Noções básicas sobre o núcleo e o declínio radioactivo
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- Jessica Câmara Igrejas
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1 Noções básicas sobre o núcleo e o declínio radioactivo 26 de Setembro de Constituição do núcleo O átomo é uma nuvem de Z electrões que rodeia um núcleo constituído por Z protões e N neutrões. Figura 1: O núcleo tem Z protões e N neutrões (nucleões). Os nucleões são por sua vez constituidos por quarks. Temos então que o número de massa A é dado por A = Z + N. (1) A designação número de massa quer dizer a massa do núcleo em unidades de nucleão, já que protões e neutrões têm praticamente a mesma massa. 1
2 Os núcleos são geralmente representados na forma A ZX, em que X é o símbolo químico do elemento. Por exemplo, o núcleo do Ferro é 56 26Fe, o que quer dizer que tem 26 protões (e portanto o átomo também tem 26 electrões) e que tem 56 nucleões. Daqui se deduz que o número de neutrões é 30. É o Z que determina o elemento. Para o mesmo Z podem haver vários valores possíveis de N, e portanto de A. Aos núcleos com igual Z e diferente A chamamos isótopos. Isótopos famosos: O Hidrogénio tem três isótopos: o hidrogénio normal, 1 1H, o deutério, 2 1H e o trítio, 3 1H. O carbono tem 4 isótopos, 11 6 C, 12 6 C, 13 6 C e 14 6 C, sendo que o mais abundamnte é o 12 6 C, com aproximadamente 98.9% de abundância relativa e que o 13 6 C tem aproximadamente 1.1% de abundância relativa. Os nucleões são constituídos, por sua vez, por quarks. Existem seis tipos de quarks: up (u), down (d), charm (c), strange (s), top (t) e bottom (b). Os quarks têm carga fraccionária. Up, charm e top têm carga +2/3 e down, starnge e bottom têm carga -1/3. Os anti-quarks têm carga oposta. São fermiões, e por isso têm spin 1/2. Os nucleões são costituídos por quarks u e d. Assim, o protão é dado por 1 1p = uud o neutrão é dado por 1 0n = udd. Porque é que os nucleões não se repelem? Com efeito, os protões dever-se-iam repelir, já que têm a mesma carga. A resposta é que no interior do núcleo faz-se sentir a força nuclear forte, que é muito mais intensa que a força electromagnética, embora de muito mais curto alcance. Tal como a força electromagnética é mediada pelos fotões (a interacção electromagnética é a troca de um fotão), a força nuclear forte é mediada pelos gluões, que são trocados entre os quarks. Tal como cargas eléctricas opostas se atraem, os quarks têm uma carga de côr (vermelho, azul, verde, anti-vermelho, anti-azul e anti-verde). A atracção dá-se entre cores diferentes e entre anti-cores. Cores iguais repelem-se. 2
3 Figura 2: Os nucleões são constituídos por quarks 2 Declínios Radioactivos A maior parte dos núcleos que podem existir não são estáveis. Isto quer dizer que podem passar a um estado de mais baixa energia. Este estado por sua vez pode ou não ser estável. A cadeia acaba no estado de mais baixa energia, que é o núcleo estável. A forma que o núcleo tem de procurar a estabilidade é livrar-se de partículas. Assim, os três tipos de emissão radioactiva são os seguintes Emissão α: o núcleo emite uma partícula α, que é um núcleo de Hélio, ou seja, dois protões e dois neutrões. Como as partículas α são muito massivas têm um fraco poder penetrante na matéria. A emissão α corresponde a uma ssão do núcleo. Este decaimento pode ser esrito como A ZX A 4 Z 2 Y He. (2) Exemplos de declínios α: U Th He Ra Rn He Emissão β: o núcleo emite uma partícula β, que pode ser um electrão ou um positrão. São muitissimo mais leves do que as partículas α. Por isso têm um poder penetrante maior, precisamente porque a sua capacidade de interactuar com a matéria também é mais reduzida. 3
4 A origem da emissão β está noutra força: a força electrofraca. Esta interacção, que é mediada pelos bosões W ± e Z 0, permite que um quark u (ou d) se tranforme num quark d (ou u), com a emissão de um positrão (ou electrão) e um neutrino (ou antineutrino). Assim aparece a partícula β que é emitida pelo núcleo. Portanto, a partícula β tem origem numa transformação de um quark noutro. A transformação de um neutrão num protão está ilustrada na gura 3. Deve imaginar-se este processo a decorrer dentro de um núcleo e que os outros nucleões são apenas expectadores do processo. Figura 3: Diagrama de Feynman que ilustra a transformação de um neutrão num protão com emissão de um electrão e um antineutrino. O decaimento beta pode ser escrito como A ZX A Z+1 Y + β + ν (3) A ZX A Z 1 Y + β + + ν (4) Exemplos de desintegrações beta: Cs Ba + β + ν 22 11Na Ne + β + + ν Emissão γ: o núcleo emite uma partícula γ, que é um fotão. Estes fotões têm uma grande energia (têm uma frequência muito superior à da luz visível, na banda dos raios-x). Têm portanto um grande poder de penetração na matéria. A emisão γ tem origem na interacção electromagnética nos núcleos. Muitas vezes dá-se após um declínio beta ou alfa, que ainda deixaram o núcleo num 4
5 estado excitado. A desexcitação dá-se através da emissão de um fotão. O decçíbio gama não altera portanto os números atómico e de massa. Pode escrever-se A ZX A Z X + γ, (5) onde o asterisco indica que o núcleo está num estado excitado. 3 Esquemas de declínio Vejamos agora alguns esquemas de declínios radioactivos O 12 5B pode decair directamente para o 12 6C através de um declínio β ou pode primeiro decair para um estado excitado 12 5C, que por seua vez decai para o estado nal através de uma emissão gama. Figura 4: Declínio do 12 5B De passagem note-se que a partícula β também se pode escrever como 0 1e e que portanto a equação do declínio se pode escrever numa forma que mostra directamente a conservação dos números atómico e de massa: 12 5 B 12 6 C e + ν (6) 12 6 C 12 6 C + γ. (7) Uma nota sobre as energias: as energias em Física Nuclear são expressas e múltiplos do electrão-volt (ev). O que é um ev? É a energia adquirida ou (perdida) por um electrão que se move através de uma diferença de potencial de 1 V. E quanto é essa 5
6 energia? Sabemos que a variação da energia potencial U de uma carga q que atravessa uma ddp de V é U = q V. Assim, no caso de um electrão e 1 V, 1 ev = 1, C 1V = 1, J. (8) Assim, a diferença de energia entre o 12 5B e o 12 6C é de 13.4 MeV, ou seja J. O declínio do Tório 228 para o Rádio 224: Figura 5: O declínio do Tório 228 para o Rádio 224 Neste esquema estão indicadas as probabilidades de cada declínio. As energias estão indicadas em MeV. Por vezes a série de declínios é longa. Uma série famosa, a série do U, está representada na gura 6. A variação total do número de massa é 38 e do número atómico é Probabilidade de Desintegração Consideremos uma colecção muito grande de núcleos radioacticos. Consideremos que λ é a probabilidade de decaimento de um núcleo por unidade de tempo: λ = probabilidade de desintegração, (9) [λ] = s 1. (10) 6
7 Figura 6: A série do Urânio 238 λ não depende do tempo, isto é, não importa se um dado núcleo está à espera de decair há 1 milhão de anos ou há 1 dia a probabilidade de que ele decaia no próximo segundo é sempre a mesma. Como se determina λ? Suponhamos que temos núcleos e que durante 5 segundos decaem 10 5 núcleos. Então a probabilidade de decaimento em 5 s é P [5s] = = (11) A probabilidade por unidade de tempo é então P (s 1 ) = s = s 1 λ. (12) De uma forma geral, se temos n(t) núcleos por decair num dado instante de tempo e se num intervalo innitésimal dt decaem dn(t) núcleos, então, por analogia com exemplo anterior compreendemos que λ é dado por λ = dn(t) dt n(t) (o sinal (-) é porque λ > 0 mas dn < 0 já que n está a diminuir). Podemos reescrever esta equação na forma dn(t) dt (13) = λn(t). (14) 7
8 Esta equação também se pode interpretar assim: taxa de variação de n(t) = prob. de desint. n o de núcleos por decair, (15) já que λn(t) deve dar o número de núcleos que decai por unidade de tempo, pela própria denição de λ. 5 Equação do declínio radioactivo Esta equação (14) é fácil de integrar, pois é a equação a que satisfaz uma exponencial. Assim, n(t) tem a forma n(t) = Ce λt, (16) em que C é uma constante a determinar. Essa determinação é trivial. Sabemos que em t = 0 ainda nenhum núcleo decaíu e portanto n(t = 0) = n 0, em que n 0 é o número inicial de núcleos. Temos então Portanto, a expressão nal para n(t) é n(t = 0) = Ce 0 = n 0 C = n 0. (17) n(t) = n 0 e λt. (18) Este é o número de núcleos que restam em cada instante t. A equação (18) é a equação do declínio radioactivo. Mostra que o número de núcleos por decair diminui de forma exponencial ao longo do tempo. A gura 7 ilustra a evolução de uma população de núcleos radioactivos com probabilidade de desintegração λ = 0.02s 1. 6 Vida Média Dada uma amostra com um número muito grande de núcleos e probabilidade de declínio λ, quanto é que um núcleo vive em média? Por outras palavras, qual é a sua vida média? A gura 8 que se segue mostra o raciocínio básico para chegar à expressão da vida média: Nesta gura estamos a tomar um incremento de t = 1s. Se tomarmos agora t dt, então o número de núcleos que viveram entre t e t + dt é dado por n(t) n(t + dt) = dn. 8
9 Figura 7: O número de núcleos por decair para uma espécie com λ = 0.02s 1. No caso t = 1s calcularíamos a vida média como uma média pesada, tomando o peso do intervalo i como sendo n(t i 1 ) n(t i ) e o intervalo seria representado pelo seu valor médio. Assim, τ = 0.5 (n(0) n(1)) (n(1) n(2)) +... n(0) (19) No caso em que t passa a dt temos n(t i 1 ) n(t i ) dn e, pelo que τ = 1 t( dn) = 1 n(0) 0 λ. (20) Este resultado mostra-se de forma simples. Começamos por notar que de acordo com a equação do declínio radioactivo se tem dn = λn 0 e λt dt. Fica então τ = λ 0 te λt dt = λ [ ( 1 e λt λ + t )] = 1 2 λ 0 λ. Chegamos então à conclusão de que a vida média é o inverso da probabilidade de desintegração (e tem unidades de s, claro). 7 Período O Período de desintegração, T, é o intervalo de tempo em que o número de núcleos por decair se reduz a metade do número inicial. Assim, n(t ) = n 0 2 n oe λt = n λt = ln 2, (21)
10 Figura 8: O tempo de vida dos núcleos em função de n(t). ou seja 8 Actividade T = ln 2 λ = τ ln 2. (22) Não podemos medir n(t) [teríamos de contar todos os núcleos radioactivos de uma amostra, o que é uma tarefa impossível] e portanto a equação do declínio radioactivo, como está, não nos serve de muito. No entanto podemos medir o número de declínios por unidade de tempo. Como já vimos, isso vale λn(t) = dn dt A(t). (23) A(t) é a actividade. É uma grandeza que já podemos medir, por exemplo, com um contador Geiger. É fácil de ver que a actividade satisfaz à mesma equação que n(t): da dt = λdn = λ[ λn(t)] λa(t). (24) dt Se A(t) satisfaz à mesma equação diferencial que n(t), então também satisfaz à mesma equação de declínio: A(t) = A 0 e λt, (25) 10
11 com A0 = A(t = 0) = λn(t = 0) = λn0. Podemos medir a actividade com um contador Geiger e através desta contagem determinar λ e assim n0. Figura 9: Determinando τ a partir das medidas da actividade. Como determinar a vida média do elemento a partir do qual se zeram as contagens mostradas na gura 9? De (25) temos ln A(t) = ln A0 λt. (26) Isto quer dizer que se tomarmos o logaritmo das contagens em função do tempo, o declive da recta será λ. Neste caso λ = s 1 τ = 89.3 s T = 61.9 s. 8.1 (27) unidades da actividade A unidade do sistema internacional é o becquerel (Bq), que é igual é uma desintegração por segundo. Na prática usa-se o Curie (Ci), 1 Ci = declínios/s. 11 (28)
12 9 A Estatística do declínio radioactivo A desintegração de um núcleo radioactivo é um processo aleatório: numa colecção de núcleos não podemos prever qual será o próximo a decair e para um núcleo em particular não sabemos quando decairá. Vimos no entanto que se λ é a probabilidade de desintegração por unidade de tempo, então λn(t) é a taxa de variação temporal de n(t), o número de núcleos por decair. Isto ainda quer dizer que podemos interpretar λn(t) como o número de declínios por unidade de tempo. Suponhamos agora que fazemos repetidas medidas do número de desintegrações num intervalo de tempo t. Então, se n(t) praticamente não variar em t temos que o número médio de desintegrações em t é n = λn(t) t. (29) Se n n(t), então podemos considerar que n(t) não varia e tomamos n(t) N =Const. Para que isto aconteça devemos ter, por (29), n = λ t 1 τ t. (30) N Agora é fácil de compreender que τ t é uma condição necessária e suciente (vimos apenas a necessária) para que 1. n(t) se possa considerar constante, =N, e 2. λn(t) t = λn t é o valor médio de desintegrações em t. Mas se µ = λn t é o valor médio, isto quer dizer que todas as medidas vão dar o valor µ de contagens? Claro que não. Se zermos muitas contagens de t segundos, os resultados vão oscilar em torno de µ. A forma como se dá essa oscilação é descrita pela distribuição de Poisson: P (n, µ) = µn e µ, (31) n! em que n é o número de contagens, µ = λn t é o número médio de contagens e P (n, µ) é a probabilidade de ter n contagens se µ for o número médio de contagens. Assim, no nosso caso pobemos ainda escrever P (n, λn t) = (λn t)n e λn t. (32) n! A forma da distribuição está ilustrada na gura. À medida que µ a distribuição de Poisson tende para uma distribuição do tipo gaussiano. Vejamos agora as propriedades da distribuição de Poisson; 12
13 Figura 10: A distribuição de Poisson para µ = 5. Normalização A soma de todas as probabilidades deve dar 1, ou seja P (n, µ) = 1. (33) n=0 É fácil ver: ( P (n, µ) = n=0 n=0 µ n ) e µ. n! Mas a expansão em série de e µ parêntesis. Assim, é precisamente pela soma entre P (n, µ) = e µ e µ = 1. n=0 Valor Médio O valor médio para qualquer distribuição de probabilidade não é mais do que a média pesada: n = n np n. Assim, neste caso temos que o número médio de contagens é n = np (n, µ) = µ. (34) n=0 Este resultado tinha de ser ser assim, já que a µ é, por hipótese, o valor médio. Temos n = np (n, µ) = n µn n=0 n=0 n! e µ = µe µ 13 n=1 µ n 1 (n 1)! =...
14 onde só se usou o facto de que o termo n = 0 é nulo e se passaram os elementos constantes para fora da soma. Se zermos agora a mudança de variável k = n 1 temos... = µe µ k=0 µ k k! = µe µ e µ = µ. Variância De uma forma geral, a variância é dada por σ 2 = 1 N 1 i=0 (x i x 2 ). (35) É fácil ver que se N, então σ 2 se pode antes escrever σ 2 = 1 N i=0 x 2 i x 2. (36) No nosso caso isto vai implicar σ = n. (37) Mostremos este resultado: a aplicação directa de (36) dá σ 2 = n=0 = µe µ n=1 n 2 µn n! e µ µ 2 = nµ n 1 (n 1)! µ2 = µe µ d dµ k=0 µ n n n=0 (n 1)! e µ µ 2 = µ n (n 1)! µ2 Se agora zermos de novo a mudança de índice k = n 1, a expressão ca µe µ d µ k+1 µ 2 = µe µ d [ µ k ] µ µ 2 dµ k! dµ k! n=1 k=0 = µe µ d dµ [µeµ ] µ 2 = µe µ (e µ + µe µ ) µ 2 = µ Este resultado quer dizer que quando fazemos contagens a variância aumenta com o número de contagens, já que σ = n. Imaginemos que fazemos muitas medições num dado intervalo de contagem e que o valor médio de contagens é 9. Isto quer dizer que as contagens se distribuem à volta do valor 9 com uma dispersão de ± 9 = ±3. Se agora aumentarmos o tempo de contagem e passarmos a ter µ = 100, então passamos a ter valores de contagem distribuídos em torno de n = 100, com uma dispersão de ± 100 = ±10. 14
15 Questão contagens? Quer isto dizer que a estatística piora com o número de Para uma contagem individual também assumimos uma variância de n, porque a contagem já é em si uma amostra estatística (p. ex.: medida única de 547 contagens. Então o resultado é n = 547 ± 547). 10 Detectores de radiação com gás 10.1 Câmaras de ionização A ideia básica do funcionamento das câmaras de ionização está ilustrada na gura 11. Figura 11: Ionozação numa câmara de gás. Um gás é mantido entre as placas de um condensador. Entre as placas aplicase uma tensão e gera-se um campo eléctrico entre elas. Quando uma partícula radioactiva (alfa, beta ou gama) ioniza um dos átomos do gás gera-se um electrão e um ião positivo. Se o campo for sucientemente forte electrões e iões não se recombinam e migram em direcção às placas com carga de sentido oposto ao seu. Consideremos agora um caso particular, em que o gás é o ar. A energia média de ionização para o ar (média sobre os diferentes componentes do ar) é 34 ev. 15
16 Suponhamos que uma partícula radioactiva de 1 MeV entra na câmara. Esta partícula vai ionizar um número de átomos igual a N = Energia da radiação Energia de ionização = (38) Formar-se-ão portanto aproximadamente pares electrão-ião. Os electrões dirigem-se para a placa positiva e os iões para a placa negativa. Os electrões são muito mais rápidos que os iões porque estes são muito mais massivos. Quando a carga correspondente a estas electrões se deposita na placa positiva gera-se uma tensão extra aos terminais do circuito das placas (isto é, esta tensão sobrepõ-se à alta tensão aplicada às placas para fazer a ionização). Essa tensão é dada pela equação habitual dos condensadores: Q = CV V = Q C, (39) em que Q é a carga dos electrõs, Q = Ne = e = C (e é a carga elementar). A capacidade C tem se ser calculada para um caso particular. Suponhamos que as placas têm dimensão de cm (área A = 10 2 m 2 ), com uma separação de d = 1 cm. Então C = ɛ 0 A d = F, (40) em que ɛ 0 = F/m é a permitividade do vazio. Vem nalmente que a tensão originada pelos electrões aos terminais da placa é V = = 0.6 mv. (41) Esta tensão é muito pequena, e tem de ser amplicada. De acordo com o que vimos, se a radiação incidente passar a ser de 2 MeV, o sinal do detector passa a ser aproximadamente 1.2 mv. Portanto o sinal é proporcional à energia da radiação. Por outro lado a voltagem aplicada às placas não inuencia a magnitude do sinal. O único efeito que se espera da variação da tensão aplicada é a variação da velocidade dos electrões e iões. Com uma tensão aplicada maior as cargas livres devem chegar mais rápidamente às placas de carga oposta. Portanto, para uma câmara de ionização, o sinal é proporcional à energia da partícula radioactiva o sinal não depende da tensão aplicada às placas E qual é a rapidez desde detector? Valores típicos são os seguintes: tensão aplicada: 100 V, velocidade de deriva dos iões 1 m/s. Para uma distância de 1 cm temos portanto um tempo de resposta de 0.01 s. Se quiséssemos fazer 16
17 contagens de radiação com este detector estaríamos limitados a valores da ordem de 100 partículas por segundo. Para valores superiores a este os sinais sobreporse-iam e não seria possível discriminá-los individualmente. Ora, uma amostra de 1µCi (valor típico de uma fonte radioactiva relativamente fraca) tem um declínios por segundo, muito mais do que o valor limite referido de 100. Em suma, as câmaras de ionização não são aptas para fazer a contagem dos declínios de uma amostra radioactiva. Servem no entanto para monitorizar a radiação. Em ambientes radioactivos a tensão gerada nas placas é diferente de zero, indicando a presença de partículas radioactivas. O circuito eléctrico genérico de uma câmara de ionização está esquematizado na gura 14. Figura 12: Ionização numa câmara de gás [ Note-se que a tensão entre as placas gera uma ddp no sentido dos terminais das baterias, enquanto que a ddp originada pela deposição de iões e electrões nas placas tem o sentido oposto. Por isso é que se pode introduzir um amperímetro no circuito e medir a corrente gerada pelos iões e electrões (a tensão de polarização das placas não gera corrente). Assim, acorrente medida é proporcional à actividade da fonte e à energia das radiações Contadores proporcionais Para conseguir contar pulsos aumenta-se a tensão entre as placas. Na verdade, passa a ser mais conveniente usar uma geometria cilíndrica, como está ilustrado na gura 13. A diferença de potencial entre o o do ânodo ( ) e o cilindro do cátodo ( ) 17
18 Figura 13: Geometria cilíndrica dos contadores proporcionais [ atinge mais de 1000 V. O campo eléctrico tem a forma E(r) = V r ln(b/a), (42) em que V é a ddp entre o e cilindro, r é a coordenada cilíndrica com origem no o, b é o raio interno do cátodo e a é o raio exterior do o. O efeito de um campo tão forte faz-se sentir não apenas na velocidade dos electrões e iões, mas também no aparecimento das avalanches de Townsend. Quando um electrão tem suciente energia pode chocar com um átomo e ionizá-lo: e + A 0 e + e + I + = 2e + I +. (43) Assim, antes da colisão havia um electrão e depois da colisão passam a haver dois electrões. O processo está esquematizado na gura 14. O sinal observado depende, tal como no caso da câmara de ionização, da energia da radiação incidente. Com efeito, o número de electrões originados por ionização primária é calculado como no exemplo do cálculo (38). Portanto, quanto maior a energia incidente, mais electrões primários. Um facto importante é que no regime que estamos a considerar cada electrão primário gera apenas uma avalanche (é nítido da gura). Portanto, relativamente ao caso da câmara de ionização o sinal é ainda proporcional à energia da radiação incidente, mas maior, porque o número de electrões que chegam ao ânodo é amplicado por acção das avalanches. Uma diferença importante, no entanto, é que agora o sinal depende do campo aplicado entre as placas. Com efeito, se a tensão entre as placas for maior a zona de campo elevado à volta do ânodo onde se iniciam as avalanches aumentam. Isto quer dizer que as avalanches têm mais espaço para crescer e chegam mais electrões ao ânodo. Portanto, para um contador proporcional, 18
19 Figura 14: Avalanche de Townsend. Ilustram-se apenas quatro avalanches. O número típico de avalanches varia entre 10 3 e o sinal é proporcional à energia da partícula radioactiva o sinal aumenta com a tensão aplicada às placas Como se pode ver de (42), o campo é muito elevado junto ao ânodo, e é nesta zona que se dão as avalanches. A propagação das avalanches é muito rápida e por isso o que determina o tempo de reacção do contador é o tempo que os electrões primários levam desde a zona da sua formação até à vizinhança do ânodo. Se a isto acrescentarmos o facto de que agora os electrões viajam muito mais rápido do que na câmara de ionização por causa da tensão aplicada, obtém-se um tempo de resposta da ordem de µs e portanto contagens da ordem de 10 6 /s Contador de Geiger-Müller O que é que acontece se o campo aplicado entre ânodo e cátodo aumentar ainda mais? Quando as energias se tornam muito elevadas os átomos que participam nas avalanches podem car em estados excitados de muito alta energia após a colisão e emitir um fotão UV ou X, também de alta energia. Podem também haver recombinações entre electrões e iões, com emissão de fotões. Estes fotões podem agora induzir o efeito fotoeléctrico num átomo do tubo, que geralmente não está na avalanche. Como o efeito fotoeléctrico é γ + A 0 e + I +, (44) 19
20 o novo fotoelectrão vai iniciar uma nova avalanche. Gerou-se pois uma avalanche secundária. Esta é uma grande diferença relativamente ao caso anterior do contador proporcional. Enquanto no caso do contador proporcional um electrão primario gera apenas uma avalanche, neste caso um electrão primário pode gerar muitas avalanches secundárias. A geração de uma avalanche secundária está ilustrada na gura 15 Figura 15: Formação de uma avalanche secundária. Os fotões viajam para todas as partes do tubo e geram fotoelectrões e avalanches secundárias por todo o tubo. Por isso nesta região, chamada de Geiger-Müller, todo o tubo participa no processo. Isso quer dizer que a radiação inicial acaba sempre por gerar o mesmo sinal: se tiver energia E gera uma cascata de avalanches; se tiver energia 2E acaba por gerar a mesma cascata. A amplicação do tubo é agora tão grande ( ) que basta uma pequena perturbação para fazer gerar a cascata. A energia das radiações incidentes não é discernível. O tubo dá o mesmo sinal para todas as radiações (e é cerca de 1 V, mesmo sem amplicação). Os contadores Geiger operam nesta região. Os iões são muito mais lentos do que os electrões. Isto quer dizer que quando os electrões chegam ao ânodo ainda os iões estão quase no mesmo sítio, ou seja, nas imediações do ânodo, onde as avalanches se iniciam. Mas então o que acontece é que os iões formam uma nuvem de carga positiva que blinda o campo eléctrico do ânodo. O campo eléctrico efectivo reduz-se muito e a possibilidade de se darem novas avalanches é quase nula. Vemos portanto que o sistema se auto-regula. A chegada dos electrões ao ânodo limita a possibilidade de novas avalanches. 20
21 No entanto ainda há uma possibilidade. Os iões acabam por chegar ao cátodo (num tempo da ordem dos ms) e como o campo é elevado, chocam com energia suciente para lhe arrancar electrões. Ora, estes electrões poderiam, agora sim, iniciar nova avalanche. Para evitar este processo adiciona-se ao tubo um gás (quenching gas), que tem por missão absorver a energia cinética dos iões através de colisões. O que acontece se se aumentar mais a tensão? Dentro da zona de Geiger- Müller não acontece nada, isto é, o valor do sinal não se altera porque todos os átomos do tubo já estão a participar nas avalanches já não há mais para dar. No entanto, aumentando ainda mais a tensão o gás entra em disrupção dá-se uma descarga entre as placas através do gás. O contador poderá car inutilizado. Portanto, para um contador de Geiger, o sinal não depende da energia da partícula radioactiva o sinal não depende da tensão aplicada às placas Um resumo dos três regimes das câmaras de gás está na gura 16. Figura 16: Um resumo dos três regimes das câmaras de gás. 21
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