J U R I S P R U D Ê N C I A D O T R I B U N A L D E J U S T I Ç A D A U N I Ã O E U R O P E I A ( 3 º. T R I M E S T R E D E 2 0 1 5 )



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Transcrição:

i J U R I S P R U D Ê N C I A D O T R I B U N A L D E J U S T I Ç A D A U N I Ã O E U R O P E I A ( 3 º. T R I M E S T R E D E 2 0 1 5 ) TAX & BUSINESS Pretende-se, com a presente Informação Fiscal, apresentar uma síntese trimestral dos principais Acórdãos proferidos pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (doravante abreviadamente designado por TJUE ) à semelhança do que fazemos em relação às decisões do Centro de Arbitragem Administrativa ( CAAD ) e do Tribunal de Contas, relacionados com o domínio da Fiscalidade, analisando, caso a caso, o impacto e o contributo que tais decisões poderão vir a ter, do ponto de vista nacional. A presente Informação Fiscal é relativa ao 3.º Trimestre de 2015. A presente Informação destina-se a ser distribuída entre Clientes e Colegas e a informação nela contida é prestada de forma geral e abstracta. Não deve servir de base para qualquer tomada de decisão sem assistência profissional qualificada e dirigida ao caso concreto. O conteúdo desta Informação não pode ser reproduzido, no seu todo ou em parte, sem a expressa autorização do editor. Caso deseje obter esclarecimentos adicionais sobre este assunto contacte contacto@rffadvogados.pt. *** 01 Esta Informação é enviada nos termos dos artigos 22.º e 23.º do Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de Janeiro, relativa ao envio de correio electrónico não solicitado. Caso pretenda ser removido da nossa base de dados e evitar futuras comunicações semelhantes, por favor envie um email com Remover para o endereço email newsletter@rffadvogados.com. Best Lawyers - "Tax Lawyer of the Year" 2014 Legal 500 Band 1 Tax Portuguese Law Firm 2013 International Tax Review "Best European Newcomer" (shortlisted) 2013 Chambers & Partners Band 1 RFF Leading Individual 2013 Who s Who Legal RFF Corporate Tax Adviser of the Year 2013 IBFD Tax Correspondents Portugal, Angola and Mozambique www.rffadvogados.pt Praça Marquês de Pombal, 16 5º (Recepção)/6º 1250-163 Lisboa Portugal T: +351 215 915 220 F: +351 215 915 244 contacto@rffadvogados.pt

1. Número do processo: C-334/14 Nome: Estado Belga contra Nathalie De Fruytier Data: Acórdão de 2 de Julho de 2015 Assunto: Isenção de IVA na actividade de transporte de órgãos e de produtos biológicos de origem humana Factos Nathalie De Fruytier (doravante abreviadamente designada por N. De Fruytier ) exerce, a título independente, uma actividade de transporte de produtos biológicos de origem humana por conta de diversos hospitais e laboratórios, sob a autoridade e a responsabilidade de um médico. N. De Fruytier não liquida IVA aquando da facturação de tais serviços, decorrentes do exercício da sua actividade. No seguimento de uma acção de inspecção, a Administração Fiscal belga veio pronunciarse sobre o enquadramento de tal actividade, tendo entendido que deveria ter sido liquidado IVA, com referência aos serviços decorrentes da actividade exercida por N. De Fruytier. No âmbito do litígio decorrente da referida inspecção, foram submetidas, ao TJUE, as seguintes questões prejudiciais: 1) Uma actividade de transporte de produtos e de órgãos, para efeitos de análises médicas ou de assistência médica ou terapêutica, pode beneficiar da isenção de imposto prevista na Sexta Directiva, aplicável a prestações de serviços de assistência efectuadas no âmbito do exercício das actividades médicas? 2) Deve o conceito de outros estabelecimentos da mesma natureza devidamente reconhecidos ser interpretado no sentido de que inclui as sociedades privadas cujas prestações consistem no transporte de produtos humanos para efeitos de análise indispensável para alcançar as finalidades terapêuticas prosseguidas pelos estabelecimentos hospitalares e de assistência médica?

Apreciação do Tribunal Em linha com a jurisprudência já conhecida, o TJUE começou por considerar que as normas de isenção constantes da Sexta Directiva, devem ser interpretadas restritivamente, por constituírem excepções ao princípio geral segundo o qual, o IVA é cobrado sobre cada prestação de serviços efectuada a título oneroso por um sujeito passivo. Neste sentido, entendeu o Tribunal que é necessário interpretar os conceitos ínsitos nas normas de isenção, de acordo com os objectivos que se pretende que sejam prosseguidos, respeitando as exigências do princípio da neutralidade fiscal, inerente ao sistema comum do IVA. Neste âmbito, o TJUE procede ao esclarecimento dos conceitos de assistência médica e de prestações de serviços de assistência, recorrendo a jurisprudência já conhecida, da qual resulta que tais conceitos visam abranger prestações que tenham por finalidade diagnosticar, tratar, e na medida do possível, curar doenças e anomalias de saúde. Por esta razão, o TJUE considerou que o transporte de órgãos e de produtos biológicos de origem humana a favor de diversos hospitais e laboratórios não constitui, manifestamente, serviços de assistência médica ou prestações de serviços de assistência, na acepção da Sexta Directiva, dado que a actividade em apreço não integra o conceito de prestações médicas efectuadas com a finalidade de diagnosticar, tratar ou curar doenças ou anomalias de saúde, ou que têm por finalidade efectiva proteger, manter ou restabelecer a saúde (cfr. Acórdão Future Health Technologies C-86/09, de 10 de Junho de 2010). No que respeita à possibilidade de a actividade ora em apreço beneficiar de isenção, por configurar uma prestação de serviços estreitamente conexa com uma hospitalização ou assistência médica, o TJUE afastou tal entendimento, dado que (i) não se verifica tal é qualificação, (ii) o serviço não é assegurado por um organismo de direito público, (iii) nem é exercido em condições análogas às que vigoram para estabelecimentos hospitalares,

centros de assistência médica e de diagnóstico ou outros estabelecimentos da mesma natureza devidamente reconhecidos. Decisão O TJUE conclui que as isenções previstas na Sexta Directiva não se aplicam a uma actividade de transporte de órgãos ou de produtos biológicos de origem humana, para efeitos de análises clínicas ou de assistência médica ou terapêutica exercida por um profissional independente, tendo em conta que este não pode ser qualificado de organismo de direito público nem de estabelecimento hospitalar, centro de assistência médica, centro de diagnóstico, ou qualquer outro estabelecimento da mesma natureza devidamente reconhecido, que opere em condições sociais análogas às que vigoram para os organismos de direito público. Implicações no direito português A presente decisão contribui para a interpretação das normas do Código do IVA que consagram isenções e, em concreto, do artigo 9.º, número 2 do Código do IVA, que prevê a isenção deste imposto para as prestações de serviços médicos e sanitários e as operações com elas estreitamente conexas efectuadas por estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares. 2. Número dos processos: C-331/14 Nome: Petar Kezić e Trgovina Prizma contra República da Eslovénia Data: Acórdão de 9 de Julho de 2015 Assunto: Sujeitos passivos de IVA: afectação do património pessoal de uma pessoa singular que exerce a profissão de empresário em nome individual Factos Petar Kezić (doravante abreviadamente designado por P. Kezić ) actua como empresário em nome individual, desde 1995, sob a firma Trgovina Prizma, tendo adquirido sete

parcelas de terreno, a título pessoal (e não na qualidade de empresário em nome individual). Duas das parcelas foram adquiridas a uma pessoa singular (em 1998 e 2000), e as outras cinco, a uma sociedade comercial (em 2001 e 2003). Não foi liquidado IVA aquando das referidas aquisições. Posteriormente, P. Kezić obteve as licenças necessárias para construir um centro comercial, nas sete referidas parcelas, tendo iniciado as obras de construção, de seguida, na qualidade de empresário em nome individual. Em 2003, P. Kezić afectou ao património da sua empresa as cinco parcelas adquiridas em último lugar, por um valor decorrente da avaliação realizada por um perito judicial. Os outros dois terrenos mantiveram-se na esfera do seu património pessoal (doravante designados por terrenos em causa ). Mais tarde, em 2004, P. Kezić vendeu o mencionado centro comercial e, bem assim, as sete parcelas de terreno subjacentes à sua construção. Assim, (i) na qualidade de empresário em nome individual, P. Kezić procedeu à venda das cinco parcelas e da parte correspondente do centro comercial, tendo liquidado IVA aquando desta transmissão e, (ii) como pessoa singular, procedeu à venda das restantes parcelas e da parte correspondente do centro comercial, neste caso, sem liquidar IVA. A Autoridade fiscal eslovena, por considerar que a venda dos terrenos em apreço se enquadrava na actividade económica exercida por P. Kezić na qualidade de empresário em nome individual, exigiu-lhe o pagamento do IVA referente a essa venda. No âmbito do litígio que opôs a Autoridade fiscal eslovena a P. Kezić, foi submetida, ao TJUE, uma questão prejudicial, tendo em vista clarificar se as disposições da Sexta Directiva devem ser interpretadas no sentido de que se deve considerar que uma pessoa, pelo facto de não ter contabilizado os terrenos nos bens imobilizados da sua empresa e por não ter liquidado IVA aquando da sua aquisição, pode ser dispensado da liquidação de IVA, aquando da correspondente venda, por ausência de incidência subjectiva.

Apreciação do Tribunal O TJUE começa por esclarecer que, de acordo com as normas da Sexta Directiva, só haverá sujeição a IVA nos casos em que se verifiquem entregas de bens e prestações de serviço, realizadas onerosamente, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade. Com efeito, nos casos em que um sujeito passivo realiza uma operação a título pessoal e não age como sujeito passivo de IVA, o TJUE tem entendimento que tal operação não fica abrangida pelo âmbito de incidência do imposto (cfr. Acórdão Armbrecht, C-291/92, de 4 de Outubro de 1995 e o Acórdão Bakcsi, C-415/98, de 8 de Março de 2002). A este respeito, o TJUE tem entendido que o conceito de sujeito passivo deve ser definido por relação ao conceito de actividade económica, englobando todas as actividades de produtor, de comerciante ou de prestador de serviços e, em particular, as operações que implicam a fruição de um bem corpóreo ou incorpóreo com vista a obter dele receitas com carácter de permanência (cfr. Acórdão Slaby C-181/10, de 15 de Setembro de 2011). Entende também o TJUE que, em caso de utilização de um bem de investimento quer para fins profissionais quer privados, o interessado pode optar, para efeitos de IVA, por afectar totalmente esse bem ao património da sua empresa ou por conservá-lo totalmente no seu património pessoal (excluindo-o do âmbito de incidência do IVA), ou ainda por integrá-lo na sua empresa apenas na parte correspondente à utilização profissional efectiva. Contudo, entende o TJUE que não se pode concluir que a venda de um terreno afecto ao património pessoal de um sujeito passivo não está, por si só, sujeita a IVA. De facto, as operações realizadas a título oneroso por um sujeito passivo estão sujeitas a IVA desde que o sujeito passivo esteja a agir enquanto tal, pelo que se revela necessário que, para além da afectação ao seu património pessoal, a transmissão seja efectuada pelo sujeito passivo, não no quadro da sua actividade económica, mas no quadro da gestão e administração do seu património pessoal. Resulta ainda da jurisprudência que o simples exercício do direito de propriedade pelo seu titular não pode, em si mesmo, ser considerada uma actividade económica.

Por outro lado, o TJUE, a respeito da venda de um terreno para construção, já determinou em decisão anterior, que o facto de o interessado ter motivações subjacentes de comercialização imobiliária, implementando meios semelhantes aos utilizados por um produtor, comerciante ou prestador de serviços, configura um critério de apreciação relevante no âmbito da incidência deste imposto, Considerando o exposto, no caso concreto, o TJUE entende que os terrenos em apreço adquiridos por P. Kezić, no seu conjunto, configuram o exercício da actividade económica enquanto empresário, atendendo a que a sua aquisição foi condição necessária para a construção do centro comercial mencionado e, bem assim, que a realização de obras de preparação dos terrenos constituem iniciativas relevadoras de que a venda dos terrenos não se enquadra no simples exercício do direito de propriedade. Decisão O TJUE entendeu que P. Kezić agiu como sujeito passivo de IVA, aquando da venda dos terrenos em causa, pelo que a referida operação devia ter sido sujeita a imposto. Implicações no direito português O presente Acórdão contribuiu para a interpretação das normas de incidência subjectiva do IVA, aprofundando o conceito de exercício de uma actividade económica, nos casos de transmissão de imoveis. 3. Número dos processos: C-255/14 Nome: Robert Michal Chmielewski contra Nemzeti Adó- és Vámhivatal Dél-alföldi Regionális Vám- és Pénzügyőri Főigazgatósága. Data: Acórdão de 16 de Julho de 2015 Assunto: Controlo das somas em dinheiro líquido que entram ou saem da União Europeia

Factos Robert Michal Chmielewski (doravante abreviadamente designado R. M. Chmielewski ), proveniente da Sérvia, entrou em território húngaro, sem declarar a soma de dinheiro líquido que levava consigo. No seguimento do transporte da quantia em apreço, a Administração tributária Húngara aplicou uma coima a R. M. Chmielewski com o fundamento de que este não tinha cumprido o dever que lhe incumbia por força do Regulamento n.º 1889/2005 e da Lei XLVIII, ao não ter declarado o referido montante no momento que entrou no território da UE. O referido Regulamento prevê que qualquer pessoa singular que entre ou saia da Comunidade Europeia, com um montante líquido igual ou superior a 10.000 deve declarar a soma que transporta às autoridades competentes. O mesmo regulamento determina que cada Estado-membro pode determinar e aplicar as sanções a aplicar nas situações de incumprimento da obrigatoriedade declarativa em apreço. Adicionalmente de acordo com o disposto na legislação aplicável, qualquer pessoa singular que entre ou saia da Comunidade, e que não cumpra (ou cumpra de maneira incompleta) o dever de declaração em apreço, deve pagar no local, uma coima fixada em (forints húngaros HUF ) de montante equivalente a: (i) 10% da soma de dinheiro líquido em sua posse, quando estar for igual ou superior a 10.000 euros e não exceda os 20.000 euros; (ii) 40% da soma de dinheiro líquido em sua posse, quando esta for superior a 20.000 euros e não exceda os 50.000 euros; (iii) a 60% da soma de dinheiro líquido em sua posse, quando esta for superior a 50.000 euros. No âmbito do litígio que opôs R. M. Chmielewski à Administração tributária Húngara, foi submetida ao TJUE a seguinte questão prejudicial: a coima efectivamente aplicada é contrária à legislação aplicável da qual decorre que as sanções estabelecidas no direito

nacional devem ser efectivas, dissuasivas e, simultaneamente, proporcionadas à infracção jurídica? Apreciação do Tribunal O TJUE começa por esclarecer que o Regulamento aplicável visa, através do princípio de declaração obrigatória de dinheiro líquido, prevenir, dissuadir e evitar a introdução do produto de actividades ilícitas no sistema financeiro, bem como recolher informações sobre esses movimentos. De acordo com a jurisprudência constante do TJUE, nestes casos, os Estados-membros são competentes para escolher as correspondentes sanções que se lhes afigurem adequadas. Todavia, os Estados-membros estão também obrigados a exercer essa competência de acordo com o disposto no direito da UE e, por conseguinte, em conformidade com os princípios gerais (nomeadamente, o princípio da proporcionalidade). Considerando o desígnio do princípio da proporcionalidade, as medidas administrativas ou repressivas de uma legislação nacional, não podem exceder os limites do estritamente necessário na prossecução dos seus objectivos, pelo que as sanções aplicáveis devem ser adequadas à gravidade da acção subjacente, designadamente assegurando uma conexão entre os meios e fins que visa atingir, neste caso, um efeito verdadeiramente dissuasivo. Neste contexto, os Estados-membros dispõem de uma margem de apreciação discricionária relativamente à legislação interna das sanções adoptadas no intuito de assegurar o cumprimento do dever de declaração acima mencionado, pressupondo que uma violação deste dever possa ser sancionada de maneira simples, efectiva e eficaz. Neste âmbito, o Tribunal entende que, tendo em conta a natureza da infracção em causa, uma coima cujo montante corresponde a 60% da soma de dinheiro líquido não declarada, quando esta coima for superior a 50.000 euros, não se afigura proporcionada, por ultrapassar os limites do que é necessário para garantir o respeito deste dever e assegurar a realização dos objectivos prosseguidos pelo Regulamento aplicável.

Decisão O TJUE entendeu que o Regulamento que dispõe sobre o controlo dos montantes líquidos que entram ou saem da UE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo em apreço, que determina a aplicação de uma coima correspondente a 60% da soma de dinheiro líquido não declarada, quando esta soma for superior a 50 000 euros, se afigura desproporcional à norma violada. Implicações no direito português A presente decisão contribuiu para a clarificar o alcance do princípio da proporcionalidade, em concreto, no que respeita à determinação de coimas aplicáveis. 4. Número do processo: C-463/14 Nome: Asparuhovo Lake Investment Company OOD contra Direktor na Direktsia Data: Acórdão de 3 de Setembro de 2015 Assunto: Dedução do IVA incidente na aquisição de serviços de consultoria por avença Factos A sociedade Asparuhovo Lake Investment Company (doravante abreviadamente designada por ALIC ), cuja actividade tem como objecto principal a agricultura, pecuária e actividades auxiliares, celebrou contratos de avença de serviços de consultoria com quatro sociedades. Tais contratos de prestação de serviços caracterizam-se pela obrigação de os prestadores estarem disponíveis fora do horário de expediente, de obterem e trocarem documentação e informação necessária entre as partes, de assegurarem a protecção dos interesses da ALIC e, bem assim, como estarem obrigados a não celebrar qualquer contrato semelhante com terceiros contendo interesses opostos aos da ALIC, ou que estejam em posições de concorrência directa com esta sociedade.

Em contrapartida, a ALIC obrigou-se ao pagamento de uma remuneração semanal aos mencionados prestadores de serviços. Neste âmbito, as referidas sociedades procederam à dedução do IVA, constante nas facturas que lhes foram emitidas pelos prestadores de serviços. Após a realização de uma inspecção fiscal, a Administração fiscal da Bulgária recusou a dedução de tal IVA, por parte da ALIC, por entender que não foi feita prova do tipo, quantidade e natureza dos serviços realmente prestados, designadamente pelo facto de nenhum documento original fazer menção ao número de horas executadas, nem à forma como os preços dos serviços tinham sido fixados. No âmbito do litígio que opôs a Administração fiscal búlgara à ALIC, foram submetidas ao TJUE as seguintes questões prejudiciais: 1) Devem os artigos da Directiva IVA, referentes ao conceito de prestação de serviços, ser interpretados no sentido de abranger os contratos de avença para prestação de serviços de consultoria como os do processo principal, nos quais o prestador de serviços, que dispõe de pessoal qualificado para a prestação dos serviços, se colocou à disposição do cliente durante o período de vigência do contrato e se obrigou a abster-se de celebrar contratos com objecto equiparável com concorrentes do cliente? 2) Devem os artigos da Directiva IVA, referentes ao facto gerador do imposto, ser interpretados no sentido de que este, no caso de prestações de serviços de consultoria por avença, ocorre no termo do prazo acordado para o pagamento, independentemente de o cliente ter ou não usufruído das prestações de serviços que o consultor disponibilizou ao cliente e da respectiva frequência? 3) Deve o artigo da Directiva IVA, sobre a exigibilidade do imposto, ser interpretado no sentido de que aquele que presta serviços no âmbito de um contrato de avença para prestação de serviços de consultoria se encontra obrigado a liquidar o IVA relativo às prestações de serviços no termo do prazo para o qual foi acordado o pagamento da avença, ou essa obrigação só se constitui quando o cliente tiver usufruído, no respectivo período de tributação, das prestações de serviços do consultor?

Apreciação do Tribunal Relativamente à primeira questão, referente à interpretação do conceito de prestação de serviços, esclarece o TJUE que o facto de os serviços ora em apreço se assemelharem, em certa medida, a uma cláusula de exclusividade, não é susceptível de alterar o carácter tributável do referido contrato. Com efeito, entende o TJUE que o conceito de «prestação de serviços» abrange os contratos de avença para prestação de serviços de consultoria a uma empresa, no âmbito dos quais o prestador de serviços se colocou à disposição do cliente durante o período de vigência do contrato. Relativamente à segunda e terceira questões prejudiciais, relativas ao facto gerador e exigibilidade do imposto, o Tribunal pronunciou-se em conjunto, referindo que o serviço ora em apreço consiste, essencialmente, em estar permanentemente à disposição do cliente para lhe prestar serviços de consultoria e que é remunerado através de montantes fixos, pagos periodicamente, devendo ser considerado como efectuado no período a que se reporta o pagamento, tenha o prestador de serviços efectivamente prestado aconselhamento ao seu cliente durante esse período ou não. Decisão O TJUE declarou que o conceito de «prestação de serviços» abrange os contratos de avença para prestação de serviços de consultoria a uma empresa, designadamente de ordem jurídica, comercial e financeira, no âmbito dos quais o prestador se colocou à disposição do cliente durante o período de vigência do contrato. No que toca aos contratos de avença relativos à prestação de serviços de consultoria, como o caso em apreço, o facto gerador do imposto e a exigibilidade do mesmo ocorrem no termo do prazo acordado para o pagamento, independentemente da questão de saber se o cliente usufruiu efectivamente dos serviços do prestador e do número de vezes que o fez.

Implicações no direito português Esta decisão contribui para a interpretação do conceito de prestação de serviços, em concreto, nos casos de serviços prestados em contrato de avença. Lisboa, 30 de Novembro de 2015 Rogério M. Fernandes Ferreira Marta Machado de Almeida Rita Arcanjo Medalho Pedro Miguel Callapez Tiago Fonte Gonçalves