ESTUDO DAS PROPRIEDADES DOS CONCRETOS UTILIZANDO CINZA PESADA COMO PARTE DA AREIA



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Transcrição:

ESTUDO DAS PROPRIEDADES DOS CONCRETOS UTILIZANDO CINZA PESADA COMO PARTE DA AREIA KREUZ, Anderson Luiz (1); CHERIAF, Malik (2); ROCHA, Janaíde Cavalcante (3) (1) Engº. Civil, Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: ander@npc.ufsc.br (2) CHERIAF, Malik Prof. Dr. Ing. Visitante, Universidade Federal de Santa Catarina, Departamento de Engenharia Civil. E-mail: malik@npc.ufsc.br (3) ROCHA, Janaíde Cavalcante Prof a Dra Ing, Universidade Federal de Santa Catarina, Departamento de Engenharia Civil, UFSC. E-mail: janaide@npc.ufsc.br RESUMO Nos dias atuais, o uso da cinza leve da queima do carvão mineral como pozolana em substituição parcial do cimento é bastante comum, principalmente através do uso já consagrado nos cimentos Portland tipo IV e II-Z, produzidos no sul do Brasil. No entanto, a cinza pesada, gerada nos processos termoelétricos, não são reaproveitadas apesar de ser gerada em grande quantidade, apresentando custos para sua manutenção em bacias em bacias de decantação. Algumas propriedades das cinza pesadas usadas no estudo foram investigadas. Apesar de apresentar uma porcentagem considerável de finos, a cinza pesada não apresentou reação pozolânica para ser classificada como pozolana. Confeccionou-se diferentes concretos com substituição de até 50% da areia pela cinza pesada, usando-se dois tipos de cimento em dosagens diferentes. Os concretos foram confeccionados em laboratório, sendo analisados principalmente a trabalhabilidade dos concretos frescos e a evolução da resistência à compressão dos concretos no estado endurecido até a idade de 180 dias. Para comparar o desempenho dos diferentes concretos, fixou-se o valor do abatimento do tronco de cone (Slump test) de todas as misturas em 80±10mm, sendo que para isso foi necessário alterar a quantidade de água das misturas. Mesmo com um consumo maior de água dos concretos contendo cinza pesada, em relação aos de referência, eles apresentaram resistência à compressão similares e até superiores. Também são apresentados os diagramas de dosagem dos concretos produzidos, análise do comportamento dos concretos devido ao efeito das cinzas e o consumo de cimento para os diferentes tipos de concreto para atingir a mesma resistência à compressão. Palavras Chaves: cinza pesada, concretos, valorização e resíduos industriais.

1 INTRODUÇÃO As cinzas oriundas das termelétricas são formadas a partir de componentes não combustíveis de carvão e, também, de partículas não queimadas devido à combustão incompleta do carvão na câmara de combustão, em temperatura variável entre 1200 e 1600ºC. Estas cinzas são classificadas em dois tipos diferentes: as cinzas leves ou volantes (60-80%) e as cinzas pesadas (20-40%). Parte das cinzas volantes (43% em 1998) foram empregadas na fabricação de cimentos compostos no Brasil. Já a cinza pesada não apresenta uso comercial apesar de ser produzida em torno de 245 mil toneladas anuais só no Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, situado em Capivari de Baixo SC (POZZOBON (1999)). CHERIAF et al. (1999) concluíram que a cinza pesada proveniente do complexo Termelétrico Jorge Lacerda, empregada no presente estudo, é muito pobre em CaO (<1%), apresentando certa similaridade com a cinza tipo F (conforme classificação da ASTM). Segundo CHERIAF et al (1999) há na cinza pesada a presença de partículas de formato irregular e significativa quantidade de partículas ocas como cenosferas e plerosferas, o efeito fíller foi evidenciado pelos autores, assim como a atividade pozolânica. Não se pode deixar de associar a cinza pesada aos agregados miúdos leves, já que os dois possuem algumas características semelhantes como menor massa específica e maior absorção de água que os agregados ditos normais. Segundo NEVILLE (1997), devido a alta absorção de água pelos agregados leves, o estabelecimento da relação água/cimento não é simples, já que esta relação não pode ser estabelecida baseada simplesmente na água total, pois segundo o autor, a água absorvida não tem influência na formação de poros capilares que tem efeito na resistência. Devido a esta absorção de água pelo agregado, pode haver maior disponibilidade de água para a hidratação quando a umidade dos poros da pasta de cimento endurecida já foi consumida. Denominando-se esta situação de cura úmida interna. KREUZ et al (2001) ao analisarem o uso da cinza pesada em porcentagens de 10%, 25% e 50% em substituição a areia no concreto, concluíram que a incorporação de cinza pesada em substituição da areia se torna vantajosa, quando são avaliadas as porcentagens de perdas de abatimento ao longo do tempo. De um modo geral, quanto maior o teor de substituição da areia pela cinza pesada, menor é a perda de abatimento. Enquanto que num concreto com 50% de substituição, aos 90 minutos apresentou 80% do seu abatimento inicial, o concreto de referência (0% de substituição) apresentou apenas 40% do seu abatimento inicial. RAVINA (1998) estudou a substituição parcial da areia fina pela cinza volante em concretos, concluindo que o efeito da cinza volante na resistência à compressão pode ser devido a diferentes mecanismos. Nas primeiras idades, a maior contribuição na resistência à compressão vem do efeito fíller, isto é, fíller um material finamente dividido que exerce duas funções: uma de empacotamento e outra reação fisicoquímica, que seria a criação de pontos para a nucleação dos produtos de hidratação ajudando na aceleração do processo de hidratação modificando a estrutura da pasta de cimento endurecida. Nas idades tardias, o efeito positivo no ganho de resistência à compressão é devido à reação pozolânica, já que para os concretos com o uso da cinza volante tiveram aumento da resistência à compressão maior que o de referência, quando estes concretos passaram das idades de 28 aos 90 dias. Já GHAFOORI e BUCHOLC (1996), realizaram um estudo piloto com o uso de cinza pesada como substituição de agregado fino na produção de concreto. Os autores demonstraram que a incorporação de cinza pesada aumenta a demanda de água na mistura para obter a mesma trabalhabilidade. Quando houve a incorporação de redutor de água na mistura, para igualar-se a relação água/cimento sem prejudicar a trabalhabilidade, as características do ponto de vista de engenharia foram similares, e muitos dos casos superiores aos das misturas de referência. Os autores chegaram a conclusão de que o emprego das cinzas pesadas como areia são viáveis em misturas com cimento Portland.

2 MATERIAIS E MÉTODOS Os concretos foram produzidos com teores de substituição da areia pela cinza pesada (AREIA/CZP) de 10%, 25%, e 50%. A substituição da areia pela cinza pesada foi realizada em relação ao volume absoluto devido à diferença das massas específicas entre a areia e da cinza pesada, onde a massa específica da areia foi de 44% maior do que a da cinza pesada. A cinza pesada foi adicionada úmida devido à sua característica de absorver grandes quantidades de água, a fim de evitar perda de abatimento elevada. Foram adotados três diferentes traços m (cimento: agregados) igual a 3,5; 5,0 e 6,5; para cada teor de substituição, com o objetivo de avaliar o comportamento das cinzas pesadas para os traços mais ricos até os mais pobres em cimento. Foram utilizados 2 tipos de cimento, o cimento Portland comum (CPIS-32) e o cimento Portland de alta resistência inicial (ARI). As dosagens foram elaboradas para atingir um abatimento de tronco de cone de 80 ± 10 mm para todos os concretos. Para os ensaios de resistência à compressão, foram moldados corpos de prova cilíndricos de concreto com dimensões de 10cm x 20cm (diâmetro: altura) e ensaiados nas idades de 3, 7, 28, 90 e 180 dias de idade, sendo utilizados de 3 a 4 corpos de prova para cada idade. O ensaio de absorção de água por capilaridade foi realizado aos 90 dias de idade, segundo procedimento da norma NBR 9779 (1987). Foram submetidos a este ensaio os concretos com traço m=5,0; moldados ao término do ensaio que avaliava a perda de abatimento por estes concretos. 2.1 Análise granulométrica da areia e da cinza pesada Para os diferentes teores de substituições da areia pela cinza pesada, foram avaliadas as composições granulométricas das combinações entre a cinza pesada e a areia. Na figura 01 estão apresentadas as granulometrias da areia e da cinza pesada, como as granulometrias referentes as diferentes composições de areia+cinza pesada a fim de compor o agregado miúdo para os diferentes concretos, comparado aos limites granulométricos da norma americana ASTM C 33. Porcentagem Retida Acumulada 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 6.3 4,8 2,4 1,2 0,6 0,3 0,15 Peneiras (mm) ASTM Inferior ASTM Superior Areia 10% AREIA/CZP 25% AREIA/CZP 50% AREIA/CZP Cinza Pesada Figura 01 Composições e limites granulométricos.

Observa-se pela figura 01 que somente a areia e a substituição de 10% da areia pela cinza pesada apresentam granulometria para concreto segundo ASTM C 33. A granulometria da mistura com substituição de 25% da areia pela cinza pesada, se aproxima bastante da prescrita pela norma americana, enquanto que para as misturas com substituição de 50%, os valores encontram-se fora da faixa granulométrica recomendadas por esta norma. Ressalta-se que a cinza pesada apresentou 23,7 % de material passante na peneira de abertura de malha de 75 µm, ficando igualmente fora dos limites granulométricos para concreto. Seguindo a NBR 7224 (1984) foi determinado através do permeabelímetro de Blaine, a área específica da cinza pesada. O material usado para o ensaio foi o passante na peneira de abertura de malha de 150 µm. O resultado médio alcançado foi de 117 m 2 /kg, valor abaixo daqueles relatados para pozolanas comuns. 2.2 Massa específica dos materiais Na tabela 01 estão apresentadas as massas específicas dos diferentes materiais empregados na confecção dos concretos. Tabela 01 Valores de massa específica dos materiais utilizados na confecção do concreto. Material Cimento CPIS Cimento ARI Cinza pesada Areia Agregado graúdo Massa específica média (g/cm 3 ) 3,14 3,12 1,813 2,605 2,742 2.3 Avaliação da atividade pozolânica da cinza pesada A determinação do Índice de Atividade Pozolânica (IAP) da Cinza Pesada foi realizado de acordo com a NBR 5752 (1992). A cinza pesada apresentou IAP igual a 58,4%; portanto, por este critério já não se pode considerar a cinza pesada, utilizada no presente estudo, como pozolana. 3 RESULTADOS E DISCUSSÕES 3.1 Propriedades dos concretos no estado fresco A tabela 02 mostra o teor de argamassa ideal (αi) relação a/c e o valor do abatimento no tronco de cone medido para os concretos AREIA/CZP (areia/cinza pesada) no momento da confecção dos corpos de prova. Nota-se pela tabela 02 que, à medida em que se aumenta o teor de substituição da areia pela cinza pesada, há um acréscimo no consumo de água. Isto pode ser explicado devido as suas características físicas, por ter granulometria bem mais fina, em comparação a areia empregada e pela alta absorção de água pela cinza pesada. Pela análise da tabela 02, verifica-se que há um consumo maior de água quando usa-se o cimento ARI em comparação ao cimento CPIS, devido a menor área específica apresentado por este último cimento, sendo 385 m 2 /kg para o CPIS e 412 m 2 /kg para o ARI. No momento da moldagem, notou-se uma maior coesão dos concretos com adição de cinza pesada em relação ao concreto de referência, isto pode ser explicado pelo maior módulo de finura apresentado pela cinza pesada.

Tabela 02 Teor de argamassa, abatimento e relação a/c dos concretos. Cimento CPI-S Substituição (%) Traço (m) Teor de argamassa (%) Relação a/c Slump (cm) Teor de argamassa (%) Cimento ARI Relação a/c Slump (cm) 0% 10% 25% 50% m=3,5 52 0,43 85 52 0,48 90 m=5,0 52 0,59 85 52 0,62 85 m=6,5 52 0,75 80 52 0,78 95 m=3,5 52 0,45 80 52 0,49 80 m=5,0 52 0,59 85 52 0,62 90 m=6,5 52 0,75 85 52 0,77 75 m=3,5 52 0,47 80 52 0,51 85 m=5,0 52 0,64 90 52 0,68 80 m=6,5 52 0,8 90 52 0,82 85 m=3,5 52 0,54 85 52 0,56 75 m=5,0 52 0,72 75 52 0,73 85 m=6,5 52 0,94 80 52 0,96 85 3.2 Propriedades do concreto no estado endurecido 3.3 Resistência à compressão Nas figuras 02 e 03 estão apresentados as curvas da evolução da resistência à compressão em relação a idade. 60,0 Cim CPIS Resistência à compressão (MPa) 50,0 40,0 30,0 20,0 10,0 0,0 0% M=3,5 0% M=5,0 0% M=6,5 10% M=3,5 10% M=5,0 10% M=6,5 25% M=3,5 25% M=5,0 25% M=6,5 50% M=3,5 50% M=5,0 50% M=6,5 0 14 28 42 56 70 84 98 112 126 140 154 168 182 Idade (dias) Figura 02 Evolução da resistência à compressão dos concretos AREIA/CZP utilizando cimento CPIS.

60,0 Cim ARI Resistência à compressão (MPa) 50,0 40,0 30,0 20,0 10,0 0,0 0% M=3,5 0% M=5,0 0% M=6,5 10% M=3,5 10% M=5,0 10% M=6,5 25% M=3,5 25% M=5,0 25% M=6,5 50% M=3,5 50% M=5,0 50% M=6,5 0 14 28 42 56 70 84 98 112 126 140 154 168 182 Idade (dias) Figura 03 Evolução da resistência à compressão do concreto AREIA/CZP utilizando cimento ARI. Nota-se pelas figuras 02 e 03 um comportamento semelhante dos concretos quanto ao aumento de resistência, tanto para os confeccionados com cimento CPIS quanto para os concretos com cimento ARI. As taxas de crescimento das resistências foram semelhantes, tanto para os concretos de referência quanto para os concretos com adição de cinza pesada nas idades entre 28 e 180 dias, sendo que o ganho de resistência entre estas idades não ultrapassou 30%. Observa-se também que a resistência à compressão de todos os concretos, quando passam da idade de 90 para 180 dias, não aumenta significativamente, ficando bastante estável. 3.4 Diagramas de dosagens Através das curvas de resistências mostradas nas figuras 02 e 03, foram calculadas as resistências à compressão para a idade de 28 dias. A partir de então, foram estabelecidos os diagramas de dosagens: entre a resistência à compressão e a relação água/cimento; traço em massa seca (m) e relação a/c; e consumo de cimento por metro cúbico em relação ao traço. Os diagramas de dosagens são mostrados nas figuras 04 e 05.

Cimento CPIS - AREIA/CZP Resistência aos 28 dias 0%AREIA/CZP 52,0 48,0 44,0 40,0 Fcj (MPa) y = 113,32e -2,1062x R 2 = 0,9748 ABRAMS y = 137,41e -2,2392x R 2 = 0,9784 10%AREIA/CZP 36,0 32,0 y = 87,784e -1,3564x R 2 = 0,997 25%AREIA/CZP 28,0 50%AREIA/CZP 24,0 20,0 y = 89,396e -1,8979x R 2 = 0,9752 Cimento (Kg/m3) 600 500 400 300 16,0 12,0 0,2 0,1 0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 3.5 8,0 Relação a/c MOLINARI 5,0 4,0 0,0 6,5 Traço"m" 4,0 R 2 = 0,9997 R 2 = 0,9997 R 2 = 0,9995 R 2 = 0,9963 LYSE Figura 04 Diagramas de dosagens dos concretos onde foi empregado o cimento CPIS. Cimento ARI - AREIA/CZP Resistência aos 28 dias 0%CAREIA/CZP 10%CAREIA/CZP 25%CAREIA/CZP 52,0 48,0 44,0 40,0 36,0 32,0 28,0 24,0 Fcj (MPa) ABRAMS y = 109,59e -1,981x R 2 = 0,9997 y = 117,82e -1,8161x R 2 = 0,9817 y = 111,28e -1,6287x R 2 = 0,9669 y = 128,49e -1,8285x R 2 = 0,9972 50%CAREIA/CZP 20,0 16,0 Cimento (Kg/m3) Relação a/c 12,0 0,2 600 0,1 500 0,0 400 0,1 0,2 300 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 MOLINARI 3,5 8,0 5,0 4,0 6,5 0,0 Traço "m" 4,0 R 2 = 0,9997 R 2 = 0,9962 R 2 = 0,9978 R 2 = 0,9994 LYSE Figura 05 Diagramas de dosagens dos concretos onde foi empregado o cimento ARI. Observando-se os gráficos plotados da figura 04 e 05, mesmo apresentando relações a/c maiores que os de referência, de modo geral observa-se resistências à compressão similares e até maiores para os concretos com substituição da areia pela cinza pesada, tanto para concretos com cimento ARI ou para o CPIS. Observa-se também que os concretos obedeceram as leis de comportamento (lei de Abrams, lei de Lyse, lei de Molinari).

3.5 Consumo de cimento para a produção de concreto com resistência média, fcj=32 MPa Através dos diagramas de dosagens e das tendências observadas, fez-se o cálculo do consumo de cimento para a produção de concreto genérico, afim de atingir uma resistência média de 32 MPa aos 28 dias de idade, objetivando comparar os consumos de cimento pelos diferentes concretos confeccionados. As quantidades de cimento necessárias para a produção destes concretos apresentam-se na tabela 03. Na figura 06 estão apresentados os histogramas com o consumo de cimento a fim de comparação. Tabela 03 Quantidades de cimento para a produção de um concreto com resistência média de 32 MPa aos 28 dias. Consumo de cimento (kg/m) Substituição (%) Cimento CPIS Cimento ARI 0% 399,6 366,1 10% 365,0 308,5 25% 354,7 304,9 50% 362,8 334,3 Consumo de cimento (kg/m3) 450 400 350 300 250 200 150 100 50 0 0% 10% 25% 50% Teor de substituição Cimento CPIS Cimento ARI Figura 06 - Histogramas com o consumo de cimento. Através da figura 06 nota-se que os concretos com adição da cinza pesada necessitam menores quantidades de cimento para produzir um concreto com o mesmo desempenho em relação a resistência à compressão. Com isso é possível concluir que, com a confecção de concretos substituindo parte da areia pela cinza pesada, produz-se concretos mais econômicos, diminuindo consideravelmente os custos com cimento. A redução pode ser observada no estudo até os 50% de substituição, sendo mais considerável para os teores de 10 e 25%. 3.6 Ensaio de Absorção de Água por Capilaridade Foram submetidos ao ensaio de absorção de água por capilaridade aos 90 dias, concretos com traço m=5,0; segundo a NBR 9779 (1987). Os resultados estão apresentados na figura 07.

0.350 0.300 Absorção Capilar (g/cm2) 0.250 0.200 0.150 0.100 0.050 CPIS 0% CPIS 10% CPIS 25% CPIS 50% ARI 0% ARI 10% ARI 25% ARI 50% 0.000 0.0 2.0 4.0 6.0 8.0 10.0 12.0 Raiz quadrada do tempo (h) Figura 07 Absorção de água por capilaridade nos concretos aos 90 dias de idade. Os resultados são apresentados como a absorção acumulada da água em relação à raiz quadrada do tempo. Nota-se que nos concretos de referência tiveram absorções capilares maiores que nos concretos com adição de cinza pesada. 4 CONCLUSÕES Pelos resultados da análise das diferentes curvas granulométricas, a cinza pesada pode servir como um material alternativo para fazer composições granulométricas, suprindo uma eventual falta de material fino na composição do concreto; O uso da cinza pesada não impede aos concretos de atingirem resistências mais elevadas, podendo ser usado como agregado; Pode-se produzir concretos com menor consumo de cimento por metro cúbico de concreto, alcançando as mesmas resistências à compressão; As taxas de crescimento de resistência à compressão foram similares nos concretos com cinza pesada comparada aos concretos de referência, entre os 28 e 180 dias; O efeito fíller das cinzas pesadas nas composições analisadas ficou evidenciado através do ganho de resistência. Os consumos de cimento menores nas dosagens com cinza pesada, e a menor absorção de água demonstraram o potencial de pozolanicidade das cinzas pesadas.

5 REFERÊNCIAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS Argamassa e concreto endurecidos Determinação da absorção de água por capilaridade. NBR 9779. Rio de Janeiro, 1987.., Cimento Portland e Outros Materiais em Pó, Determinação da área específica Método de ensaio, NBR 7224. Rio de Janeiro, 1984, 10 p..,materiais pozolânicos Determinação de atividade pozolânica com cimento Portland Índice de atividade pozolânica com cimento Método de ensaio, NBR 5752. Rio de Janeiro, 1992. CHERIAF, M.; ROCHA, J. Cavalcante; PÉRA, J. Pozzolanic proprieties of coal combustion bottom ash. Cement and Concrete Research. V. 29 (1999) 1387-1391. GHAFOORI N., BUCHOLC J. Investigation of Lignite-Based Bottom Ash for Structural Concrete. Journals of Materials in Civil Engineering, Vol 8, Issue 3. Aug 1996, pp 128-137. KREUZ A. L., CHERIAF M., ROCHA J. C. Propriedades de Concretos Estruturais Incorporando Cinza Pesada como Parte da Areia. IV Seminário Desenvolvimento Sustentável e a Reciclagem na Construção Civil Materiais Reciclados e suas Aplicações. Ibracon Comitê Técnico 206. São Paulo. Junho 2001. pp 215-224. KREUZ A. L. Utilização de Cinzas Pesadas de Termelétricas na Substituição de Cimento e Areia na Confecção de Concretos. Dissertação de mestrado do Curso de Pós-graduação da Universidade Federal de Santa Catarina, Departamento de Engenharia Civil, Florianópolis, Brasil, 2001. (no prelo) NEVILLE A. M. Propriedades do Concreto. Ed. PINI, 2ª edição. São Paulo, 1997. 828p. POZZOBON, C. E. Aplicações tecnológicas para a cinza do carvão mineral produzida no Complexo Termelétrico Jorge Lacerda. Dissertação de mestrado do Curso de Pós-graduação da Universidade Federal de Santa Catarina, Departamento de Engenharia Civil, Florianópolis, Brasil, 1999. 122p. RAVINA, D.; Mechanical properties of concrete incorporating a high volume of class F fly ash as partial fine sand replacement. Materials and Strutures/Matériaux et Constructions, Vol.31, pp 84-90, Mars 1998. ROCHA, J. C.; CHERIAF, M; POZZOBON, C. E.; MAIA, M. S.; MAGRI, L.; XAVIER S. M. T.; Reaproveitamento das cinzas pesadas do Complexo Jorge Lacerda na elaboração de materiais de construção: aspectos técnicos e ambientais. XV Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica, Foz do Iguaçú-PR, Brasil, 1999. Disponível em CD-Rom. AGRADECIMENTOS Este trabalho foi realizado com o apoio financeiro da Gerasul.