das formas jurídicas previstas no anexo da Directiva; a sociedade deve ter, quer face à lei interna quer face às convenções destinadas a eliminar a dupla tributação, o domicílio fiscal num Estado membro e a sociedade deve estar sujeita e não isenta dos impostos enumerados no artigo 3º alínea c) da Directiva. (4) Segundo o art.2º nº3 do CIRC, consideram-se residentes as pessoas colectivas e outras entidades que tenham sede ou direcção efectiva em território português. (5) Deste dispositivo pode entender-se que o valor que o património transferido pode assumir o seu valor fiscal, que é entendido, na Directiva 2005/19/CE, como o valor que teria sido fixado para o cálculo de ganho ou de uma perda a considerar para efeitos de determinação da matéria colectável de um imposto sobre o rendimento, sobre os lucros ou sobre as maisvalias da sociedade contribuidora, se estes elementos do activo e do passivo tivessem sido vendidos no momento da fusão, da cisão ou da cisão-parcial, mas independentemente destas operações. (6) Nos termos do art.32º nº2 do CIRC, as provisões que foram aceites como custo fiscal que não devam subsistir por não se terem verificado os eventos a que se reportam, consideram-se proveitos do respectivo exercício. (7) A transmissão dos prejuízos fiscais coloca-se apenas nos casos de cisão-dissolução e de cisão total-fusão. (8) Para evitar a evasão fiscal foram estabelecidos, no Despacho nº532/2002 de 14 de Março do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, limites à dedução anual dos prejuízos ao lucro tributável das sociedades beneficiárias. (9) Entende-se sociedade residente em país terceiro uma sociedade não residente num Estado-membro da União Europeia. (10) Estabelecimento estável nos termos do art. 5º do CIRC, (11) Se existir uma convenção destinada a eliminar a dupla tributação com o país em que se situa o estabelecimento estável, a dedução à colecta é feita nos termos do art.85º nº2 do CIRC, se não existir convenção, a dedução traduz-se na aceitação como custo do imposto que teria sido efectivamente liquidado e pago no Estado do estabelecimento estável na falta da Directiva 90/434/CEE. (12) Entendemos que estamos perante uma troca de participações sociais quando há dissolução da sociedade cindida ou quando a cisão parcial é feita com redução do capital social da sociedade cindida. (13) Entendemos que não estamos perante uma troca de participações sociais quando há uma cisão parcial com redução das reservas da sociedade cindida. (14) Este conceito está previsto no art.8º nº5 da Directiva 2005/19/CE (15) Despacho nº1588/2004 do Subdirector-Geral do IR. Revisores & Empresas > Abril /Junho 2006 57