Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Transcrição

1 Número do processo: XXX-9/002 Relator: Des.(a) Saldanha da Fonseca Relator do Acordão: Des.(a) Saldanha da Fonseca Data do Julgamento: 19/11/2014 Data da Publicação: 27/11/2014 Númeração 02820XX EMENTA: DIREITO CIVIL - COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - PARCELAS MENSAIS - INADIMPLEMENTO - RESCISÃO DO NEGÓCIO - RESTITUIÇÃO DE VALORES - PERCENTUAL DE RETENÇÃO. Verificado o caráter abusivo do percentual de retenção compensatória previsto em promessa de compra e venda para o caso de rescisão motivada por inadimplemento do comprador, portanto, onerosidade excessiva em prejuízo do contratante à luz do artigo 51, IV, do CDC, o correspondente ajuste deve ser promovido de maneira a preservar o equilíbrio contratual. A restituição imposta ao vendedor demandante como decorrência da rescisão do contrato deve levar em conta as parcelas segundo valor pago pelo comprador, devidamente atualizada. Recurso parcialmente provido. APELAÇÃO CÍVEL Nº /002 - COMARCA DE ITABIRITO - APELANTE(S): ROCHA EMPREENDIMENTOS LTDA. - APELADO(A)(S): ADRIANA DE LIMA (Omitido) A C Ó R D Ã O Vistos etc., acorda, em Turma, a 12ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO. DES. SALDANHA DA FONSECA RELATOR. 1

2 DES. SALDANHA DA FONSECA (RELATOR) V O T O Cuidam os autos de ação de rescisão contratual c/c reintegração de posse e perdas e danos ajuizada por Rocha Empreendimentos Ltda. em face de Adriana de Lima (Omitido) em que a autora, denunciando inadimplemento das obrigações assumidas pela ré no âmbito da promessa de compra e venda com ela havida, busca a ruptura do liame com todos os consectários que daí resultam. Por força da r. sentença de f , o pedido foi julgado procedente para declarar a rescisão do contrato litigioso e reintegrar a autora na posse do bem mediante ressarcimento de 90% do valor das prestações pagas, no percentual do salário mínimo, conforme estipulado no contrato, assegurada a retenção do imóvel pela requerida até o efetivo pagamento. Insatisfeita, a demandada recorre. Com esteio na apelação de f vindica a majoração da retenção pelas despesas administrativas a fim de que alcance percentual não inferior a 30%; a não vinculação da soma a ser devolvida ao salário mínimo; e o deferimento de perdas e danos correspondentes a 0,5% sobre o valor do imóvel por mês de ocupação. Apesar de intimada, a apelada não ofertou contrarrazões. Conheço do recurso, porque cumpridos seus pressupostos de admissibilidade. A promessa de compra e venda de imóvel havida pelos litigantes segundo instrumento de f foi nestes autos rescindida por má conduta da ré, então promissária compradora, porquanto inadimplente no pagamento do preço ajustado. Trata-se de compra e 2

3 venda de lote 04, da quadra 05, "... com limites e confrontações conforme planta do Bairro Capanema, situado em Itabirito-MG." (f. 21). Para a autora, entretanto, a retenção de apenas 10% das parcelas contratuais cuja restituição foi-lhe imposta como consectário da rescisão do contrato não se mostra hábil a suprir despesas administrativas e fiscais, tampouco perdas e danos pelo longo período de fruição do bem, devendo ser observado, para este efeito, o percentual mínimo de 30%. Que, de qualquer modo, a restituição deve corresponder ao total pago pela ré, devidamente atualizado, deduzido o percentual de retenção, não devendo prevalecer, para este efeito, quantificação segundo percentual incidente sobre valor atual do salário mínimo, conquanto tenha sido este o critério contratual fixado para quantificação das parcelas mensais devidas pela compradora (f. 21). O contrato litigioso (f ), por sua cláusula 12, ao dispor sobre a rescisão imotivada por inadimplemento da compradora, determinou a perda, em favor da vendedora, de 50% (cinquenta por cento) das prestações já pagas pela adquirente a título de indenização pela ocupação do lote prometido, despesas fiscais e administrativas. É certo, no entanto, que a compra e venda litigiosa teve por objeto um lote (f. 21). E, tratando-se de lote, a fruição não se mostra devida. A apelante vendeu para a apelada um lote não edificado e dos autos não consta qualquer prova de edificação futura ou de uso do imóvel para fins econômicos de sorte a permitir que o acordo de pagamento de fruição se tornasse legítimo. O que se tem evidenciado é a posse da apelada advinda do contrato firmado e não o uso efetivo do lote negociado, motivo pelo qual não há falar-se em indenização pela fruição na hipótese de rescisão motivada do contrato a justificar a recomposição a este título postulada pela autora apelante. Neste cenário, o critério compensatório entabulado pelos contratantes deve prevalecer, não, todavia, no que pertine ao percentual de retenção (50%), de ajuste necessário, eis que, conforme 3

4 bem pontuado na r. sentença, excessivamente oneroso para o consumidor contratante, nesta condição colocado em desvantagem exagerada (artigo 51, IV, do CDC), notadamente quando sopesado sob o prisma da boa-fé objetiva. A esse respeito cumpre trazer à colação entendimento jurisprudencial: "DIREITO CIVIL - CONTRATO DE HOSPEDAGEM - REDE DE HOTÉIS CREDENCIADOS - CESSÃO DE DIREITO DE OCUPAÇÃO POR TEMPO COMPARTILHADO - "TIME-SHARING" - CLÁUSULA PENAL - EXCESSIVIDADE - CDC. A cláusula penal, por sua natureza acessória, destinada a estimular o cumprimento da obrigação principal, pode ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo. Recurso parcialmente provido." (TJSP. Apelação ª Câmara de Direito Privado. Rel. Des. Clóvis Castelo. J. 13/02/12. Data de registro: 15/02/12) E, após sopesar as circunstâncias do caso, em particular a circunstância de que a hipótese não comporta indenização por fruição, tenho que a redução do percentual contratual de 50% para 10%, tal como imposta na origem, está apta a atender ao comando da cláusula 12 (f. 22), vale dizer, indenizar despesas fiscais e administrativas. Trata-se de referência capaz de restaurar o equilíbrio contratual. Nada obstante, o ressarcimento incumbido à autora deve corresponder ao percentual de 90% imposto na origem, todavia, incidente sobre os valores efetivamente pagos pela ré, atualizados desde cada pagamento. Ainda que as parcelas mensais do preço tenham sido fixadas em 80% do salário mínimo (f. 21), tenho que o percentual de ressarcimento incumbido à autora, ora recorrente, deverá levar em conta as parcelas segundo valores pagos à época pela ré, devidamente 4

5 atualizados. Justifica-se, neste contexto, o parcial ajuste da r. sentença, compreensão que não se abala por teses e preceitos em contrário alçados. Ao abrigo de tais fundamentos, dou parcial provimento à apelação para, em reforma, determinar que o ressarcimento imposto à autora incida sobre o valor histórico das parcelas efetivamente pagas pela ré, monetariamente atualizado pelos índices da e. Corregedoria-Geral de Justiça a contar de cada pagamento, quantia que deverá ser acrescida de juros moratórios de 1% ao mês, contados da citação. A r. sentença fica mantida quanto ao mais. Custas recursais, pelas partes. DES. DOMINGOS COELHO (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a). DES. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA - De acordo com o(a) Relator(a). SÚMULA: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO" 5