ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GAB. DESEMB - WILLIAM COUTO GONÇALVES 2 de outubro de 2012

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1 ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GAB. DESEMB - WILLIAM COUTO GONÇALVES 2 de outubro de 2012 APELAÇÃO CIVEL Nº ( ) - VITÓRIA - VARA FAZENDA PÚBLICA MUNICIPAL APELANTE :CLARO S/A APELADO : MUNICIPIO DE VITORIA RELATOR SUBSTITUTO DES. LYRIO REGIS DE SOUZA LYRIO REVISOR SUBSTITUTO DES. JANETE VARGAS SIMOES R E L A T Ó R I O V O T O S O SR. DESEMBARGADOR LYRIO REGIS DE SOUZA LYRIO (RELATOR):- Relatório Cuidam-se os autos de Apelação Cível interposta por Claro S/A em face da sentença (fls. 235/239) proferida pelo Juízo da Vara dos Feitos da Fazenda Pública Municipal de Vitória, Comarca da Capital, que nos autos da Ação Anulatória de Multa Administrativa proposta em seu desfavor pelo Município de Vitória, julgou improcedente pretensão deduzida pelo Autor/Apelante, condenando ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa. O Apelante (fls. 240/257) pugna pela reforma da sentença pelos seguintes fundamentos: 1º) não se recusa a vender aparelhos celulares mediante pagamento à vista; 2º) a apresentação de comprovante de crédito só é exigida por ocasião da contratação dos serviços de telefonia móvel na modalidade "pós-pago"; 3º) nulidade da decisão administrativa por ausência de fundamentação; 4º) ausência de conduta capaz de caracterizar infração às normas de defesa do consumidor; 5º) apresentou proposta de acordo ao consumidor nos mesmo termos por ele requerido; 6º) aplicação exorbitante da multa no montante de R$ ,00 (cento e setenta e cinco mil reais), quando do ajuizamento da ação. Em resposta (fls. 290/298) o Apelado sustenta a manutenção da sentença. Relatoriei. Ao Revisor.

2 Vitória, ES, em 05 de junho de Des. William Couto Gonçalves Relator Voto Extrai-se dos autos que o Apelante propôs em desfavor do Apelado Ação Anulatória de Multa Administrativa, postulando a nulidade do processo administrativo que ensejou a aplicação de multa administrativa no importe de R$ ,47 (cento e setenta e três mil seiscentos e quarenta e nove reais e quarenta e sete centavos). O MM. Juiz singular julgou improcedente a pretensão deduzida pelo Apelante, condenando o Apelante/Autor ao pagamento das custas e honorários advocatícios. Consta dos autos, que o Sr. Sandro Taquetti Haddad Elias apresentou reclamação junto ao Procon do Município de Vitória (Processo nº 1471/06 AI nº 456/07), sustentando que teria comparecido a uma loja da Autora/Apelante para adquirir um aparelho celular da marca Nokia, modelo 6111 ou da marca Motorola, modelo V3Blacck, no plano 200 minutos, ocasião em que a venda lhe teria sido negada, por ausência de comprovante de crédito, mesmo o consumidor desejando efetuar o pagamento à vista. (Fls. 65/66). A reclamação ensejou Processo Administrativo, culminando na aplicação de multa no valor de R$ ,35 (cento e vinte e dois mil quatrocentos e trinta e um reais e trinta e cinco centavos), valor este que na propositura da ação já alcançava o importe de R$ ,47 (cento e setenta e três reais e seiscentos e quarenta e nove reais e quarenta e sete centavos). A hipótese dos autos (aplicação de multa pelos Órgãos de Proteção ao Consumidor - PROCON) tem sido enfrentada, com muita freqüência, pelos Tribunais pátrios, dada a repetição de fatos como os descritos neste processo. Sobre o tema, trago à colação jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA. MULTA APLICADA PELO PROCON. VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO. REVISÃO DO QUANTUM. MATÉRIA FÁTICA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. ÓBICE QUE INVIABILIZA O SEGUIMENTO DO RECURSO PELA ALÍNEA "C" DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. 1. Não se pode conhecer do pedido de redução do valor da multa administrativa imposta à agravante pelo Procon - em decorrência da violação ao dever de

3 informação ao consumidor quanto à divulgação, em anúncio publicitário, de pacote da programação de TV fechada -, já que, por demandar revisão probatória - para se verificar a gravidade da infração, a vantagem auferida e a condição econômica do fornecedor, critérios previstos no artigo 57 do CDC - encontra óbice no enunciado da Súmula 07/STJ. 2. O óbice acima relatado inviabiliza, também, o seguimento do recurso especial pela alínea "c" do permissivo constitucional. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no Ag /SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/04/2012, DJe 27/04/2012). (Original sem grifos). PROCESSUAL CIVIL. MULTA DO PROCON MUNICIPAL. QUANTUM ARBITRADO. MATÉRIA NÃO PREQUESTIONADA. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DA SÚMULA 282/STF. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 07/STJ. COMPETÊNCIA DO PROCON. ATUAÇÃO DA ANATEL. COMPATIBILIDADE. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. SÚMULA 07/STJ. (...) 4. O entendimento do Tribunal recorrido, no sentido de que o Procon tem poder de polícia para impor multas decorrentes de transgressão às regras ditadas pela Lei n /90, está em sintonia com a jurisprudência do STJ, pois sempre que condutas praticadas no mercado de consumo atingirem diretamente os consumidores, é legítima a atuação do Procon para aplicar as sanções administrativas previstas em lei, decorrentes do poder de polícia que lhe é conferido. Acresça-se, para melhor esclarecimento, que a atuação do Procon não inviabiliza, nem exclui, a atuação da Agência reguladora, pois esta procura resguardar em sentido amplo a regular execução do serviço público prestado. 5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, não provido. (REsp /RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/12/2010, DJe 08/02/2011). (Original sem grifos). PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE OMISSÕES. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO PROBATÓRIO DOS AUTOS. RELAÇÃO DE CONSUMO. EMPRESA PÚBLICA. MULTA IMPOSTA PELO PROCON. POSSIBILIDADE. (...) 3. A questão não mereceria acolhida, pois o entendimento do Tribunal recorrido, no sentido de que é pacífico que o Procon tem poder de polícia para impor multas decorrentes de transgressão às regras ditadas pela Lei n /90, está em sintonia com a jurisprudência do STJ. 4. Não é possível em sede de recurso especial realizar análise acerca da proporcionalidade do valor da multa administrativa imposta, com base na gravidade da infração, na presença de atenuantes e na situação econômica do infrator, vez que demanda a análise de aspectos fático-probatórios dos autos. 5. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp /RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/09/2010, DJe 15/10/2010). (Original sem grifos). Anote-se aqui, ser perfeitamente possível a imposição de multa administrativa pelo Órgão Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor - Procon. Quanto a alegação de nulidade do processo administrativo por ausência de fundamentação, razão não assiste ao Apelante. A motivação dos atos administrativos, embora sem expressa previsão constitucional, é derivada dos direitos fundamentais dos administrados, sobretudo aqueles

4 vinculados ao devido processo legal. A Administração Pública tem o dever de agir dentro dos princípios que norteiam a atividade administrativa - princípio da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência -, devendo por esta razão, dizer ao cidadão o porquê da prática de determinado ato. Na hipótese aqui descrita, verifico que a Administração Pública atendeu todos os requisitos que lhe são impostos para a aplicação da sanção prevista, haja vista que a decisão que julgou subsistente a reclamação está suficientemente fundamentada, podendo ser perfeitamente identificado o fato que ocasionou a imposição da multa, a natureza da reclamação e os argumentos da defesa. (Fls. 73/76). Anote-se, à propósito, que o Apelado agiu em defesa da ordem constitucional e consumerista, justificando sua conduta dentro dos preceitos legais que lhe são atribuídos. Cito, por oportuno, o seguinte precedente: ADMINISTRATIVO - MANDADO DE SEGURANÇA - MULTA ADMINISTRATIVA APLICADA PELO PROCON MUNICIPAL - LESÃO A CONSUMIDOR - EMPRESA PERTENCENTE AO MESMO GRUPO ECONÔMICO DA FABRICANTE DO PRODUTO DEFEITUOSO - APLICAÇÃO DA TEORIA DA APARÊNCIA - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA - DECISÃO ADMINISTRATIVA QUE SEGUIU O PROCEDIMENTO LEGAL - AUSÊNCIA DE OFENSA AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA - VIA MANDAMENTAL - INADEQUADA PARA DISCUTIR A IRRAZOABILIDADE E DESPROPORCIONALIDADE DO VALOR DA MULTA - APELO CONHECIDO E IMPROVIDO - SENTENÇA MANTIDA. 1 - (...). 2 - Não fere o contraditório e a ampla defesa a decisão administrativa que culminou na aplicação de multa à apelante seguindo todo o trâmite procedimental previsto legalmente. 3 - (...) 4 - Apelo conhecido e improvido. Sentença mantida. (TJES, Classe: Apelação Civel, , Relator Designado: CARLOS SIMÕES FONSECA, Órgão julgador: PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Julgamento: 24/08/2010, Data da Publicação no Diário: 25/08/2011). (Sem grifo no original). Por fim, quanto a irresignação do Apelante ao valor da multa, razão lhe assiste. O artigo 56, do Código de Defesa do Consumidor, prevê que as infrações das normas de defesa do consumidor ficam sujeitas, conforme o caso, às sanções administrativas ali elencadas, sem prejuízo das de natureza civil, penal e das definidas em normas específicas. Cuida-se de matéria sobre a qual não pende discussão jurisprudencial, senão vejamos: (...) A multa consagrada no art. 56 do CDC não objetiva à reparação do dano sofrido pelo consumidor (objeto de demanda judicial própria), mas sim à punição por prática vedada pela norma de proteção e defesa do consumidor, a fim de coibir a sua reiteração, o que caracteriza típico exercício do poder de polícia administrativa. Ausência de violação ao princípio do non bis in idem. Precedente da Turma: RMS /BA, DJ de (...). (RMS /RN, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/10/2006, DJ 19/10/2006).

5 Por sua vez, o artigo 57, do Código Consumerista, estabelece três critérios para a gradação da multa: I - a gravidade da infração; II - a vantagem auferida e III - a condição econômica do fornecedor. A estes, o artigo 28 do Decreto 2181/97 acresceu mais um: IV - a extensão do dano causado aos consumidores. Deflui-se dos autos, que o consumidor, compareceu a uma das lojas da Autora/Apelante para adquirir um aparelho celular, ocasião em que a venda lhe teria sido negada, por ausência de comprovante de crédito, mesmo o consumidor desejando efetuar o pagamento à vista. Nota- se que o valor da multa no importe de R$ ,35 (cento e vinte e dois mil quatrocentos e trinta e um reais e trinta e cinco centavos), valor este que na propositura da ação já alcançava o importe de R$ ,47 (cento e setenta e três reais e seiscentos e quarenta e nove reais e quarenta e sete centavos), não se mostra de acordo com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade que norteiam toda e qualquer sanção. Afirmo que não há dúvidas de que a multa, em casos tais, deve ter um caráter preventivo para obstar o transgressor na prática de outros atos ilícitos e deve ter também um caráter repressivo para que o sancionado se intimide na reincidência da prática de atos ilícitos. Ocorre que, na hipótese sob exame, o fato que desencadeou o ato administrativo não teve a gravidade revelada no procedimento para ensejar a aplicação da multa de R$ ,35 (cento e vinte e dois mil quatrocentos e trinta e um reais e trinta e cinco centavos), valor este que, repita-se, já alcançava o importe de R$ ,47 (cento e setenta e três reais e seiscentos e quarenta e nove reais e quarenta e sete centavos). Assim sendo, é de ser provido parcialmente o apelo para reduzir a multa para R$ ,00 (cinquenta mil reais) atualizados. Em situação análoga, posicionou-se este egrégio Tribunal de Justiça: EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO, CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL. AÇÃO ANULATÓRIA. VIOLAÇÃO ÀS NORMAS CONSUMERISTAS. DESCUMPRIMENTO À CONVOCAÇÃO DE ORDEM DO PROCON MUNICIPAL. MULTA ADMINISTRATIVA. OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. REDUÇÃO DO VALOR DA MULTA APLICADA. AUSÊNCIA DE RAZOABILIDADE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. I. Na hipótese, foi aplicada multa administrativa à Recorrente (empresa operadora de telefonia móvel), por não ter comparecido à audiência de conciliação em processo administrativo instaurado junto ao PROCON/VITÓRIA, nos termos do artigo 33, 2º, do Decreto nº 2.181/97. II. A aplicação da pena de multa, atendeu aos preceitos do devido processo legal, porquanto a Recorrente foi intimada expressamente da nova data da audiência, a qual, inclusive, somente foi redesignada em razão de seu pedido, na 1ª (primeira) audiência. III. Não se afigura razoável, nem adequada, ao caso concreto, a valoração da multa no patamar de R$ ,17 (cento e seis mil, cento e sete reais e dezessete centavos), diante do ilícito praticado, nos termos do artigo 57, parágrafo

6 único, do Código de Defesa do Consumidor, resultando em sua redução para o valor de R$ ,00 (vinte mil reais). IV. Recurso conhecido e parcialmente provido. (TJES, Classe: Apelação Civel, , Relator: NAMYR CARLOS DE SOUZA FILHO, Órgão julgador: SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Julgamento: 14/02/2012, Data da Publicação no Diário: 01/03/2012). (Original sem grifos). Nesse sentido, embora caiba ao Município de Vitória, através do Órgão de Proteção e Defesa do Consumidor a aplicação de multa administrativa, por descumprimento das normas do CDC, esta deve ser fixada, além dos requisitos previstos no artigo 57, do mesmo diploma, aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. DO EXPOSTO, conheço do presente recurso e a ele dou parcial provimento, para reduzir a multa administrativa do valor de R$ ,47 (cento e setenta e três mil seiscentos e quarenta e nove reais e quarenta e sete centavos), para o valor de R$ ,00 (cinquenta mil reais). Mantenho a fixação dos honorários advocatícios no percentual fixado. É como voto.

7 * O SR. DESEMBARGADOR JANETE VARGAS SIMOES :- Voto no mesmo sentido * O SR. DESEMBARGADOR ARNALDO SANTOS SOUZA :- Voto no mesmo sentido * D E C I S Ã O Vistos, relatados e discutidos estes autos, APELAÇÃO CIVEL Nº ( ), em que são as partes as acima indicadas, ACORDA o Egrégio Tribunal de Justiça do Espírito Santo (Primeira Câmara Cível), na conformidade da ata e notas taquigráficas da sessão, que integram este julgado, em, À UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. * * *