Ocorrência de resíduos de ionóforos poliéteres em leite UHT comercializado na região metropolitana do Rio de Janeiro
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1 Artigo DOI: / x Ocorrência de resíduos de ionóforos poliéteres em leite UHT comercializado na região metropolitana do Rio de Janeiro Occurrence of polyether ionophore residues in UHT milk marketed in the metropolitan region of Rio de Janeiro Resumo Mararlene Ulberg Pereira* Bernardete Ferraz Spisso Silvana do Couto Jacob Rosana Gomes Ferreira Mychelle Alves Monteiro Rafaela Pinto da Costa Armi Wanderley da Nóbrega Os ionóforos poliéteres são antibióticos utilizados em bovinos como promotores de crescimento, para aumentar a produção de leite em vacas em lactação e prevenir e tratar a coccidiose. Os ionóforos poliéteres autorizados como aditivos antimicrobianos no Brasil para uso na alimentação de bovinos e vacas leiteiras são a lasalocida e a monensina sódica. Entretanto, poucos são os métodos analíticos para determinação destes resíduos em leite e não há dados de monitoramento disponíveis no Brasil. Essa classe ainda não está incluída nos programas de controle de resíduos em leite implementados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária e pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Este trabalho teve como objetivo avaliar a ocorrência de seis ionóforos poliéteres em leite UHT empregando um método analítico desenvolvido e validado no Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde. O método foi aplicado em 102 amostras de leite integral UHT comercializadas na região metropolitana do Rio de Janeiro. Nas amostras analisadas somente resíduos do antibiótico monensina foram encontrados. Esta substância foi detectada em 14% das amostras, mas as concentrações estimadas foram bem inferiores ao limite máximo de resíduo de 2 µg/kg recomendado pelo Codex Alimentarius e pela Comunidade Europeia. Palavras-chave: Resíduos de Medicamentos Veterinários; Anticoccidianos; Leite; Ionóforos Poliéteres; Antibióticos Abstract Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde, Fundação Oswaldo Cruz (INCQS/Fiocruz), Rio de Janeiro, RJ, Brasil * mararlene.pereira@incqs. fiocruz.br Polyether ionophore antibiotics are used in cattle to promote growth, to increase milk production in lactating cows, and to prevent and treat coccidiosis. In Brazil, lasalocid and monensin are the two polyether ionophores that are allowed as antimicrobial additives in cattle and dairy cow feed. However, there are few methods for determining the residues of these additives in milk, and no monitoring data are available in Brazil. These residues are not yet included in the residue control programs in the milk matrix implemented by the National Sanitary Surveillance Agency and the Ministry of Agriculture, Livestock and Supply. The present study aimed to evaluate the occurrence of 6 polyether ionophores in UHT milk using an analytical method developed and validated by the National Institute for Quality Control in Health. The method was applied to 102 samples of whole UHT milk marketed in the metropolitan region of Rio de Janeiro. In the analyzed samples, only residues of the antibiotic monensin were found. The residues were detected in 14% of the samples; however, the estimated concentrations were well below the maximum residue limit of 2 µg/kg recommended by the Codex Alimentarius and the European Community. KEYWORDS: Veterinary Drug Residues; Anticoccidials; Milk; Polyether Ionophores; Antibiotics Recebido: 30 jul 2014 Aprovado: 06 fev 2015 Vigil. sanit. debate 2015;3(3):
2 INTRODUÇÃO Os ionóforos poliéteres são antibióticos largamente empregados na alimentação animal para prevenir e tratar a coccidiose, enfermidade causada por protozoários dos gêneros Eimeria bovis e Eimeria suernii que residem na mucosa intestinal. Além de serem agentes anticoccidianos, atuam como promotores de crescimento em bovinos e suínos, melhorando a eficiência alimentar e a taxa de ganho de peso 1. Em ruminantes são empregados ainda para aumentar a produção de leite em vacas em lactação 2. Existem seis ionóforos poliéteres aprovados no Brasil (lasalocida, maduramicina, monensina, narasina, salinomicina e senduramicina), sendo que somente a monensina e a lasalocida são autorizadas para bovinos e vacas em lactação. A salinomicina sódica é autorizada apenas para bovinos de corte para o aumento de ganho de peso 3. Esses antibióticos influenciam a contratilidade do tecido muscular, produzindo efeitos farmacológicos agudos sobre o sistema cardiovascular, com aumento do fluxo e dilatação coronariana. Vítimas de doença coronariana arterial podem ser mais susceptíveis a efeitos adversos 4. São relatados na literatura casos de exposição acidental de seres humanos, levando à insuficiência cardíaca e renal aguda, seguida de óbito 5. Para proteger a saúde humana, diferentes autoridades regulatórias têm estabelecido Limites Máximos de Resíduos (LMRs) e Níveis Máximos (NMs) ou tolerâncias para alguns ionóforos poliéteres 5,6,7. Em 2008, o Codex Alimentarius, através do Comitê de Especialistas em Aditivos Alimentares e Contaminantes (JECFA) avaliou alguns ionóforos poliéteres no que diz respeito à toxicidade e segurança e estabeleceu o LMR de 2 µg/kg para a substância monensina em leite, que posteriormente foi também adotado pela Comissão Europeia 5,7. A Comissão Europeia, através do parecer da Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (European Food Safety Authority, EFSA), em 2009, estabeleceu NMs para a presença de alguns resíduos de ionóforos poliéteres em gêneros alimentícios, incluindo o leite. Foram estabelecidos NMs de 1 μg/kg para lasalocida e narasina e 2 μg/kg para salinomicina, maduramicina e senduramicina 6. A competência de se estabelecer LMRs no Brasil é da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). No entanto, ainda não há valores nacionais estabelecidos para a classe dos ionóforos poliéteres. Neste caso, podem ser utilizados os recomendados pelo Codex Alimentarius e os constantes nas Diretivas da União Europeia 8. De acordo com a Lei nº 9.782/99, cabe à ANVISA, regulamentar, controlar e fiscalizar os produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública. No art. 8º, parágrafo 1º, inciso II, desta Lei, é determinado o controle e a fiscalização sanitária dos resíduos de medicamentos veterinários em alimentos, que podem configurar um risco à saúde da população, caso não sejam observadas as boas práticas veterinárias, seja em função do não cumprimento dos períodos de carência, do uso exagerado e/ou indevido, entre outros fatores 9. É importante ressaltar que os ionóforos poliéteres ainda não estão incluídos nos programas nacionais de monitoramento em leite, ou seja, no Plano Nacional de Controle de Resíduos e Contaminantes em Produtos de Origem Animal (PNCRC) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e no Programa de Análise de Resíduos de Medicamentos Veterinários em Alimentos de Origem Animal (PAMVet) da ANVISA 8,10. Portanto, ainda não há informações sobre a eventual presença de resíduos de ionóforos poliéteres em leite disponível ao consumo no Brasil. O leite é um alimento de origem animal acessível à população brasileira e que possui elevado valor nutritivo, pois é fonte de proteínas, algumas vitaminas, gorduras, carboidratos e alguns sais minerais, fundamentais à saúde humana 11,12,13. Segundo o relatório da Pesquisa de Orçamentos Familiares (IBGE/POF, 2008/2009), a classe leites e derivados constitui-se no segundo maior gasto com a alimentação na área urbana, com 11,0%, e na área rural, ocupa o terceiro lugar, com 8,7% 14. Esses dados expressivos de estimativa de consumo, aliados à sua importância na alimentação de grupos populacionais de maior risco, como idosos e crianças, além da falta de dados nacionais sobre a presença de resíduos de ionóforos poliéteres em leite definiram a escolha dessa matriz para estudo. MÉtodo Aquisição e preparo das amostras As amostras foram adquiridas, com recursos do INCQS, em 17 locais (supermercados, padarias, mercearias e lojas hortifrutigranjeiras) de 16 bairros e seis cidades da região m etropolitana do Rio de Janeiro no período de dezembro de 2012 a fevereiro de Trinta e uma marcas foram contempladas nas 102 amostras coletadas. Antes da abertura das embalagens, as amostras foram homogeneizadas manualmente. Uma alíquota de 8 ml de cada amostra foi armazenada à temperatura igual ou inferior a -70ºC para reensaio, caso necessário. Solventes, reagentes e padrões Metanol (MeOH) e acetonitrila (ACN) para cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC) foram adquiridas da J. T. Baker (Phillipsburg, NJ, USA) e Merck (Darmstadt, Germany), respectivamente. Acetato de sódio (NaOAc) e ácido fórmico (FOA) da Merck Suprapur (Darmstadt, Germany), acetato de sódio anidro (NaOAc) e sulfato de magnésio anidro para análise empregados na extração QuEChERS foram fornecidos pela Merck (Darmstadt, Germany). Água ultra-pura foi fornecida por um sistema Milli-Q (Millipore, Bedford, MA, USA). Padrões de narasina (NAR), salinomicina (SAL) e nigericina (NIG) foram da Sigma-Aldrich (St. Louis, MO, USA). Lasalocida A de sódio (LAS), maduramicina alfa de amônio (MAD) e monensina de sódio (MON) foram da Dr. Ehrenstorfer (Augsburg, Germany). Senduramicina de sódio (SEN) da Phibro Animal Vigil. sanit. debate 2015;3(3):
3 Health foi doada pelo laboratório de referência da União Europeia (Community Reference Laboratory, CRL) Bundesamt fur Verbraucherschutz und Lebensmittelsicherheit (Berlin, Germany). Os padrões de ionóforos poliéteres foram preparados a fim de obter uma concentração de aproximadamente 1000 µg/ml em metanol. Somente a lasalocida foi preparada na concentração de 10 µg/ml em metanol, pois o padrão comercializado é uma solução de 100 µg/ml em acetonitrila. Estas soluções podem ser estocadas em freezer a temperaturas igual ou inferior a -70ºC durante pelo menos 3 anos para SEN e 2 anos para MON, SAL, MAD, NAR, NIG e LAS. Soluções padrão intermediárias e de trabalho foram preparadas no mesmo dia da análise em concentrações apropriadas a partir das soluções padrão estoque em metanol. Extração da amostra e curva de calibração Foram pipetados 2,0 ml da amostra de leite em um tubo de centrífuga de polipropileno de 50 ml e adicionados 50 µl de metanol e 50 µl da solução de NIG a 0,6 µg/ml, agitando-se em vórtex por 10 segundos. Foram acrescentadas às amostras duas porções de 4,0 ml de acetonitrila, agitando-se em vórtex por 1 minuto a cada adição. Após a adição de 0,8 g de sulfato de magnésio anidro e 0,2 g de acetato de sódio anidro agitou-se em vórtex por 1 minuto. Após repouso de 5 minutos, foram centrifugadas a rpm por 5 minutos a 4ºC. Uma alíquota de 250 µl do sobrenadante foi transferida para um tubo de centrífuga de polipropileno de 15 ml e evaporada à secura sob um fluxo suave de nitrogênio a (46 ± 1)ºC. Os extratos secos foram reconstituídos com 1 ml de solvente de diluição 5 mmol/l NaOAc:MeOH, 70:30, v/v, agitados em vórtex por 15 segundos e filtrados em filtro de 0,22 µm para vials âmbar. Para quantificar as amostras foram construídas curvas de calibração em uma matriz comprovadamente branca com a fortificação no início do procedimento com seis níveis de concentração, além do ponto zero, todos com adição do padrão interno NIG. As concentrações foram equivalentes a 0,5, 1, 1,5, 2, 2,5 e 3 vezes o LMR/NM (Valores preconizados de NMs 6 : 1 µg/kg para a LAS e NAR, 2 µg/kg para a SAL, MAD e SEN e LMR 5,7 de 2 µg/kg para a MON). As extrações foram realizadas conforme descrito para as amostras. A fim de monitorar a qualidade dos resultados analíticos, uma amostra branca da matriz, uma amostra branca de reagentes e amostras fortificadas no nível equivalente a 1 LMR/NM foram também analisadas. Condições analíticas do sistema LC MS/MS Um sistema LC-MS/MS composto de Cromatógrafo a Líquido de Alta Eficiência Shimadzu Prominence e espectrômetro de massas sequencial API5000 Applied Biosystems/MDS Sciex, com interface TurboIonspray foi empregado. O software Analyst foi usado para controle do sistema, aquisição e análise dos dados. A configuração do cromatógrafo a líquido compreende uma bomba quaternária LC-20AD, um degaseificador de membrana DGU-20A5, um autoamostrador SIL-20AC, um forno de coluna CTO -20AC e uma controladora CBM-20A. A separação dos antibióticos foi realizada numa coluna analítica ACE C18 (50 mm 2,1 mm i.d., 3 µm de tamanho de partícula), com uma coluna de guarda do mesmo material (Advanced Chromatography Technologies, Aberdeen, Escócia). Fases móveis A, B e C foram H 2 O, ACN e MeOH, respectivamente, todas com 0,1% FOA. O programa de gradiente de eluição é apresentado na Tabela 1 e foi o mesmo empregado anteriormente para a separação de ionóforos poliéteres, macrolídeos e lincomicina em matriz ovo 15. O fluxo foi de 0,3 ml/min a 35ºC e a temperatura do auto-amostrador foi ajustada a 4ºC. O volume de injeção foi de 25 µl. O modo de ionização utilizado foi o eletrospray positivo, com aquisição por Monitoramento de Reações Múltiplas (MRM) e foram monitorados 3 transições para casa substância. A otimização dos parâmetros de MRM foi realizada por infusão direta dos padrões de ionóforos poliéteres. Outros parâmetros selecionados na infusão automática foram: voltagem do ionspray de 4500 V, temperatura da fonte de 450ºC e voltagem do potencial de entrada de 10 V. Os parâmetros declustering potential (DP), collision energy (CE) e collision exit potential (CXP) foram otimizados para cada transição de MRM com dwell times de 20 ou 25 ms (Tabela 2). Nitrogênio foi empregado como gás de nebulização e de secagem (55 psi), gás de colisão (10, unidade arbitrária) e gás de cortina (Curtain gas TM,10 psi). Identificação e quantificação A identificação e confirmação dos ionóforos poliéteres nas amostras foi efetuada de acordo com a Decisão n o 657/2002 pelos critérios de tempo de retenção relativo, razão sinal/ruído e razão de íons 16. A NIG foi utilizada como padrão interno para efetuar o cálculo de tempo de retenção relativo. A transição de MRM mais intensa (primeira transição) foi escolhida para a quantificação, como mostra a Tabela 2 e duas transições adicionais foram monitoradas para confirmação. O monitoramento de pelo menos duas transições (par de íons precursor/produto) para cada substância confere ao método analítico o número mínimo de pontos de identificação (Identifications Points, IPs) necessários para a confirmação de substâncias por espectrometria de massas sequencial de baixa resolução, conforme os critérios descritos na Decisão n o 2002/657/EC 16. Embora duas transições fossem suficientes, três transições para cada analito foram selecionadas. Tabela 1. Programa de gradiente de eluição. Tempo (min) %A %B %C , , , , , , , , Vigil. sanit. debate 2015;3(3):
4 Tabela 2. Condições analíticas do sistema LC-MS/MS para a determinação de ionóforos poliéteres. Analito Tempo de RSD (%) do tempo Tempo de Massa d Íon precursor e Íon produto Dwell retenção (min) a de retenção b retenção relativo c (u) (m/z) (m/z) (ms) DP f CE g CXP h LAS A 7,76 a 7,86 0,03 0,839 a 0, ,4 613,3 377, , , MAD 8,82 a 8,93 0,03 0,954 a 0, ,5 939,6 877, , , MON A 8,37 a 8,47 0,03 0,904 a 0, ,4 693,4 675, , , NAR A 8,60 a 8,70 0,02 0,929 a 0, ,5 787,4 431, , , NIG 9,22 a 9,33 0, ,5 747,5 703, , , SAL A 8,22 a 8,32 0,02 0,888 a 0, ,5 773,5 431, , , SEN 7,78 a 7,87 0,02 0,840 a 0, ,5 895,5 833, , , a Tempos de retenção obtidos nos experimentos de validação. b Desvios padrão relativos (RSD) do tempo de retenção obtidos nos experimentos de validação. c Tempo de retenção relativo, calculado a partir dos tempos de retenção obtidos nos experimentos de validação. d Massa monoisotópica exata do ácido livre, considerando as massas atômicas exatas dos isótopos mais abundantes. e Íon precursor para LAS A, MAD alfa, MON A, NAR A, NIG, SAL e SEN = [M+Na] +. f Declustering Potential (V). g Collision Energy (V). h Collision Exit Potential (V). A quantificação dos analitos nas amostras foi efetuada diretamente por interpolação na curva de calibração obtida para cada analito pelo método dos mínimos quadrados ponderados (MMQP), com peso equivalente a 1/y, empregando o software Analyst. Resíduos de ionóforos poliéteres foram considerados detectados nas amostras quando os critérios de identificação/confirmação foram atendidos e quando a concentração encontrada para um determinado analito apresentou concentração superior ao limite de detecção estabelecido na validação. Estudos de validação O método analítico empregado para avaliar as amostras de leite foi desenvolvido e validado no laboratório segundo o Procedimento Operacional Padronizado de Métodos de Análise para Resíduos de Medicamentos Veterinários em Alimentos: Protocolo de Validação 17 e demonstrou ser apto para o uso pretendido, uma vez que os resultados dos parâmetros de validação atenderam aos critérios preconizados na área de resíduos de medicamentos veterinários em alimentos, e adequado para fins de avaliação da conformidade de amostras em relação aos limites recomendados pelo Codex Alimentarius e pela Comunidade Europeia. O procedimento foi validado em três níveis de concentração equivalentes a 0,5, 1 e 1,5 vezes o LMR/NM. O intervalo linear do detector na presença de matriz foi de 0,25 a 3,5 vezes o LMR/NM, para os analitos MON, NAR, SAL e SEN e 0,5 a 3,5 NM para os analitos LAS e MAD. A Tabela 3 apresenta um resumo dos resultados das principais figuras de mérito avaliadas na validação. A descrição completa do procedimento de validação com os respectivos resultados estão relatados em dissertação 18 e em artigo submetido à revista internacional indexada. Resultados e discussão Das 102 amostras de leite integral UHT adquiridas no comércio da região metropolitana do Rio de Janeiro, a maior parte foi procedente da região Sudeste, como pode ser observado na Figura 1 que apresenta o gráfico do quantitativo das amostras de leite por estado de origem. Do total de 102 amostras analisadas nenhuma apresentou resíduos de LAS, MAD, NAR, SAL e SEN. Destas amostras, 14 foram Vigil. sanit. debate 2015;3(3):
5 Tabela 3. Resultados das principais figuras de mérito avaliadas na validação. Analito Concentração µg/kg Recuperação LOD LOQ CCα CCβ global a,b (%) RSD a,b (%) LAS 0,2 0,4 1,2 1, MAD 0,4 0,9 2,5 3, MON 0,06 0,1 2,4 2, NAR 0,04 0,1 1,2 1, SAL 0,03 0,07 2,3 2, SEN 0,1 0,4 2,4 3, a Valores globais equivalentes a 1 LMR/NM. b Em condições de precisão intermediária. LOD: limite de detecção; LOQ: limite de quantificação; CCα: limite de decisão. CCβ: capacidade de detecção. 30 RJ 22 MG Origem dos leites analisados 4 SP 5 ES Figura 1. Quantidade de amostras de leite integral UHT por estado de origem. 21 RS consideradas contaminadas pelo antibiótico MON, pois atenderam aos critérios de identificação/confirmação de acordo com a Decisão n o 657/ e apresentaram concentrações superiores ao limite de detecção (LOD) do método estabelecido na validação (0,06 µg/kg). Sete amostras puderam ser quantificadas, uma vez que apresentaram concentrações maiores do que o limite de quantificação (LOQ) estimado na validação (0,1 µg/kg). As concentrações estimadas foram bem inferiores ao LMR recomendado pelo Codex Alimentarius de 2 µg/kg 5. A Figura 2 apresenta os cromatogramas da transição de quantificação e uma transição de confirmação do analito MON para a amostra 194/2012 com concentração estimada de 0,4 µg/kg e para uma amostra de leite fortificada com concentração equivalente ao LMR. A Tabela 4 apresenta um resumo dos níveis de contaminação por ionóforos poliéteres das 102 amostras de leite UHT coletadas na região metropolitana do Rio de Janeiro, e de acordo com os dados apresentados, todas as amostras foram consideradas conformes, pois nenhuma apresentou níveis superiores aos recomendados pelo Codex Alimentarius 5 e pela Comunidade Europeia 6,7. É importante ressaltar que não foram encontrados relatos de monitoramento de ionóforos poliéteres em leite no Brasil e essa classe ainda não está incluída nos programas de monitoramento em leite implementados pela ANVISA (PAMVet) e 13 SC 2 PR 2 GO 3 BA pelo MAPA (PNCRC/Leite). Ainda, o número de publicações descrevendo resultados de monitoramento desses antibióticos em leite em países como China, Coreia, Espanha e Canadá é também muito escasso 19,20,21,22. Um artigo apresentado por Zhan et al. 19 avaliou um número pequeno de amostras de leite cru (20 amostras) coletadas em Ningbo, na China, empregando um método multi-resíduo para 255 drogas veterinárias, incluindo os ionóforos poliéteres MAD, SAL, NAR e LAS. Nenhuma das quatro substâncias foi detectada nessas amostras. Kim et al. 20 analisaram 196 amostras, incluindo leite, frango e ovos comercializados em mercados locais da Coreia, apenas para o analito NAR. Para a matriz leite não foi relatada contaminação por NAR. O limite de quantificação estabelecido do método foi de 5 ng/g e portanto, 5 vezes superior ao NM recomendado pela Comunidade Europeia, que é de 1 µg/kg 6. Segundo o artigo, na Coreia não há LMR estabelecido para NAR em leite. Nebot et al. 21, a fim de verificarem a aplicabilidade do método desenvolvido para LAS, MON, NAR, MAD e SAL, avaliaram 100 amostras de leite cru coletadas em fazendas no noroeste da Espanha e 15 amostras de leite compradas em supermercados locais. Nenhuma das amostras apresentou contaminação por ionóforos poliéteres acima do LMR e NM estabelecidos. Thompson, Noot e Kendall 22 avaliaram a presença de LAS, MON, NAR e SAL em 1072 amostras de leite cru de um laticínio em Alberta, no Canadá. Nenhum resíduo de NAR e SAL foi constatado nas amostras, com base em um limite de quantificação de 0,1 ng/g. LAS foi quantificada em apenas uma amostra, a uma concentração de 0,16 ng/g. MON foi verificada em 736 das 1072 amostras (69%), em concentrações iguais ou superiores ao limite de quantificação de 0,1 ng/g. Este LOQ é 100 vezes menor do que o LMR estabelecido pelo Canadá de 10 ng/g para MON no leite. Segundo os autores, outras amostras atenderam aos critérios de identificação, mas como apresentaram concentrações inferiores ao LOQ não foram consideradas na estatística. Das 736 amostras consideradas contaminadas, 685 apresentaram concentrações de MON entre 0,10 e 0,29 ng/g. Vigil. sanit. debate 2015;3(3):
6 (A) Intensity, cps (B) Amostra 194/ MON / (Unknown) / amu - sample 44 of 114 from Análise de amostra Area: 2.34e+004 counts Height: 4.25e+003 cps RT: min ,4/675, Time, min P3M 106_ MON / (Standard) / amu - sample 11 of 114 from Análise de amostra Area: 1.36e+005 counts Height: 2.25e+004 cps RT: min Amostra 194/ MON / (Unknown) / amu - sample 44 of 114 from Análise de amostra Area: 1.47e+004 counts Height: 2.49e+003 cps RT: min 0 693,4/479, Time, min P3M 106_ MON / (Standard) / amu - sample 11 of 114 from Análise de amostra Area: 8.25e+004 counts Height: 1.47e+004 cps RT: min Intensity, cps 2.2e4 2.0e4 1.8e4 1.6e4 1.4e4 1.2e4 1.0e ,4/675,3 1.4e4 1.2e4 1.0e Time, min ,4/479, Time, min Figura 2. Cromatogramas da transição de quantificação (à esquerda) e uma transição de confirmação (à direita) do analito MON referentes à amostra 194/2012 com concentração estimada de 0,4 µg/kg (A) e à amostra de leite fortificada com concentração equivalente a 1 LMR: 2 µg/kg (B). Tabela 4. Níveis de contaminação de ionóforos poliéteres em 102 amostras de leite UHT coletadas na região metropolitana do Rio de Janeiro Analito Frequência e níveis de contaminação nas amostras Concentração (µg/kg) Amostras Amostras n.d. > LOD e > 1LOQ e > CCα Mínimo Máximo contaminadas (%) não-conformes (%) (< LOD) < LOQ < 2LOQ LAS MAD MON ,11 0, NAR SAL SEN Os resultados obtidos por Thompson, Noot e Kendall 22 assemelham-se aos obtidos neste estudo, pois os autores também não detectaram resíduos de NAR e SAL, e a LAS foi detectada em uma única amostra, em baixa concentração. No Canadá, a LAS e a SAL são autorizadas para uso como aditivo alimentar para o gado, mas não especificamente para o gado leiteiro em lactação. No Brasil, a LAS é autorizada para uso como aditivo zootécnico em vacas em lactação e a SAL, como no Canadá, também é autorizada apenas para bovinos de corte. A NAR não é autorizada para uso em bovinos no Brasil e no Canadá 3,23. Tanto no Brasil quanto no Canadá a MON pode ser utilizada para o gado leiteiro via aditivos zootécnicos, a fim de aumentar a eficiência de produção de leite, o que pode justificar a quantidade elevada de contaminação por MON (69%) nas amostras de leite do estudo realizado no Canadá 3,23. Neste trabalho, 14% das amostras foram consideradas contaminadas por MON, embora nenhuma tenha apresentado concentração acima do LMR. Cabe ressaltar que as amostras de leite analisadas neste trabalho são tratadas termicamente pelo processo UHT, Vigil. sanit. debate 2015;3(3):
7 além de serem padronizadas a 3% de gordura. Como observado no ensaio de robustez na validação, a MON é termicamente sensível e potencialmente sujeita a sofrer degradação durante processamentos térmicos. Além disso, o efeito de diluição que ocorre nas usinas de beneficiamento, onde mais de 6000 litros de leite por dia são recebidos e misturados de diversos produtores, pode contribuir na diluição destes resíduos em relação à concentração no leite cru 24. Considerando essas questões, o panorama quanto à presença de resíduos de MON em leite cru pode ser bem diferente. É importante ressaltar que neste estudo o método cromatográfico utilizado no monitoramento possui um tempo total de corrida de 18 minutos e os métodos de Kim et al. 20, Thompson, Noot e Kendall 22 e Nebot et al. 21 apresentaram tempos de corridas de 15, 22 e 36 minutos, respectivamente, porém não contemplaram todos os analitos. Zhan et al. 19 empregaram um tempo de corrida de 12 minutos, menor do que o do presente trabalho, mas além de não monitorarem todos os analitos, utilizaram a técnica cromatográfica de UPLC (Ultra Performance Liquid Chromatography) que é muito mais rápida que a de HPLC (High-performance Liquid Chromatography). Conclusão Os resultados do monitoramento de 102 amostras de leite integral UHT mostraram que somente resíduos de MON puderam ser detectados, sendo que sete amostras continham resíduos do antibiótico em concentrações superiores ao limite de detecção (LOD) e outras sete apresentaram concentrações maiores do que o limite de quantificação (LOQ), porém a concentração mais alta encontrada foi de 0,37 µg/kg, que equivale a aproximadamente 3/8 do LMR de 2 µg/kg recomendado pelo Codex Alimentarius. Esses resultados indicam que não há indícios de emprego das substâncias não autorizadas (MAD, NAR, SAL e SEN) em vacas lactentes, no universo estudado, pois nenhum destes fármacos foi encontrado. A MON, muito provavelmente, é o ionóforo poliéter autorizado mais utilizado em vacas leiteiras, uma vez que a LAS, a outra substância autorizada para esses animais, não foi encontrada em nenhuma das amostras. Só há um produto registrado como aditivo melhorador de desempenho à base de LAS para bovinos (Taurotec), enquanto há 22 produtos à base de MON, segundo a Coordenação de Fiscalização de Produtos para Alimentação Animal (CPAA/DFIP) do MAPA 3. É importante ressaltar que não foram encontrados relatos de monitoramento de ionóforos poliéteres em leite no país e essa classe ainda não está incluída nos programas de monitoramento em leite implementados pela ANVISA e pelo MAPA. Portanto, este trabalho apresenta dados inéditos no Brasil sobre a ocorrência de resíduos de ionóforos poliéteres neste produto de origem animal. Também não foram identificados dados de monitoramento em leites processados em outros países, o que torna o presente trabalho inédito tanto no âmbito nacional quanto internacional. Um monitoramento futuro em leites em pó, pasteurizado e cru poderá ser realizado pelo Laboratório de Resíduos de Medicamentos Veterinários do INCQS, a fim de gerar mais dados de ocorrência e possibilitar uma futura avaliação da exposição, dando subsídios a uma análise de risco. As informações geradas são importantes para que se recomendem medidas preventivas de alcance em toda a cadeia produtiva, a fim de promover e proteger a saúde da população, conforme a missão da Vigilância Sanitária. REFERêNCIAS 1. The Merck veterinary manual. Whitehouse Station: Merck; c Antimicrobial feed additives [Atualizado em: dez 2013; acesso em: 30 abr 2013]. 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