III-049 - TRATAMENTO BIOLÓGICO ANAERÓBIO CONJUGADO DE RESÍDUOS SÓLIDOS E LÍQUIDOS. Sueli Farias de Souza (1) Graduanda do Curso de Química Industrial da UEPB. Bolsista de Iniciação Cientifica do CNPq/PIBIC/UEPB. Valderi Duarte Leite Doutor em Hidráulica e Saneamento pela Escola de Engenharia de São Carlos-USP. Professor Titular do Departamento de Química da UEPB. Wilton Silva Lopes Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente pelo PRODEMA/UFPB/UEPB. Químico Industrial pela UEPB. Professor do Departamento de Química da UEPB. Gilson Barbosa Athayde Junior Doutor em Saneamento da Universidade de Leeds (Inglaterra). Engenheiro Civil pela UFPB. Josiane Silva de Oliveira Graduanda do Curso de Química Industrial da UEPB. Endereço (1) : Rua Gilberto Pereira, nº 361, Liberdade, Campina Grande PB. CEP: 58105-355. Brasil Tel: (083) 342-9864 - e-mail: xwa@bol.com.br. RESUMO O processo biológico anaeróbio visa estudar o estado de putrefação de resíduos sólidos orgânicos na ausência de oxigênio molecular através de reações bioquímicas exercidas por microrganismos específicos. O objetivo da pesquisa foi avaliar a influência da recirculação de esgoto sanitário em reator anaeróbio de batelada no tratamento conjugado de resíduos sólidos e líquidos na tentativa de minimizar o tempo de estabilização. O sistema experimental foi instalado e monitorado na Estação Experimental de Tratamento Biológico de Esgoto Sanitário-EXTRABES, na cidade de Campina Grande PB. Foram utilizados dois reatores com capacidade unitária de 50L, onde um dos reatores era recirculado com esgoto domestico (reator A) e outro recirculado com água destilada (reator B). O substrato utilizado para alimentação dos reatores foi caracterizado física e quimicamente. Os resultados obtidos ao longo do período de monitoração foram de 7,0 unidades de ph (reator A) e 5,0 (reator B); AT: 950 a 4437 mg de CaCO 3 /L (reator A) e 865 a 5250 mg de CaCO 3 /L (reator B); AGV: 82 a 9600 mg de H AC /L (reator A) e 1032 a 10100 mg de H AC /L (reator B); DQO: 1104 a 55413 mg de O 2 /L (reator A) e 8895 a 39028 mg de O 2 /L (reator B); STV: 424 a 24156 mg/l (reator A) e 1990 a 21848 mg/l (reator B); NTK: 201 a 862 mg/l (reator A) e 319 a 907 mg/l (reator B); NH 4 + : 100 a 498 mg/l (reator A) e 233 a 526 mg/l (reator B). Analisando os dados pode-se concluir que o reator recirculado com esgoto doméstico apresentou maior eficiência no processo de bioestabilização quando comparado ao reator recirculado com água destilada. PALAVRAS-CHAVE: Resíduos sólidos orgânicos, esgoto doméstico, tratamento conjugado, reator de batelada. INTRODUÇÃO No Brasil diariamente são gerados 125 mil toneladas de resíduos sólidos domiciliares, com cerca de 56% (percentagem em peso) é constituída por resíduos sólidos orgânicos que são lançados de forma indiscriminada causando problemas de ordem sanitária extremamente graves, pois uma vez lançados no meio ambiente inadequadamente a fração orgânica putrescível libera líquidos percolados oriundos do processo de degradação poluindo ar (através da liberação de gases nocivos), a água (através de infiltrações do percolado em corpos aquáticos), solo (causando erosões) e dificultando o controle epidemiológico. Portanto, se faz necessário o estudo de técnicas de tratamento para os resíduos sólidos orgânicos com o objetivo de minimizar os impactos causados, além de aproveitar todo material tratado. Uma alternativa é o tratamento anaeróbio, no qual o substrato é submetido a processos bioquímicos ocorridos em diversas etapas capazes de estabilizar o material orgânico através da ação de ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1
microrganismos que atuam simultaneamente em ambiente livre de oxigênio molecular. Para que haja a conversão do material orgânico é indispensável o estudo de condições que favoreçam a continuidade do processo (umidade, temperatura ideal, faixa de ph adequada e potencial de óxido-redução), haja vista, o tempo requerido para uma total estabilização do resíduo sólido orgânico. Numa contextualização geral, a principal desvantagem atribuída aos tratamentos anaeróbios é o longo período de tempo necessário para bioestabilização, uma vez que dependendo das atividades biológicas, se faz indispensável a exploração de técnicas que reduzam este tempo. Uma forma viável seria a utilização do esgoto doméstico no tratamento conjugado da fração putrescível dos resíduos sólidos urbanos. O esgoto doméstico seria utilizado como líquido de recirculação na tentativa de catalisar o processo de degradação do material, mediante ações de bactérias existentes no substrato somadas as bactérias existentes no esgoto recirculado. O objetivo deste trabalho foi avaliar a eficiência da recirculação de esgoto doméstico no processo de bioestabilização anaeróbia de resíduos sólidos orgânicos. METODOLOGIA O sistema experimental era formado por dois reatores anaeróbios de batelada com capacidade unitária de 50 L cada, constituído de dispositivo de coleta do percolado, medidor de biogás e dispositivo para recirculação de líquido. Na Figura 1 é apresentado um esquema das unidades constituintes do sistema experimental. Dispositivo para recirculação de esgoto domestico Dispositivo para coleta de gás Biogá Substrato Filtro Dispositivo para coleta de percolado Figura 1 Esquema das unidades constituintes do sistema. Os reatores diferenciam-se entre si pela recirculação de esgoto sanitário (reator A) e água destilada (reator B). Os reatores foram instalados e montados na Estação Experimental de Tratamento Biológico de Esgoto Sanitário EXTRABES, nas imediações do bairro do Tambor, na cidade de Campina Grande PB. Na Tabela 1 são apresentados os parâmetros operacionais aplicados aos reatores. Tabela 1 Parâmetros operacionais aplicados aos reatores. Parâmetros Reatores TU (%) Mt (kg) Mr (kg) Mrm (kg) Vr (L) Lr (espécie) COA (Kg/m 3 ) A B 78 78 20 20 15 15 5 5 50 50 Esgoto Doméstico Água destilada TU= Teor de umidade; Mt = Massa total; Mr = Massa do resíduo ; Mrm = Massa do rumem; Vr = Volume do reator; Lr = Líquido utilizado na recirculação; CO= Carga orgânica aplicada. 400 400 O carregamento dos reatores foi realizado após a determinação da umidade, ph, carbono total e DQO do substrato, como também do volume útil de cada reator e do peso da massa adicionada. Terminado o carregamento, os reatores foram lacrados para evitar possível infiltração de ar. Neste trabalho, a parte analítica foi aplicada as três frações: sólida, liquida e gasosa. As analises foram realizadas utilizando-se os métodos preconizados por APHA (1995). As amostras líquidas (percolado) foram coletadas e ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 2
analisadas com freqüência semanal (durante um período de 122 dias), após este período passaram a ser analisadas quinzenalmente. O biogás produzido foi medido semanalmente, usando-se o método de deslocamento de água, que apesar de não apresentar resultados de grande precisão, se bem controlados, fornecem resultados confiáveis. RESULTADOS E DISCUSSÕES Na Tabela 2 são apresentados os dados da caracterização física e química do substrato alimentado aos reatores. Tabela 2 - Caracterização Física e Química do Substrato. PARÂMETROS VALOR EXPERIMENTAL ph Umidade(%) Sólidos Totais(%) Sólidos Totais Fixos(%) Sólidos Totais Voláteis(%) Carbono Orgânico Total(%) Nitrogênio Total(%) Demanda Química de Oxigênio (%) Relação C/N 4,8 80 20 9,08 90,92 50,51 2,4 26 21 Analisando os dados da Tabela 2, observa-se que o ph do substrato ficou em torno de 5, enquanto a DQO representou 26% da massa total dos resíduos sólidos orgânicos em base seca. Na Tabela 3 são apresentados dados de caracterizações gerais físicas e químicas ao esgoto doméstico bruto utilizado no processo de bioestabilização do material do reator. Tabela 3 - Caracterização Física e Química do Esgoto Bruto. PARÂMETROS VALOR EXPERIMENTAL ph Ácidos Graxos Voláteis(mg/L) Alcalinidade Total(mg/L) Nitrogênio Orgânico (mg/l) Nitrogênio Amoniacal (mg/l) Nitrogênio Total(mg/L) Demanda Química de Oxigênio (mg/l) Fósforo Total (mg/l) Na Figura 2, são apresentados os perfis dos dados de ph nos líquidos percolados durante o período de monitoração. 7,6 70,8 402 16,7 35,8 52,5 359 6,2 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 3
Fig. 2 Perfil dos dados de ph nos líquidos percolados. Na Figura 2, observa-se que em ambos os reatores até 100 dias de operação os líquidos percolados apresentavam características ligeiramente ácidas em torno de 5 unidades de ph. Após o período de 400 dias de operação, observase uma variação significativa nos valores de ph dos líquidos percolados do reator A (reator recirculado com esgoto doméstico), passando de valores ligeiramente ácidos (em torno de 5,0) para valores próximos a neutralidade (em torno de 7,0). No mesmo período o ph dos líquidos percolados do reator B (reator recirculado com água destilada), apresentaram características estacionárias em torno de 5,0 unidades de ph. Nas Figuras 3 e 4 são apresentadas as evoluções temporais das concentrações de Alcalinidade Total (AT) e Ácidos Graxos Voláteis (AGV) respectivamente nos líquidos percolados dos dois reatores. Fig. 3 Evolução temporal das concentrações de Alcalinidade Total nos líquidos percolados. Fig. 4 Evolução temporal das concentrações de Ácidos Graxos Voláteis nos líquidos percolados. Na Figura 3 observa-se que a concentração de Alcalinidade Total dos líquidos percolados do reator A (reator recirculado com esgoto doméstico) decresceu simultaneamente até os 100 primeiros dias de monitoração. Entre os 100 e 220 dias a concentração de Alcalinidade Total variou de 1050 a 4416 mg de CaCO 3 /L passando a decrescer novamente no período de 400 a 500 dias. O não tamponamento do processo de bioestabilização, deverá está associado diretamente a forte hidrólise do material orgânico, proporcionando a liberação acentuada de Ácidos Graxos Voláteis. No reator B (reator recirculado com água destilada) o processo de bioestabilização ocorre de forma muito lenta, não tendo acontecido a redução da Alcalinidade Total na mesma intensidade do reator A. Na Figura 4, observa-se que as concentrações de Ácidos Graxos Voláteis nos líquidos percolados do reator A, sofreram leves flutuações que variaram entre 79,2 a 9600 mg de H AC /L; enquanto no reator B, as concentrações nos líquidos percolados, sofreram bruscas variações em seus respectivos valores, dados que quando comparados aos valores adquiridos das concentrações nos líquidos percolados do reator A não apresentaram um decréscimo significativo. Nas Figuras 5 e 6 são apresentados os perfis das concentrações de Demanda Química de Oxigênio (DQO) e Sólidos Totais Voláteis (STV) respectivamente dos dois reatores. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 4
Fig. 5 Perfis das concentrações de Demanda Química de Oxigênio. Fig. 6 Perfis das concentrações de Sólidos Totais Voláteis. Na Figura 5, observa-se que a concentração da Demanda Química de Oxigênio (DQO) nos líquidos percolados do reator A, atingiu a magnitude máxima de 54138,19 mg de O 2 /L nos primeiros 50 dias de monitoração, decrescendo gradativamente para algo em torno de 15854,5 mg de O 2 /L aos 170 dias. No período 170 a 400 dias constatou-se variações da concentração de DQO nos líquidos percolados, sendo reduzido bruscamente a concentração de DQO após os 400 dias de monitoração do reator A. Quanto ao reator B, os líquidos percolados não apresentaram o mesmo pico de concentração de DQO que apresentou o reator A sendo a concentração máxima de DQO de 39028,09 mg de O 2 /L nos primeiros 50 dias de monitoração. Após este período foi constatado decréscimo significativo da concentração de DQO sempre menores magnitudes, quando comparado com os dados do reator A. O comportamento da concentração de DQO dos dois reatores demonstra que a massa de resíduos sólidos orgânicos quando recirculado continuamente com esgoto doméstico, o processo de bioestabilização acontece com maior intensidade em um espaço de tempo mais curto. Na Figura 6, os perfis das concentrações de Sólidos Totais Voláteis em ambos reatores apresentaram seus respectivos picos aos 280 dias de operação. Observou-se que as concentrações nos líquidos percolados do reator A, após o período de 280 a 376 dias sofreram bruscas oscilações, até atingirem patamares em torno de 424 mg/l de Sólidos Totais Voláteis, enquanto que no reator B os valores alcançados atingiram cerca de 2884 mg/l, evidenciando a influência da recirculação de esgoto na degradação da fração putrescível. Nas Figuras 7 e 8 são apresentados as evoluções temporais nas concentrações de Nitrogênio Total Kedjahl (NTK) e Nitrogênio Amoniacal (NH 4 + ) respectivamente nos líquidos percolados em ambos reatores. Fig. 7 Evolução temporal das concentrações de Nitrogênio Total Kedjahl nos líquidos percolados Fig. 8 Evolução temporal das concentrações de Nitrogênio Amoniacal nos líquidos percolados Na Figura 7, observa-se que os valores das concentrações de Nitrogênio Total Kedjahl nos líquidos percolados do reator A sofreram variações de decréscimos gradativos até atingirem um pico aos 245 dias de monitoração, logo após este período os valores das concentrações adquiriram um parcial decréscimo acompanhado de leves flutuações com ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 5
patamares em torno de 299,6 mg/l. As concentrações de Nitrogênio Total Kedjahl nos líquidos percolados do reator B sofreram leves flutuações, valores que permaneceram superiores em relação as concentrações nos líquidos percolados do reator A. Na Figura 6, observa-se aos primeiros 60 dias de monitoração as concentrações de Nitrogênio Amoniacal nos líquidos percolados do reator A apresentaram um leve acréscimo, após este período exatamente aos 74 dias os valores passaram a decrescer atingindo valores em torno de 100 mg/l, as concentrações dos líquidos percolados dos reatores A e B alcançaram concentração máxima aos 405 dias. Nos líquidos percolados do reator B as concentrações sofreram leves variações até atingir um patamar em torno de 259 mg/l. CONCLUSÃO Analisando os dados deste trabalho, pode-se concluir que: A recirculação de esgoto doméstico na massa de resíduos sólidos orgânicos tratada anaerobiamente, possibilita positivamente o encurtamento do processo de bioestabilização; Torna o processo de tratamento anaeróbio de resíduos sólidos orgânicos mais competitivo, quando comparado com outras formas de tratamento; O tratamento conjugado de resíduos sólidos e líquidos em mesmo sistema experimental, precisa continuar ser estudado, haja vista, a obtenção de parâmetros de projeto para que este tipo de alternativa tecnológica possa ser aplicado em escala real. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 6