Atitude e Crença de Autoeficácia: Relações com o Desempenho em Matemática
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- Ricardo Leal Carvalhal
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1 Atitude e Crença de Autoeficácia: Relações com o Desempenho em Matemática Attitude and Self-Efficacy Belief: Relationships with Performance in Mathematics VIVIANE REZI DOBARRO 1 MÁRCIA REGINA FERREIRA DE BRITO 2 Resumo Este artigo tem por objetivo descrever parte de uma tese de doutorado sobre uma pesquisa realizada com alunos de Ensino Médio de uma escola pública e outra escola particular de uma cidade do interior de São Paulo, cujo objetivo foi investigar as relações entre variáveis afetivas relacionadas à Matemática, tais como a atitude em relação à disciplina e a crença de autoeficácia na atividade matemática, com o desempenho na solução de problemas. Foram aplicados quatro instrumentos do tipo lápis e papel e a análise estatística dos dados coletados possibilitou concluir que existe uma relação altamente significativa entre o desempenho, a atitude e a autoeficácia em relação à matemática. Palavras-chave: Atitudes; Autoeficácia; Solução de Problemas. Abstract This article is part of a doctorate thesis about a research carried out with two groups of high school students, one from a public school and another from a private school in a city in the interior of São Paulo State. Its objective was to investigate the relationship among affective variables related to mathematics such as the attitude towards the subject and the self-efficacy belief when involved in mathematical problem-solving tasks. Four paper-and-pencil instruments were used and the statistical analysis of the data has made it possible to conclude that, in mathematics, there is a highly significant correlation among performance, attitude and self-efficacy. Key-words: Attitudes; Self-efficacy; Problem solving. Introdução A Psicologia da Educação Matemática tem se firmado como uma área de conhecimento interdisciplinar, desenvolvida por psicólogos, pedagogos e matemáticos, investigando o processo de solução de problemas e variáveis afetivas envolvidas na execução de atividades matemáticas. Muitos estudos têm dado atenção a fatores como ansiedade, atitudes, crença de autoeficácia, atribuição de causalidade, autorregulação da aprendizagem, entre outros. 1 UniAnchieta; Fatec Jundiaí - prof.viviane@fatecjd.edu.br 2 Unicamp - mbrito@unicamp.br Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp , 2010
2 Este trabalho teve por objetivo estudar a atitude em relação à Matemática e a crença de autoeficácia na solução de problemas matemáticos, duas variáveis afetivas que, segundo pesquisas na área, influenciam no desempenho, trazendo assim contribuições à área da Psicologia da Educação Matemática. O interesse em investigar tais construtos é compreender melhor como se relacionam alguns dos muitos fatores que influenciam o desempenho escolar. Isso é de grande importância, principalmente na relação professor-aluno-conhecimento, já que muitos professores atribuem o fracasso escolar apenas como falta de empenho do aluno que deveria estudar mais, desconsiderando a história de vida do estudante, seu desenvolvimento cognitivo e afetivo, e o contexto onde ocorre o processo ensinoaprendizagem. Não só professores, mas também coordenadores, diretores, pais e psicólogos devem observar e analisar as situações de ensino-aprendizagem de uma forma mais abrangente, de forma a retirar do aluno a responsabilidade pelo fracasso que, por muitas vezes, é produto de um sistema educacional recheado de problemas e contradições, incluindo aí a formação deficiente dos professores. De acordo com os pressupostos da Teoria Social Cognitiva de Bandura (1986), a maneira pela qual o indivíduo soluciona os seus problemas é fortemente influenciada pelas crenças que ele possui acerca de suas capacidades. Segundo ele, não basta apenas possuir conhecimentos e habilidades se a crença de autoeficácia percebida pelo sujeito é negativa. A crença de autoeficácia influencia a solução de problemas de matemática em todos os níveis de habilidades, ou seja, sujeitos em cada um dos níveis de habilidade (baixa, média ou elevada) sempre apresentam desempenho melhor quando suas crenças de autoeficácia em Matemática são mais positivas (COLLINS, 1982, citado por BANDURA, 1993, 1997). Isso acontece porque a crença de autoeficácia influencia os padrões de pensamento e o comportamento das pessoas. Um indivíduo baseia-se, parcialmente, nas percepções de eficácia ao escolher o que fazer, ao decidir quanto esforço será investido em cada atividade, o quanto perseverará face aos eventuais desapontamentos, determina os níveis de ansiedade e como a tarefa será abordada do ponto de vista da confiança (PAJARES e MILLER, 1995; BONG, 1997; LOOS, 2003). Em outras palavras, um funcionamento efetivo requer tanto destrezas quanto crenças de eficácia para usá-las bem (BANDURA, 1997, p. 37). Nesse trabalho, entende-se por crença de autoeficácia matemática a confiança que um indivíduo possui a respeito de sua própria habilidade para desempenhar, com sucesso, uma tarefa matemática 200 Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp , 2010
3 (KRANZLER e PAJARES, 1997). Segundo Krutetskii (1976), existem muitos fatores, além das habilidades, conhecimentos, destrezas e hábitos, que influenciam o desempenho do estudante em uma atividade matemática, dentre eles, a atitude em relação a esta atividade. Segundo Brito (1996, p. 11), atitude é uma disposição pessoal, idiossincrática, presente em todos os indivíduos, dirigida a objetos, eventos ou pessoas, que assume diferente direção e intensidade de acordo com as experiências do indivíduo. Além das habilidades, o presente trabalho buscou investigar aspectos afetivos como as atitudes e a crença de autoeficácia de estudantes em relação à Matemática. Com base nos aspectos apresentados, o objetivo elaborado com o presente estudo foi de investigar alguns fatores afetivos que interferem no desempenho na solução de problemas matemáticos. Assim, a pergunta de pesquisa é: Existem relações entre atitude, crenças de autoeficácia e o desempenho na solução de problemas de Matemática? Em seguida, o leitor encontrará considerações mais específicas sobre a atitude em relação à Matemática e o conceito de crença de autoeficácia matemática segundo a teoria sócio-cognitiva de A. Bandura (1997). Também estão descritos o método, a análise dos dados, resultados e conclusões. As escolhas das fundamentações teóricas para o presente trabalho foram baseadas na revisão da literatura pertinente ao tema desenvolvida durante a Tese de Doutorado desenvolvida por Dobarro (2007). Atitudes em Relação à Matemática Atitudes são processos psicológicos individuais, formadas por meio de processos psicológicos e sociais, na díade individual-coletivo. No presente trabalho, as atitudes foram investigadas a partir do ponto de vista e das abordagens da Psicologia. Segundo Aiken (1970), atitude é entendida como uma predisposição ou tendência de um indivíduo a responder positivamente ou negativamente a algum objeto, situação, conceito ou outra pessoa (AIKEN, 1970, p. 551). Nesse trabalho, a atitude significa: Uma disposição pessoal, idiossincrática, presente em todos os indivíduos, dirigida a objetos, eventos ou pessoas, que assume diferente direção e intensidade de acordo com as experiências do Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp ,
4 indivíduo. Além disso, apresenta componentes do domínio afetivo, cognitivo e motor. (BRITO, 1996, p.11). No presente estudo foram investigadas as atitudes em relação à Matemática. Para tanto, considerou-se a Matemática como objeto, dois sentidos, positiva ou negativa e o gostar ou não gostar da Matemática com maior ou menor intensidade. Segundo Brito (1998), a dimensionalidade das atitudes é variável e depende do objeto de estudo, sendo que os aspectos cognitivos influenciam os afetivos e se expressam via comportamento. A atitude em relação à Matemática apresenta relação com a ansiedade, as habilidades, as crenças de autoeficácia, os fatores sociais e sofre a influência dos pais, é dependente do gênero e é afetada pelas atitudes e pela motivação dos professores de Matemática. Desde a década de 60, as atitudes em relação à Matemática foram mais profundamente estudadas pelos pesquisadores (AIKEN, 1970). Segundo esse autor, as atitudes em relação à Matemática se evidenciam em torno da terceira série da Educação Básica, sendo que elas podem se tornar mais positivas ou negativas durante o desenvolvimento escolar. Além disso, estudos apontam que as atitudes tendem a se tornar mais negativas quando a Álgebra é introduzida, além de outros conceitos matemáticos abstratos (BRITO, 1996; UTSUMI, 2000; LOOS, 2003). Algumas vezes o termo atitude é confundido com um comportamento observável, e que uma vez adquirida ela não mais seria passível de modificação, cristalizando-se. Na verdade, a atitude nada mais é que uma pré-disposição a uma situação, objeto ou fato, revelando-se apenas por meio de respostas encobertas. Ainda vale considerar que: As atitudes são adquiridas e não inatas e embora algumas atitudes sejam mais duradouras e persistentes que outras, elas não são estáveis e variam ao longo da vida dos indivíduos, de acordo com circunstâncias ambientais. As atitudes são altamente suscetíveis às influências da cultura na qual o indivíduo está imerso (...) [portanto] as atitudes são aprendidas. (BRITO, 1996, p. 12). A formação das atitudes em relação à Matemática por um indivíduo depende também das crenças que esse sujeito desenvolve durante sua vida escolar, seja por meio de sua experiência, seja por meio da transmissão de crenças por outros que convivam com ele e que de alguma forma representem um papel de autoridade, como os pais e professores. Segundo Eagly e Chaiken (1993), as pessoas formam suas atitudes com base na aprendizagem sobre os atributos do objeto e acrescentam mentalmente a este objeto atributos que são consistentes com suas atitudes. Segundo Brito (1996, p. 24), sobre o aspecto cognitivo: 202 Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp , 2010
5 Dificilmente os alunos poderão aprender significativamente conteúdos para os quais eles não estejam cognitivamente preparados, isto é, certos conteúdos matemáticos são ensinados aos alunos antes que eles tenham atingido o nível de desenvolvimento cognitivo adequado e que sua capacidade de abstração esteja amadurecida. Esses fatores podem contribuir grandemente para o surgimento de atitudes negativas em relação à Matemática. Segundo Klausmeier (1977), as atitudes possuem cinco atributos definidores: (1) aprendibilidade, as atitudes são aprendidas e o aluno pode ou não ter intenção e consciência sobre elas; (2) estabilidade, ou seja, algumas atitudes são aprendidas e se fixam, enquanto que outras seriam provisórias; (3) significado pessoal-societário, sendo que as relações entre as pessoas e entre as pessoas e os objetos afetam a forma como o indivíduo se sente em relação a si mesmo; (4) conteúdo afetivo-cognitivo, pois as emoções de um indivíduo sobre o objeto da atitude e as informações que esse indivíduo possui a respeito desse objeto influenciam a atitude; (5) orientação aproximaçãoesquiva, isto é, a atitude de alguém sobre um objeto pode influenciar a aproximação ou afastamento deste. A revisão de literatura sobre as atitudes em relação à Matemática feita por Dobarro (2007) indicou vários trabalhos sobre as diferenças relacionadas ao gênero. Segundo Brito (1996), o sistema educacional, as concepções da escola, da família e os meios de comunicação reforçam a crença de que a Matemática é um domínio predominantemente masculino. Foi verificado, principalmente, que sujeitos de diferentes gêneros apresentam diferenças de atitudes, sendo que os sujeitos do gênero feminino apresentam atitudes mais negativas, que as atitudes influenciam o desempenho, que as atitudes dos professores de Matemática influenciam as atitudes e o desempenho dos estudantes nessa disciplina e que programas de intervenção bem preparados podem modificar as atitudes em relação à Matemática, modificando também o desempenho. Segundo Aiken (1970), as atitudes são desenvolvidas e/ ou modificadas mais positivamente se houver mais atenção dos materiais e livros para esse e outros aspectos psicológicos, maior atenção dos professores sobre as atitudes do grupo e dos pais em relação às atitudes dos filhos. Crenças de Autoeficácia Segundo Brito e Neumann (2001, p. 45), os fenômenos cognitivos não se produzem isolados dos demais fenômenos psíquicos. Outras variáveis, tais como as afetivas, Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp ,
6 motivacionais e atitudinais também são importantes na atividade cognitiva. Nesse sentido, outros teóricos têm investigado construtos que explicam, além do funcionamento intelectual, características autorregulatórias, motivacionais e afetivas (Bandura, 1993). Segundo a Teoria Sócio-cognitiva desenvolvida pelo psicólogo americano Albert Bandura, as pessoas fazem contribuições causais ao seu próprio funcionamento por meio de mecanismos de agência pessoal (1993, p.118), ou seja, as pessoas podem exercer influência sobre o que elas fazem (BANDURA, 1997, p. 3). O ser humano age com intencionalidade, antecipação, autorreação e autorreflexão, pois possui capacidades, sistema de crenças e capacidades autorreguladoras, o que possibilita ao agente organizar cursos de ação (BANDURA, 2001). Isso é representado esquematicamente na forma de um triângulo (não necessariamente eqüilátero) que recebeu o nome de Tríade de Reciprocidade entre o ambiente, o indivíduo e o comportamento (Figura 1): COMPORTAMENTO FATORES PESSOAIS AMBIENTE Figura 1: Esquematização das relações entre as três classes de determinantes na causalidade de reciprocidade triádica (traduzido de BANDURA, 1986, p. 24). As crenças pessoais de eficácia constituem o principal fator do fazer humano, pois por meio do sistema de crenças é que as pessoas avaliam se elas são ou não capazes de fazer e produzir resultados. Além disso, a crença de autoeficácia controla também a ação das pessoas, a autorregulação do processo de pensamento, da motivação e de estados afetivos e fisiológicos. Segundo Bandura (1997, p ), eficácia é uma aptidão gerada na qual subdestrezas cognitivas, sociais, emocionais e comportamentais são organizadas e efetivamente orquestradas para servir a inúmeros propósitos. Os processos cognitivos são atividades cerebrais emergentes que exercem influências determinadas e as delimitações pessoais são influenciadas pela autoavaliação das capacidades. Segundo Bandura (1997, p. 4, 8), os processos de pensamento não são 204 Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp , 2010
7 somente atividades emergentes do cérebro, elas também exercem influência determinativa (...) a autoinfluência afeta não somente as escolhas, mas o sucesso com a qual os cursos de ação escolhidos são executados. A crença de autoeficácia varia em três dimensões: nível, força e generalidade. Isso acontece, pois a eficácia pessoal não é uma disposição contextual global (...) é um fenômeno multifacetado (...) um alto senso de eficácia em uma atividade ou domínio não é necessariamente acompanhada por uma crença positiva de autoeficácia em outros campos (BANDURA, 1997, p. 42). As três dimensões são assim explicadas: O nível da prova, atividade ou tarefa interfere na crença de autoeficácia do indivíduo, pois uma crença não é descontextualizada, depende das condições da situação. A generalidade pode variar sobre diferentes domínios. Isso significa considerar o grau de similaridade das tarefas, as capacidades necessárias (comportamento, cognição, afetividade), as características qualitativas das situações e do indivíduo. A força pressupõe considerar que existem crenças pessoais de eficácia mais fortes ou mais fracas. Além disso, indivíduos com crença negativa de autoeficácia são mais facilmente influenciados por experiências negativas que indivíduos com crença positiva, pois estes, mesmo diante de adversidades, continuarão persistindo. As competências humanas manifestam-se de forma diferente nas diferentes áreas, pois requerem conhecimentos e destrezas específicos. Existem duas crenças básicas sobre como as pessoas constroem habilidades (BANDURA, 1993): 1. A crença de que a aquisição de conhecimentos e competências pode levar o indivíduo a aumentar suas habilidades acadêmicas: crianças com essa crença julgam suas capacidades mais em termos de melhoria pessoal do que por comparação com os colegas e consideram os erros como parte natural do processo de aprendizagem; 2. A crença a respeito da existência de uma capacidade inata: crianças com essa crença e que possuem baixo desempenho acreditam que lhes falte inteligência e procuram apenas por tarefas fáceis. Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp ,
8 Essas concepções afetam os processos de pensamento e o desempenho por meio de mecanismos de crença de autoeficácia que compreendem a crença na própria capacidade de organizar e executar cursos de ações requeridas para produzir determinadas realizações (BANDURA, 1997, p.3), sendo que as crenças de autoeficácia incluem processos cognitivos, motivacionais, afetivos e seletivos. O sistema de crenças de autoeficácia é multidimensional. A crença de autoeficácia influencia fortemente as escolhas que as pessoas fazem, ou seja, os cursos de ação que elas podem planejar, o esforço e a persistência dos indivíduos, principalmente diante de adversidades, e está ainda relacionada com a ansiedade pessoal diante de uma tarefa. Bandura (2004) afirmou que as crenças pessoais de eficácia são o aspecto principal do seu autoconhecimento, sendo que são adquiridas e modificadas em função de quatro fatores: 1. Experiências de domínio da tarefa: servem como indicadores da capacidade do indivíduo em determinado campo. É o fator que exerce maior influência sobre a crença de autoeficácia pessoal, pois fornece uma resposta direta sobre o sucesso de um indivíduo. 2. Modelagem social: alteram as crenças de eficácia por meio da comparação com as competências e habilidades de outros, isto é, por meio da comparação do desempenho pessoal com o desempenho de outras pessoas que o sujeito julgue como equivalentes naquele domínio. 3. Persuasão social: a persuasão verbal e outros tipos de influências sociais são indícios sobre as capacidades pessoais que um indivíduo recebe e percebe e que estariam, em um primeiro momento, externas a ele. 4. Estados físicos e emocionais: a partir desses indícios (como por exemplo, nervosismo, sudorese e outros) as pessoas julgam suas capacidades e vulnerabilidade diante da tarefa. Segundo Pajares e Miller (1995), a percepção da autoeficácia é boa preditora do comportamento, mais que da própria capacidade, já que determinam o que o indivíduo pode fazer com seus conhecimentos e suas destrezas. Pesquisas indicam que a crença de autoeficácia é um dos motivos pelas quais indivíduos com as mesmas habilidades e conhecimentos apresentam desempenhos distintos em uma tarefa. Bandura (1986) afirmou que existe uma diferença entre possuir o conhecimento e 206 Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp , 2010
9 habilidade e ser capaz de usá-las em situações desgastantes. A habilidade, segundo ele, é uma organização de destrezas cognitivas, sociais e motivacionais, um atributo mutável pertencente ao repertório comportamental do indivíduo. Uma crença de autoeficácia elevada é condição necessária para que as habilidades sejam bem utilizadas, em outras palavras: Existe uma diferença marcante entre possuir o conhecimento e habilidade e ser capaz de usá-los bem quando nos encontramos sob condições desgastantes. Conquistas pessoais requerem, além de habilidades, crenças de autoeficácia para usá-las bem. (BANDURA, 1993, p. 119). Segundo Bandura (1986), a crença de autoeficácia é acessada em um domínio específico e em relação a uma atividade específica. Kranzler e Pajares (1997) afirmaram que a Matemática tem sido o principal foco de estudo dos psicólogos sociais interessados em investigar a crença de autoeficácia em um domínio escolar. Assim, a crença de autoeficácia matemática é a confiança que um indivíduo possui a respeito de sua própria habilidade para desempenhar, com sucesso, uma tarefa matemática. A crença de autoeficácia matemática tem sido acessada em relação à solução de problemas, a cursos relacionados à área de exatas e à aplicação de Matemática em problemas do cotidiano. No domínio específico da Matemática escolar, Pajares (2003) afirma que o efeito da crença de autoeficácia no desempenho é tão forte quanto o efeito da competência, pois as crenças de autoeficácia têm impacto no funcionamento acadêmico. Para este autor, é importante que os professores estabeleçam objetivos relevantes para o desenvolvimento cognitivo dos estudantes para que possam ter resultados significativos na realização de atividades. Esses objetivos, para terem maiores efeitos positivos, seriam objetivos de curto prazo (tempo próximo de realização). A crença de autoeficácia matemática prediz mais fortemente o desempenho em Matemática que outras variáveis, tais como o auto-conceito matemático, a ansiedade matemática, os desempenhos anteriores, o valor atribuído à Matemática, ou a autoregulação para a aprendizagem de conceitos matemáticos (PAJARES e MOLEIRO, 1994, citado por PAJARES e GRAHAM, 1999) As teorias descritas nesse capítulo podem ajudar os professores na compreensão das dificuldades encontradas pelos alunos durante a execução de atividades matemáticas e como esses problemas interferem negativamente na aprendizagem da disciplina. É Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp ,
10 interessante perceber que existe mais do que empenho necessário por parte do aluno na busca pelo sucesso na escola, mas que também os professores devem sempre atentar para que as variáveis afetivas sejam construídas positivamente na escola, assim como os métodos de ensino e as formas de avaliação da aprendizagem que devem sempre considerar as diferentes formas de estruturação das habilidades, respeitando as distintas estratégias de solução de problemas que os sujeitos escolhem. Método Baseado na revisão de literatura feira por Dobarro (2007) foram definidos a fundamentação teórica, o problema de pesquisa, um delineamento adequado para responder à questão principal proposta e aos objetivos, os instrumentos, os procedimentos para a coleta e análise dos dados e as variáveis de interesse do estudo. Da pergunta de pesquisa já relatada, foram formulados os seguintes objetivos: 1. Descrever e comparar o desempenho dos sujeitos na prova matemática, segundo o gênero, idade e tipo de escola. 2. Descrever as atitudes em relação à Matemática e as crenças de autoeficácia na solução de problemas matemáticos segundo o gênero, a idade e o tipo de escola. 3. Verificar se existem relações entre o desempenho dos sujeitos na solução de problemas matemáticos e as atitudes em relação à Matemática. 4. Relacionar o desempenho matemático e as crenças de autoeficácia na solução de problemas matemáticos. 5. Comparar as atitudes em relação à Matemática e as crenças de autoeficácia na solução de problemas matemáticos. Este trabalho teve caráter de uma pesquisa exploratória, que utilizou métodos estatísticos quantitativos. O estudo foi realizado em duas etapas, sendo a primeira um estudo preliminar com o objetivo de identificar problemas na execução dos instrumentos, tanto no que se refere aos enunciados e apresentação das provas, quanto aos conteúdos matemáticos, conferindo a sua adequação aos objetivos da pesquisa. Os instrumentos foram aplicados a uma amostra de conveniência com 36 sujeitos, alunos do segundo ano do Ensino Médio de uma escola pública. Foi observado o tempo necessário para concluir os instrumentos e se o número de sessões pré-estabelecido era adequado. Foi necessário o desenvolvimento de dois novos instrumentos que foram 208 Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp , 2010
11 testados posteriormente a 27 estudantes também matriculados em um segundo ano do Ensino Médio. Posteriormente, a etapa do estudo final foi desenvolvida em outra amostra de conveniência com os mesmos instrumentos do estudo preliminar, com exceção da escala de crença de autoeficácia e da prova de desempenho cuja nova versão foi utilizada. Os sujeitos da etapa final, que foram considerados para a análise dos dados, foram 213 estudantes, sendo 104 do gênero masculino e 109 do gênero feminino, matriculados na segunda série Ensino Médio de duas escolas, com idades entre 15 e 18 anos, amostra essa que foi escolhida por conveniência. Esses estudantes frequentavam aulas no período diurno. A pesquisa foi desenvolvida em duas escolas, uma pública e uma particular, ambas localizadas na região central de uma cidade de porte médio do interior do estado de São Paulo. Estes estudantes foram autorizados pelo diretor de cada unidade a participarem do trabalho. Os dados foram coletados mediante a aplicação de quatro instrumentos: 1. Um questionário informativo, com questões fechadas, contendo questões relativas à identificação, idade e gênero. 2. Escala de atitudes em relação à Matemática, do tipo Likert, composta de 20 proposições, elaborada por Aiken (1961, 1963), revista por Aiken e Dreger (1963), traduzida, adaptada e validada por Brito (1996, 1998). 3. Escala de crença de autoeficácia na solução de problemas matemáticos, composta por 12 itens, de cinco pontos na escala Likert (1 nada confiante a 5 totalmente confiante), desenvolvida por Dobarro (material ainda não publicado), segundo as orientações de Duval (2003) sobre a representação semiótica. 4. Uma prova matemática, do tipo lápis e papel, contendo 12 problemas matemáticos, sendo os mesmos problemas constantes do instrumento descrito no item (3). Esse instrumento foi aplicado uma semana após a aplicação da escala de crença de autoeficácia. O objetivo da aplicação desse instrumento era justamente relacionar o desempenho na prova com a crença de autoeficácia em relação aos mesmos problemas. Segundo Duval (2003), as representações semióticas são primordiais na atividade matemática, do ponto de vista cognitivo. Isso se deve ao fato que as possibilidades de tratamento matemático dependem do sistema de representação utilizado e também pelo Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp ,
12 fato dos objetos matemáticos não serem objetos diretamente perceptíveis, são acessados apenas por meio de um sistema de representação que permite designá-los. Para esse autor, não se deve confundir o objeto e sua representação, mas o acesso aos objetos matemáticos passa obrigatoriamente por representações semióticas. Portanto, é muito difícil não confundir um objeto com a sua representação se a única forma possível de acesso a esse objeto é por meio da representação. A importância da representação semiótica vai mais além, ou seja, o conteúdo da representação depende mais do registro da representação que do objeto representado (DUVAL, 2002, p. 4). Para Duval (2003) são quatro os tipos de registros de representação: Representação discursiva, em que há predominância no uso da língua natural, são requeridos raciocínios dedutivos e argumentação, por meio de associações verbais e conceituais; Sistemas de escritas, sendo as numéricas, as algébricas e as simbólicas; Figuras geométricas, planas ou em perspectivas e em várias dimensões, requerendo apreensão operatória e perceptiva; Gráficos cartesianos, tanto a representação no gráfico cartesiano quanto o uso de quadros, tabelas, gráficos de barras, gráficos em três dimensões e diagramas circulares também. Há ainda, segundo Duval (2003), duas formas de transformação: tratamento, quando uma atividade requer somente representações em um mesmo registro, e conversão, quando uma atividade requer representações em registros diferentes, porém conservando a referência aos mesmos objetos. Essa forma é a mais difícil de transformação. A teoria de Duval (2002, 2003) é pertinente para a construção dos problemas que compõe a escala de crença de autoeficácia, pois o reconhecimento do registro de um objeto é a condição fundamental para que um aluno consiga transferir ou modificar formulações ou representações de informações durante uma resolução de problema (DUVAL, 2003, p. 21). A escala de crença de autoeficácia utilizada no estudo final foi composta por 12 problemas de Matemática sendo que: Oito problemas requerem a representação em língua natural; Sete problemas requerem algum sistema de escrita como língua natural, assim divididos: um em registro de número natural, um em registro de números 210 Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp , 2010
13 inteiros, um em registro de números decimais e fracionários e quatro em representação algébrica. Quatro em representação de figuras geométricas sendo que três deles requerem apreensão operatória e três deles requerem apreensão perceptiva. Quatro problemas na representação gráfica, sendo dois sobre gráfico cartesiano e dois sobre tabelas. Dois problemas envolvem tratamento como transformação dentro de um mesmo sistema de representação e dez requerem a conversão entre sistemas diferentes. Análise dos dados A análise dos dados quantitativos foi feita com 213 sujeitos. Considerando esse número de sujeitos, a aplicabilidade dos testes t e F está garantida, segundo Bussab e Moretin (1986), devido ao tamanho da amostra (n > 30), sendo 104 sujeitos do gênero masculino (48,8%) e 109 sujeitos do gênero feminino (51,2%), 39% alunos da escola pública e 61% da escola particular. Os estudantes possuíam idades que variaram de 15 a 18 anos, sendo que 79,4% possuíam 16 ou 17 anos. Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa de alunos do gênero masculino e feminino nas duas escolas ( 2 (1, N = 213) = 0,322; p = 0,322). Quanto à adequação do número de sujeitos, segundo Cone e Foster (1994), em um estudo deve estar preferencialmente entre sete e 20 para cada categoria. Foram consideradas para este estudo preliminar seis categorias: gênero, idade, tipo de escola, atitude em relação à Matemática, crenças de autoeficácia matemática e desempenho matemático. Assim, a amostra desse estudo atingiu o número mínimo de sujeitos. Os resultados referentes à escala de atitudes em relação à Matemática foram analisados de duas formas: quanto à pontuação obtida na escala pelos sujeitos (como uma variável escalar variando de 20 a 80) e quanto à classificação da atitude do sujeito (positiva ou negativa) quando comparada a pontuação em relação à pontuação média da amostra. Por esse motivo, a classificação da atitude foi efetuada em um intervalo de 20 a 80, considerando-se as 20 primeiras proposições da escala. A consistência interna da escala foi considerada altamente satisfatória devido ao valor do alpha de Cronbach resultante ( = 0,95). Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp ,
14 A média final dos estudantes foi de 45,5 pontos (SD = 11,92), sendo que as diferenças nas atitudes dos estudantes segundo o gênero não foram consideradas estatisticamente significativas (t (211) = 2,496; p = 0,116), assim como as médias das atitudes calculadas em relação ao tipo de escola (t (211) = 0,085; p = 0,771). Não foi também significativa a diferença na pontuação da atitude em relação à idade (F (3, 209) = 0,790; p = 0,501). Os sujeitos foram classificados como apresentando uma atitude mais positiva ou mais negativa em relação à Matemática se a pontuação obtida pelo aluno era superior ou inferior, respectivamente, à média obtida na amostra de 45,5 pontos. Não houve diferença entre as atitudes dos sujeitos do gênero masculino e feminino ( 2 (1, N = 213) = 0,002; p = 0,967). Apesar de não encontrada diferença significativa em relação à escola quando comparadas as pontuações na escala de atitude, quando os sujeitos foram classificados em atitude positiva ou negativa, essa diferença foi estatisticamente significativa ( 2 (1, N = 213) = 9,900; p = 0,002), privilegiando os alunos da escola particular. Em relação à escala de crença de autoeficácia, os resultados obtidos foram analisados de duas formas: primeiramente, segundo a pontuação obtida pelo sujeito (variando de 12 a 60) e posteriormente classificando o sujeito como possuidor de uma crença positiva, ou não, de autoeficácia na solução de problemas matemáticos, segundo a pontuação obtida pelo sujeito em relação à pontuação média da amostra. A consistência interna do instrumento foi considerada satisfatória devido ao valor do alpha de Cronbach resultante ( = 0,77). A pontuação média da amostra foi de 39,6 (SD = 7,9), sendo que os sujeitos do gênero masculino e do gênero feminino são igualmente confiantes (t (211) = 0,535; p = 0,465). Também não foi considerada estatisticamente significativa a diferença de pontuação entre as duas escolas (t (211) = 1,844; p = 0,176) ou diferenças relativas às idades dos sujeitos (F (3, 209) = 0,718; p = 0,542). Os sujeitos foram classificados como possuindo crenças positivas de autoeficácia matemática se obtivesse pontuação superior a 39,6, correspondente a pontuação média da amostra. Caso contrário, se o sujeito apresentasse uma pontuação inferior a essa, seria classificado como um sujeito de crenças negativas de autoeficácia matemática. Diferenças quanto ao gênero não foram consideradas estatisticamente significativas ( 2 (1, N = 213) = 0,023; p = 0,880). A mesma análise foi executada quanto à classificação 212 Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp , 2010
15 dos sujeitos com crenças positivas ou negativas e a escola de matrícula, sendo encontradas diferenças significativas ( 2 (1, N = 213) = 14,329; p = 0,000). Assim como ocorreu com as atitudes, há mais sujeitos com crenças positivas na escola privada que na escola pública. Em uma segunda sessão, uma semana depois, os alunos responderam à prova de desempenho que continha as mesmas questões da escala de crença de autoeficácia matemática. Na primeira sessão, os alunos foram orientados a não solucionar os problemas e na segunda sessão os sujeitos foram liberados a solucioná-los. Foram atribuídas pontuações em cada questão de acordo com os critérios estabelecidos por Charles (1988), em uma escala gradual de 0 a 2 pontos para cada questão. Ao final, a nota na prova foi recalculada em uma variação de zero a dez pontos. As notas apresentaram uma distribuição normal, porém uma média final baixa (M = 4,1; SD = 1,9). Se compararmos o resultado da escala de crença de autoeficácia e da prova de Matemática, que apresentam problemas muito semelhantes podemos concluir que os sujeitos superestimaram seus desempenhos, pois a média da crença de autoeficácia, 39,6, esteve acima do ponto médio da escala, 36 pontos, enquanto que a média da prova de desempenho esteve abaixo do ponto médio da prova, 5 pontos. A diferença entre as médias não foi considerada significativa quando os sujeitos foram comparados em relação ao gênero (t (211) = 1,943; p = 0,165). A mesma análise foi executada em relação ao tipo de escola e foi encontrada diferença estatisticamente significativa, sendo que os alunos da escola privada tiveram um melhor desempenho em relação aos alunos da escola pública (t (211) = 9,410; p = 0,002). Quando os desempenhos foram analisados em relação à idade dos sujeitos, não foram encontradas diferenças significativas (F (3, 209) = 0,497; p = 0,685). Os resultados indicaram que o problema mais difícil de ser solucionado pela baixa freqüência de acertos foi o número 11 e o problema mais fácil foi o número 9. Os resultados parecem indicar que a crença de autoeficácia não correspondeu ao desempenho na prova, já que anteriormente os estudantes se avaliaram mais confiantes quanto ao exercício 6, e menos confiantes em relação aos problemas 2 e 10. Um dos objetivos da pesquisa era verificar se existiam relações entre a atitude em relação à Matemática, a crença de autoeficácia na solução de problemas matemáticos e o desempenho em uma prova matemática. Para tanto, foram calculados os coeficientes Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp ,
16 de correlação de Pearson, cujos resultados estão explícitos na Tabela 1: Tabela 1. Correlações de Pearson entre a atitude em relação à Matemática, a crença de autoeficácia matemática e o desempenho matemático. Atitude Eficácia Desempenho Atitude r 1,000 0,549 0,411 p 0,000 0,000 Eficácia r 1,000 0,427 p 0,000 Desempenho r 1,000 p Todas as relações foram altamente significativas (ps = 0,000), o que indica que os sujeitos que apresentam atitude positiva também apresentam crenças positivas de autoeficácia e bom desempenho, e que os sujeitos que apresentam atitudes negativas em relação à Matemática também apresentam crenças negativas de autoeficácia e um desempenho menos satisfatório na solução de problemas matemáticos. Dentre as três relações, a mais significativa foi entre a atitude e a crença de autoeficácia. Em outras palavras, existe relação entre a atitude em relação à Matemática, a crença de autoeficácia matemática e o desempenho na solução de problemas matemáticos. Conclusões Como investigado por meio de levantamento bibliográfico e sugerido como hipótese principal do atual trabalho, era esperado que variáveis afetivas relacionadas à Matemática tais como a atitude em relação à disciplina e a crença de autoeficácia na atividade matemática tivessem relação com o desempenho na solução de problemas. Isso foi confirmado pelos dados obtidos. Assim, como identificado por Souza (2006, p. 111): A capacidade cognitiva de um estudante é condição necessária, mas não suficiente para explicar as causas de seu sucesso ou insucesso na escola, devendo-se considerar a interação entre cognição, motivação e afeto, pois o uso efetivo dos recursos cognitivos está fortemente vinculado a aspectos motivacionais e afetivos. Vários trabalhos indicaram que havia diferenças com relação ao gênero. Por esse motivo, foram investigadas diferenças em relação às atitudes, às crenças de autoeficácia e ao desempenho dos sujeitos. 214 Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp , 2010
17 Na revisão de literatura, algumas pesquisas indicam que os sujeitos do gênero feminino tendem a apresentar atitudes mais negativas que os sujeitos do gênero masculino (UTSUMI, 2000), mas não foram encontradas diferenças significativas. Por outro lado, esse resultado é concordante com outras pesquisas como Utsumi e Mendes (2000) e Viana e Brito (2004). Isso indica que, considerando a amostra do trabalho, para alunos com características semelhantes, não se deve atribuir tratamento diferenciado a alunos dos dois gêneros enquanto se trata de atitudes em relação à Matemática. As crenças de autoeficácia matemática são, em geral, mais positivas para alunos do gênero masculino, segundo os trabalhos na área (LENT, LOPES e BIESCHKE, 1993; PAJARES e MILLER, 1994). Esses sujeitos tendem a ser mais confiantes que os sujeitos do gênero feminino. Os dados obtidos para esse trabalho indicaram que os participantes de ambos os gêneros possuíam crenças de autoeficácia matemática equivalentes, contrariando a maioria dos resultados levantados na revisão de literatura que encontraram crenças mais positivas de autoeficácia para sujeitos do gênero masculino. Por outro lado, os resultados do presente trabalho estão em conformidade com a afirmação de Pajares (2003), que muitas pesquisas também não têm encontrado diferenças de gênero sobre as crenças de autoeficácia, assim como Neves (2002). Da mesma forma, já quanto ao desempenho matemático, não foram encontradas diferenças significativas que fossem relacionadas ao gênero. Segundo Rezi (2001), dependendo do tipo de habilidades que são requeridas em uma atividade, os sujeitos de um gênero ou outro seria beneficiado. Mas, no atual trabalho, a prova de desempenho não tinha por objetivo investigar uma habilidade específica e sim representações matemáticas gerais, ou seja, a prova teve um caráter eclético, era composta por vários conceitos e várias formas distintas de apresentação do conteúdo requerido. Portanto, há relações entre a atitude em relação à Matemática, a crença de autoeficácia na solução de problemas matemáticos e o desempenho nessa atividade, porém essas relações não se devem às diferenças quanto ao gênero. No que se refere ao tipo de escola, esse trabalho investigou duas instituições de ensino médio: uma privada e uma pública. Considerando que a amostra era de conveniência, e que os resultados se referem a alunos matriculados em escolas com características semelhantes, algumas diferenças foram identificadas. Em relação à atitude matemática, não foram encontradas diferenças significativas entre Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp ,
18 as duas escolas, quando considerada a pontuação média na escala. Porém, quando os sujeitos foram classificados como possuidores de atitudes positivas ou negativas, havia uma diferença significativa na freqüência de sujeitos. Em outras palavras, houve uma freqüência maior de sujeitos com atitudes positivas na escola privada que na escola pública. A crença de autoeficácia dos sujeitos da escola pública e privada, quando analisada a pontuação média na escala, não foi diferente. Porém, da mesma forma, houve uma freqüência maior de alunos com crenças positivas de autoeficácia na escola privada que na escola pública. Como existem relações entre as atitudes, as crenças de autoeficácia e o desempenho, e as duas primeiras variáveis favoreceram os alunos da escola privada, era esperado então que o desempenho desses alunos também fosse superior, assim como indicado também pela revisão de literatura. Isso foi confirmado nesse trabalho, assim como encontrado por Alves (1999). Com relação à idade, na amostra do atual trabalho, o intervalo encontrado foi pequeno, de 15 a 18 anos, sendo que a idade mais freqüente foi de 16 anos e apenas 1,9% deles possuía 18 anos. Por esse motivo, não se pode afirmar, com base nesses dados, que existam diferenças de desempenho ou de variáveis afetivas tais como atitude e crença de autoeficácia que sejam atribuídas à idade. Para isso, um trabalho considerando uma amostra com um intervalo maior pode responder a essa questão de forma mais objetiva. É importante ressaltar que todos esses resultados não podem ser generalizados para uma amostra qualquer e sim para um conjunto de estudantes com características semelhantes aos dos participantes dessa pesquisa, já que a amostra desse trabalho foi de conveniência. Como as relações entre essas três variáveis (atitudes, crença de autoeficácia e desempenho) foram altamente significativas, isso indica que o professor deve preocupar-se com esses aspectos quando decide os métodos de ensino que serão adotados em suas aulas. Pesquisas indicam que a utilização de formas lúdicas de ensino, como materiais manipulativos, o uso de jogos, situações contextualizadas e interdisciplinaridade tendem a motivar os alunos, desenvolvendo atitudes mais positivas em relação à Matemática, e conseqüentemente influenciando no desenvolvimento de crenças mais positivas de autoeficácia. 216 Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp , 2010
19 À medida que se demonstra que os professores podem exercer algum tipo de influência sobre as crenças do aluno e sobre seu desempenho, não se deve perder de vista que essa influência pode ocorrer num sentido bastante positivo, atuando nos fatores que favorecem o desenvolvimento de autoeficácia elevada. (SOUZA, 2006, p. 123). Assim, tão relevante como a influência da atitude no desempenho na solução de um problema matemático, a crença de autoeficácia do sujeito no domínio da Matemática desempenha um papel fundamental de influência sobre o aproveitamento de todos os processos cognitivos necessários em uma atividade matemática. Provavelmente, favorecendo o desenvolvimento de atitudes e prestando atenção à crença de autoeficácia do estudante, o desempenho dos alunos durante a solução de atividades matemáticas será também desenvolvido. E, conseqüentemente, haveria um incremento na própria atitude e crença de autoeficácia, perpetuando assim um ciclo vicioso saudável e ideal para todos os envolvidos no processo ensino-aprendizagem. Uma das implicações desse trabalho seria verificar, de forma experimental, a influência de diversos métodos de ensino na motivação, nas atitudes e na crença de autoeficácia matemática dos alunos. Outra pesquisa bastante interessante seria investigar esses mesmos construtos em domínios ainda mais específicos da Matemática, como a Geometria ou a Estatística. A atitude já foi explorada em pesquisas desenvolvidas pelo grupo PSIEM (VENDRAMINI, 2000; CAZORLA, 2002; VIANA, 2005). A crença de autoeficácia também poderia ser investigada nesses outros contextos. A ideia é que professores, coordenadores e pais de alunos estejam mais atentos a essas variáveis afetivas e que percebam e procurem desenvolver nos seus alunos. Referências AIKEN, L. R. (1970). Attitudes Toward Mathematics. Review of Educational Research, v. 40, n. 4, pp ALVES, E. V., (1999). Um Estudo Exploratório dos Componentes da Habilidade Matemática Requeridos na Solução de Problemas Aritméticos por Estudantes do Ensino Médio. Campinas, SP: Faculdade de Educação da UNICAMP, 190p. (Dissertação, Mestrado em Educação). BANDURA, A. (1977). Self-efficacy: Toward a Unifying Theory of Behavioral Change. Psychological Review, v. 84, n. 2, pp (1986). Social Foundations of Thought and Action: a Social Cognitive Theory. New Jersey: Prentice Hall. Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp ,
20 . (1993). Perceived Self-Efficacy in Cognitive Development and Functioning. Educational Psychologist, 28 (2), (1997). Self-Efficacy: The Exercise of Control. New York: W. H. Freeman and Company.. (2001). Social Cognitive Theory: An Agentic Perspective. Annual Review Psychology, 52, (2004). Swimming against the mainstream: the Early Years from Chilly Tributary to Transformative Mainstream. Behavior Research and Therapy, 42, BARROS, A. M. (1996). Atribuições Causais e Expectativas de Controle da Realização na Matemática. Psychologica, v. 15, BONG, M. (1997). Generality of Academic Self-Efficacy Judgments: Evidence of Hierarchical Relations. Journal of Educational Psychology, 89 (4), BRITO, M. R. F. (1996). Atitudes em Relação à Matemática em Estudantes de 1 o e 2 o Graus. Campinas, SP: Faculdade de Educação da UNICAMP. (Tese, Livre Docência em Educação). Brito, M. R. F. (1998). Adaptação e Validação de uma Escala de Atitudes em Relação à Matemática. Zetetiké, 6, 9, BRITO, M. R. F., NEUMANN, V. J. N. (2001). A Psicologia Cognitiva e suas Aplicações à Educação. In Márcia Regina Ferreira de Brito (org.), Psicologia da Educação Matemática: Teoria e Pesquisa. Editora Insular. BUSSAB, W. O., MORETTIN, P. A. (1987). Estatística Básica. São Paulo: Atual. CAZORLA, I. M. (2002). A Relação entre a Habilidade Viso-Pictórica e o Domínio de Conceitos Estatísticos na Leitura de Gráficos. Campinas, SP: Faculdade de Educação da UNICAMP, 190p. (Tese, Doutorado em Educação). CHARLES, R. (1988). How Do You Evaluate Problem Solving? Arithmetic Teacher, no. 35, v. 8, pp DOBARRO, V. R. Solução de Problemas e Tipos de Mente Matemática: Relações com as Atitudes e Crenças de Autoeficácia. Campinas, SP: Faculdade de Educação da UNICAMP (Tese, Doutorado em Educação), DUVAL, R. (2002). The Cognitive Analysis of Problems of Comprehension in the Learning of Mathematics. PME Papers, Julho.. (2003). Registros de Representações Semióticas e Funcionamento Cognitivo da Compreensão em Matemática. In: Aprendizagem em Matemática: Registros de Representação Semiótica, de Silvia Dias Alcântara Machado (org.), pp Campinas, SP: Papirus. EAGLY, A. H., CHAIKEN, S. (1993). The Psychology of Attitudes. Forth Worth: Harcourt Brace College Publishers. GIL, A. C. (1989). Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Ed. Atlas. 218 Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp , 2010
21 KLAUSMEIER, H. J. (1977). Manual de Psicologia Educacional: Aprendizagem e Capacidades Humanas. Traduzido por Maria Célia Teixeira de Azevedo de Abreu. São Paulo: Harbra. KRANZLER, J. & PAJARES, F. (1997). An Exploratory Factor Analysis of Mathematics Self-Efficacy Scale-Revised (MSES-R). Measurement and Evaluation in Counseling and Development, 29, KRUTETSKII, V. A. (1976). The Psychology of Mathematical Abilities in Schoolchildren. Chicago: The University of Chicago Press. Traduzido do idioma russo para o inglês por Joan Teller. LENT, R. W., LOPEZ, F. G., BIESCHKE, K. J. (1993). Predicting Mathematics- Related Choice and Success Behaviors: Test of An Expanded Social Cognitive Model. Journal of Vocational Behavior, v. 42, pp LOOS, H. (2003). Atitude e Desempenho em Matemática, Crenças Auto-Referenciadas e Família: Uma Path Analysis. Campinas, SP: Faculdade de Educação da UNICAMP (Tese, Doutorado em Educação). NEVES, L. F. (2002). Um Estudo sobre as Relações entre a Percepção e as Expectativas dos Professores e dos Alunos e o Desempenho em Matemática. Campinas, SP: Faculdade de Educação da UNICAMP (Dissertação, Mestrado em Educação). PAJARES F. (2003). Gender Differences in Mathematics Self-efficacy Beliefs. In A. Gallagher & J. Kaufman (Eds.), Mind the gap: Gender Differences in Mathematics. Boston, MA: Cambridge University Press, material não publicado. PAJARES, F. & GRAHAM, L. (1999). Self-Efficacy, Motivation Constructs, and Mathematics Performance of Entering Middle School Students. Contemporary Educational Psychology, v. 24, PAJARES, F., MILLER, M. D. (1994). Role of Self-Efficacy and Self-Concept Beliefs in Mathematical Problem Solving: A Path Analysis. Journal of Educational Psychology, 86 (2), (1995). Mathematics Self-Efficacy and Mathematics Performances: The Need for Specificity of Assessment. Journal of Counseling Psychology, 42 (2), (1997). Mathematics Self-Efficacy and Mathematical Problem Solving: Implications of Using Different Forms of Assessment. The Journal of Experimental Education, 65, REZI, V. (2001). Um Estudo Exploratório sobre os Componentes das Habilidades Matemáticas Presentes no Pensamento em Geometria. Campinas, SP: Faculdade de Educação da UNICAMP, 174p. (Dissertação, Mestrado em Educação). SOUZA, L. F. N. I. (2006). Crenças de autoeficácia matemática. In: Azzi, Roberta Gurgel; Polydoro, Soely Aparecida Jorge. (Org.). Autoeficácia em Diferentes Contextos. Campinas - SP: Alínea. TRIOLA, M. F. (1999). Introdução à Estatística. São Paulo: LTC. UTSUMI, M. C. (2000). Atitudes e Habilidades Envolvidas na Solução de Problemas Algébricos: um Estudo Sobre o Gênero, a Estabilidade das Atitudes e Alguns Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.12, n.2, pp ,
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