Adriane Barth 1, Fabricia Kohler de Carvalho 1, Vitor Azarias Campos 2 e Anderson Fernandes 1. Resumo

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1 ISSN DOI: /ecb.v4i2.54 Acesso livre em 42 ANÁLISES CROMOSSÔMICAS EM POPULAÇÕES DE Leptodactylus chaquensis (ANURA, LEPTODACTYLIDAE) E Hypsiboas raniceps (ANURA, HYLIDAE) DO CERRADO DE MATO GROSSO CHROMOSOME ANALYSIS OF Leptodactylus chaquensis (ANURA, LEPTODACTYLIDAE) AND Hypsiboas raniceps (ANURA, HYLIDAE) POPULATIONS FROM THE MATO GROSSO SAVANA Adriane Barth 1, Fabricia Kohler de Carvalho 1, Vitor Azarias Campos 2 e Anderson Fernandes Universidade do Estado de Mato Grosso - UNEMAT, Centro de Pesquisas, Estudos e Desenvolvimento Agro-Ambientais - CPEDA, Rodovia MT - 358, Km 07, Jardim Aeroporto, CEP: , Tangará da Serra, MT, Brasil. 2 - Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT, Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Conservação da Biodiversidade, Instituto de Biociências, Av. Fernando Corrêa da Costa, s/n, CCBS-II, Boa Esperança, CEP Cuiabá, MT, Brazil. drikabarth@yahoo.com.br Resumo O Cerrado brasileiro é considerado um hotspot devido à rica biodiversidade e acelerada perda de hábitat. Este trabalho objetivou realizar análises citogenéticas nas espécies Leptodactylus chaquensis e Hypsiboas raniceps do Cerrado de Mato Grosso. Para L. chaquensis foi encontrado número cromossômico de 2n=22 com morfologia 2K=16M+4SM+2ST. A NOR foi observada no par cromossômico oito. Para H. raniceps foi observado número cromossômico de 2n=24 com morfologia 2K=8M+16SM. A NOR esteve localizada no par 11 e em um dos homólogos do par cromossômico quatro (população A) e no par 11 e em um dos homólogos do par um (população C). A heterocromatina foi consistente com a região da NOR em H. raniceps. Os dados aqui observados diferem dos encontrados na literatura para estas duas espécies, e demonstram a importância de se realizar análises citogenéticas com a biodiversidade da região. Palavras-chave: Citogenética, Anuros, Biodiversidade e Conservação. Abstract Brazilian Savana is considered a hotspot due to the rich biodiversity and accelerated habitat loss. In this study we perform a cytogenetic analysis of two anurans from the Mato Grosso Savana Leptodactylus chaquensis and Hypsiboas raniceps. Leptodactylus chaquensis showed chromosome number of 2n=22 with 2K=16M+4SM+2ST morphology, and NOR located on the eight chromosome pair. Hyla raniceps showed chromosome number 2n=24 with 2K=8M+16SM morphology, and NOR located on the 11th chromosome pair. Furthermore, H. raniceps showed variation on a third NOR located in one homologue of the fourth chromosome pair (population A) and in one homologue of the first chromosome pair in the populations C. Heterochromatin was consistent with NOR regions in H. raniceps. This study showed chromosomal variations unknown until now in L. chaquensis and H. raniceps, highlighting the importance of cytogenetic studies concerning this region s biodiversity. Key-words: Cytogenetic, Anuran, Biodiversity and Conservation. Introdução 847 espécies pertencentes a esta ordem (SBH, 2013). No mundo existe cerca de espécies de A família Leptodactylidae apresenta distribuição anuros descritas (Frost, 2013) e aproximadamente bastante ampla que inclui o extremo sul do Texas metade destas ocorrem na Região Neotropical (Heinicke (Estados Unidos da América), Sonora (México), ao norte et al., 2007). Só no Brasil, até o presente estão descritas das Antilhas, e ao sul do Brasil. O gênero Leptodactylus

2 43 apresenta 89 espécies distribuídas desde a América do Norte, Central e América do Sul até a Argentina (Frost, 2013). A espécie Leptodactylus chaquensis apresenta ampla distribuição desde o norte da Argentina, oeste do Paraguai, norte do Uruguai, Bolívia e Brasil (Lavilla et al., 2000; Heyer et al., 2004; Acosta et al., 2005; Frost, 2013). Mais de vinte espécies do gênero Leptodactylus já foram estudadas citogeneticamente, sendo que a grande maioria apresentaram cariótipos bastante similares, com 2n=22 cromossomos, compostos predominantemente pelas morfologias metacêntrica e submetacêntrica, mas com ocorrência de cromossomos subtelocêntricos em algumas espécies (Gazoni et al., 2012; Alves e Silva, 2007; Amaro-Ghilardi et al., 2004). Recentemente, Gazoni et al (2012) descreveram, para a espécie Leptodactylus marmoratus, número cromossômico de 2n=24. A família Hylidae apresenta a maior diversidade de espécies entre os anuros (Gruberet al., 2007), com 926 espécies distribuídas em três subfamílias (Frost, 2013). O gênero Hypsiboas foi revalidado recentemente e hoje compreende 84 espécies descritas, sendo que destas 51 ocorrem no Brasil (Frost, 2013). A espécie Hyla raniceps (que pertencia ao grupo Hyla albopunctatus) foi renomeada como Hypsiboas raniceps (passando a fazer parte do grupo Hypsiboas albopunctatus). De acordo com Gruber et al. (2007) estudos cromossômicos de H. raniceps apresentaram número cromossômico de 2n=24. informações que permitem uma visão mais ampla sobre como estas espécies estão se comportando com relação à trajetória evolutiva de seu cariótipo. Anuros podem ser utilizados como bioindicadores da qualidade do ambiente, pois são muito sensíveis as alterações ambientais, principalmente em virtude de sua pele permeável e devido aos girinos (estágio larval) serem bastante afetados por substâncias dissolvidas na água. Assim, a qualidade de um ambiente pode ser avaliada pela presença de anfíbios e pela sua reprodução com sucesso (Bertoluci, 2002). A principal ameaça à conservação dos anfíbios é a destruição de seus habitats, como consequência do desmatamento, do avanço da fronteira agrícola, das queimadas e do desenvolvimento da infraestrutura e urbanização (Young et al., 2004). Segundo Silvano e Segala (2005), restam apenas 34% da vegetação original do Cerrado brasileiro, que tende a desaparecer em 30 anos se o atual modelo de desenvolvimento na região for mantido. Até o presente, estima-se que existam cerca de 150 espécies de anfíbios no Cerrado, sendo que destes, 28 são endêmicos (Klink e Machado, 2005). A grande diversidade de espécies, aliada ao alto índice de degradação deste bioma demonstram a importância em se realizar estudos com anuros. Assim, este trabalho objetivou realizar análises citogenéticas em duas espécies do Cerrado de Mato Grosso Leptodactylus chaquensis e Hypsiboas raniceps por meio da análise de coloração convencional com Giemsa, bandeamento Ag- NOR e bandeamento C. Análises citogenéticas são importantes Material e Métodos ferramentas nos estudos das espécies uma vez que Obtenção do material biológico os cromossomos podem ser estudados nas suas mais variadas características. Diferentes bandeamentos Foram coletados indivíduos das espécies cromossômicos podem revelar aspectos da estrutura Leptodactylus chaquensis e Hypsiboas raniceps em três geral e organização da cromatina, além da localização localidades distintas no município de Tangará da Serra, de determinados genes ou sequências (Hilliset al., Mato Grosso no ano de 2008, sendo: Ponto A referente 1996). Em estudos evolutivos, essas técnicas auxiliam ao Mirante da Serra, ponto B referente a Estrada da no detalhamento das transformações que ocorreram Itamarati e ponto C referente a Granja Ziani (Figura em grupos de espécies próximas, com cariótipos muito 1). Os espécimes foram coletados por meio de busca semelhantes (Guerra, 1988). ativa e localização a partir da vocalização dos mesmos. Os indivíduos coletados foram acondicionados em Em anuros, análises citogenéticas geram sacos individualizados e acomodados em caixas de

3 44 Figura 1 Áreas de coleta das amostras no município de Tangará da Serra. A) Ponto A: Chácara Mirante, B) Ponto B: Estrada da Itamarati, C) Ponto C: Granja Ziani e D) Distância total entre os pontos B e C = 37 km. Imagens geradas e distâncias calculadas a partir do aplicativo Google Earth. isopor para manter a temperatura até serem levados ao laboratório. Os três pontos apresentaram graus distintos de degradação, sendo o ponto A o mais conservado (área desmatada em recuperação). O ponto B apresentou altos índices de degradação, sendo rodeado com o cultivo de cana-de-açúcar. Neste último ponto, os indivíduos foram coletados em poças de água às margens das plantações. Já o ponto C se encontrava cercado por grandes áreas desmatadas para agricultura, sendo que sua região de mata é a via de escoamento das águas provenientes das plantações próximas. Todos os indivíduos coletados foram depositados no Museu de Zoologia da Universidade do Estado de Mato Grosso-UNEMAT de Tangará da SerraMT. As coletas foram realizadas sob licença permanente do ICMBio sob o número Evolução e Conservação da Biodiversidade Obtenção dos dados citogenéticos Para as preparações citológicas foi aplicada colchicina a 1% nos indivíduos de 10 a 12 horas antes da dissecção. Em seguida, as células intestinais foram extraídas e preparadas segundo metodologia proposta por Schmid (1978). Os cromossomos foram corados com uma solução de Giemsa a 5%. O bandeamento Ag-NOR foi realizado seguindo Howell e Black (1980) com algumas modificações. Foi utilizada solução de nitrato de prata a 25% e as lâminas foram incubadas a 50 C por aproximadamente 30 minutos. O bandeamento C foi realizado segundo Sumner (1990) com algumas modificações no tempo dos reagentes como segue. As lâminas foram primeiramente tratadas com solução de ácido acético 50%, incubadas Rio Paranaíba, Vol. 4 Nº ago-dez 2013

4 45 em ácido clorídrico (0,2 N) por 7 a 8 minutos, hidróxido de bário (5%) por 20 a 21 segundos, solução salina em temperatura ambiente por 13 minutos. Em seguida as lâminas foram lavadas em água destilada e coradas com o corante Giemsa a 25%. As lâminas foram analisadas e as metáfases foram fotografadas em um microscópio óptico Quimis Q720-D2 equipado com uma câmera CCD para captura de imagem. O pareamento e ordenação dos cromossomos foram baseados na observação visual auxiliada por medições diretas com o auxílio do software Image-Pro Plus, versão 3.1 (Media Cybernetics, 1998). Os cariótipos foram montados e classificados segundo nomenclatura de Levan et al. (1964), em três categorias, com base no índice de Relação de Braços (RB= comprimento do braço maior dividido pelo comprimento do braço menor). Resultados Leptodactylus chaquensis Foram coletados seis indivíduos de L. chaquensis no Ponto A referente ao Mirante da Serra, seis indivíduos no Ponto B referente a Estrada da Itamarati e quatro indivíduos no Ponto C referente a Granja Ziani durante seis noites de amostragem. Foi determinado número cromossômico de 2n= 22 com a fórmula cariotípica de 2K=16M+4SM+2ST (Figura 2). O bandeamento NOR apresentou a região organizadora de nucléolos no braço curto do par cromossômico oito (Figura 2 no destaque). Para esta espécie não foi possível a obtenção de dados com o bandeamento C. Hypsiboas raniceps Foram coletados seis indivíduos de H. raniceps no Ponto A e cinco indivíduos no Ponto C. No ponto B não foi possível visualizar indivíduos ou identificar vocalizações desta espécie que indicaria sua presença no local. Para as populações de H. raniceps dos pontos A e C foram determinados o número cromossômico de 2n=24 com morfologia cromossômica de 2K= 8M+16SM (Figura 3 A e B). Figura 2 - Cariótipo de L. chaquensis do ponto A referente ao Mirante da Serra, submetido a coloração convencional. Em destaque, par cromossômico com a marcação Ag-NOR positiva. Barra = 5 µm

5 46 Figura 3 A) Cariótipo de H. raniceps coletada no ponto A referente ao Mirante da Serra e B) Cariótipo de H. raniceps coletada no ponto C referente a Granja Ziani. Em destaque bandeamento Ag-NOR mostrando a variação na posição da NOR entre as duas populações analisadas. C) metáfase submetida ao bandeamento C de H. raniceps coletada no Ponto A e D) metáfase submetida ao bandeamento C de H. raniceps coletada no ponto C. Setas indicam marcações no par cromossômico 11 e no par cromossômico seis. Barra = 5 µm Com relação a NOR, ambas as populações banda C positiva no braço curto do par 6. apresentaram marcações na porção terminal do braço longo do par 11. No entanto, foi possível observar uma Discussão variação na posição de uma terceira NOR, localizada O número cromossômico observado no presente na região terminal de um dos homólogos do par estudo com L. chaquensis corrobora dados da literatura cromossômico quatro na população A, e localizada (Gazoni et al., 2012; Amaro-Ghilardi et al., 2004). No próxima ao centrômero do braço longo de um dos entanto, diferentes morfologias cromossômicas foram homólogos do par cromossômico um, na população C observadas no presente trabalho com relação aos dados (Figura 3 A e B no destaque). apresentados por Amaro-Ghilardi et al., (2004) para amostras de vários estados brasileiros (Pernambuco, O bandeamento C demonstrou que as duas Bahia, Paraná, Mato Grosso, Tocantins, São Paulo populações apresentam região de heterocromatina e Piauí) os quais apresentaram apenas morfologias condizente com a região da NOR no par 11 (Figura 3 C e metacêntricas e submetacêntricas. A diferença nas D). Ocasionalmente foi possível observar marcações de

6 47 morfologias encontradas para as populações aqui estudadas podem ser reflexo de rearranjos do tipo inversão pericentromérica e podem indicar algum grau de diversificação associado à especiação. A diferença na morfologia, associada a ampla distribuição de L. chaquensis, pode ser um indicativo, de que podemos estar tratando de um complexo de espécies ainda não totalmente conhecido. Com relação ao bandeamento NOR, os dados aqui apresentados corroboraram estudos prévios com a espécie, os quais também apresentaram a NOR localizada no par cromossômico oito (Amaro- Ghilardi et al., 2004; Gazoni et al., 2012). Com relação a H. raniceps, o número cromossômico 2n=24 encontrado no presente trabalho foi condizente com os dados citogenéticos para H. raniceps e outras espécies do gênero Hypsiboas encontrados por outros pesquisadores (Baldo et al., 1999; Gruber et al., 2007). Segundo estes resultados, o número cromossômico é uma característica conservada dentro do gênero. Estudos citogenéticos na família Hylidae tem revelado variação no número cromossômico de 2n=22 como em espécies de Lysapsus (Busin et al., 2006) a 2n=30 em espécies de Dendropsophus (Medeiros et al., 2006; Medeiros et al., 2013). Segundo Morescalchi (1973), a evolução cariotípica de alguns gêneros de Hylidae teria seguido uma tendência em diminuir o número cromossômico, sendo 2n=26 um número ancestral que, por fusões cromossômicas, teria originado os cariótipos 2n=24 e posteriormente 2n=22 e 2n=20. Já em alguns gêneros, eventos como fissões cêntricas teria elevado o número cromossômico originando os cariótipos 2n=30. No que se refere a região organizadora de nucléolos, múltiplas NOR tem sido observada em várias espécies de anuros (Wiley etal. 1989; Silva et al., 1999; Veiga-Menoncello et al., 2003; Lourenço et al., 2000; Amaro-Ghilardi et al., 2006; Barth et al., 2013). A visualização de marcações de NOR em somente um dos homólogos de um par cromossômico foi também descrito em outras espécies da família Hylidae (Gruber et al., 2007) e demais famílias de anuros (Schmid, 1978; Schmid et al., 1995). Múltiplas NOR é considerado um estado derivado para anuros (King, 1990) quando comparada com a NOR em apenas um par cromossômico. O heteromorfismo com relação a posição da terceira NOR (cromossomo 4 na população A e cromossomo 1 na população C) pode ser um indicativo da ocorrência de translocação cromossômica entre estes dois pares cromossômicos durante a evolução cariotípica destas duas populações. O fato de ter sido observado um único fenótipo para esta terceira NOR em cada população, é um indicativo de que possivelmente não está havendo fluxo gênico entre as mesmas. Amostragens mais amplas se fazem necessárias para confirmar essa suposição. Os dados citogenéticos aqui observados para L. chaquensis e H. raniceps demonstraram diferenças cariotípicas importantes quando comparadas com análises realizadas por outros pesquisadores com as mesmas espécies coletadas em outras localidades. Estes dados demonstram que estas espécies de anuros da região do Médio Norte do Mato Grosso podem estar passando por um processo de especiação, diferenciado das demais regiões. Essa constatação demonstra a importância de se realizar estudos genéticos com a fauna visando compreender quais fatores estão relacionados com essa diferenciação, a fim de compreender se essa fonte de variação pode estar relacionada com a alteração no ecossistema, causado principalmente pelo avanço da agricultura no Estado de Mato Grosso. Sendo assim, o avanço das pesquisas citogenéticas de anuros na região, podem servir de ferramenta para a conservação de hábitat e preservação da biodiversidade do bioma Cerrado. Agradecimentos Agradecemos à Fundação de Amparo a Pesquisa (FAPEMAT) pelo apoio financeiro, a Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT) pelo apoio financeiro e infraestrutura e ao ICMBio pela licença de coleta.

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