CUIA DE GEDEÃO (1982) DE PEDRO CASALDÁLIGA: A LUTA PELA TERRA EM MATO GROSSO
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1 1 CUIA DE GEDEÃO (1982) DE PEDRO CASALDÁLIGA: A LUTA PELA TERRA EM MATO GROSSO AMANDA FERREIRA PAULO DOS SANTOS 1 Em 1964 houve o golpe militar que viria por um fim à uma democracia em processo de ampliação, e que mais tarde essa ditadura se tornaria mais radical, com perseguições e intervenções a sindicatos, repressão aos movimentos populares e prisões dos líderes desses movimentos, o rompimento com as alianças entre trabalhadores rurais e urbanos. As reformas de bases propostas em 1963 sofreram interrupções com este golpe, que no primeiro momento foi apoiado por empresários nacionais e multinacionais, oligarquias rurais, setores das classes médias, grande imprensa, instituições religiosas, profissionais liberais e até alguns trabalhadores. Porém o afunilamento político somado a estagnação econômica entre 1964 e 1968, gerou descontentamento por parte de alguns apoiadores desse regime, principalmente os das classes médias, após também denúncias de desrespeito aos direitos humanos de oposicionistas presos, a Igreja Católica retirou grande parte do seu apoio e ao longo do tempo se tornou uma das principais opositoras do regime, porém ainda era aberta ao diálogo com líderes do regime. No entanto, no mesmo ano do golpe militar o Estatuto da Terra, foi aprovado, manipulando assim uma falsa reforma agrária que somente reforçou a ideia do grande latifúndio, nesse período ela vinha acompanhada de bases da modernização no campo, política de expansão e ocupação da fronteira agrícola no norte e centro-oeste, novo aspecto capitalista o agronegócio, monocultura de soja e cana e a centralização de terras nas mãos de empresas nacionais e internacionais. Mato Grosso sempre vista em grande parte de sua história, como terra não civilizada, fortaleceu assim a ideia de colonizar essas fronteiras, pela necessidade de modernizálas e manter a totalidade territorial fronteira, ou área que necessitava ser colonizada, modernizada, para garantir integridade territorial e política do país (Joanoni Neto, 2007). Mas essa ocupação só se concretizou após incentivos generosos do governo nos
2 anos de 1970 e, além disso, a abertura de rodovias contou muito nessa ocupação do estado de Mato Grosso. Inevitavelmente mudou a vida dos pequenos agricultores, que usavam a terra para sua própria subsistência. *1 Graduando: Licenciatura plena em História, Universidade Federal de Mato Grosso. Orientador: Prof. ª. Drª. Thaís Leão Vieira. Bolsista FAPEMAT Contrapondo a essa ideia de necessidade de modernização do centro-oeste e norte, Casaldáliga em sua obra poética expõe o desfavorecimento do índio e do pequeno produtor nesse novo contexto histórico do Brasil. Bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia, teólogo, poeta e ligado ao grupo de teologia da libertação, foi um dos personagens centrais entre as tensões políticas da igreja popular e a ditadura militar, engajado a solucionar os conflitos que essa política de modernização e interiorização, juntamente com alguns grupos de populares e de pessoas ligadas à Prelazia passaram a analisar os problemas locais como conflitos fundiários, problemas indígenas, trabalho escravo, dentre outros. Através de poemas da obra, Cuia de Gedeão, compreendemos o que foi a luta pela terra no estado de Mato Grosso, no período da ditadura. Com a vinda de grandes empresas rurais para essa região, através do incentivo do governo, a relação de trabalho e exploração da terra teve grande modificação, exigindo assim uma maior demanda por área cultivável, desta forma indígenas, posseiros, pequenos produtores, foram perdendo o seu espaço na terra, agravando ainda mais a situação social e econômica deste estado. Houve extermínio da população indígena por conta das terras, como Casaldáliga expõe em um de seus poemas. 2 Sino de Fátima de São Lourenço, boca-metal do vento: onde estão as bocas vivas de tantos Bororo
3 3 calados no Tempo (CASALDÁLIGA, 1982, p. 28). Ainda em sua obra, expõe poemas que retratam a expulsão dos índios de suas terras, e a cobiça que sempre existiu, sobre elas. Agora o índio não recebe mais vidros coloridos - recebe tratores, projetos... (Como antigamente, à troca da Terra. O que o Branco quer, o que sempre quis, é a Terra índia. Concentrar a terra, concentrando o lucro para os invasores; concentrando o Povo no mortal espaço da vida invalida pelos invasores; no final pedaço da cova lacrada pelos invasores...) (CASALDÁLIGA, 1982, p. 37)
4 4 Diante dessa ocupação arbitrária e a força, os direitos das famílias de pequenos produtores e dos indígenas, foram desconsiderados, causando grandes problemas sócioeconômico, que se refletem até hoje. Estes pequenos produtores, após perderem o direito sobre suas terras, tiveram de se deslocar atrás, destas novas áreas de colonização, assim várias cidades surgiram através desse processo. Dos 38 municípios que existiam até a década de 1970, passou para 142 municípios, em menos de vinte e cinco anos. E foi na igreja que estas famílias, que foram induzidas a deixar suas terras, e os indígenas, encontraram o seu principal apoio, ao lado destes, Dom Pedro Casaldáliga passou a lutar pelos direitos humanos, e buscar por mudanças desse cenário de conflitos, já que a região era considerada a mais conflituosa em âmbito nacional, por motivo da terra. E em seu livro Cuia de Gedeão destaca essas lutas pela terra. Não há uma terra sem males, ainda. Ainda, aqui. Mas há uma Terra bastante, se fosse de todos. Os males e os bens tornados partilha, na busca, na espera da Terra-sem-males...! (CASALDÁLIGA, 1982, p. 30) Destacam-se também, as súplicas dos camponeses, em ter
5 5 Contudo essa discussão pela democratização da terra no Mato Grosso, as tensões entre a igreja popular e a ditadura militar, que ocorreram por causa dessa luta, serviram para uma resignificação religiosa em São Félix do Araguaia-MT e uma mudança no cenário político-social nas décadas seguintes 1980 e 1990.
6 6 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA: BARROZO, João Carlos (Org.). Mato Grosso: Do sonho à utopia da terra. Cuiabá: EdUFMT/ Carlini & Caniato Editorial, 2008 CASALDÁLIGA, Dom Pedro. A Cuia de Gedeão: poemas e autos sacramentais sertanejos. Petrópolis, RJ, Editora Vozes, HARRES, Marluza Marques ; JOANONI NETO, Vitale. (Organizadores). História, terra e trabalho em Mato Grosso: ensaios teóricos e resultados de pesquisas. São Leopoldo: Oikos; Unisinos; Cuiabá: EdUFMT, JOANONI NETO, Vitale. Fronteiras da Crença: Ocupação do Norte de Mato Grosso após Cuiabá: Carlini & Caniato; EdUFMT Editora da Universidade Federal de Mato Grosso, REIS, Daniel Aarão; RIDENTI, Marcelo; MOTTA, Rodrigo Patto Sá (org.) A ditadura que mudou o Brasil: 50 anos do golpe de Rio de Janeiro: Zahar, 2014
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