A Função da Descentralização no Direito Administrativo
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1 A Função da Descentralização no Direito Administrativo Nas palavras do Professor Freitas do Amaral, a descentralização consiste num sistema em que a função administrativa esteja confiada não apenas ao Estado, mas também a outras pessoas colectivas territoriais. 1 Desta acepção retira-se que, num sistema descentralizado, o exercício da função administrativa não cabe essencialmente ao Estado, mas é também entregue a outras pessoas colectivas, que podem ser, por sua vez, públicas ou privadas. Logo, na opção inversa, verifica-se que há centralização quando o exercício da função administrativa é incumbida apenas ao Estado. Em Portugal, a força desta descentralização administrativa decorre, nomeadamente, da Constituição da República Portuguesa, que de acordo com o artigo 267º, número 2, diznos que a lei estabelecerá formas adequadas de descentralização e desconcentração administrativa, como se verifica respectivamente às Autarquias Locais, às Regiões Autónomas, aos Institutos Públicos, às Associações e finalmente às Universidades Públicas. A descentralização não consiste apenas no exercício de funções administrativas por entidades colectivas que não o Estado, é necessário adicionar, que a estas pessoas colectivas, sejam investidas competências e atribuições que permitam a aproximação da administração às populações e que sejam ainda afectos os meios financeiros para que possam efectivamente exercer aquelas competências, tais como, prosseguir as atribuições transferidas, entre outras. A Lei Nº 159/99, de 14 de Setembro, relativa ao quadro de transferência de atribuições e competências para as autarquias locais, dá-nos um exemplo desse investimento de poderes, quando no seu artigo 1º estabelece: a transferência de atribuições e competências para as autarquias locais ( ). Retomando novamente o conceito de descentralização, foi referido que consiste num sistema em que a função administrativa está confiada a outras pessoas colectivas que não o Estado, tendo ainda um exercício de transferência de competências, atribuições e ainda meios financeiros para que a outra pessoa colectiva que não o Estado tenha modos de prosseguir essas atribuições. Retira-se desta definição três características deste sistema: desde logo, a existência de duas pessoas colectivas distintas, ou seja o Estado que delega as respetivas competências e atribuições, e a Pessoa Colectiva que fica encarregue de prosseguir e concretizar esses mesmos poderes atribuídos. De seguida, temos um segundo acto que diz respeito ao exercício de 1 AMARAL, Diogo Freitas do, Curso de Direito Administrativo, p.873. Leonor Maria Campos Joaquim; Nº56928; Turma B; Subturma 15. Página 1
2 transferência das competências, atribuições e os meios financeiros. E, finalmente, uma terceira situação, em que a pessoa colectiva tem de dispor de autonomia financeira e administrativa para poder prosseguir e concretizar os respetivos poderes transferidos. Relativamente às modalidades de descentralização, distinguem-se as seguintes formas: territorial, institucional ou associativa, e ainda pode ser de primeiro ou segundo grau. 2 Considera-se territorial nos casos em que a pessoa colectiva assenta sobre uma fracção do território, que corresponderão às Autarquias Locais e às Regiões Autónomas. O Professor Freitas do Amaral entende que a descentralização, em sentido estrito, corresponde apenas à descentralização territorial, enquanto que as demais, respectivamente Associativa e Institucional, manifestam-se como uma mera devolução de poderes. 3 Há descentralização institucional (Institutos Públicos) nos casos em que a pessoa colectiva tem substrato patrimonial, e associativa nos casos em que o substrato da pessoa colectiva é associativo (Associações e Universidades Públicas). O substrato corresponde à realidade social que suporta a personalização. Nos Institutos públicos o substrato sendo patrimonial deve-se entender que tem por vista o aumento do capital, enquanto que nas Associações, o substrato associativo significa que não têm necessariamente fim lucrativo, mas têm principalmente vista à realização de fins concretos. Quanto aos graus em que a descentralização se manifesta, os Professores Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos numeram duas modalidades: a descentralização pode ser de primeiro grau, correspondendo assim à que resulta diretamente da Constituição da República Portuguesa (CRP) ou através de uma outra lei, e pode ser em segundo grau, resultando de um ato administrativo habilitado por lei: por exemplo, a criação de empresas municipais, intermunicipais e regionais pelos próprios municípios (Lei Nº 58/98, de 18 de Agosto). Enquanto que o Professor Freitas do Amaral, neste aspecto, afecto aos graus da descentralização, distingue principalmente três formas: descentralização privada, quando há atribuição de personalidade jurídica de direito privado, descentralização administrativa, quando há atribuição de personalidade jurídica de direito público, agregando situações de atribuição de autonomia administrativa, autonomia financeira e de faculdades regulamentares, e finalmente descentralização politica, quando há transferência de poderes legislativos, como se verifica nas Regiões Autónomas quanto aos seus 2 Este último aspecto referem, designadamente, os Professores Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos em Direito Administrativo Geral Introdução e Princípios Fundamentais. p AMARAL, Diogo Freitas do, Curso de Direito Administrativo, p.878. Leonor Maria Campos Joaquim; Nº56928; Turma B; Subturma 15. Página 2
3 estatutos, Assembleias Legislativas Regionais e Governo Legislativo Regional. Os Professores Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos acrescentam ainda que, em quaisquer das modalidades de descentralização, a entidade descentralizada pode ser de fins gerais (Autarquias Locais) ou de fins específicos (Institutos Públicos e as Associações Públicas). A adoção ao sistema da descentralização administrativa assume uma grande importância no que toca às vantagens de que dela decorrem. Verifica-se desde logo que, a descentralização, permite uma melhor eficácia e funcionalidade da função administrativa. De seguida, confirma-se a existência de uma maior limitação ao poder politico, pois este sistema traz a administração próxima das populações, garantindo-lhes uma maior liberdade e funcionando como um impedimento a um abuso por parte do Estado. Há ainda a concretização do artigo 2º da CRP, na medida em que permite um aprofundamento da democracia participativa, dado que as necessidades das populações são satisfeitas por aquelas que demonstrem interesse, permitindo que essas escolham quem as vai representar. De um modo sucinto, é muito mais vantajoso ter um sistema descentralizado que permita que cada uma das pessoas colectivas represente respectivamente os seus sujeitos e os seus interesses que apenas um único órgão o faça, podendo suceder abusos por parte dessa entidade por prossecução de interesse próprios que não os do povo. No entanto, os sistemas descentralizados acatam ainda uma série de inconvenientes, no que diz respeito, principalmente, a uma falta de especialização por parte daqueles a que são incumbidos os poderes de representar, por exemplo, em casos nas autarquias locais em que o autarca eleito não retém as qualificações necessárias para o exercício destas funções, podendo levar a um abuso dos poderes por partes destas figuras. Ainda a ter em conta que há a desvantagem de haver um excessivo número de centros de decisão, de patrimónios autónomos e de exigências de gestão financeira. 4 A descentralização não é uma dimensão que se impõe como absoluta. É acompanhada por limitações à transferência de competências e atribuições para pessoas colectivas a designar, limitações estas que podem ser quanto: ao modo como a Administração é limitada e, por conseguinte, também o são as entidades colectivas, podem ainda ser limitadas a quantidade de poderes que são transferidas para as tais entidades e, por último, impõe-se limites quanto ao modo que os poderes que são transferidos para as entidades são exercidos. Relativamente à primeira limitação 4 SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de. Direito Administrativo Geral Introdução e Princípios Fundamentais Leonor Maria Campos Joaquim; Nº56928; Turma B; Subturma 15. Página 3
4 enumerada, a Administração não goza de poderes absolutos que se impõe a tudo e todos. Na realidade, a mesma está subjugada ao Principio da Legalidade com o previsto no artigo 3º do Código do Procedimento Administrativo (CPA). Numa acepção mais simples, enquanto que a autonomia privada consiste na liberdade de estipular e celebrar todos os negócios jurídicos que não sejam proibidos por lei, o Principio da Legalidade é o outro lado da moeda quanto à Autonomia Privada, dado que Os órgãos da Administração Pública devem atuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes forem conferidos e em conformidade com os respectivos fins (Artigo 3º, CPA), ou seja, a Administração só pode agir mediante aquilo que a lei permita, e nunca fora dessa esfera de competência atribuída pela lei. Portanto, quando são limitados os poderes atribuídos à Administração, naturalmente que os poderes das entidades descentralizadas também o são. Refere-nos a segunda limitação a quantidade de poderes alvo de transferência para as entidades administrativas. O artigo 267º/2 da CRP abrange esta limitação quando estabelece sem prejuízo da necessária eficácia e unidade de ação. Ora, não faria sentido o Estado atribuir mais poderes que o necessário ou que não se encaixem no fim prosseguido àquela entidade administrativa. Claramente, mediante o tipo de entidade administrativa em causa, a transferência de poderes, nomeadamente de competência e atribuições, tem de ser adequada à necessidade, ao objecto e fim prosseguido por essa entidade. A terceira e última limitação consagra o Principio da Tutela Administrativa. Esta ultima limitação manifesta a intervenção do Estado na gestão do exercício das pessoas colectivas, nomeadamente as autarquias locais. Daqui resulta, principalmente, a tutela administrativa que consististe sobretudo na possibilidade de intervenção de uma pessoa colectiva publica na esfera de gestão de outra pessoa colectiva (não necessariamente pública), e tem como objecto a legalidade da actuação das autarquias locais e também o mérito pelas decisões destas. Encontra-se constitucionalmente previsto no artigo 242º. É uma limitação à descentralização na medida em que a entidade administrativa não é integralmente independente do órgão principal da Administração. Resta, por último, mencionar o âmbito de aplicação do principio da subsidiariedade (previsto tanto no artigo 6º da CRP, e no artigo 2º/2 da Lei Nº 159/99, de 14 de Setembro) no que toca à descentralização administrativa. Este principio estabelece que o poder público só deve atuar quando se verifique que uma outra entidade, pública ou privada, de hierarquia inferior não tenha a capacidade para o fazer ou para alcançar os fins desejados pelo poder público. A Lei Nº159/99, de 14 de Leonor Maria Campos Joaquim; Nº56928; Turma B; Subturma 15. Página 4
5 Setembro esclarece este sentido: ( ) as atribuições e competências (devem) ser exercidas pelo nível da administração melhor colocado para as prosseguir com racionalidade, eficácia e proximidade aos cidadãos. Verifica-se assim a concretização do principio da subsidiariedade no que toca à descentralização administrativa. Bibliografia AMARAL, Diogo Freitas do. Curso de Direito Administrativo - Vol. I. 3º Ed. Almedina. Coimbra CAETANO, Marcello. Manual de Direito Administrativo Almedina. Coimbra Vol. I. 10º Ed. SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de. Direito Administrativo Geral Introdução e Princípios Fundamentais. 3ºEd. Dom Quixote CAUPERS, João. Introdução ao Direito Administrativo. 10ª Ed. Âncora Editora. Lisboa Leonor Maria Campos Joaquim; Nº56928; Turma B; Subturma 15. Página 5
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