Prezados Senhores/Senhoras



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Transcrição:

Prezados Senhores/Senhoras O SIESP - Sindicato da Indústria do Estado de São Paulo, com apoio da ABCE Associação Brasileira de Concessionárias de Energia Elétrica, realizou em 14 de agosto o Workshop: Responsabilidade por Danos Elétricos e a Defesa do Consumidor. O evento contou com a participação da ANEEL, da CSPE Comissão de Serviços Públicos de Energia do Estado de São Paulo, do Procon, do Protest, consultores da área, advogados e representantes das empresas concessionárias. O objetivo foi trazer os diversos aspectos da questão, para que o entendimento dos agentes envolvidos pudesse caminhar para uma visão mais embasada e convergente. As contribuições que o SIESP e a ABCE trazem aqui para esta audiência pública refletem as discussões feitas no workshop e se dividem em duas partes: a primeira é a análise feita por José Fernando Simão, mestre em direito civil pela USP e professor titular de direito civil da FAAP Fundação Armando Álvares Penteado, que proferiu elucidativa palestra no referido workshop e que tem estudado profundamente a questão do Código de Defesa do Consumidor, tendo escrito o livro: Vícios do Produto no Código de Defesa do Consumidor Editora Atlas, 2003. A segunda refere-se aos comentários e sugestões relativas aos aspectos tarifários do tema da Audiência Pública. Agradecemos a oportunidade de contribuir para esta importante audiência e colocamo-nos à disposição para esclarecimentos e/ou detalhamentos que a Agência considerar conveniente. Atenciosamente Silvia M Calou Diretora Executiva

Parte I Análise Técnico/Jurídica Análise da minuta de Resolução da Agência Nacional de Energia Elétrica ANEEL referente ao ressarcimento de danos elétricos em equipamentos instalados em unidades consumidoras, causados por perturbação ocorrida no sistema elétrico solicitada pelo Sindicato da Indústria da Energia no Estado de São Paulo SIESP em parceria com a ABCE Associação Brasileira das Concessionárias de Energia Elétrica. Objetivo do presente trabalho O objetivo do presente trabalho, de acordo com a solicitação recebida do Sindicato da Indústria da Energia no Estado de São Paulo SIESP/ ABCE Associação Brasileira das Concessionárias de Energia Elétrica, é a análise da minuta de Resolução da ANEEL, a ser submetida à Audiência Pública que se realizará em Brasília no dia 4 de novembro de 2003, mormente no tocante aos termos jurídicos empregados e o seu alcance prático, bem como contribuir com possíveis sugestões sempre no sentido de esclarecer e torná-la de fácil aplicação, evitando-se, assim, possíveis dúvidas quando de sua vigência no campo das relações existentes entre as concessionárias e seus clientes. Assim, optamos por dividir o trabalho em três partes: uma introdução sobre o tema da responsabilidade civil, a análise dos artigos mais relevantes da minuta de Resolução e imediatamente após a análise a elaboração de algumas sugestões, como forma de contribuição da SIESP/ABCE no aprimoramento da minuta em debate. 1. Conceito de Responsabilidade Civil I - Introdução O termo responsabilidade tem sua origem no verbo latino respondere e significa ter a pessoa tornando-se garantidor de algo. As definições de responsabilidade, em sua maioria, vêm atreladas à idéia de culpa criando-se forte liame entre ambos os conceitos o que pode induzir ao falso raciocínio de que sem culpa inexiste responsabilidade. Uma das definições jurídicas de responsabilidade civil clássica é a seguinte: é a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam.

Em resumo, trata-se da obrigação imposta pela lei às pessoas no sentido de responder pelos seus atos, isto é, em certas condições, as conseqüências prejudiciais destes. Tomando-se como ponto de partida a definição supra, depreende-se que a primeira análise a ser feita é se o agente causador do dano tem ou não a obrigação de reparar o prejuízo causado, daí porque a expressão que pode incumbir. Em linhas gerais, para que se conclua pela existência de obrigação de reparação mister se faz a presença cumulativa dos seguintes requisitos ou pressupostos: a ação ou omissão do agente, culpa do agente, dano experimentado pela vítima e relação de causalidade (nexo causal). Ainda, deve-se verificar a ausência das causas excludentes de responsabilidade: caso fortuito, a força maior e a culpa exclusiva da vítima. Assim, pode-se definir responsabilidade civil como a obrigação de indenizar um prejuízo por parte daquele que direta ou indiretamente o causou desde que exista um liame de causalidade entre a ação ou omissão do agente e o prejuízo experimentado pela vítima. Exemplo clássico de estudo da responsabilidade civil ocorre quando há batida de veículos. Para que surja o dever de indenizar será necessária a análise da situação prática e a existência de culpa do motorista que bateu, existência de um prejuízo real e que tal prejuízo tenha como causa o acidente de automóvel. Enquanto a responsabilidade penal prevê a punição daquele que praticou conduta contrária às normas de ordem pública devidamente tipificadas como crime, a responsabilidade civil prevê a absoluta necessidade de indenização do prejuízo sofrido pela vítima, devendo a parte voltar ao stato quo ante. O objetivo do estudo da responsabilidade civil é a forma de apagar para a vítima o resultado do evento danoso, recolocando-a na situação em que se encontrava antes daquele fato. Entretanto, frisa-se que se não se trata de um enriquecimento da vítima, mas de simples reposição dos prejuízos. Se a vítima fosse indenizada sem a prova de algum dos pressupostos supra (ex: vítima não sofreu o dano em razão da rede elétrica, mas sim da telefonia, ou vítima ligou a televisão em voltagem 220 e o aparelho queimou), estaríamos diante de evidente enriquecimento sem causa, instituto repudiado pelo direito e fonte de injustiças. 2. Pressupostos da Responsabilidade Civil (i) Ato ilícito (ação ou omissão do agente) ato ilícito é aquele que viola direitos e causa dano a outrem, ainda que exclusivamente moral. É o ato praticado em desacordo com o ordenamento jurídico que viola direito individual e subjetivo e causa dano, gerando a possibilidade de reparação no âmbito civil.

Se nenhum ato ou omissão praticou o agente, o dano eventualmente experimentado pela vítima não lhe pode ser imputável (ex: Se João não bateu no carro de José, qualquer dano ao carro teve outra causa e não há dever de José indenizar João) e não há dever de indenizar. A responsabilidade do agente pode defluir de ato próprio, de ato de terceiro que esteja sob a responsabilidade do agente (ex: responsabilidade do pai pelos atos de seus filhos, do empregador pelos atos de seus empregados) e ainda de danos causados por coisas que estejam sob sua guarda (ex: responsabilidade do dono do cachorro que ataca uma criança). Exceção: Em algumas hipóteses a lei determina o dever de indenizar ainda que o agente tenha praticado atos lícitos. São os praticados em legítima defesa (ex: estou sendo assaltado e para me defender acabo atingindo um terceiro que passava na rua) e em estado de necessidade (ex: para não atropelar uma criança que se soltou das mãos de sua mãe, bato em um carro que está estacionado. Cometo um mal menor - dano ao carro para evitar um mal maior morte de um ser humano). (ii) culpa do agente O conceito de culpa pode ser resumido da seguinte maneira: age com culpa aquele que não observa os deveres legais de cuidado de diligência. Age com culpa o motorista que deve trafegar com velocidade máxima de 120 km/h e trafega a 180 km/h. Age com culpa o médico que deixa de verificar, após a cirurgia, se esqueceu algo na barriga do paciente e lá se encontra uma tesoura. Age com culpa o advogado que perde um prazo para a interposição de recurso. A culpa pode ser classificada da seguinte maneira: culpa lato sensu inclui a idéia de culpa stricto sensu e dolo (é a intenção de causar o dano ex: estou com raiva de meu vizinho e de propósito bato no carro dele que está estacionado) e; culpa stricto sensu que é a violação de um dever que o agente podia conhecer e observar, de acordo com os padrões médios de comportamento, e o dano resultante desta não observação do dever de cuidado não era por ele querido (ex: não quero bater o carro, mas por distração bato no carro do vizinho); A culpa que, na teoria clássica, era requisito essencial para que surgisse o dever de indenizar, vem sendo paulatinamente desconsiderada pelo direito, sendo que em casos cada vez mais freqüentes, v.g. responsabilidade objetiva, por força de lei (CDC, art. 12), torna-se irrelevante a sua existência daí porque não pode fazer parte da definição.

Pode-se dizer, inclusive, que existe uma verdadeira tendência do legislador em desprestigiar o elemento da culpa mormente no caso da proteção dos interesses metaindividuais e dos hipossuficientes. Exemplo claro disto é a relação de consumo. Entretanto, não se pode dizer que a culpa perdeu o status de pressuposto da responsabilidade civil. A culpa pode ser dividida de acordo com seus graus: culpa grave - resulta de dolo ou de negligência crassa (ex: a mãe que deixa o medicamento sabor morango sobre a mesa perto da jarra de suco e a toma como remédio); culpa leve - conduta se desenvolve sem a atenção normalmente devida (ex: mãe apenas põe o remédio sobre a geladeira e a criança consegue tomar); e culpa levíssima - o evento danoso somente teria sido evitado mediante cautelas extraordinárias (ex: mãe coloca remédio em um armário e não tranca o mesmo. Criança abre o armário e toma o remédio). A culpa pode ser dividida de acordo com suas modalidades: negligência é a modalidade de culpa por omissão (ex: motorista que não indica por meio de seta que irá fazer uma conversão); a imprudência consiste na culpa por ação, o agir sem as cautelas necessárias (ex: dirigir com velocidade superior à permitida); e a imperícia é a inaptidão técnica para a prática de determinado ato, verifica-se no desenvolvimento de uma profissão ou ofício (ex: advogado que perde o prazo para interposição de um recurso). A culpa pode ser exclusiva da vítima, de um terceiro, ou concorrente. Sendo a culpa exclusiva da vítima ou de um terceiro, desaparece o dever de indenizar em razão da quebra do nexo causal conforme se analisará abaixo. Na hipótese de culpa concorrente o que se verifica é que tanto o causador do dano (agente), quanto a pessoa que sofreu o prejuízo (vítima) tiveram sua parcela de culpa no evento danoso. Nessa hipótese, não seria justo que o agente arcasse sozinho com a indenização e exatamente por isso determina o artigo 945 do Código Civil de 2002, que esta deverá ser proporcionalmente reduzida. O evento danoso só ocorreu em razão da atitude culposa de ambos. Exemplifica-se. Se o condutor dirige seu carro a 150 km/h quando a velocidade máxima permitida é de 100 km/h, mas por outro lado o pedestre não se utiliza da passarela e cruza a pista, quando é atropelado, está-se diante de culpa concorrente. Se o prejuízo do pedestre foi de R$ 1.000,00, o juiz deverá reduzir a indenização de acordo com a proporção de culpa de cada um analisada no caso concreto.

(iii) nexo de causalidade - para que surja a obrigação de indenizar, é imprescindível a prova do nexo de causalidade direto e imediato entre a ação ou omissão do agente e o dano experimentado pela vítima. É a relação causa-efeito, ou seja, o dano (efeito) deve ter por causa a ação ou omissão do agente. Se teve outra causa, não há que se falar em dever de indenizar (ex: cai uma árvore e amassa a parte da frente de meu carro. Se meu vizinho bate na parte traseira do veículo no dia seguinte, o dever de indenizar subsiste apenas no tocante aos danos decorrentes da batida. Aqueles danos decorrentes da queda da árvore não tiveram como causa a batida e, portanto, o vizinho não será responsável pela indenização). Um outro exemplo para ilustrar a questão, na área de energia elétrica, seria o seguinte. A concessionária fornece energia elétrica a determinado consumidor fora do nível adeqüado durante o período noturno, período este no qual os equipamentos elétricos estão desligados. Ora, se durante a noite os aparelhos elétricos estão desligados, qualquer dano que surgir no período diurno, em que a tensão está no nível adequado, não poderá ter como causa a sobretensão noturna. Falta relação de causalidade entre a queima de equipamentos ocorrida durante o dia e a sobretensão noturna. As excludentes de responsabilidade civil atuam diretamente sobre o nexo causal fazendo-o desaparecer. São elas: culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, caso fortuito ou força maior. A culpa será exclusiva da vítima quando o agente que causa diretamente o dano é apenas instrumento do acidente, mas não há nexo causal entre seu ato e o prejuízo experimentado (ex: um pedestre bêbado se atira na frente do veículo; o consumidor coloca seu gato para secar no forno de microondas). Nessa hipótese, injusto seria onerar o agente com a indenização se a vítima cria a situação conduz ao prejuízo. A culpa será exclusiva de um terceiro quando o dano decorre de um ato daquele que não é partícipe da relação jurídica em análise, não é vítima nem responsável pelo dano. Será um terceiro, nos termos do artigo 14, parágrafo terceiro, do CDC, aquela pessoa que não é consumidor (destinatário final) nem fornecedor do serviço. Assim, se um poste é derrubado por culpa exclusiva de um terceiro que trafegava embriagado, e com a queda há danos aos consumidores de energia elétrica, caberá ao motorista o dever de indenizar, tendo em vista a culpa exclusiva do terceiro no evento danoso. Deve-se frisar à exaustão que a o fato de a concessionária fornecer energia elétrica não significa que esta tenha necessariamente culpa no evento danoso. A concessionária

pratica um ato lícito (fornecimento de energia elétrica) e não pode ser penalizada por isto. Exatamente em razão da culpa exclusiva da vítima ou do terceiro rompe-se o nexo causal e desaparece o dever de indenizar o consumidor. A concessionária não pode ser condenada a indenizar nestas hipóteses, soba alegação de que por fornecer energia, age automaticamente com culpa. Além de injusta, tal visão denota ausência de lógica jurídica. se realmente fosse acolhida a tese esboçada por alguns, as excludentes previstas no Código de Defesa do Consumidor NUNCA se verificariam! Nesse caso, exatamente por analogia à culpa exclusiva da vítima, o nexo causal desaparece e não poderia existir o dever de indenizar. Caso fortuito ou de força maior são aqueles eventos necessários cujos efeitos não era possível evitar ou impedir, nos limites da razoabilidade. Contém a idéia de irresistibilidade, mas não de imprevisibilidade. As expressões são sinônimas, pois a lei não as diferencia quanto aos seus efeitos: rompem o nexo causal e excluem o dever de indenizar (art. 393 do Código Civil de 2002). São exemplos clássicos: o raio, o tufão, o furacão, as enchentes, as greves, os motins e rebeliões. A idéia de irresistibilidade dependerá de outro conceito jurídico: a razoabilidade. Assim, um assalto na rua poderia ser evitado, pelo menos em tese, se o Estado dispusesse de um efetivo suficiente de policiais para colocar um policial em cada esquina da cidade. Poder-se-ia então concluir que o assalto é algo resistível? A resposta é não, pois não seria razoável imaginar-se tal solução diante dos exorbitantes gastos que representaria e sua pouca operacionalidade. (iv) dano - não há que se falar em responsabilidade sem a comprovação da ocorrência de dano efetivo experimentado pela vítima. Danos hipotéticos não são indenizáveis. Etimologicamente, dano vem de demere, que significa tirar, apoucar, diminuir. Indenizar, portanto, é tornar indene, ou seja, repor aquilo que foi tirado, diminuído. O ônus da prova do prejuízo experimentado é da própria vítima. Se esta não prova que houve o dano, desaparece este importante pressuposto e com ele o dever de indenizar.

Exemplifica-se com casos que ocorrem com freqüência na prática. Uma mulher faz uma cirurgia plástica estética para diminuir o tamanho de seus seios. A cirurgia é mal feita e a pessoa fica um defeito, mas, alguns dias depois, recorre a outro profissional para nova operação. Quando ocorre a nova operação, a prova do defeito da primeira fica prejudicada, razão pela qual não é mais possível se estabelecer a extensão do prejuízo nem mesmo se este realmente ocorreu. A idéia de indenização abrange as perdas e danos (danos emergentes e lucros cessantes) e, se envolver inabilitação total ou parcial para o trabalho, ou morte, poderá abranger ainda o pagamento de pensão alimentícia, que poderá ser vitalícia, até que perdure a inabilitação para o trabalho e, em caso de morte, terá como base a expectativa média de sobrevida do brasileiro (65 anos de idade). São danos emergentes os prejuízos já sofridos e lucros cessantes aquilo que razoavelmente se deixou de ganhar. Assim, se uma pessoa é atropelada e não pode trabalhar por um mês, serão danos emergentes os valores gastos com médico, remédios, gesso, hospital e lucros cessantes o salário que deixará de receber por ficar em casa. A indenização mede-se pela extensão do dano (Código Civil de 2002, art. 944, caput). Apurado o tamanho real do prejuízo, fixa-se a indenização. Se a batida destruiu o pára-choque que vale R$ 200,00, a indenização será de exatamente R$ 200,00 e nem um centavo a mais. Isso porque indenização não significa um ganho para a vítima, mas só reposição do que foi perdido. 1. Das definições II A minuta da Resolução (i) Caso de força maior. A minuta trata da definição de força maior como causa de exclusão da responsabilidade civil e corretamente afasta a do conceito a idéia de previsibilidade. SUGESTÃO 1: Artigo, 2º, inciso I, sugere-se que seja acrescentada a expressão: Caso fortuito ou de força maior. RAZÕES DA SUGESTÃO: Tendo em vista que os termos força maior e caso fortuito são usados pela lei como sinônimos e toda a doutrina é clara em afirmar que o efeito de ambos é o mesmo, ou seja, a quebra do nexo causal, e não há motivo de ordem jurídica para sua distinção, razão pela qual não prosperam na prática distinções entre os institutos. Se assim não for, na utilização prática da Resolução da ANEEL, podem os consumidores erroneamente imaginar que apenas não haveria responsabilidade de indenização se o dano

decorresse de força maior, mas que a concessionária deveria indenizar na hipótese de caso fortuito. Entretanto, tal premissa não ocorre por força da equivalência dos conceitos. A sugestão que se formula seguiria doutrina e jurisprudência majoritárias que repudiam as diferenças, dificilmente comprováveis no dia-a-dia, e também, que não contam com algum elemento claro de diferenciação. OBSERVAÇÕES: A força maior se caracteriza pela irresisitibilidade, ou seja, aquele fato, mesmo previsível, cujos efeitos não podem ser evitados ou impedidos. Neste ponto, fica claro que se imaginarmos um RAIO (evento de índole ininteligente), ainda que seja previsível sua ocorrência durante uma tempestade, não poderia ser evitado, já que ainda que haja pararaios nas proximidades da rede elétrico, nada garante que o raio não entre na rede e venha a causar danos aos aparelhos. Faltaria à engenharia técnicas a garantir que este evento seja evitável, resistível, dentro dos limites da razoabilidade. Não seria razoável imaginar que se transformando a rede em subterrânea, todos os problemas com raios estariam resolvidos, exatamente pelo altíssimo custo da operação e o equilíbrio econômico-financeiro do Contrato de Concessão. Esta solução, para fins de resistibilidade do evento raio, abalroamento de veículos, queda de galhos de árvores, dentre outras, fica fora do razoável e, portanto, tais eventos continuam sendo considerados como exemplo de caso fortuito ou de força maior. Argumentar-sei-ia sobre a possibilidade de utilização de dispositivos de proteção a serem alocados na rede evitando os efeitos do raio e das chamadas sobretensões na queima de aparelhos elétricos. Mais uma vez a questão passa pela análise da razoabilidade. O custo envolvido na alocação de tais aparelhos cuja eficácia em termos de evitabilidade de danos também seria discutível, só poderia ser considerada razoável se provado que tal dispositivo teria custo inferior aos danos causados aos aparelhos elétricos dos consumidores. Se o dispositivo de proteção significar custos maiores que os danos causados aos aparelhos dos consumidores, mais uma vez foge-se de idéia de razoabilidade exigir sua instalação. (ii) A ausência da definição dos conceitos de culpa exclusiva do consumidor, culpa exclusiva do terceiro e culpa concorrente. SUGESTÃO 2: Artigo 2º, acrescentar-se-iam três incisos ao artigo para a definição de culpa exclusiva do consumidor, culpa exclusiva do terceiro e culpa concorrente da concessionária nos seguintes termos: XIV Culpa exclusiva do consumidor se verifica quando este age sem a observância de um dever de cuidado e acaba, por sua conduta imprudente, negligente ou imperita, causando danos elétricos a seus equipamentos;

XV Culpa exclusiva do terceiro se verifica quando em razão de ato ou omissão de alguém, que não o consumidor ou a concessionária, causa uma perturbação no sistema elétrico que ocasiona danos elétricos aos equipamentos do consumidor; XVI Culpa concorrente ocorre quando a concessionária e o consumidor ou terceiros agem paralelamente de maneira negligente, imprudente ou imperita e em razão da culpa destes ocorre o evento danoso. RAZÕES DA SUGESTÃO: Afasta corretamente o dispositivo a idéia de culpa concorrente como causa de exoneração do dever de indenizar. Assim, necessária se faz a definição de cada um dos institutos para que se evitem discussões do alcance destes termos. Caso a minuta não esclareça o alcance dos dispositivos, poder-se-ia imaginar que pelo simples fato de a concessionária fornecer energia elétrica, haveria sempre culpa concorrente entre ela e o consumidor ou ela e o terceiros, o que denota verdadeira confusão conceitual deletéria aos interesses das partes à aplicação prática da Resolução. Dir-se-ia inclusive, que a ausência de tal clareza de conceitos já se revela fonte de desgaste entre as concessionárias e o órgão regulador que tenderia a se agravar em não havendo a clara e objetiva conceituação da culpa e suas diferentes acepções. OBSERVAÇÕES: É importante frisar que, ainda que não haja acolhimento da sugestão formulada, a diferença entre os institutos da culpa concorrente que se opõe à culpa exclusiva do consumidor ou do terceiro faz-se imprescindível, nos exatos termos acima formulados. Nota-se que o artigo 14, parágrafo 2º, inciso II do CDC se faz claro ao elencar como excludentes de responsabilidade civil, afastando o dever de indenizar da concessionária (como prestadora de serviços), a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Exemplifica-se. São exemplos de culpa exclusiva do consumidor os danos decorrentes dos atos do consumidor que, de maneira imprudente, liga seu aparelho de 110 volts na tomada de 220; se o consumidor residencial instala em sua residência equipamentos para desenvolver comércio, tais como freezers, geladeiras ou fogões industriais que acabam sofrendo danos em decorrência de perturbações de energia elétrica, se o consumidor, no ato de instalação do equipamento, adota procedimentos errados e contrários à orientação do fabricante, revelando negligência, dentre outros. O simples fato de a concessionária fornecer energia não significa que tenha agido com culpa (negligência ou imprudência). Nos exemplos supra, fica claro que foi o consumidor que agiu de maneira negligente ou imprudente. São exemplos de culpa exclusiva do terceiro os danos que decorrem de abalroamento aos postes em razão da conduta imprudente ou negligente dos motoristas que

dirigem embriagados, ou acima dos limites permitidos de velocidade, ou de maneira desastrosa acabam fazendo manobras que derrubam ou fazem os postes balançarem e os fios se chocarem. Em idêntico sentido aqueles que trafegam com veículos muito altos e se chocam com a rede elétrica aérea (nos exatos moldes do que aconteceu na cidade de São Paulo com o caminhão que ficou preso sob a Ponte Euzébio Matoso), ou nos casos de furto de fios e cabos que geram danos aos consumidores, ou mesmo se o raio entra na rede pela rede de telefonia (placa de fax modem). O simples fato de a concessionária fornecer energia não significa que tenha agido com culpa (negligência ou imprudência). Nos exemplos supra, fica claro que foi um terceiro que agiu de maneira negligente ou imprudente. Entretanto, se houver culpa concorrente (concessionária e consumidor ou concessionária e terceiro) a concessionária deverá indenizar o consumidor pelos prejuízos sofridos aos aparelhos e decorrência da perturbação do sistema elétrico. Exemplifica-se: Se o poste é abalroado, mas já estava bambo por falta de manutenção da concessionária; se o carro, de leve, toca o poste, mas os fios não estavam esticados como deveriam, e isto acaba gerando danos; se por ausência de manutenção os fios e postes estão velhos, então um simples toque de um pedestre faz com que ocorram danos. O simples fato de a concessionária fornecer energia não significa que tenha agido com culpa (negligência ou imprudência). Nos exemplos supra, fica claro que além de fornecer energia, a concessionária agiu de maneira negligente ou imprudente, assim como o consumidor ou o terceiro. Daí falar-se em culpa concorrente, pois todos agiram de maneira negligente ou imprudente. (iii) Nexo causal SUGESTÃO 3: Artigo 2º, inciso XI, sugere-se alteração da redação para a seguinte: Nexo de causalidade: é a relação causa-efeito entre o ato praticado pela concessionária e o dano sofrido pelo consumidor. RAZÕES DA SUGESTÃO: A forma de conceituar nexo de causalidade utilizada na minuta pode dar margem a interpretações equivocadas do que seja o nexo causal. A idéia não é de simples vínculo, mas de causa e efeito. A palavra vínculo indicaria apenas que o evento teve uma relação, um vínculo com o dano. Para que surja o dever de indenizar não basta a existência de um vínculo. Deve o ato do agente ser causa do prejuízo, não simplesmente a ele vinculado, ligado. A definição adotada é contraditória com a própria resolução que em seu artigo 10º traz as exceções ao dever de indenizar. Assim vejamos: se o consumidor por culpa sua utiliza incorretamente um aparelho que é danificado, desaparece a relação causa-efeito entre o ato da concessionária e o dano ao consumidor, mas continua a existir um vínculo contratual: o fornecimento de energia elétrica.

OBSERVAÇÕES: A sugestão que se dá é no sentido de esclarecer o alcance da expressão nexo de causalidade uma das mais importantes na definição de responsabilidade do agente, já que rompido o nexo, desaparece o dever de indenizar. De qualquer forma, ainda que a sugestão não seja acolhida, resta claro que a definição de nexo causal supera os termos da Minuta, eis que o simples vínculo do ato da concessionária não é suficiente para que se produza o dever de indenizar. Se o dano não tiver por causa direta e imediata a atitude da concessionária não haverá o dever de indenizar. A palavra vínculo não indica o real alcance do nexo causal: liame de causalidade, relação causa-efeito. 2. Dos procedimentos SUGESTÃO 4: Alterar o parágrafo único do artigo 5º para a seguinte redação: Na comprovação do nexo de causalidade deverão ser considerados os eventos previstos na Resolução da ANEEL nº 024 de 27 de janeiro de 2000 denominados interrupção, interrupção de longa duração, considerando-se seu fato gerador, data, hora, centésimo de minutos do início e restabelecimento da interrupção e número de unidades consumidoras atingidas pela interrupção. RAZÕES DA SUGESTÃO: As razões pela quais se sugerem a modificação com a retirada dos termos ali contidos são de ordem acadêmica (técnica de engenharia elétrica) e jurídica. A razão de ordem acadêmica, técnica, é a seguinte: nem os especialistas no assunto de energia elétrica conseguem obter um consenso no tocante às definições de tais eventos e suas conseqüências, motivo pelo qual, diante da ausência de consenso, sua prova se faz mais complexa sendo necessária uma ampla dilação probatória, que não é própria da esfera administrativa, mas sim do procedimento judicial. As definições contidas no parágrafo único do art. 5 º da minuta da resolução não permitem a uniformização de um procedimento de análise técnica, por não haver literatura técnica ou mesmo legislação que possibilitem a averiguação para comprovação da perturbação, seja através de medição, pelo alto custo de equipamentos capazes de fazer tal medição, ou através de simulações, pela falta de modelagem dos sistemas de distribuição de média e baixa tensão, respectivamente acima e abaixo de 1 kv, conforme Resolução ANEEL 505 ou 2,3 kv conforme Resolução ANEEL 456. E não é só. A NBR5410 e a NBR5419 impõem a necessidade de o consumidor efetuar a proteção aos seus equipamentos e aparelhos eletro-eletrônicos, contra surtos de tensão originados pela rede elétrica ou rede de comunicação das concessionárias, bem como descargas atmosféricas diretas e indiretas, haja visto que os padrões de construções definidos nas NBR5433 e NBR5434 permitirão uma proteção parcial.

Também, com relação ao evento intermitente, na forma definida na minuta da resolução, já está contemplado no art. 17 da Resolução ANEEL 456, faltando disciplinar as formas de constatação para comprovação da perturbação. Portanto, não caberia à minuta atual redefini-lo. Na esfera judicial, diante dos princípios da ampla defesa e do contraditório, constitucionalmente garantidos, poder-se-á debater o alcance de tais eventos e suas conseqüências quanto aos danos eventualmente causados aos aparelhos ligados à rede. O outro motivo é de ordem jurídica. A própria ANEEL, por meio da Resolução 024, não define tais tipos de eventos, exatamente pelos motivos acima expostos. Sem a definição de tais eventos na Resolução 024, a saída para a solução de danos daí decorrentes só pode ser a esfera judicial, salvo os casos em que a própria concessionária tiver mecanismos de averiguação de tais eventos. OBSERVAÇÕES: A redação do artigo em debate indica que caberá à concessionária adotar procedimentos para a comprovação do nexo de causalidade, mas isto não significa que a concessionária deverá ter mecanismos para a prova de todo e qualquer tipo de evento, por inúmeras razões de lógica e jurídicas. Por uma questão de lógica, nem todos os eventos podem ser comprováveis com a precisão necessária a comprovar o nexo causal. Mesmo que a concessionária disponha, por exemplo, de um mapa que comprove a existência de raios em uma região, isto não significa dizer que haverá uma precisão no tocante ao local exato em que o raio caiu. Há uma noção de proximidade. Isto também se aplica no tocante aos eventos transitórios e temporários, cuja prova técnica se faz muito complexa, o que só seria razoável que se realizasse na esfera judicial. A razão jurídica também é bastante forte. Em regra, cabe à vítima do dano, no caso o consumidor, a prova do nexo causal, sendo possível sua inversão apenas por determinação judicial. Não se pode partir da premissa que o ônus está invertido contra a concessionária em todo e qualquer tipo de dano elétrico. A determinação seria contrária ao próprio CDC que traz a possibilidade de inversão, como exceção. Mas, ainda que não se acolhesse a sugestão de modificação do parágrafo único do artigo 5º, não se poderia impor às concessionárias o ônus de provar todo e qualquer evento que ocorra em sua rede. 3. Dos limites da responsabilidade ANÁLISE DO ARTIGO 10 E SEU ALCANCE: O artigo em questão trata da fixação da responsabilidade da concessionária no tocante aos eventos danosos e os danos causados, prevendo expressamente as excludentes de responsabilidade civil.

Nota-se, inicialmente, que seguindo os ditames do CDC, a resolução determina que a responsabilidade das concessionárias é OBJETIVA, ou seja, independe de culpa, desde que haja nexo causal. Em resumo: o artigo confirma a teoria da responsabilidade civil objetiva por meio da qual havendo um ato ou omissão do agente, um dano causado por tal ato (nexo causal), há o dever de indenizar ainda que o agente (concessionária) não tenha agido de maneira culposa ou dolosa. Verifica-se que há necessidade da presença dos outros três elementos, razão pela qual a própria minuta indica que, faltando nexo causal (incisos I e III) ou o dano (inciso II) desaparece o dever de indenizar. O inciso I segue em sua literalidade o artigo 14, parágrafo terceiro, do CDC que determina ser excludente de responsabilidade do fornecedor a culpa exclusiva do consumidor, do terceiro ou a prova de que o defeito não existe. As três hipóteses não poderiam faltar na minuta, sob pena de contrariedade de norma hierarquicamente inferior (resolução) à lei superior (CDC na qualidade de lei ordinária). Então, sua presença é essencial para a validade da resolução inserida no ordenamento brasileiro que tem como topo a Constituição Federal. Cabe a intelecção e compreensão de cada uma delas e os institutos já foram objeto de análise no item 1, supra. De qualquer forma, diante da importância do tema, frisa-se o seguinte: o fato de a concessionária fornecer energia elétrica, não significará que está terá necessariamente parcela de culpa no evento danoso e que, portanto, em decorrência deste raciocínio tortuoso, NUNCA PODERIAM SER APLICADAS AS EXCLUDENTES DA CULPA EXCLUSIVA DO CONSUMIDOR OU DO TERCEIRO. Tal raciocínio confunde dois conceitos distintos da responsabilidade civil. Se de um lado sempre a concessionária, por fornecer a energia, terá participação no evento (requisito da AÇÃO), nem sempre concorrerá com o elemento CULPA, pois este exige que a concessionária aja de maneira imprudente, negligente, ou imperita. Assim, se o carro bate no poste em razão de estar embriagado o motorista, e isto causa danos aos equipamentos elétricos, não há que se falar em culpa concorrente, salvo se provado que o poste não estava bem fixado ao solo, ou que não havia manutenção nos fios, ou mesmo que o material do poste estava podre e não fora trocado pela concessionária. Nesta hipótese, a culpa deixa de ser exclusiva do terceiro e passa a ser concorrente, eis que se verifica a negligência ou imprudência da concessionária, ao lado da culpa do motorista que dirigia embriagado.

A mesma situação ocorrerá se o consumidor, por má utilização do aparelho, por não seguir a instrução do fabricante, causar dano ao eletrodoméstico. Tal atitude caracteriza culpa exclusiva e afasta a responsabilidade civil da concessionária. Entretanto, se o equipamento for danificado não só por culpa do consumidor que o utilizou mal, mas também por uma falha na prestação de serviços da concessionária, surge o dever de indenizar em razão da culpa concorrente. Em resumo, alegando a concessionária culpa exclusiva do consumidor ou de um terceiro e fazendo a prova desta culpa, caso a vítima do dano pretenda provar a culpa concorrente da concessionária, será dela o ônus da prova. Enquanto o ônus da prova da culpa exclusiva é da concessionária (por se tratar de fato extintivo do direito de indenização do consumidor), será do consumidor o ônus de provar a culpa concorrente da concessionária (fato constitutivo de seu direito de indenização). O inciso II afirma, indiretamente, ser do consumidor o ônus de provar o dano sofrido, pois se este reparar o equipamento e desaparecer com a prova do dano, perderá o direito à indenização. Deve o consumidor, antes de consertar o aparelho, sujeitá-lo à vistoria prévia da concessionária, como forma de demonstrar a existência do dano e sua extensão. Em momento algum permite a minuta que o consumidor seja indenizado sem que faça a prova de seu prejuízo. Nesse sentido, clara é a disposição do artigo 6º que determina ser o facultado ao consumidor a verificação do aparelho danificado, in loco, mas de qualquer forma cabe a ele provar que houve o dano e sua extensão. O inciso III é meramente exemplificativo e traz situações descritas de culpa exclusiva do consumidor. Tratam-se de meros exemplos e não de um rol taxativo. Servem para esclarecer as situações genericamente descritas no inciso I sob o nome de culpa exclusiva do consumidor. III Conclusões Como conclusão, louva-se a iniciativa do órgão regulador em disciplinar a matéria, possibilitando-se, por meio da Audiência Pública, um amplo e completo debate da questão dos danos causados aos equipamentos instalados em unidades consumidoras, com análise das sugestões que visam a contribuir com o aprimoramento jurídico e prático da minuta da resolução em questão. José Fernando Simão Advogado e Professor

Parte II Aspecto econômico-tarifário na questão dos danos elétricos A obrigação da concessionária de ressarcir os consumidores por danos elétricos está clara no Contrato de Concessão para Prestação de Serviço Público de Energia, que prevê: Sem prejuízo do disposto na Lei 8078 de 11 de setembro de 1990 ( Código de Defesa do Consumidor ) na prestação de serviço, objeto desse contrato, a concessionária assegurará aos consumidores, dentre outros, os seguintes direitos: receber ressarcimento de danos, que porventura lhe sejam causados em função do serviço concedido. No contrato de adesão encaminhado aos consumidores, se informa que constitui um dos principais direitos do consumidor ser ressarcido, quando couber, pelo conserto ou reposição de equipamentos elétricos ou eletrodomésticos, danificados em função da prestação do serviço inadequado. A Lei 8078, o Código de Defesa do Consumidor, no artigo 12 prevê que o fornecedor responde, independentemente de culpa, pela reparação de danos causados aos consumidores, e só não será responsabilizado, se provar que o defeito não existe, ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Há necessidade de um tratamento adequado dos diversos aspectos, e a busca de procedimentos claros e justos na relação entre as duas partes envolvidas, do fornecedor e consumidor, não devendo existir oposição de interesses entre empresa distribuidora e seus clientes. Assim, deve ser vista a questão do aspecto econômico envolvido na questão dos danos. O Contrato de Concessão prevê indicadores de qualidade no fornecimento de energia elétrica, e como está lá explícito, um dos indicadores de qualidade é o FEC, ou freqüência equivalente de interrupções por consumidor, um cálculo obtido a partir do número de interrupções ocorridas, num dado período de tempo, ponderado pelo número de consumidores afetados, e a média equivalente por consumidor. O Contrato de Concessão admite explicitamente, portanto, a ocorrência das interrupções, e existe até um indicador com limites máximos do número de interrupções. Portanto, há o reconhecimento de que a atividade de distribuição de energia elétrica incorpora, obrigatoriamente, a ocorrência de interrupções, e danos elétricos ocorrem em decorrência de interrupções. Então, temos as seguintes evidências: (1) O consumidor tem direito à reparação do dano causado em função do serviço, e isso é inquestionável. (2) A distribuidora tem a obrigação de indenizar esses danos, nos casos em que couber; é uma exigência do contrato. (3) As interrupções são ocorrências admitidas, por serem inevitáveis, dentro de certos limites. E as ocorrências associadas a interrupções podem gerar danos em aparelhos elétricos. Portanto, a atividade de distribuição pressupõe a ocorrência desses eventos e de danos: por melhor que seja a qualidade da concessionária, por mais bem intencionada, por mais que invista, sempre vai se deparar com essas interrupções e o risco de haver danos elétricos, cuja responsabilidade cabe à concessionária, é obrigação da concessionária fazer indenização de danos elétricos. Sendo, assim, uma obrigação da concessionária, inevitável,

se não há dúvidas quanto ao direito do consumidor, é necessária a previsão de cobertura dos recursos para a concessionária cumprir uma obrigação contratual decorrentes desses eventos, desses danos decorrentes de interrupções admitidas, dentro de certos limites, como normais. Em qualquer atividade, num mercado livre, num mercado competitivo, todo custo associado ao exercício da atividade é previsto, e agregado. Mas é evidente que há um limite: num mercado concorrencial, competitivo, em que o consumidor tem liberdade de escolher, pesando preço e qualidade, o mercado se encarrega de colocar um limite ao que será aceito como um custos normal da atividade. Assim, se a ocorrência de algum dano é inevitável, se há problemas que não se tem como evitar, é claro que os custos associados devem ser levados em consideração dentro de limites normais. A questão é como tratar isso, numa atividade regulada. As tarifas não contemplam a cobertura de custos referentes à indenização de danos elétricos, embora seja algo absolutamente reconhecido por todos, como parte inerente da atividade, por melhor que seja a qualidade do serviço. Na fixação de tarifas das distribuidoras, não estão contemplados valores para cobertura desses gastos com ressarcimento de danos, nos chamados custos eficientes da empresamodelo, Empresa de Referência criada pelo regulador, que atribui valores pelas atividades e custos ali previstos. Se a Empresa de Referência tivesse que atuar nas áreas de concessão de distribuidoras reais, certamente não teria como evitar os danos elétricos decorrentes dessas interrupções - por melhor, mais cuidadosa, qualificada, e eficiente que fosse mas apesar disso a Empresa de Referencia não contempla custos para ressarcimentos de danos. Tampouco nos ativos elétricos da distribuidora, integrantes da sua Base de Remuneração, foi prevista remuneração ou depreciação de ativos para, se fosse possível, impedir as interrupções e os danos elétricos. Portanto, tem-se o reconhecimento de que a interrupção é algo normal na atividade de distribuição; que o consumidor tem o direito ser ressarcido de um dano; e que, em um mercado livre, competitivo, dentro de certos limites, esses valores para ressarcimento seriam colocados nos custos. Como se trata de um mercado controlado, regulado, por se tratar de um serviço público essencial exercido em caráter monopolista, deve ser adotado algum critério para essa compensação ou para ajuste desse custo. Duas alternativas seriam possíveis:! Uma, é a concessionária fazer investimentos, para eliminar ou reduzir ocorrências. Assim, por exemplo, se ela tivesse uma rede subterrânea, o galho de árvore não atingiria a rede, ou o carro não poderia abalroar o poste; ou ainda a concessionária deveria colocar dispositivos de proteção na rede, ou dispositivos junto à entrada do consumidor para evitar o problema.

! A segunda alternativa é reconhecer os custos decorrentes do ressarcimento de danos, mas com limites, ou seja, com critérios regulatórios. Para que isso? Para evitar a complacência, ou seja, o repasse limitado, se uma concessionária eventualmente tem muitos casos e, já que está tudo coberto, pago na tarifa não olha com atenção e acaba onerando o conjunto de seus consumidores com ressarcimento de danos que seriam indevidos ou evitáveis. Então, é preciso um critério regulatório para evitar complacência, e o repasse ilimitado, até mesmo por causa de manutenção ruim: se não cuidar bem do sistema elétrico e o número de interrupções e pedidos de danos se elevar, não terá repasse automático. Assim, propõe-se que seja adotado um critério regulatório com previsão, nos custos operacionais utilizados no cálculo da tarifa, de valores para ressarcimento desses danos, dentro de limites limites que, no fundo, vão fazer o mesmo papel que faria a competição do mercado livre. No caso de investimentos das concessionárias, as redes subterrâneas de fato poderiam reduzir os problemas - mas, por serem de alto custo tem uma repercussão tarifária fortíssima, e um dos princípios buscados por toda a regulação é a questão da modicidade tarifaria. No caso de dispositivo de proteção, o impacto tarifário seria menor, mas um simples exercício permite demonstrar que seu custo é muito mais elevado do que a fixação de um limite de reconhecimento nos custos operacionais, para ressarcimento dos danos. Por exemplo: se fosse possível instalar um dispositivo de proteção que custasse o equivalente a apenas R$ 10,00 por consumidor, a simples remuneração desse investimento representaria remuneração de R$ 1,71 por ano (R$ 10,00 X 17,06% correspondente à taxa bruta de remuneração), fora a depreciação. No caso do reconhecimentos de custos dentro de limites com um critério regulatório, para se evitar complacência ou má manutenção se poderia admitir um valor-limite equivalente, por exemplo, a R$ 0,50 por consumidor por ano (1/3 do valor necessário para a remuneração de R$ 1,71), ou um valor que se mostrasse adequado para tanto, esse é um valor-limite a ser discutido, mas certamente pela experiência se sabe que teria muito menor custo e impacto para a tarifa. Estabelecer um valor-limite para inclusão no cálculo das tarifas, referente à cobertura de despesas de ressarcimento de danos elétricos parece ser o mecanismo mais eficiente para essa finalidade.