III-138 CARACTERIZAÇÃO DO LODO QUÍMICO PRIMÁRIO GERADO NO TRATAMENTO DE EFLUENTES DA INDÚSTRIA QUÍMICA TFL DO BRASIL VISANDO A VALORIZAÇÃO DO RESÍDUO



Documentos relacionados
GLOSSÁRIO MICROBIOLÓGICOS FÍSICO-QUÍMICOS PARÂMETROS PARÂMETROS

DISPOSIÇÃO DE RESÍDUOS DE ESTAÇÃO DE TRATAMENTO DE ÁGUA EM LAGOA FACULTATIVA DE ESGOTO: CARACTERIZAÇÃO DA ETA

CARACTERIZAÇÃO E TRATABILIDADE DO EFLUENTE DE LAVAGEM DE UMA RECICLADORA DE PLÁSTICOS

ENSAIOS FÍSICO-QUÍMICOS PARA O TRATAMENTO DOS EFLUENTES DO TRANSPORTE HIDRÁULICO DAS CINZAS PESADAS DA USINA TERMELÉTRICA CHARQUEADAS

VI-172 GERENCIAMENTO DE RESÍDUOS DE ANÁLISES LABORATORIAIS EM UMA INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL

TABELA ANEXA AO DECRETO Nº PREÇOS REFERENTES AOS SERVIÇOS DE ÁGUA

Parâmetros de qualidade da água. Variáveis Físicas Variáveis Químicas Variáveis Microbiológicas Variáveis Hidrobiológicas Variáveis Ecotoxicológicas

II-109 PÓS-TRATAMENTO DE EFLUENTE DE EMBALAGENS METÁLICAS UTILIZANDO REATOR DE BATELADA SEQUENCIAL (RBS) PARA REMOÇÃO DA DEMANDA QUÍMICA DE OXIGÊNIO

ETAPAS DE UM TRATAMENTO DE EFLUENTE

Logística Reversa: destinação dos resíduos de poliestireno expandido (isopor ) pós-consumo de uma indústria i catarinense

EMBALAGENS DE ALIMENTOS COM FIBRA DE COCO VERDE Gilberto Alves Rodrigues

Telefones: (31) / Site:

Os setores industriais geradores de materiais secundários e resíduos com potencial de uso em fertilizantes contendo micronutrientes

SISTEMAS DE TRATAMENTO DE EFLUENTES INDUSTRIAIS. Engº Ricardo de Gouveia

Engº. Gandhi Giordano

Opersan Resíduos Industriais Sociedade Ltda. 3º Prêmio FIESP de Conservação e Reuso de Água

Gerenciamento e Tratamento de Águas Residuárias - GTAR

FERTILIZANTES Fertilizante: Classificação Quanto a Natureza do Nutriente Contido Quanto ao Critério Químico Quanto ao Critério Físico

III-046 USO DE RESÍDUO DE CURTUME EM PEÇAS PARA CONSTRUÇÃO CIVIL

SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL

O processo de destinação de embalagens vazias de defensivos agrícolas

TENDO EM VISTA: O Tratado de Assunção, o Protocolo de Ouro Preto e as Resoluções Nº 91/93, 151/96 e 21/01 do Grupo Mercado Comum.

AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DE REATOR UASB NO TRATAMENTO DE EFLUENTES GERADOS POR HOSPITAL DA SERRA GAUCHA

RELATÓRIO ANUAL DO SISTEMA DE TRATAMENTO DE ESGOTOS

ENG. ELVIRA LÍDIA STRAUS SETOR DE RESÍDUOS SÓLIDOS INDUSTRIAIS

FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE DE PALMAS DIRETORIA DE CONTROLE AMBIENTAL GERÊNCIA DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL

COLETA SELETIVA VIDRO

Viagem Técnica Ecocitrus

MONITORAMENTO DA QUALIDADE DAS ÁGUAS DO CÓRREGO QUARTA-FEIRA, CUIABÁ-MT

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE. Mônica Macedo de Jesus & Sidnei Cerqueira dos Santos RESÍDUOS & REJEITOS

I DIAGNÓSTICO DE GERENCIAMENTO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS DE SERVIÇO DE SAÚDE EM UM HOSPITAL PÚBLICO EM BELÉM/PA

AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DE REATOR UASB EM INDÚSTRIA DE ALIMENTOS

CATÁLOGO DOS PRODUTOS QUIMICOS

Mostra de Projetos Programa de Utilização Agrícola do Lodo de Esgoto no Estado do Paraná

Eficiência de remoção de DBO dos principais processos de tratamento de esgotos adotados no Brasil

MINIMIZAÇÃO DE RESÍDUOS. Clédola Cássia Oliveira de Tello Serviço de Gerência de Rejeitos - SEGRE

XXXV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO

AVALIAÇÃO DA EFICIÊNCIA DE REATOR UASB AO RECEBER LODO SÉPTICO

Ideal Qualificação Profissional

o hectare Nesta edição, você vai descobrir o que é um biodigestor, como ele funciona e também O que é o biodigestor? 1 ha

GERENCIAMENTO DE RESÍDUOS E EFLUENTES NA INDÚSTRIA DE COSMÉTICOS

CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE-CONAMA

Elaboração Item 2 inclusão do PG-C-01 Programa Integrado de SSTMA Item 2 Codificação dos documentos de referência

Associada TRANSFORMANDO RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS EM PRODUTO SEGURO E DE QUALIDADE PARA A AGRICULTURA. Tratamento de Efluentes e Reciclagem Agrícola

GERENCIAMENTO DE RESÍDUOS QUÍMICOS NOS LABORATÓRIOS DO SEMAE - SÃO LEOPOLDO

QUEM TRATA BEM DOS SEUS RESÍDUOS É BEM TRATADO PELO MERCADO!

Resíduos Sólidos: A Classificação Nacional e a Problemática dos Resíduos de Ampla e Difusa Geração

A gestão de resíduos na UNISINOS atendendo aos requisitos da ISO :2004. Palestrante: Dra. Luciana Paulo Gomes, UNISINOS

Licenciamento e Controle Ambiental em Abatedouros de Frangos

Tratamento de Efluentes na Indústria e Estabelecimentos de Alimentos

POTENCIALIDADES DO LODO DE ESGOTO COMO SUBSTRATO PARA PRODUÇÃO DE MUDAS

GSC EXPLICA SÉRIE EXPERTISE VETERINÁRIA

PROJETO DE REDUÇÃO DOS RESÍDUOS INFECTANTES NAS UTI S DO HOSPITAL ESTADUAL DE DIADEMA

Especial Online RESUMO DOS TRABALHOS DE CONCLUSÃO DE CURSO. Engenharia Ambiental ISSN

RESOLUÇÃO ARSAE-MG 015, de 24 de janeiro de 2012.

Sistemas Compactos de Tratamento de Esgotos Sanitários para Pequenos Municípios

CORRELAÇÃO ENTRE OS VALORES DE DBO E DQO NO AFLUENTE E EFLUENTE DE DUAS ETEs DA CIDADE DE ARARAQUARA

TRATAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS (RSU) Profa. Margarita María Dueñas Orozco

Introdução ao Tratamento de Resíduos Industriais

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

SISTEMA DE TRATAMENTO DE EFLUENTES DA INDÚSTRIA TEXTIL

RELATÓRIO ANUAL DE QUALIDADE DAS ÁGUAS DE ABASTECIMENTO

Soluções Ambientais para a Destinação de Resíduos

ATO nº 03/2009. Artigo 2º - Para os efeitos deste Ato, são considerados efluentes especiais passíveis de recebimento pelo SAAE:

Sistema Integrado de Licenciamento - SIL

TRATAMENTO DA ÁGUA PARA GERADORES DE VAPOR

RESÍDUOS SÓLIDOS Gerenciamento e Controle

Tratamento e Inertização das Areias de Fundição TECNOLOGIA LIMPA E DIMINUIÇÃO CONTINUA NA GERAÇÃO DE RESÍDUOS INDUSTRIAIS

AGRICULTURA URBANA. Principais ameaças à prática da Agricultura urbana

III-062 PLANEJAMENTO EXPERIMENTAL PARA AVALIAR O TEMPO DE ARMAZENAGEM DE LODO INDUSTRIAL

SISTEMA DE REAPROVEITAMENTO DE ÁGUA RESIDUAIS DE PROCESSOS INDUSTRIAL E ESGOTO RESIDENCIAIS POR MEIO DE TRANSFORMAÇÃO TÉRMICAS FÍSICO QUÍMICA N0.

PREFEITURA MUNICIPAL DE VILA VELHA Secretaria Municipal de Desenvolvimento Sustentável

Estudo com tratamento de água para abastecimento PIBIC/

LODO DE ESGOTO: UTILIZAÇÃO SUSTENTÁVEL

Shopping Iguatemi Campinas Reciclagem

II-120 REUTILIZAÇÃO DO BANHO RESIDUAL DE CURTIMENTO, UTILIZANDO TECNOLOGIA DE SEPARAÇÃO POR MEMBRANA

O processo de tratamento da ETE-CARIOBA é composto das seguintes unidades principais:

SOCIEDADE DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA E SANEAMENTO S/A

Reuso macroexterno: reuso de efluentes provenientes de estações de tratamento administradas por concessionárias ou de outra indústria;

DECRETO Nº , DE 30 DE DEZEMBRO DE 2014.

SECRETARIA DE ESTADO DO AMBIENTE CONSELHO ESTADUAL DE MEIO AMBIENTE DO RIO DE JANEIRO ATO DO PRESIDENTE

LANÇAMENTO DE EFLUENTES

ESTRATÉGIAS E DESAFIOS PARA A IMPLANTAÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS

Os resíduos sólidos podem ser classificados de acordo com a origem, tipo de resíduo, composição química e periculosidade conforme abaixo:

Banco de Boas Práticas Ambientais. Estudo de Caso. Reaproveitamento de Rejeitos na Mineração - Projeto Areia Industrial

ANÁLISE COMPARATIVA DA UTILIZAÇÃO DE DOIS TIPOS DE COAGULANTES PARA O TRATAMENTO DE ÁGUA DE ABASTECIMENTO

ABSORÇÃO DE MICRONUTRIENTES APÓS APLICAÇÃO DE BIOSSÓLIDO NO DESENVOLVIMENTO INICIAL DE EUCALIPTO

RESOLUÇÃO N o 307, DE 5 DE JULHO DE 2002 Publicada no DOU nº 136, de 17/07/2002, págs

FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE DE PALMAS DIRETORIA DE CONTROLE AMBIENTAL GERÊNCIA DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL

MARETE INDUSTRIAL APLICAÇÕES

RECUPERAÇÃO TÉRMICA DE AREIA DESCARTADA DE FUNDIÇÃO (ADF)

TÉCNICAS DE GESTÃO DE RESÍDUOS EM EMPRESAS DE REPARAÇÃO VEÍCULAR

Relatório Técnico FCTY-RTC-RSO Referência: Programa de Gerenciamento de Resíduos Sólidos da Construção Civil. Fevereiro/2014.

ESTUDO SOBRE DESTINAÇÃO ADEQUADA AOS RESÍDUOS LÍQUIDOS, SÓLIDOS E GASOSOS GERADOS NO PROCESSO DE GALVANOPLASTIA DA INDÚSTRIA I. T.

I Congresso Baiano de Engenharia Sanitária e Ambiental I COBESA

RESPOSTA TÉCNICA. Preciso de informações sobre reciclagem de thinner, fabricante de máquinas para reciclagem e viabilidade.

REMOÇÃO DE LODO DE LAGOAS DE ESTABILIZAÇÃO E ACONDICIONAMENTO EM CONTENTORES GEOTÊXTEIS. Josué Tadeu Leite França 06/11/2012

Alternativas tecnológicas disponíveis. Variações de custo e de segurança das operações.

Aplicação de Reúso na Indústria Têxtil

Transcrição:

III-138 CARACTERIZAÇÃO DO LODO QUÍMICO PRIMÁRIO GERADO NO TRATAMENTO DE EFLUENTES DA INDÚSTRIA QUÍMICA TFL DO BRASIL VISANDO A VALORIZAÇÃO DO RESÍDUO Marina Brenner Medtler (1) Gestora ambiental pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS). Mestranda em Engenheria civil - Área: Gerenciamento de resíduos pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS). Luis Alcides Schiavo Miranda (2) Químico Industrial pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Mestre em Ciência dos Alimentos - Área: Biotecnologia de Alimentos pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Doutor em Ciências - Área: Biotecnologia Ambiental pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Pós-Doutorado em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (IPH/UFRGS). Endereço (2) : Laboratório de Saneamento Ambiental- Sala 6B216 - Unisinos. Av. Unisinos, 950 São Leopoldo Rio Grande do Sul - RS - CEP: 93022-000 - Brasil - Tel: (51) 35901122 Ramal: 1783 - e-mail: lalcides@unisinos.br RESUMO A TFL do Brasil, localizada em São Leopoldo, é uma indústria química que produz produtos para acabamento de couro. Durante o processo de tratamento de efluentes da empresa, na etapa de coagulação/floculação, são geradas em média 6,4 toneladas de lodo químico primário por mês. Esse resíduo atualmente é enviado para aterro industrial. O efluente que dá origem ao lodo é decorrente do processo industrial, do curtume experimental, do setor expedição e de lavagem de embalagens. O presente trabalho teve como objetivos realizar a caracterização físico-química do lodo gerado pela empresa, quantificar o lodo gerado bem como custos com transporte, armazenamento e disposição final do resíduo a fim de sugerir através de dados encontrados na literatura para sua valorização. Embora o lodo químico primário possua características de lodo de curtume desejáveis para aplicação no solo, forma mais sustentável de disposição final, a presença de Cromo hexavalente no resíduo o classifica como perigoso. Por fim, sugere-se para a empresa a realização da etapa de coagulação/floculação do efluente do curtume experimental em separado das outras fontes, para possibilitar o tratamento de 50% do lodo gerado em processo de compostagem e posterior utilização agrícola. Para isso, sugere-se ainda a determinação da relação Carbono/Nitrogênio do novo lodo gerado para averiguar seu potencial agrícola. PALAVRAS-CHAVE: Lodo primário, tratamento de efluentes, indústria química, lodo químico. INTRODUÇÃO A indústria química é o setor industrial sobre o qual se concentra de maneira mais intensa as preocupações quanto à contaminação ambiental. Da mesma forma, a indústria curtumeira possui grande potencial poluidor devido à utilização de cromo na etapa de curtimento e a grande geração de resíduos e efluentes industriais com alto teor de matéria orgânica. Com o aumento da concorrência e das preocupações com a melhoria da qualidade do meio ambiente, as indústrias vêm buscando alternativas para diminuir seus custos e reduzir impactos ambientais, aumentando a credibilidade perante o mercado consumidor (FERNANDES, 2002). Dessa forma, a utilização de resíduos industriais em diversos segmentos da indústria e agricultura, como matéria prima ou insumo, vem aparecendo como uma boa alternativa para o gerenciamento de resíduos. Resíduos perigosos de origem industrial geralmente são dispostos em aterros industriais, que exigem da empresa geradora, pagamento pela quantidade de resíduo disposto no local. Essa forma de disposição final, além de onerosa para a empresa, está longe de ser a alternativa de disposição final mais sustentável, já que o resíduo é confinado em uma vala, muitas vezes sem receber nenhum tipo de tratamento. ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1

O lodo químico primário gerado na etapa de coagulação/floculação do tratamento de efluentes é um resíduo constituído de água, sólidos suspensos e produtos resultantes dos reagentes aplicados ao efluente (RICHTER, 2001). Os custos com a disposição final dos lodos gerados neste processo representam de 20 a 60% dos custos operacionais de uma estação de tratamento (ANDREOLI e PINTO, 2001). Diversas formas de tratamento e utilização de lodos gerados na etapa primária do tratamento de água, efluentes domésticos e industriais são descritas na literatura. Dentre as formas de utilização e disposição final, destacamse o uso do lodo na agricultura, sua incorporação como matéria prima em diversos produtos da construção civil e disposição em aterro industrial. As opções de utilização e disposição final requerem caracterização apropriada do resíduo, já que ele pode conter substâncias prejudiciais para o ecossistema, como metais pesados e poluentes orgânicos (MARTINS, VOUTZA e SAMARA 2004). Apenas através da caracterização do resíduo, pode-se indicar a forma mais segura de disposição, bem como tratamentos que aumentem as possibilidades de reciclagem. A TFL do Brasil (São Leopoldo - RS) é produtora de resinas acrílicas, tintas compactas e outros produtos para acabamento de couros, e produz atualmente cerca de 6,4 toneladas/mês de lodo químico primário, o qual precisa ser enviado para disposição externa, gerando custos de disposição e transporte. Este trabalho tem por objetivo caracterizar o lodo químico gerado pela empresa, visando sua valorização e possibilidades de disposição e/ou utilização. MATERIAIS E MÉTODOS CARACTERIZAÇÃO DA INDÚSTRIA A indústria química TFL do Brasil, localizada no município de São Leopoldo RS é uma das filiais de uma indústria multinacional alemã. A unidade de São Leopoldo está no mercado desde 1996 e possui atualmente 94 funcionários. A empresa obteve em 2001 a certificação da ISO 9001 e 14001, certificações do sistema de gestão da qualidade e do sistema de gestão ambiental, com a finalidade de atender à exigências de mercado. A unidade produz produtos para acabamento de couro: polimerização de resinas acrílicas, dispersões de sílicas, emulsões de ceras sintéticas e naturais, misturas de óleos vegetais e animais, compounds (misturas de resinas, ceras, e outros), emulsões de silicones, dispersões de dióxido de titânio, dispersões de negro de fumo e neutralizações de ácidos e bases. Por esse motivo, a empresa possui um curtume experimental para testar seus produtos em couro. Quanto aos insumos químicos utilizados na produção, são mais de 400 produtos, dos quais se pode destacar sais inorgânicos, ácidos orgânicos, álcalis, sílicas, resinas de poliuretanos, resinas acrílicas e tensoativos. A TFL fabrica por mês aproximadamente 200 toneladas de produtos enzimáticos e sais inorgânicos diversos, 500 toneladas de compounds e auxiliares para acabamento de couro e 600 toneladas de tensoativos e produtos para ribeira líquidos. ESTAÇÃO DE TRATAMENTO DE EFLUENTES A estação de tratamento de efluentes da empresa trata, além do efluente gerado no processo produtivo, o efluente gerado nos laboratórios e no curtume experimental. O curtume experimental é responsável por 50% dos efluentes gerados. Neste curtume, são realizadas todas as etapas de tratamento do couro. O couro é curtido ao Cromo. Os efluentes dessas três fontes vão para tanques de mistura. Cada tanque possui volume de 12m 3 e pertence a um setor produtivo diferente. Os tanques 1 e 2 recebem efluente dos laboratórios de aplicação (curtume) e controle de qualidade, de lavagem de embalagens e de expedição. O terceiro tanque recebe efluente do setor de fabricação de resinas acrílicas e o quarto do setor de lacas, tintas e bases para tintas. Os efluentes dos quatro tanques são homogeneizados no tanque de mistura, de 36 m 3, recebendo o mesmo tratamento. O primeiro tratamento recebido pelo efluente é físico-químico, onde é feita a coagulação, floculação, sedimentação e remoção do lodo. Para a coagulação/floculação do efluente bruto são usados três reagentes nas seguintes concentrações: policloreto de alumínio (300 ppm), polieletrólito à base de poliacrilamida (7 ppm) e coagulante orgânico à base de tanino - Tanfloc (1800 ppm). A desidratação do lodo é geralmente realizada em 2 ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental

um filtro prensa, sendo utilizados leitos de secagem apenas quando é realizada a limpeza do tanque de mistura. O lodo úmido e a torta de lodo desidratado gerada pelo filtro prensa encontram-se na Figura 1. Figura 1: Lodo químico primário gerado na TFL do Brasil antes e após desaguamento em filtro prensa (Foto: TFL do Brasil). Após o tratamento primário, o líquido é enviado para o tratamento secundário em uma lagoa aerada com volume de 210 m 3, e desta para o corpo d'água. Atualmente a empresa está pesquisando, em uma unidade piloto, a possibilidade de pós-tratamento através de um sistema de banhados construídos de escoamento vertical. São gastos pela empresa R$ 8,24 por m 3 de efluente tratado, estando incluso neste valor os gastos com a disposição do lodo gerado na primeira etapa do tratamento. A estação de tratamento de efluentes recebe em média 14 m 3 /dia de efluentes. CARACTERIZAÇÃO DO LODO QUÍMICO PRIMÁRIO A empresa forneceu a caracterização do efluente bruto e os laudos da última caracterização de seu lodo químico primário contendo ensaios de lixiviação e solubilização, conforme as normas NBR 10005 e NBR 10006 e análise dos parâmetros: ph, fenol, óleos e graxas totais, sulfetos, arsênio, chumbo, cromo total, cromo hexavalente, mercúrio, níquel, cianeto total, densidade, umidade, óleos e graxas mineral e óleos e graxas vegetal/animal. Havendo a empresa fornecido estes dados optou-se por acrescentar a caracterização os seguintes: STV (sólidos totais voláteis), nitrogênio, nitrogênio Amoniacal, fósforo, potássio, ferro, manganês, alumínio, zinco, cobre, cálcio, molibdênio e boro. Para determinação de STV foi utilizado método gravimétrico e para a análise de Nitrogênio e Nitrogênio Amoniacal, método titulométrico, ambos de acordo com APHA, 1995. Os demais parâmetros foram determinados por Espectrometria de Emissão Atômica (ICP AES). Para a caracterização físico-química foi realizada uma única coleta de lodo desaguado em filtro prensa no dia 08 de junho de 2010, visto que o processo produtivo industrial não muda ao longo do tempo. Os dados de custo com armazenamento, transporte e disposição do lodo químico primário foram fornecidos pela indústria geradora, bem como os dados da caracterização da indústria e os utilizados para caracterização do efluente bruto. RESULTADOS A seguir, os resultados do trabalho são apresentados em três subseções: caracterização do efluente bruto; quantidade de lodo gerado, despesas de armazenamento, transporte e disposição final; e classificação e caracterização físico-química do lodo. ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 3

CARACTERIZAÇÃO DO EFLUENTE BRUTO Para melhor entendimento dos resultados de caracterização do lodo químico primário algumas considerações sobre a caracterização do efluente bruto serão feitas nessa seção. A caracterização do efluente bruto encontrase na Tabela 1. Tabela 1: Parâmetros físico-químicos utilizados na caracterização do efluente bruto gerado pela TFL do Brasil de janeiro a maio de 2010 Observando a tabela acima é possível constatar que o efluente bruto da TFL apresenta características de efluente de curtume, que segundo CRUZ, MITTEREGER e BRAUN (2010) APUD FORESTI (1972), são principalmente a presença de cromo, ph elevado, a presença de sulfetos livres, grande quantidade de matéria orgânica e elevado teor de sólidos suspensos. Salienta-se a baixa relação DBO/DQO de 0,24 caracterizando um efluente de baixa biodegradabilidade. Entretanto esta relação pode ser alterada pelo pré-tratamento físicoquímico. QUANTIDADE DE LODO GERADO, DESPESAS DE ARMAZENAMENTO, TRANSPORTE E DISPOSIÇÃO FINAL Na etapa primária do tratamento são gerados em média 6426 kg de lodo desidratado por mês. Atualmente o lodo gerado pela indústria é disposto em aterro industrial. O valor cobrado da empresa geradora é de R$ 122,56 por tonelada de lodo disposto. A Figura 1 apresenta um gráfico com a quantidade mensal de lodo (kg) gerado pela indústria química de janeiro de 2009 a julho de 2010. Em seguida, é apresentado na Figura 2 gráfico dos valores mensais pagos pela indústria para a disposição do lodo em aterro industrial no mesmo período. Figura 2: Quantidade de lodo primário (kg) gerado pela indústria química 4 ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental

Figura 3: Valores (R$) pagos pela indústria química para dispor o lodo químico primário em aterro industrial. A empresa gastou no ano de 2009 R$ 10059,72 com a disposição do lodo gerado. Em 2010, até o mês de julho, foram gastos R$ 4903,50. Além da despesa com a disposição do resíduo, há também despesas com o armazenamento e transporte do lodo. O lodo químico primário desidratado em filtro prensa é armazenado em sacos plásticos pretos, para acondicionamento de resíduos perigosos, exigidos pelo aterro industrial para o recebimento do resíduo. São comprados 4000 sacos por ano, com valor unitário de R$ 0,75, totalizando um gasto de R$ 3000,00. Para o transporte do lodo, são pagos à transportadora contratada pela TFL do Brasil R$ 104,50 por caçamba de resíduo transportado. Em 2009, foram gastos pela empresa R$ 2200,00 para o transporte de lodo e em 2010, até o mês de agosto, R$ 1463,00. No ano de 2009, foram gastos com o armazenamento, transporte e disposição do lodo químico primário R$ 15259,72. Embora os valores pagos pela empresa para dispor o resíduo sejam baixos, considerando a demanda de locais para disposição de resíduos pelas indústrias, o valor gasto poderia ser utilizado para tratar o lodo possibilitando sua utilização. CLASSIFICAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-QUÍMICA DO LODO Quanto a classificação do resíduo, nenhum dos parâmetros analisados no substrato obtido através do ensaio de lixiviação foi superior aos limites máximos estabelecidos no anexo F da norma NBR 10004 (ABNT, 2004). No ensaio de solubilização, os elementos alumínio e ferro foram encontrados em concentrações superiores aquelas definidas no anexo G da norma. Sendo assim, de acordo com os ensaios, o lodo químico primário gerado na etapa de coagulação/floculação do tratamento de efluentes da indústria química foi classificado como classe II A, não inerte. Entretanto, 50% do efluente que dá origem ao lodo primário da indústria química é proveniente do curtume experimental. Lodos provenientes do tratamento de efluentes líquidos originados no processo de curtimento de couro ao cromo (código K195) constam no anexo B da norma NBR 10004, lista de resíduos perigosos de fontes fixas, como perigosos, independente do resultado dos ensaios de lixiviação e solubilização. A caracterização físico-química do lodo químico primário encontra-se no quadro 1: ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 5

Quadro 1: Caracterização físico-química do lodo químico gerado na etapa primária do tratamento de efluentes da indústria química TFL do Brasil Parâmetro Unidade Concentração Método ph 12,34 Eletrometria ST g/kg 74,62 Teor STV 50,28 Cinzas % 15,35 Gravimetria Umidade 61,12 Nitrogênio Total 41,2 mg/l Nitrogênio Amoniacal 21,7 Titulometria Fósforo Alumínio 827,87 1474,27 Cálcio 24325,77 Sódio 690,85 Zinco 127,80 Cobre 4,00 Ferro 433,81 Manganês 19,36 Espectrometria de Emissão Atômica Potássio 104,96 Cádmio 0,05 Bário 7,51 Boro 2,81 Selênio mg/kg 0,05 Molibdênio 0,05 Fenol 7,092 Sulfetos 7,873 Colorimetria Teor de Cromo Hexavalente 89,71 Teor de Cromo Total 210,99 Teor de Arsênio < 0,020 Teor de Chumbo 30,903 Teor de Mercúrio < 0,05 Espectrofotometria Absorção Atômica Teor de Níquel 3,395 Cianeto Total < 0,025 Óleos e Graxas Totais 131,37 Óleos e Graxas Mineral 44,79 Gravimetria - Extração Soxhlet Óleos e Graxas Animal/Vegetal 86,58 Densidade g/cm 3 0,82 Refratometria Ao observar o quadro 1 pode-se constatar que o lodo químico primário possuí características de lodo de curtume desejáveis para utilização agrícola, como a alta concentração de cálcio (24325,77 mg/kg), que torna o lodo um bom corretivo para solos ácidos, bem como, quantidade desejável de matéria orgânica (50,28% de STV), que pode melhorar as propriedades físico-químicas do solo. Ao se tratar de macronutrientes, especialmente de Nitrogênio, para aplicação do lodo ao solo como fonte de nutrientes, o mesmo necessita ser misturado a outros resíduos orgânicos com alto teor de Nitrogênio devido à baixa concentração desse elemento no resíduo. Os metais pesados encontrados no lodo não ultrapassaram os limites máximos estabelecidos pela Resolução 375 (CONAMA, 2006) que estabelece parâmetros para utilização agrícola de lodos de esgoto. Boa parte dos micronutrientes foi encontrada no lodo em concentrações típicas em solos. Entretanto, o lodo contém cromo hexavalente, metal potencialmente toxico não contemplado nesta legislação por ser originado em processos industriais. 6 ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental

O lodo possui concentração considerável de alumínio, que se deve à utilização do policloreto de alumínio como coagulante na etapa primária do tratamento de efluentes. Em lodos com alta concentração de Alumínio, a recuperação de coagulante torna-se uma alternativa interessante. No entanto, no caso da indústria química em questão, que gera em média 6426 kg de lodo por mês, a quantidade recuperada seria muito pequena. Considerando a concentração de Alumínio do lodo (1474,27mg/kg), se 84,2% do Alumínio for recuperado (quantidade de coagulante recuperada em lodo de esgoto no estudo de Xu et. al, 2008) seriam recuperados 7,97 kg de Alumínio por mês. Considerando ainda as despesas com produtos químicos, equipamentos e mão de obra, a recuperação de coagulante do lodo gerado na empresa torna-se economicamente inviável. CONCLUSÕES Nenhum dos parâmetros analisados no substrato obtido através do ensaio de lixiviação foi superior aos limites máximos estabelecidos no anexo F da norma NBR 10004 (ABNT, 2004). No ensaio de solubilização, os elementos Alumínio e Ferro foram encontrados em concentrações superiores àquelas definidas no anexo G da referida norma. De acordo com os padrões por ela estabelecidos, o lodo químico primário gerado na etapa de coagulação/floculação do tratamento de efluentes da indústria química TFL do Brasil foi classificado como classe II A, não inerte. O lodo químico gerado na TFL possui características de lodo de curtume desejáveis para utilização agrícola, como a alta concentração de cálcio, que torna o lodo um bom corretivo para solos ácidos, e a grande quantidade de matéria orgânica, que pode melhorar as propriedades físico-químicas do solo. Ao se tratar de aplicação do lodo ao solo como fonte de nitrogênio para determinada cultura, o mesmo necessita ser misturado a outro resíduo orgânico rico em nitrogênio, devido à baixa concentração desse elemento no lodo químico primário. Os metais pesados encontrados no lodo não ultrapassaram limites máximos estabelecidos pela Resolução 375 (CONAMA, 2006) para lodo de esgoto. Boa parte dos micronutrientes foram encontrados no lodo em concentrações típicas em solos. Entretanto, como 50% do efluente bruto que dá origem ao lodo químico primário é originado no curtume experimental da empresa, em que se utiliza cromo para o curtimento do couro, o resíduo é automaticamente considerado como perigoso por constar no anexo B da NBR 10004 (ABNT, 2004) como resíduo perigoso de fonte fixa, devendo ser encaminhado para aterro industrial. Sugere-se que a etapa de coagulação/floculação do efluente do curtume seja realizada separadamente aos efluentes provenientes de outras fontes, possibilitando que 50% do lodo gerado pela TFL do Brasil não seja considerado como perigoso, nem enviado para aterro industrial, podendo ser utilizado na agricultura. O lodo proveniente da coagulação do efluente do processo industrial, dos laboratórios, da expedição e lavagem de embalagens, após a prensagem, poderá ser encaminhado para compostagem e posterior utilização agrícola. Para isso, sugere-se a realização de análise para determinação da relação carbono/nitrogênio do lodo, para avaliar a possibilidade de compostagem deste resíduo, ou a sua incorporação em um processo de cocompostagem, misturado a outro resíduo, permitindo o aproveitamento do seu potencial agrícola. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 10004 - Classificação de Resíduos, 61 páginas, Rio de Janeiro, 2004. 2. CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente. 2006. Resolução nº 375 de 29 de agosto de 2006. p. 6. Disponível em: http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res06/res37506.pdf. Acessado em: Agosto/2010. 3. CRUZ, Clovis Oliveiro Heiden da; MITTEREGER Júnior, Horst; BRAUN, José Everton. Estudos Preliminares da Produção de Biogás e Subprodutos a partir do lodo primário originado do tratamento de efluentes de curtume. Revista da Associação Brasileira dos Químicos e Técnicos da Indústria do Couro, Estância Velha, v. 210, p.40-45, 2010. ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 7

4. FERNANDES, Patrícia de Freitas. Reaproveitamento do Lodo da Estação de Tratamento de Efluentes de uma Indústria Cerâmica. 2002. 81 f. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2002. 5. ANDREOLI, Cleverson Vitório; PINTO, Marcelo A. Teixeira. Processamento de Lodos de Estação de Tratamento de Esgotos. In: ANDREOLI, Claverson Vitório et al. Resíduos sólidos do saneamento: processamento reciclagem e disposição final, 2001. Projeto PROSAB. 6. MARTINS, I.; VOUTZA, D.; SAMARA, C. Assesment of the environmental hazard from municipal and industrial wastewater treatment sludge by employing chemical and biological methods. Ecotoxicology And Environmental Safety, Thessaloniki, v. 62, p.397-407, 2004. 8 ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental