UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DEPARTAMENTO DE MICROBIOLOGIA Ana Luísa Paiva Amaral MICRORGANISMOS INDICADORES DE QUALIDADE DE ÁGUA Belo Horizonte 2007
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DEPARTAMENTO DE MICROBIOLOGIA Ana Luísa Paiva Amaral MICRORGANISMOS INDICADORES DE QUALIDADE DE ÁGUA Monografia apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais para obtenção do Título de Especialista. ORIENTADOR: Prof. Dr. Carlos Augusto Rosa (Laboratório de Ecologia e Biotecnologia de leveduras / Departamento de Microbiologia / ICB / UFMG) Belo Horizonte 2007
Agradecimentos Agradeço a Deus por me guiar nesta jornada, possibilitando cumprir mais esta tarefa. Ao meu orientador Prof. Dr. Carlos Augusto Rosa pelo exemplo de profissional, pela paciência, amizade e incentivo, que foram de grande importância para a realização deste trabalho. A Adriana Oliveira Medeiros, revisora desta monografia. Aos professores do curso de Especialização em Microbiologia. Aos colegas do curso de pós-graduação em Microbiologia pelo incentivo e convivência agradável. Aos meus pais pelo apoio incondicional para que este projeto se concretizasse.
1 SUMÁRIO 1. Resumo... 2 2. Objetivo... 3 3. Relevância e Justificativa... 4 4. Microrganismos de interesse sanitário... 6 4.1. Grupo Coliforme... 6 4.1.1. Escherichia coli... 7 4.2. Enterococcus spp.... 9 4.3. Pseudomonas aeruginosa... 10 4.4. Staphylococcus aureus... 11 4.5. Clostridium perfringens... 12 4.6. Bactérias Heterotróficas... 13 4.7. Presença de leveduras em ambientes aquáticos... 14 5. Água para consumo... 18 5.1. Águas minerais... 20 6. Contaminação microbiológica de corpos d água naturais e os potenciais riscos à saúde humana... 21 7. Conclusão... 23 8. Referências bibliográficas... 24
2 1. RESUMO Diante de um problema crescente que vem sendo a utilização errônea dos recursos hídricos, surge a necessidade de um estudo maior a respeito desse bem natural tão necessário a sobrevivência do planeta. A integridade dos ecossistemas aquáticos vem sofrendo os impactos causados pelas atividades humanas e suas comunidades estão sujeitas às diversas alterações ambientais. A população microbiana aquática reflete as condições terrestres circundantes e as atividades ali exercidas, e os órgãos administrativos utilizam essa população, com alguns indicadores para classificar os corpos d água. A quantificação de microrganismos de interesse sanitário como os coliformes é de grande importância para a saúde pública, uma vez que sua presença indica contaminação por material fecal. Os microrganismos da microbiota intestinal indígena podem causar doenças e se tornar uma ameaça para o indivíduo quando ocorre um eventual desequilíbrio do ecossistema digestivo ou quando estes microrganismos alcançam sítios estéreis do corpo. Os enterococos têm sido propostos como indicadores também, devido à alta concentração nas fezes e alta taxa de sobrevivência no ambiente. A Pseudomonas aeruginosa por conta de sua versatilidade, é padrão de potabilidade no Brasil. Estafilococos responsáveis por infecções e produção de toxinas, clostridios devido à resistência aos tratamentos convencionais de água. Bactérias heterotróficas, só representam riscos se encontradas em altas concentrações, mas sua enumeração é utilizada como um parâmetro complementar aos coliformes. Assim como as leveduras, que só apresentam altas taxas onde os níveis de poluição orgânica são elevados. Sendo a água de importância vital ao indivíduo, a garantia de sua potabilidade e de suas condições higiênico-sanitárias é de grande importância para toda a população. Sob o aspecto da saúde pública, a água potável deve estar isenta de microrganismos do grupo coliforme, que podem ou não ser de origem fecal.
3 2. OBJETIVO - Através de revisão bibliográfica, indicar os principais microrganismos indicadores de qualidade de água, suas respectivas características e ocorrência.
4 3. RELEVÂNCIA E JUSTIFICATIVA Cada vez mais tem se chamado a atenção para a utilização racional dos recursos hídricos do nosso planeta, uma vez que, se não houver um controle maior deste bem natural, a procura será cada vez maior do que a demanda. O planeta Terra tem 75% de superfície líquida, sendo 97% de água salgada, 2% de geleiras, e 1% de água doce. O Brasil tem 8% da água doce do planeta, cerca de 112 bilhões de metros cúbicos. Aproximadamente 80% das águas nacionais estão na Amazônia, onde só se encontram 5% dos brasileiros. Os outros 20% das águas nacionais têm de abastecer 95% da população (CREA,1988). A integridade ecológica dos ecossistemas aquáticos continentais vem sofrendo com maior intensidade os impactos causados pelas atividades humanas nas últimas décadas e suas comunidades estão sujeitas às diversas alterações ambientais sendo, em muitos ambientes, substancialmente reduzidas ou mesmo eliminadas. Assim, a demanda crescente e contínua pelos recursos aquáticos, causadas pelo crescimento populacional, urbanização, industrialização e irrigação podem levar a uma rápida e contínua degradação deste ambiente (MEDEIROS, 2005). A vida aquática inclui interações entre os microrganismos, e entre os microrganismos e a fauna e flora constituintes do mesmo ambiente. Muitas espécies realizam alterações bioquímicas que reciclam os elementos e nutrientes da água, desempenhando assim um papel importante na manutenção do fluxo de nutrientes e ocupando posição-chave na cadeia alimentar do ambiente aquático. A população microbiana aquática reflete as condições terrestres circundantes, mostrando os efeitos de práticas domésticas, agrícolas e industriais, conduzindo assim a uma degradação da qualidade da água decorrente do impacto das atividades humanas. Os microrganismos encontrados em ambiente aquático são determinados pelas condições físicas e químicas que ocorrem naquele ambiente, e essas condições variam de um local para o outro e em relação a fatores como temperatura, luminosidade, ph e nutrientes. Algumas espécies microbianas são nativas em áreas ecológicas específicas, enquanto outras são transitórias, provenientes de atividades
5 humanas que geram um impacto na biodiversidade. Por exemplo, em águas que recebem esgotos domésticos com grande quantidade de nutrientes orgânicos, podem ser encontradas bactérias do grupo coliforme, como a Escherichia coli. A presença deste microrganismo na água pode indicar risco potencial a saúde, uma vez que o mesmo é proveniente do intestino grosso do homem e de animais de sangue quente, indicando assim contaminação fecal, isto acontece também com outras bactérias como os estreptococos fecais, e também vírus intestinais como o causador da Hepatite A ou poliomielite (GREENBERG et al., 1992). Os órgãos administrativos utilizam esses parâmetros para classificar os corpos d água quanto ao seu destino, uso e quanto a sua condição sanitária. (BRASIL, 2005). Pode-se citar também fatores prejudiciais ao crescimento microbiano como o lançamento de efluentes industriais em cursos d água, com elevados níveis de metais pesados. Pesquisas que levem em consideração as interações entre os ecossistemas aquáticos e terrestres são fundamentais para a conservação dos recursos hídricos e sua diversidade biológica (MEDEIROS, 2005). No presente trabalho serão tratados como tema as águas naturais e potáveis e os diversos fatores que possam influenciá-las de maneiras maléficas, limitar-se-á ao estudo de bactérias, fungos e leveduras. Serão levados em consideração microrganismos presentes no ambiente aquático como contaminantes. Serão observados também os limites estabelecidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente, Resolução 274 (2000) e 357(2005), para lazer e recreação de contato primário, e esclarecendo alguns critérios para considerar a potabilidade da água de acordo com a portaria nº 518 do Ministério da Saúde (2004). Serão citados ainda alguns microrganismos como Enterococcus spp., Pseudomonas aeruginosa, Staphylococcus aureus, Clostridium perfringens, Escherichia coli, bactérias heterotróficas, fungos filamentosos e leveduras.
6 4. MICRORGANISMOS DE INTERESSE SANITÁRIO 4.1. Bactérias do grupo Coliforme A quantificação bacteriana em corpos d água é de grande interesse para saúde pública, uma vez que a detecção de altos níveis bacterianos esta freqüentemente associada com elevados níveis de patógenos para humanos (USEPA, 1986). A maioria dos microrganismos patogênicos, causadores de doenças transmitidas pela água, é predominantemente de origem fecal e são conhecidas como patógenos entéricos. Microrganismos enteropatógenos geralmente aparecem em concentrações muito baixas em águas ambientais quando comparada à diversificada microbiota existente. Pelo fato de que os microrganismos patogênicos usualmente aparecem de forma intermitente e em baixo número na água, podem ser pesquisados outros grupos que estão presentes juntamente com os patogênicos nas fezes. Shibata et al. (2004), afirmam que os microrganismos tipicamente utilizados como indicadores são aqueles encontrados em elevadas concentrações nas fezes humanas. Os coliformes fecais, um subgrupo dos coliformes totais representados principalmente pela espécie Escherichia coli, têm sido extensivamente utilizados no monitoramento da qualidade de águas e são considerados os mais específicos indicadores de qualidade de águas destinadas a potabilidade e balneabilidade (LÓPEZ-PILA & SZEWZYK, 2000; YOUN-JOO et al., 2002; ALM et al., 2003; NOGUEIRA, et al., 2003; LEBARON et al., 2005). O grupo coliforme é constituído por bactérias pertencentes aos gêneros Citrobacter, Escherichia, Enterobacter e Klebsiella (NOGUEIRA et al., 2003). São bacilos aeróbios ou anaeróbios facultativos, Gram negativos e não formadores de esporos, oxidase-negativos, capazes de desenvolver na presença de sais biliares ou agentes tensoativos que fermentam a lactose com produção de ácido, gás e aldeído a 35,0 ± 0,5ºC em 24-48 horas, e que podem apresentar a enzima ß-galactosidase. Embora estes microrganismos estejam relacionados com contaminação fecal, podem também ser encontrados em outros locais, oriundos de vegetais e do solo, observado, principalmente, para os gêneros
7 Citrobacter, Enterobacter e Klebsiella (GELDREICH, 1975; CABELLI, et al., 1979; 1983; HAGLER & MENDONÇA-HAGLER, 1988; BAUDISOVÁ, 1997). Além disso, alguns estudos sugerem que as altas temperaturas tropicais, a elevada radiação solar e a presença de predadores podem diminuir a sobrevivência destes microrganismos que deixam de exercer uma função de indicadores de presença de patógenos em tais condições (FUJIOKA et al., 1999; ROSA et al., 1990; BYAMUKAMA et al., 2000, WHITMAN et al., 2004). Diversos fatores podem interferir sobre a enumeração dos coliformes, como ph, temperatura e outros organismos presentes na água. Pseudomonas aeruginosa é conhecida por interferir sobre a contagem colimétrica e acreditase que a síntese do pigmento piocianina esteja ligada com este fenômeno (GUILHERME & SILVA, 2000). A qualidade bacteriológica de águas recreacionais é avaliada pelos mesmos indicadores recomendados para águas destinadas ao consumo humano, isto é, coliformes totais e coliformes fecais (YOSHPE-PURER et al., 1987). 4.1.1. Escherichia coli Os coliformes fecais, um subgrupo dos coliformes totais representados principalmente pela espécie Escherichia coli, estão mais especificamente relacionados com contaminação fecal oriundos de animais de sangue quente. Entretanto, sua utilização como indicador de poluição fecal tem sido questionada, pois a metodologia usualmente empregada para detectar essas bactérias, é realizada à temperatura de 44,5 ± 0,2 ºC como fator seletivo. Porém esta temperatura permite o isolamento de outros coliformes termotolerantes, não necessariamente provenientes de contaminação fecal (CABELLI et al., 1979; 1983; HAGLER & MENDONÇA HAGLER, 1988; ELMUND et al., 1999; BYAMUKAMA et al., 2000; SCOTT et al., 2002). Países localizados em regiões de clima temperado têm utilizado, com sucesso, E. coli como indicadores de poluição fecal. Porém, a adequação de E. coli como indicadores de poluição fecal em regiões tropicais e subtropicais não tem sido propriamente demonstrada (CHAO et al., 2003). Isto porque, vários trabalhos mostram que E. coli tem sido encontrada nos solos e corpos d água,
8 onde estudo destes ambientes tem mostrado que é improvável que a fonte destas bactérias seja contaminação fecal humana. Algumas pesquisas sugerem que estas bactérias originaram-se de outros animais que residiram na área e que desenvolveram mecanismos para manter populações de células viáveis por longo período de tempo em condições tropicais (BYAPPANAHALLI & FUJIOKA, 1998; FUJIOKA et al., 1999; SOLO-GABRIELE et al., 2000; DESMARAIS et al., 2002; CHAO et al., 2003; WINFIEKD & GROSIMAN, 2003). Carrillo et al. (1985) e Hagler et al. (1993) isolaram E. coli de águas naturais preservadas de contaminação fecal, como as águas de bromélias e de chuvas em florestas tropicais. Embora existam ainda algumas divergências quanto ao seu uso, as bactérias do grupo coliforme têm demonstrado eficiência no monitoramento de águas doces em relação à presença de contaminação fecal. Além disso, os órgãos administrativos utilizam estes parâmetros para classificar os corpos d água quanto a seu destino, uso e quanto à sua condição sanitária (BRASIL, 2005). Sabe-se que os coliformes não têm a capacidade de crescer em baixas concentrações de carbono orgânico, as altas temperaturas tropicais e a elevada radiação solar diminuem o seu potencial de sobrevivência na água, e assim deixam de exercer uma função de indicadores de presença de patógenos em tais condições (HAGLER et al., 1986; ROSA, et al., 1990). Segundo KUHNERT et al. (2000), existe uma grande diversidade de linhagens de Escherichia coli comensal pertencentes a diferentes sorotipos, e que podem ser isoladas das fezes de indivíduos saudáveis. Estas linhagens são eliminadas maciçamente no ambiente e podem contaminar os alimentos, a superfície de corpos d água e os sedimentos, geralmente sem causar nenhum efeito adverso a saúde humana. A E. coli comensal da microbiota intestinal é considerada inofensiva para o hospedeiro e é um patógeno oportunista. Segundo BERG (1996), a microbiota normal associada ao trato digestivo é responsável por três funções importantes para a saúde do hospedeiro. Essas funções são as seguintes: resistência à colonização devido à inibição da multiplicação de microrganismos exógenos; imunomodulação que permite uma resposta imune mais rápida e adequada durante uma agressão infecciosa; e contribuição nutricional que fornece vitaminas, substratos energéticos e reguladores na forma de ácidos graxos voláteis. Somente em algumas raras
9 circunstâncias as linhagens de E.coli comensal podem tornar-se uma ameaça para o indivíduo saudável (KUHNERT et al., 2000). Para Santos et al. (2003), os microrganismos da microbiota intestinal indígena podem causar doença e tornar uma ameaça para o indivíduo quando ocorre um eventual desequilíbrio do ecossistema digestivo ou quando estes microrganismos alcançam sítios estéreis do corpo. Este desequilíbrio pode ser devido a uma imunossupressão do indivíduo ou terapias com antimicrobianos. Pacientes com sistema imune debilitado são incapazes de conter os microrganismos comensais do seu habitat natural após o rompimento da barreira natural entre o intestino e outros sítios estéreis do corpo (KUHNERT et al., 2000). 4.2. Enterococcus spp. Os enterococos são um subgrupo dos estreptococos diferenciados por sua habilidade de crescer em 6,5% de NaCl, em ph 9,6, e entre 10 a 45ºC (BLANCH et al., 2003). Os enterococos são bactérias encontradas no trato intestinal do homem e dos animais, e são comumente isolados de ambientes contaminados pelo material fecal humano e animal, como exemplo esgoto urbano, água e solos que recebem fertilizantes de origem animal, além de produtos alimentícios derivados de animais (KUHN et al., 2003). Os enterococos adquiriram recentemente particular relevância médica devido ao aumento de doenças, principalmente nasocomiais, causadas por eles (BLANCH et al., 2003; ANDRE et al., 2005). Até o presente, estão descritas 30 espécies pertencentes ao gênero Enterococcus. E. faecalis é a espécie dominante encontrada em fezes humanas, mas E. faecium, E. hirae, E. avium e E. durans também tem sido isoladas. Em bovinos, E. faecium é a espécie predominante isolada, mas E. faecalis, E. hirae e E. casseliflavus também são encontradas (ANDRE et al., 2005). Devido a alta concentração nas fezes e alta taxa de sobrevivência no ambiente, enterococos tem sido proposto como indicador de contaminação fecal complementar aos coliformes fecais (USEPA, 2000; ANDREA et al., 2002; KÜHN et al., 2003; NOBLE et al., 2003). Mcfeters et al. (1974) estudaram a sobrevivência de bactérias indicadoras e de patógenos entéricos em águas de
10 poços, observando que o grupo coliforme morre mais rapidamente que o grupo enterococo, e diante disto utilizou-o como indicador para avaliação da qualidade de água em seu trabalho. 4.3. Pseudomonas aeruginosa O gênero Pseudomonas compreende bactérias unicelulares, Gram negativas, que são bastonetes retos ou curvos medindo 0.5 a 1.0 µm X 1.5 a 4.0 µm. As células são móveis por um ou vários flagelos polares. Não é conhecida a formação de esporos neste gênero. As bactérias são catalasepositivas e aeróbias estritas, exceto por algumas que são denitrificantes (GARRITY et al., 2001). Pseudomonas aeruginosa é capaz de crescer e multiplicar em diversos ambientes incluindo água, esgoto, solo, plantas e animais (KIMATA et al., 2004; PIRNAY et al., 2005). A espécie Pseudomonas aeruginosa é um patógeno oportunista importante na etiologia de muitas doenças infecciosas nos humanos, e também está envolvido em infecções hospitalares. Numerosos casos de foliculite, dermatite, e infecções de orelha e do trato urinário são atribuídos a P. aeruginosa, adquirida por meio de recreação em águas contaminadas (ESIOBU et al., 2004). Devido a isto, vários trabalhos que avaliam a presença desta espécie em ambientes aquáticos foram realizados (PELLETT et al., 1983; KIMATA et al., 2004; ESIOBU et al., 2004; RUIZ et al., 2004; PIRNAY et al., 2005). No Brasil, a bactéria é padrão de potabilidade em águas minerais. Por conta da sua grande versatilidade metabólica, a bactéria teria vantagens sobre os demais microrganismos na água (VASCONCELOS, et al. 2006). Pseudomonas aeruginosa é considerado um microrganismo metabolicamente mais versátil que os coliformes, capaz de persistir por mais tempo na água e tende a resistir aos agentes cáusticos do ambiente por mecanismos ainda desconhecidos (Smith & Iglewski, 2003). A atividade antimicrobiana de Pseudomonas aeruginosa sobre os coliformes foi verificada em um estudo sobre o antagonismo entre Pseudomonas aeruginosa e bactérias indicadoras de contaminação fecal em
11 água (VASCONCELOS, 2006). O estudo sugere também a importância da investigação de fenômenos de antagonismo entre Pseudomonas aeruginosa e o grupo coliforme e consequentemente, sua implicação nas análises colimétricas, determinando até que ponto as análises colimétricas podem ser comprometidas. 4.4. Staphylococcus aureus Os estafilococos são células esféricas gram-positivas que normalmente se dispõem em cachos irregulares semelhantes a cachos de uva. Crescem rapidamente em vários meios de cultura e mostram-se metabolicamente ativos, fermentando carboidratos e produzindo pigmentos que variam de branco a amarelo intenso. Alguns são membros da microbiota normal da pele e mucosa dos humanos; outros provocam supuração, formação de abscessos, várias infecções piogênicas e até mesmo septicemia fatal. Tradicionalmente os estafilococos são divididos em duas categorias: coagulase positivos e coagulase negativos. Essa divisão é baseada na capacidade de coagular o plasma que é uma propriedade considerada, há longo tempo, como importante marcador de patogenicidade (TORTORA, 2006). O S. aureus produz uma série de enzimas que podem contribuir para a sua patogenicidade, tais como a coagulase, catalase, desoxirribonuclease (DNAse), lipase, termonuclease (TNase), bem como a toxina hemolítica, cuja produção está associada com sua virulência. Seu alto poder de colonizar várias partes do corpo, pode dar origem a infecções assintomáticas, facilitando assim a disseminação de várias doenças (SCHAECHTER et al., 2002). Os estafilococos desenvolvem rapidamente resistência a numerosos agentes antimicrobianos, portanto, constituem problemas terapêuticos difíceis. Os estafilococos produzem catalase, o que os diferencia dos estreptococos. Os estafilococos fermentam lentamente muitos carboidratos, produzindo ácido láctico, mas não gás. O tipo mais comum de intoxicação alimentar é causado por uma enterotoxina estafilocócica termoestável (TORTORA, 2006). Alguns estudos sobre o monitoramento de águas recreacionais sugerem além da contagem de coliformes, uma abordagem sobre alguns
12 microrganismos indicadores de origem não-fecal, como contagem de bactérias heterotróficas, leveduras e Staphylococcus aureus (HAGLER, 1986). Staphylococcus aureus é um importante patógeno de enfermidades que resultam em infecções ou em produção de toxinas. É o principal agente etiológico de doenças transmitidas por água contaminada por animais, pessoas doentes, e portadores assintomáticos (TOOD, 1977; VERHOEF, 1981). Algumas espécies de estafilococos coagulase negativo, normal da microbiota humana, tem sido isolados de amostras clínicas originárias de vários tipos de infecções. Este patógeno oportunista tem sido frequentemente encontrado em águas de piscinas cloradas e águas de praias inclusive nos locais onde o índice de coliformes satisfaz o padrão de balneabilidade (HAGLER, 1990). A contagem de S. aureus pode ser um bom monitoramento para evitar infecções de pele e de olhos, uma vez que esse microrganismo se mostra resistente em águas cloradas e salinas (HAGLER, 1990). 4.5. Clostridium perfringens Clostridium perfringens é uma bactéria anaeróbia, em forma de bastonete, Gram positiva, esporogênica, sulfito redutora, amplamente distribuída na natureza e considerada como parte da microbiota intestinal normal do homem e de animais (HATHEWAY et al. 1980). As células vegetativas de C. perfringens encontram no intestino condições adequadas para sua esporulação, o que não ocorre facilmente em meios de cultura, utilizados para crescimento in vitro (LABBE, 1980). Os esporos são eliminados nas fezes e, dessa forma, chegam ao meio aquático onde apresentam excepcional longevidade, em função da grande resistência a condições ambientais desfavoráveis. Por esse motivo, são úteis na detecção de contaminação fecal remota, em situações nas quais outros indicadores, como Escherichia coli e estreptococos fecais, já não se encontrariam presentes. O uso de C. perfringens como um indicador de qualidade de água tem sido objeto de vários estudos. De acordo com Medema et al. (1997), os esporos de C. perfringens sobrevivem mais tempo nas águas fluviais que os oocistos do protozoário
13 Cryptosporidium parvum, podendo, desta forma, ser considerado um indicador útil da presença deste parasita, responsável por inúmeros surtos de doenças intestinais de origem hídrica e resistente ao tratamento convencional da água. O monitoramento de C. perfringens em água tratada pode fornecer subsídios para se avaliar a eficiência na remoção de organismos patogênicos resistentes, tais como oocistos de Cryptosporidium ou cistos de Giardia, em sistemas de tratamento de água. 4.6. Bactérias Heterotróficas O termo bactérias heterotróficas inclui todas as bactérias que usam nutrientes orgânicos para o seu crescimento. Estas bactérias são universalmente presentes em todos os tipos de água, alimento, solo, vegetação e ar. A contagem de bactérias heterotróficas representa diversos microrganismos isolados a partir de um método particular, que incluem algumas variáveis como meio de cultura, tempo e temperatura de incubação, e a forma de inoculação no meio (ALLEN, 2004). A enumeração de alguns gêneros de microrganismos pelo método de contagem de bactérias heterotróficas pode variar muito de acordo com o meio de cultura escolhido, temperatura de incubação, tempo de incubação, origem da água (rios, reservatórios de águas superficiais, água tratada), e estação do ano. Todos os gêneros de bactérias heterotróficas encontrados em águas são comuns também em alimentos, e são ingeridos pelo homem diariamente. Altas concentrações de carboidratos e proteínas ajudam a multiplicação desses microrganismos nos alimentos, mas não em água, onde sua concentração é significativamente menor, caracterizando assim os alimentos como um risco maior à saúde do que a ingestão de água (ALLEN, 2004). Para considerarmos as bactérias heterotróficas como um risco à saúde, elas devem estar em altas concentrações para serem capazes de infectar uma pessoa idosa. A capacidade de um microrganismo de causar uma enfermidade frequentemente está associada ao seu fator de virulência. Alguns estudos afirmam que contagens de bactérias heterotróficas entre 500-1000 UFC/mL em águas potáveis pode interferir nas análises de
14 coliformes, a portaria nº 518 do Ministério da Saúde estabelece que em 20% das amostras mensais para análise de coliformes totais nos sistemas de distribuição, deve ser efetuada a contagem de bactérias heterotróficas e, uma vez excedidas 500 unidades formadoras de colônia (UFC) por ml, devem ser providenciadas imediata recoleta, inspeção local e, se constatada irregularidade, outras providências cabíveis. A determinação da contagem de bactérias heterotróficas pode ser usada para monitorar a eficácia dos processos de tratamento de água potável e verificar mudanças indesejáveis na qualidade durante a sua distribuição e estoque, mas não por razões de risco para a saúde. 4.7. Presença de leveduras em ambientes aquáticos As leveduras são microrganismos predominantemente unicelulares, imóveis e englobam um grupo funcional de organismos heterotróficos que colonizam substratos contendo fontes de carbono. Com relação à faixa de temperatura são classificadas como mesófilas crescendo preferencialmente entre 18 e 45ºC. Taxonomicamente pertencem a 100 gêneros entre as classes Ascomicetos e Basidiomicetos (KURTZMAN & FELL, 1998). Estudos sobre a diversidade e distribuição de leveduras em ambientes aquáticos e terrestres, animais e frutos no Brasil, têm mostrado que diferentes habitas possuem comunidades distintas de leveduras sendo encontrados diversos biótipos ainda não descritos, e possivelmente espécies novas. Pesquisas envolvendo leveduras de ambientes tropicais vêm sendo conduzidas com uma freqüência ainda inferior a desejável, pois muitos ambientes são devastados antes mesmo de se conhecer a microbiota (HAGLER et al., 1995). Apesar de inúmeros trabalhos feitos com objetivo de caracterizar as leveduras presentes em ambientes aquáticos, existem poucos dados referentes a sua ocorrência em lagos e rios em regiões tropicais, sendo a maioria dos trabalhos desenvolvidos em regiões temperadas. Segundo Hagler & Ahearn (1987) em lagos não poluídos são encontradas contagens geralmente abaixo de 10 unidades formadoras de colônia (UFC) de leveduras por 100 ml. Lagos mesotróficos possuem
15 contagens entre 10 e 50 UFC/100 ml. Águas que estão recebendo descargas de poluentes, mas que ainda são seguras para uso recreacional, possuem contagens entre 50 e 100 UFC por 100 ml. E, finalmente, águas eutrofizadas apresentam contagens acima de 100 UFC/100 ml. Tem sido observada uma correlação entre os níveis de poluição orgânica e as populações de leveduras. Cooke (1963, 1965) observou a existência de uma grande diversidade de leveduras em todos os estágios de tratamento de esgoto e que estas ocorriam em altas densidades em águas naturais que recebiam efluentes de esgotos domésticos. Quinn (1984) sugere que a presença de elevado número de leveduras poderia ser utilizada como um bom indicador de enriquecimento orgânico periódico ou localizado em ambientes aquáticos. A composição da microbiota fúngica em um corpo d água pode ser influenciada por vários parâmetros físicos e químicos, como por exemplo, temperatura, ph, oxigênio dissolvido e fosfatos totais dissolvidos (WOOLLETT et al., 1970; SIMARD & BLACKWOOD, 1971 a, b; QUINN, 1984; HAGLER et al., 1986; FUJITA et al., 1987; ROSA et al., 1990, 1995; MORAIS et al., 1996). Segundo Bärlocher (1982) ecossistemas aquáticos com dados físicos e químicos semelhantes apresentam elevado grau de similaridade quanto à diversidade de espécies de fungos. Rosa et al. (1995) e Morais et al. (1996) não encontraram correlação significativa entre a freqüência de espécies de leveduras e as variáveis físico-químicas para os lagos da região de Lagoa Santa, Minas Gerais. Medeiros (2002) em estudo realizado em lagos e rios da Bacia do rio Doce encontrou correlação significativa entre as contagens de leveduras e as concentrações de fósforo solúvel reativo e nitrato no lago Dom Helvécio. Na lagoa Carioca as contagens de leveduras apresentaram correlação com temperatura, ph, amônia e luz. Um elevado número de espécies de leveduras tem sido freqüentemente isolado em ambientes aquáticos, observando-se o predomínio dos gêneros Aureobasidium, Candida, Cryptococcus, Rhodotorula, Saccharomyces e Trichosporon, sendo que a maioria das espécies destes gêneros está associada a plantas, solos ou fontes de poluição orgânica (MEDEIROS, 2005). As leveduras pertencentes ao gênero Cryptococcus e as leveduras negras principalmente a espécie Aureobasidium pullulans são conhecidas por serem
16 os tipos predominantes em ambientes aquáticos com pouca ou nenhuma poluição, já os gêneros Candida e Rhodotorula são predominantes em águas contendo esgotos domésticos. Odds (1988) relata como isoladas do trato gastrointestinal humano, as espécies Candida albicans, C. glabrata, C. guilliermondii, C. parapsilosis e C. tropicalis. A espécie C. albicans é a levedura oportunista, associada ao homem, mais amplamente estudada. Alguns relatos demonstram ainda o isolamento dessa espécie em anfíbios (ODDS, 1988) e, de acordo com a literatura revista por esse autor, C. albicans é comprovadamente encontrada em 58 espécies animais incluindo primatas, mamíferos selvagens e domesticados, além de pássaros. Algumas pesquisas mostraram que densidades altas de C. albicans estavam associadas com contaminação fecal humana recente em águas doces de regiões temperadas, mas baixas taxas de isolamento ou até sua ausência tem sido observada em locais poluídos, sendo encontrada em águas tropicais, mesmo na ausência de contaminação fecal (VALDEZ-COLAZO et al., 1987). Águas poluídas por efluentes industriais apresentam microbiota fúngica característica, relacionada com a fonte poluidora. O gênero Saccharomyces constitui um exemplo típico, sendo freqüentemente isolado de locais próximos à indústria de vinho, cerveja e pão (AHEARN et al., 1968). Ambientes aquáticos que recebem efluentes industriais podem ser habitados por microrganismos, com a habilidade de degradar dejetos tóxicos e sobreviver em ambientes hostis, fazendo deles grandes candidatos para serem utilizados em processos de biorremediação (SLÁVIKOVÁ & VADKERTIOVÁ, 1997 a, b). Segundo Hagler et al. (1995) o estudo de diversidade e distribuição de leveduras em ambientes aquáticos indicam que habitas diferentes possuem comunidades de leveduras características, revelando muitos biótipos diferentes que provavelmente representam novas espécies. Uma grande diversidade de populações de leveduras tem sido encontrada em ambientes aquáticos porem, estas parecem originar de ambientes terrestres incluindo esgotos (HAGLER et al., 1995). Medeiros (2002) em trabalho realizado na bacia do rio Doce encontrou a maior diversidade de espécies de leveduras nos ambientes aquáticos que recebiam maior carga de material alóctone. Candida krusei, C. parapsilosis e C. guilliermondii foram predominantes nos ambientes onde foi observada a maior diversidade de espécies de leveduras e que recebiam
17 grande quantidade de esgoto doméstico. Estes microrganismos provavelmente entraram nos corpos d água carreados pelas chuvas encontrando ambientes favoráveis para sua sobrevivência. Segundo Hagler & Ahearn (1987), poucas espécies de leveduras são específicas de habitas aquáticos sendo que diferentes populações destes microrganismos podem ser encontradas em água doce originadas de ambientes terrestres e esgotos.