ANÁLISE DA VULNERABILIDADE SÍSMICA DE INFRAESTRUTURAS RODOVIÁRIAS E FERROVIÁRIAS. APLICAÇÃO À ZONA DA GRANDE LISBOA
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1 ANÁLISE DA VULNERABILIDADE SÍSMICA DE INFRAESTRUTURAS RODOVIÁRIAS E FERROVIÁRIAS. APLICAÇÃO À ZONA DA GRANDE LISBOA Fotografia Autor 2 30 mm 40 mm Luís M. C. GUERREIRO Professor Auxiliar ICIST - DECIVIL - IST Lisboa João J. R. T. AZEVEDO Professor Catedrático ICIST - DECIVIL - IST Lisboa SUMÁRIO Apresenta-se uma metodologia para a caracterização e análise da vulnerabilidade sísmica de redes rodoviárias e ferroviárias, visando o desenvolvimento de um simulador para a estimativa dos danos causados por sismos na região da Grande Lisboa. Apresenta-se uma classificação dos diversos tipos de obras de arte existentes na rede nacional e os critérios para classificação dos estados de dano associados aos seus elementos, considerando o efeito dinâmico da resposta das estruturas, os fenómenos de liquefacção e deslizamento de terreno de fundação. Utilizando o simulador e considerando diversos conjuntos de cenários sísmicos, são apresentados alguns resultados de um estudo de sensibilidade da rede aos valores da magnitude da acção sísmica. 1. INTRODUÇÃO A implementação de políticas de planeamento que permitam avaliar e minimizar as consequências de um sismo e a elaboração de planos de emergência a accionar em caso de sinistro, são dois objectivos importantes dos serviços de protecção civil. A obtenção de cenários sísmicos revela-se para tal fundamental, já que permite avaliar a segurança das estruturas existentes para diferentes ocorrências da acção sísmica e definir e aperfeiçoar a forma de intervenção, optimizando os respectivos planos de emergência.
2 474 SÍSMICA º Congresso Nacional de Sismologia e Engenharia Sísmica Apresentam-se neste artigo as metodologias desenvolvidas e alguns passos percorridos na construção de um modelo para a análise da vulnerabilidade sísmica das redes rodoviária e ferroviária de transportes na Área Metropolitana de Lisboa e alguns concelhos limítrofes. O projecto inseriu-se num trabalho mais vasto, coordenado pelo Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil, que visou desenvolver um modelo para análise da vulnerabilidade sísmica do edificado, em geral, de estruturas consideradas estratégicas e das redes de infra-estruturas. O impacto dos danos provocados pelos sismos na rede de transportes é normalmente importante, não pelo número de vítimas registado, tipicamente reduzido, mas pelos prejuízos económicos por eles causados. Os danos económicos podem ser classificados em directos e indirectos. Os directos, de que se apresentam dois exemplos na figura 1, são o somatório dos custos de reparação dos elementos da rede afectados, enquanto que os indirectos, muito mais difíceis de quantificar, estão relacionados com a forma como a economia é afectada pela ruptura da rede de transportes. A importância dos danos indirectos é tanto maior quanto mais desenvolvida for a economia da zona afectada pelo sismo. Nos sismos de Northridge (1994), Kobe (1995) e Taiwan (1999), embora não tenha havido uma quantificação dos danos indirectos existe a convicção de que estes excederam os danos directos. Figura 1: Danos em infra-estruturas de transportes Para uma avaliação correcta dos danos é conveniente separar a análise de danos nas vias e nas obras de arte. Nas vias, os danos resultam essencialmente da rotura do solo de fundação ou da obstrução devida a diversos fenómenos tais como a liquefacção, movimento de falhas ou deslizamento de taludes. Os danos em obras de arte podem ser divididos em dois grupos, de acordo com o fenómeno que está na sua origem: rotura do solo de fundação (movimento de falhas, liquefacção, deslizamento de terrenos) ou efeito dinâmico da vibração do solo. Enquanto os danos originados pela rotura de fundação dependem essencialmente do nível de deformação do solo, os devidos ao efeito dinâmico dependem das características dinâmicas das pontes e viadutos e da sua capacidade para resistir a acções cíclicas. As regras de dimensionamento sísmico de pontes e, como consequência, a sua capacidade sismo resistente, têm evoluído muito nas últimas décadas, pelo que a idade das obras de arte é um indicador essencial para avaliar o seu desempenho. Verifica-se dos relatos de danos de sismos passados, que a data de construção é um dos parâmetros que mais influencia o nível de danos observado.
3 Luís M. C. GUERREIRO, João J. R. T. AZEVEDO IDENTIFICAÇÃO E LEVANTAMENTO DAS REDES A implantação georreferenciada de todas as obras de arte baseou-se num levantamento com um sistema portátil de leitura de coordenadas GPS, também usado para o definir o traçado das vias rápidas e auto-estradas. Os dados do Instituto Geográfico do Exército foram usados no traçado de todas as outras vias. A Figura 2 mostra as redes de auto-estradas e de estradas nacionais da zona em estudo, com indicação das obras de arte mais importantes. Figura 2: Rede rodoviária Auto-estradas e vias rápidas e estradas nacionais O simulador tem portanto implementado um SIG que contem as duas redes (rodoviária e ferroviária) definidas através de troços de via e nós. Estes últimos correspondem às localizações das obras de arte ou a pontos singulares como as intersecções entre vias ou de vias com limites de zonas geográficas usadas para definir o tipo de solo e a acção sísmica ou para caracterizar diferentes potenciais de liquefacção e de deslizamento de terreno. 3. DEFINIÇÃO DA VULNERABILIDADE DAS REDES 3.1. Metodologia de avaliação da vulnerabilidade Existem várias metodologias para avaliação de danos físicos em redes de transporte tais como as descritas no ATC13 [1] e no HAZUS99 [2], que se baseiam em danos observados durante sismos. O HAZUS99 apresenta uma metodologia baseada na definição de curvas de fragilidade que permitem estimar os danos a partir de medidas directas da acção sísmica (espectro de resposta, movimento permanente do solo, aceleração de pico, etc.). Por não existirem dados sobre danos ocorridos na área em estudo não foi possível adoptar directamente nenhuma das metodologias. Optou-se então por utilizar a metodologia HAZUS99 com as adaptações necessárias a uma melhor representação do cenário português. Os danos são classificados em cinco estados, de acordo com o seu grau de severidade, correspondendo, para cada tipo de estrutura e a cada estado de dano, uma curva de fragilidade, através da qual é calculada a probabilidade de ocorrerem danos desse tipo.
4 476 SÍSMICA º Congresso Nacional de Sismologia e Engenharia Sísmica Foram adoptados os seguintes estados de dano: Sem danos (ds 1 ), Danos Ligeiros (ds 2 ), Danos Moderados (ds 3 ), Danos Elevados (ds 4 ), Colapso (ds 5 ). Consoante o tipo de elemento da rede considerado (via, ponte ou viaduto e túnel) existe uma descrição específica de cada um dos estados de dano Curvas de fragilidade As curvas de fragilidade foram modeladas através de funções de distribuição de probabilidade log-normal, do tipo das utilizadas no HAZUS99, habitualmente usadas para descrever a resistência de um elemento, permitindo calcular a probabilidade de atingir ou exceder cada estado de dano em função do nível da acção sísmica. Cada curva de fragilidade é caracterizada por uma mediana e por um factor de dispersão (desvio padrão do logaritmo da variável). A variável de entrada, cuja mediana e dispersão permitem caracterizar a curva de fragilidade, é uma medida do nível da acção sísmica e pode ser um valor do espectro de resposta ou o deslocamento permanente do solo, consoante o tipo de situação analisada: danos devidos à acção dinâmica imposta pelo movimento do solo; devido à ocorrência de liquefacção; devido à ocorrência de deslizamentos de terrenos. Nas pontes e viadutos, para a análise dos danos devido ao efeito dinâmico imposto pelo movimento do solo, a variável de entrada é o valor espectral correspondente ao período de 1.0 segundo e coeficiente de amortecimento de 5%. A utilização deste período de referência justifica-se por se considerar ser um valor próximo do que as pontes em estudo devem apresentar. Para estimar os danos devidos à liquefacção ou deslizamentos utiliza-se como variável de entrada o valor do deslocamento permanente do solo. Nas vias, o efeito dinâmico da acção é desprezável, sendo os danos somente função do deslocamento permanente do solo, quer por liquefacção quer por deslizamentos de terreno. As curvas de fragilidade tomam a seguinte forma: P [ Ds ds ] = Φ{[ln(Mediana)-ln(X)]/β} (1) com: Φ Função de distribuição log-normal (cumulativa); X Variável de entrada; Ds Nível de dano; ds Nível de referência característico de um dado estado de dano; β Coeficiente de dispersão (medida da dispersão dos valores em torno da mediana). As medianas e coeficientes de dispersão são elementos essenciais para a definição do comportamento sísmico dos elementos da rede. Não sendo praticável classificar cada um dos elementos procedeu-se, tal como propõe o HAZUS99, a uma divisão por classes. Nos túneis e vias rodoviárias adoptaram-se as classes consideradas no HAZUS99 por se considerar não haver diferenças significativas entre a situação dos Estados Unidos e o caso nacional. Para as pontes foram consideradas classes adaptadas à situação nacional por serem importantes as diferenças entre as soluções de pontes consideradas nos dois países. O estabelecimento das classes de pontes consideradas neste estudo resultou da observação dos tipos existentes realizada durante o levantamento da rede e da opinião de peritos nesta área de projecto. As classes consideradas contemplam a divisão por tipologias e também a divisão por idade de
5 Luís M. C. GUERREIRO, João J. R. T. AZEVEDO 477 projecto, por ser muito importante na caracterização do comportamento sísmico das pontes dada a evolução registada ao nível da regulamentação portuguesa. No Quadro 1 são indicadas as várias classes consideradas neste trabalho, às quais foi ainda acrescentado o índice (+) ou (-) conforme se trate de pontes de antes e depois de 1985, data em que na prática se começou a aplicar a regulamentação actual. Quadro 1: Classes de pontes e viadutos Descrição Arco de alvenaria. A1 Arco de alvenaria com tabuleiro em B.A. (alargamento) A2 Vigas ou laje de B.A. assente sobre pilares e encontros de alvenaria. A3 Quadro monolítico de B.A. B1 Arco de B.A. B2 Quadro pré-fabricado de B.A. B3 P.I. com tabuleiro em laje: assente em encontros de B.A. C1 assente em encontros de B.A. e em pilares. C2 P.I. com tabuleiro em laje vigada: assente em encontros de B.A. D1 assente em encontros de B.A. e em pilares. D2 P.S. (2 ou 3 vãos), tabuleiro em laje nervurada, + que 1 nervura e 1 só pilar por apoio: com ligações monolíticas aos encontros. E1 com ligações descontinuas aos encontros mas que mobilizam a sua resistência. E2 livres nos encontros e com a resistência sísmica garantida pelos pilares. E3 P.S. (2 ou 3 vãos), tabuleiro em laje nervurada, restantes soluções de pilares: com ligações monolíticas aos encontros. F1 com ligações descontinuas aos encontros mas que mobilizam a sua resistência F2 livres nos encontros e com a resistência sísmica garantida pelos pilares F3 P.S. (2 ou 3 vãos), tabuleiro em laje vigada e 1 só pilar por apoio.* G1 P.S. (2 ou 3 vãos), tabuleiro em laje vigada, + de 1 pilar por apoio ou 1 em lâmina.* H1 Viadutos longos ( de 3 vãos) com tabuleiro em laje nervurada: com resistência sísmica garantida pelos encontros. I1 com resistência sísmica garantida pelos encontros e pilares I2 com resistência sísmica garantida pelos pilares I3 com aparelhos dissipadores de energia I4 Viadutos longos (de 3 vãos) com tabuleiro em laje vigada: com resistência sísmica garantida pelos encontros. J1 com resistência sísmica garantida pelos encontros e pilares J2 com resistência sísmica garantida pelos pilares J3 com aparelhos dissipadores de energia J4 Pontes Especiais L1 (*) As ligações aos encontros não são monolíticas mas mobilizam a sua resistência Para determinar os valores das medianas e coeficientes de dispersão que caracterizam o comportamento sísmico das várias classes de pontes seria importante dispor de dados estatísticos sobre danos sísmicos em Portugal, à semelhança do que aconteceu com o projecto Hazus na zona da Califórnia. Como a informação não existe houve que adaptar a informação disponível à situação portuguesa, de acordo com critérios que se prendem com as regras e códigos de dimensionamento num e noutro país. Foram identificadas as classes de pontes do Hazus com contrapartida nos tipos de pontes correntes em Portugal. Não obstante se verificar
6 478 SÍSMICA º Congresso Nacional de Sismologia e Engenharia Sísmica que os valores das medianas considerados no Hazus são relativamente elevados, optou-se por considerar que os valores das medianas associados a cada estado de dano deveriam ter razões semelhantes no caso português e americano, resumindo-se portanto a tarefa, para cada tipo de estrutura, à determinação da mediana associada a um nível de dano específico. De acordo com a regulamentação actual o valor característico da acção corresponde ao quantilho de 95% [3]. O valor característico da resistência dos materiais corresponde ao quantilho de 5%, devendo os valores de dimensionamento ser calculados com base em coeficientes de segurança devidamente calibrados. Estes coeficientes de segurança estão calibrados de forma a obter valores de dimensionamento com 0.5% de probabilidade de não serem excedidos. Para os materiais mais correntes, aço e betão, esses coeficientes são respectivamente 1.15 e 1.5, que correspondem a coeficientes de variação de 0.15 e 0.45, assumindo uma função de distribuição de probabilidade log-normal para a caracterização dos materiais. Para a definição da resistência das secções responsáveis pela segurança das pontes considerouse que obedece a uma distribuição do tipo log-normal com o coeficiente de variação de (valor intermédio em relação aos normalmente utilizados para o aço e para o betão), que o critério de dimensionamento contemplado na actual regulamentação portuguesa (estados limites últimos) corresponde a um estado de dano que pode ser classificado como Moderado e que o valor de dimensionamento da resistência da secção coincide com o efeito da acção correspondente ao valor de combinação desta. Ao admitir-se que o valor da resistência da secção corresponde à probabilidade de não ser excedido igual a 0.5%, a relação entre este valor e a mediana é igual a Como o valor de dimensionamento da secção corresponde ao valor de combinação da acção sísmica regulamentar, o valor da mediana da curva associada ao estado de dano Moderado é obtido pela multiplicação por 2.13 daquele valor de combinação (Sa(T=1.0)=0.28g). Para definir as medianas associadas à situação de dimensionamento antes de 1985, baseada na definição de estados limites de serviço, considerou-se mais adequado a comparação com o estado de dano definido como Ligeiro, sendo o valor de combinação Sa=0.15g. Com base nestes valores obtêm-se os valores de referência das medianas apresentados no Quadro 2. Com base nestas medianas e assumindo o mesmo coeficiente de dispersão que o Hazus admite (β=0.4), foram calculadas as curvas de fragilidade de referência que se representam na figura 3. Quadro 2: Valores das medianas (pontes) Classe de Dano Antes de 1985 Após 1985 Ligeiros Moderados Elevados Colapso
7 Luís M. C. GUERREIRO, João J. R. T. AZEVEDO 479 Probabilidade Pa Ligeiros 0.8 Moderados 0.8 Moderados 0.6 Ligeiros 0.6 Elevados Elevados Colapso 0.2 Colapso 0.2 Antes 1985 Após Probabilidade Pa Sa(1.0) [xg] Sa(1.0) [xg] Figura 3: Curvas de fragilidade de referência Com base nas curvas de fragilidade de referência podem definir-se as medianas associadas às curvas de fragilidade representativas do comportamento de cada classe de pontes, introduzindo um conjunto de parâmetros correctivos, baseado na previsão do comportamento sísmico de cada um dos tipos de classe de pontes, dado se considerar que cada classe pode apresentar um comportamento que pode ser inferior ou superior à média, devendo ser respectivamente afectado por um factor inferior ou superior à unidade. Por exemplo, se considerarmos a classe C2+, Passagem Inferior com tabuleiro em laje, assente em encontros de betão armado e em pilares - após 1985, admitiu-se que, devido às suas características, estas estruturas têm um comportamento superior à média para níveis mais baixos da acção sísmica e que tende para a média para os valores mais elevados desta. Esta conclusão tem a ver com o facto das estruturas deste tipo se encontrarem relativamente bem travadas longitudinalmente e apresentarem uma relação largura/comprimento favorável. Desta forma os valores considerados para o factor correctivo foram: 1.15, 1.10, 1.05 e Foram ainda considerados factores correctivos para ter em conta o ângulo de viés (semelhantes aos previstos no Hazus) e para ter em conta qualquer particularidade específica de uma dada obra de arte (com base na observação no local ou do projecto). Para além dos danos devido ao movimento vibratório, outros fenómenos podem dar origem a danos devido à acção sísmica, nomeadamente a rotura de fundações. No Hazus são considerados dois tipos de rotura de fundação: devido à ocorrência de liquefacção (assumindose a existência de dois tipos de problemas: o movimento lateral e o assentamento) ou por deslizamento de terreno. Em ambos os casos se adoptou a mesma do Hazus, dado não se considerar existirem diferenças para a situação californiana. 4. RESULTADOS Com base no simulador construído, foram examinados alguns cenários sísmicos, entre os quais se destacam dois potencialmente gravosos para a região de Lisboa. O primeiro, denominado Cenário Tejo, no vale do Tejo com epicentro entre Lisboa e o Barreiro e magnitude 6.5 e o segundo, denominado Sines, com epicentro ao largo de Sines e magnitude 9.
8 480 SÍSMICA º Congresso Nacional de Sismologia e Engenharia Sísmica Realce-se que tendo sido decidido analisar apenas as principais vias rodoviárias e todas as vias ferroviárias, tal correspondeu a identificar, caracterizar e analisar, no que diz respeito a obras de arte, um total de 521 obras de arte da rede rodoviária e 243 da rede ferroviária. Uma análise macroscópica dos resultados permite concluir que a simulação dos danos está de acordo com aquilo que seria expectável. Com efeito, e não obstante se fazer seguidamente uma análise mais detalhada da influência de cada parâmetro da acção sísmica ou das características das redes, a análise geral permite desde logo observar que os danos são potenciados em função de parâmetros lógicos, ou seja, em função da maior magnitude, menor distância epicentral, ocorrência de liquefacção, ocorrência de escorregamentos e maior vulnerabilidade das obras de arte. Assim, e embora se trate de observações genéricas e obviamente expectáveis, importa referir que: os danos tendem a concentrar-se na zona epicentral, diminuindo com a distância epicentral de uma forma aparentemente em concordância com situações semelhantes observadas no passado em outros sismos; os danos, tanto nas obras de arte como nos troços de via, são muito influenciados pela ocorrência de liquefacção de solos; os danos nos troços de via são influenciados pela ocorrência de deslizamentos de taludes; os danos ocorrem preferencialmente nas obras de arte às quais foram atribuídas as funções de vulnerabilidade mais gravosas e a tipologia dos solos de fundação tem também influência na vulnerabilidade das obras de arte, embora a ocorrência de liquefacção (directamente dependente do tipo de solo) seja o parâmetro mais condicionante. Para cada cenário examinado, a cada obra de arte foi atribuído, entre os cinco possíveis (sem danos, danos ligeiros, moderados, elevados ou colapso), o estado de dano com uma probabilidade de não ser excedido inferior a 50%, ou seja a classe que corresponde ao valor mediana dos danos observados Cenário Tejo O cenário Tejo revelou-se um cenário com um volume significativo de danos, tanto para a rede rodoviária como para a rede ferroviária. Neste cenário, 4% das obras de arte rodoviárias e 10% das ferroviárias ficam classificados como sofrendo alguns danos, sendo as colapsadas ou com danos elevados respectivamente 2% e 5%. Estes valores situam-se dentro do que seria expectável para um cenário deste tipo, sendo interessante relembrar que no sismo de Northridge na Califórnia, apenas 1% das obras de arte rodoviárias de uma zona de extensão comparável colapsaram ou tiveram danos significativos. O efeito da liquefacção é bastante visível, sendo-o também mais visível nas obras de arte rodoviárias do que ferroviárias. As obras de arte com danos elevados e colapsadas localizam-se por um lado na zona sujeita a liquefacção da margem sul do Tejo (Fogueteiro, Seixal e Barreiro) e por outro na zona de Lisboa localizada junto ao rio e portanto perto do epicentro, onde mesmo não havendo liquefacção se observam danos importantes devidos ao efeito dinâmico Cenário Sines O cenário Sines revelou-se o cenário que induz o maior volume de danos, tanto para a rede rodoviária como para a rede ferroviária. Neste cenário, 21% das obras de arte rodoviárias e
9 Luís M. C. GUERREIRO, João J. R. T. AZEVEDO % das ferroviárias ficam classificados como sofrendo alguns danos, sendo as colapsadas ou com danos elevados respectivamente 18% e 14%. Neste caso, o efeito da liquefacção é extremamente elevado, sendo claro que na grande maioria dos casos o colapso ocorre induzido por este efeito. A grande maioria das obras de arte com danos elevados e colapsadas localizamse nas zonas sujeitas a liquefacção da margem sul, as quais além de apresentarem elevado potencial de liquefacção têm maior proximidade ao epicentro. Na figura 4 apresentam-se para os dois cenários e para as obras de arte das duas redes, as estimativas gerais dos estados de danos, sendo possível verificar que o cenário Sines é substancialmente mais gravoso do que o cenário Tejo, principalmente em virtude da ocorrência mais pronunciada de fenómenos de liquefacção. Rede Ferroviária Rede Rodoviária Tejo Sines Tejo Sines Sem danos Danos Ligeiros Danos Moderados Danos Elevados Colapso Figura 4: Estimativa geral de danos nas obras de arte das redes para dois cenários sísmicos Com o intuito de verificar a sensibilidade das estimativas a eventuais incorrecções na avaliação das curvas de fragilidade das obras de arte, foi tida em conta a consideração de um factor minorante das características resistentes das obras de arte em geral. Considerou-se que esse coeficiente poderia variar entre 1.0 (o que corresponde a assumir uma correcta avaliação da capacidade resistente) e 0,2 que corresponde a uma redução drástica da efectiva resistência das obras de arte para 20% da estimada com base nos critérios gerais. As justificações para considerar o factor minorante prendem-se com possíveis deficiências sistemáticas de projecto ou construção, não contabilizáveis na avaliação efectuada. Da análise efectuada, de que se apresentam alguns resultados na figura 5, pode inferir-se que a consideração de factores minorantes mais afastados da unidade implica um agravamento geral do estado de danos das diferentes estruturas. Pode constatar-se que à medida que o factor é mais reduzido, vai diminuindo o número de obras de arte sem danos e vai aumentando o número de obras de arte nas classes de danos mais elevados. A variação é quase insignificante para valores do factor minorante iguais a 0.8 e apenas é significativa para valores inferiores a 0,5, o que mostra que o modelo conduz a danos esperados não muito sensíveis a pequenas variações nas propriedades das curvas de fragilidade adoptadas.
10 482 SÍSMICA º Congresso Nacional de Sismologia e Engenharia Sísmica 500 Nº de pontes F = 1.0 F = 0.8 F = 0.6 F = 0.5 F = 0.4 F = Sem danos Danos Ligeiros Danos Moderados Danos Elevados Colapso Figura 5: Danos observados em função do factor minorante da capacidade resistente (F) 5. CONCLUSÕES A metodologia proposta para avaliação do comportamento de elementos de redes de infraestruturas de transportes parece ser adequada à estimativa global de danos e permite analisar o impacto de diferentes cenários sísmicos, nomeadamente em termos de localização epicentral e magnitude. As estimativas obtidas para alguns cenários sísmicos gravosos, permite concluir que se observariam danos relativamente semelhantes aos verificados em outras zonas sísmicas. Sendo a fiabilidade dos resultados dependente das curvas de fragilidade adoptadas para os diferentes tipos de obras de arte, parece no entanto ser mais dependente de uma correcta caracterização do potencial de liquefacção. 6. REFERÊNCIAS [1] Applied Technology Council - ATC13 - Earthquake Damage Evaluation Data for Californial, [2] Federal Emergency Management Agency and National Institute of Building Sciences - Earthquake Loss Estimation Methodology HAZUS99 - Technical Manual, [3] RSA Regulamento de Segurança e Acções para Estruturas de Edifícios e Pontes, Imprensa Nacional Casa da Moeda, 1984.
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