REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

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1 REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ACORDAO N. 400/2016 PROCESSO N.o 299-B/2012 Processo de Recurso Extraordinano de Inconstitucionalidade Em nome do Povo, acordam em conferencia, no Plenario do Tribunal Constitucional: 1- RELATORIO Maria Isabel Simao de Figueiredo Teixeira veio ao Tribunal Constitucional interpor urn Recurso Contencioso, com fundamento no artigo 180?, n.o 2, aline a b) da Constituic;:ao da Republica de Angola, doravante CRA, contra irregularidades constatadas no processo de "despejo imediato com processo sumario," n? 2007/0174-B, em que foi condenada, que correu os seus tramites no Tribunal Provincial do Lobito. Insatisfeita com 0 saneador-sentenc;:a, a Recorrente intentou recurso de apelac;:ao junto do Tribunal Supremo, Processo n~ 1695/11-B, que foi distribuido em sessao ordinaria de 29 de Abril de Venerando Tribunal Supremo, de cuja decisao se recorre, nao conheceu 0 recurso alegadamente por nao ter a Recorrente cumprido 0 disposto no artigo 134? do C6digo das Custas Judiciais, C.C.J. A Recorrente alega, essencialmente, que: 1- ERe no processo n.o 2007/0174- B, que correu tramites no Tribunal Provincial do Lobito em que foi condenada a desocupar, no prazo de 60 dias, 0 im6vel onde reside ha mais de 34 anos.. 2- Dele interp6s recurso de apelac;:ao junto do Tribunal Supremo pelo facto de 0 referido processo estar eivado de vicios de forma, em consequencia da nao aplicac;:ao das normas legais e actos processuais exigidos por lei.

2 3- No Tribunal Supremo, 0 Juiz Conselheiro relator ordenou a extin~ao da instancia par ter side informado pelo Escrivao do processo que a Recorrente nao pagou 0 preparo inicial e 0 imposto de justi~a, cobrado nos termos do artigo 134~ do C.C.J. 4- A Recorrente pagou as guias do processo a que estava obrigada, quem nao 0 fez foi a Recorrida e, por erro do Escrivao, por nao ter sabido distinguir as partes, porquanto a verso de fls. 114 dos autos diz: " a Recorrente pagou as custas e a fls. 118 a apelante nao procedeu ao deposito do preparo inidal do julgamento no Tribunal ad quem". 5- Foi com a ocorrencia desses erros-vicios que a Recorrente se viu prejudicada com a decisao do Venerando Juiz Conselheiro do Tribunal Supremo, que ordenou a extin~ao da instancia, 0 que favorece a Recorrida, pelo que pretende que se fa~a justi~a sobre 0 caso sub-judice, porquanto: Meritissimo Juiz do Tribunal "a quo" nao realizou a audiencia preparat6ria prevista no artigo 508., n.03 do C.P.C para expurgar as excep~oes apresentadas pela Recorrente, tais como a falta de titulo de propriedade sobre 0 im6vel, bern assim como a inexistencia do contrato de arrendamento que serviria de base para a ac~ao de despejo imediato que se propos apresentar em juizo s elementos descritos nos autos a fls. 3, 5, 26, 28, 30 e 31, respectivamente, certidao da Delega~ao Municipal de Finan~as do Lobito, Documento de Arrecada~ao de Receitas, DAR, Escritura de Doa~ao, Requerimento de Jose Maria Costa de Paiva Antunes dirigido ao Ministro da Justi~a a solicitar autoriza~ao para doar os seus bens a Maria Adelaide Jose de Carvalho, Imposto Sobre as Sucessoes e Doa~oes do Servi~o de Fazenda e Contabilidade, que 0 Meritissimo Juiz "a quo" se serviu para decidir atraves do Despacho Saneador Senten~a, nao constituem elementos essenciais para por fim alide. l~ 0}< 6- Pelas razoes acima expostas, a Recorrente preferiu apresentar Recurso ao Tribunal Constitucional para a reaprecia~ao dos factos e melhor decidir para 0 bern da justi~a. A Recorrente termina pedindo a este Tribunal que suspenda imediatamente a entrega da casa na data prevista, ate it decisiio final da causa, a avoca9iio do 1 ~s;;: ~

3 processo para a sua reapreciac;:ao neste Tribunal e a reposic;:ao legal da tramitac;:ao processual, com todas as suas fases, ate ao julgamento da causa, para que seja feita uma justic;:a clara, sa e serena. Acompanham 0 requerimento inicial essencialmente os seguintes documentos. 1- Despacho Saneador -sentenc;:a, proferida pela Sala do Civel e Administrativo do Tribunal Provincial do Lobito no processo n.o 2007/0174-B (Doc. fis.7). 2- Despacho de admissao do recurso ordinario para 0 Tribunal Supremo (Doc. fis. 19). 3- Termo de distribuic;:ao do recurso ordinario que tomou 0 n.o 1695-B (Doc. fis.20). 4- Cota e informac;:ao do Escrivao de Direito do Tribunal Supremo (Doc. fis. 21). 5- Despacho do Venerando Juiz Conselheiro ordenando que se cumpra 0 disposto no artigo 134 das C.C.J (Doc. fis. 22). 6- Informac;:ao do Escrivao de Direito dando conhecimento que a Recorrente nao cumpriu com 0 disposto no artigo 134 do C.C.J. (Doc. fis. 24). 7- Despacho do Venerando J uiz Conselheiro relator que extingue a instancia com 0 fundamento no artigo 134, do C.C.J (Doc. fis.25). 8- Certidao emitida pel a Delegac;:ao Municipal de Financ;:as do Lobito (Doc. fis. 25 e 26). 9- Documento de Arrecadac;:ao de Receitas - DAR (Doc. fis.28). 10- Comprovativo do pagamento do imposto sobre as sucessoes e doac;:oes (Doc. fis. 31). o presente recurso foi admitido com fundamento de "aqui relevar 0 interesse publico de verificar se, com a decisao recorrida, foram desatendidos os direitos constitucionais da recorrente ahabitac;:ao e a urn processo justo". IT - COMPETENCIA DO TRIBUNAL o Tribunal Constitucional e competente para conhecer 0 presente recurso, que a Recorrente intitulou de Recurso Contencioso, com fundamento no artigo 180., n. 2, alinea b) da Constituic;:ao da Republica de Angola, que foi admitido e se mandou seguir como recurso extraordincirio de inconstitucionalidade, para estar em conformidade com as disposic;:oes combinadas da aline a m), do artigo 16. da Lei n.02/08, de 17 de Junho, Lei Organica do Tribunal Constitucional, L.O.T.C, e da alinea a), do artigo 49. da Lei n.o 3/08 de 17 de Junho, Lei do Processo 3

4 Constitucional, L.P.C, ambos com a alterac;ao feita pelas Leis n.o 24 e 25/10 de 3 de Dezembro, respectivamente, conjugadas com 0 artigo 180. n.01 e al. a) do n.02 dacra. ill - LEGITIMIDADE DA RECORRENTE A Recorrente tern legitimidade directa para recorrer, porquanto e Re e foi condenada no Processo n.o 2007/0174-B que correu tramites no Tribunal Provincial do Lobito. Por outro lado, foi indeferido, liminarmente, 0 recurso de apelac;ao que intentou junto do Venerando Tribunal Supremo, que permitiria a reapreciac;ao da decisao proferida pelo Tribunal "a quo ", com fundamento no artigo 134. do C6digo das Custas Judiciais. Resulta, por isso, que a Recorrente e parte legitima e, como tal, tern legitimidade para interpor 0 presente recurso extraordinario de inconstitucionalidade, conforme estatui a al. a) do artigo 50 da L.P.C. De acordo com 0 estatuido na citada norma, "tem legitimidade para interpor recurso extraordinario de inconstitucionalidade para 0 Tribunal Constitucional 0 Ministerio Publico e as pessoas que, de acordo com a lei reguladora do processo em que a senten~a fai proferida, tenham legitimidade para dela interpor recurso ordinario". IV - OBJECTO DO RECURSO o presente recurso tern como objecto apreciar a constitucionalidade do Despacho proferido pelo Venerando Tribunal Supremo, de fls.121, que extingue a instancia Recurso de Apelac;ao n 1695-B - com fundamento no artigo 134. C.C.J., e do Saneador sentenc;a proferido pelo Tribunal Provincial do Lobito no Proc. n. 2007/0174-B. o processo foi avista do Ministerio Publico. Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar para decidir. ~ ~ \~~c- ~ ~~ V-APRECIANDO Do recurso interposto pela Recorrente resulta evidente a sua inconformidade com a decisao da prime ira instancia, que determinou 0 seu despejo imediato da habitac;ao em que reside ha cerca de 40 anos e do despacho que dedarou extinta a apelac;ao por si interposta. Pretende, assim, a Recorrente que 0 Tribunal

5 Constitucional se pronuncie sobre a constitucionalidade dessas decisoes e garanta a tutela dos seus direitos que entende estarem desatendidos. Colocada que esta a questao constitucional a apreciar, importa, desde logo, analisar a verifica~ao ou nao do transite em julgado das decisoes objecto do presente recurso, tendo em conta 0 periodo que medeia entre a data de prola~ao do Despacho do Venerando Tribunal Supremo (11107/2011) - fis. 118v) e a propositura do presente recurso (17110/2012). Verifica-se dos autos que a Recorrente e 0 seu mandatano legal, identificado a fis. 17, nao foram legalmente notificados do despacho, de fis. 115, para pagamento de preparo e do despacho, de fis. 118v, que determina a extin~ao da instancia. As certidoes constantes nos autos de notifica~ao de tais despachos (fis. 117, 121 e 127) foram feitas a pessoa, em cidade e em domicilio diferentes dos indicados na procura~ao junto aos autos. Esse erro na notifica~ao constitui uma irregularidade face ao disposto no n. 1 do artigo 253. e do n.o 1 do artigo 254., ambos do CPC, e impediu a Recorrente de conhecer tempestivamente a decisao de que agora vern recorrer, com a evidencia de que dela tomou ciencia apenas na fase de execu~ao do despejo. Assim, nao tendo side a Recorrente notificada na forma legal devida, e entendimento deste Tribunal que nao transitou em julgado a decisao recorrida, nem caducou 0 dire ito da Recorrente a interpor recurso de inconstitucionalidade da referida decisao. o presente recurso, como acima se refere, foi admitido e mandado seguir como recurso extraordinario de inconstitucionalidade, 0 que, nos termos do unico do l~~ artigo 49. da Lei n.o 3/08, de 17 de Junho, com a altera~ao dada pelo artigo 13. da Lei n.o 25110, de 3 de Dezembro, pressupoe 0 "previo esgotamento nos tribunais comuns e demais tribunais, dos recursos ordinarios legalmente previstos. " ~~ A Recorrente interpos recurso de Apela~ao para 0 Tribunal Supremo do Despacho Saneador Senten~a proferido pelo Tribunal Provincial do Lobito. Com o Despacho de extin~ao da instancia, proferido na apela~ao, ficou esgotada a cadeia recurs6ria no ambito da jurisdi~ao comum, tal como exigido no unico do artigo 49. da LPC. Assim sendo, pode e deve 0 Tribunal Constitucional conhecer tambem constitucionalidade do Despacho Saneador senten~a, como pretende da a

6 Recorrente, uma vez que 0 recurso ao Tribunal Constituciorial e, no caso, 0 unico meio a disposi<;ao da Recorrente para assegurar a tutela jurisdicional do seu direito fundamental ahabita<;ao. Esta compreensao enquadra-se no ambito enos limites do recurso extraordinario de inconstitucionalidade, que e urn mecanisme jurisdicional de ultima ratio que visa conferir protec<;ao contra viola<;5es dos direitos fundamentais, conforme resulta das disposi<;5es conjugadas dos artigos 28., 29. n.o 5, 72., 180. n.o1 e 2 al. a) e 226. da CRA. Consequentemente, e entendimento do Tribunal Constitucional que, quando exista decisao do Venerando Tribunal Supremo que ponha termo ainstancia, sem conhecimento do merito da causa, mas esgotando a cadeia recurs6ria ordinaria, 0 Tribunal Constitucional deve, para nao denegar justi<;a constitucional, conhecer a constitucionalidade, da decisao de prime ira instancia, quando esta tenha side suscitada ou resulte evidente dos autos. Relativamente ao despacho proferido pel a Camara do Civel e Administrativo do Tribunal Supremo, constata-se nos autos que, como ja antes dito, a Recorrente nao foi regularmente notificada para proceder ao pagamento do preparo, pelo que o despacho de extin<;ao da instancia, fundado no nao pagamento desse preparo, esta prejudicado pela irregularidade da notifica<;ao e conduziu a urn resultado que se considera inconstitucional, por prejudicar 0 dire ito da Recorrente ao recurso. Mesmo que nao tivesse existido 0 erro acima apontado, e entendimento deste Tribunal, ja reflectido noutro Ac6rdao (Ac6rdao n.o 393/2016), que a falta de pagamento de preparo nao conduz necessariamente a-extin<;ao da instancia, na medida em que as custas podem ser pagas em momenta posterior, tal como admite 0 CPC (artigos 698. e 725. ). Consequentemente, e inconstitucional 0 -\} disposto no n.o 1 do art.o 292. do CPC, quando estabelece que "os recursos sao ~\:} julgados desertos pela falta de preparo ou pagamento de custas... ", por nao estar conforme a Constitui<;ao, pois a deser<;ao do recurso com esse fundamento sacrifica, desproporcionalmente, 0 ideal constitucional de tutela efectiva dos direitos fundamentais e de protec<;ao do recurso. Uma outra questao que importa tambem apreciar e a da "idoneidade" da forma processual seguida na prime ira instancia (ac<;ao de despejo imediato com processo summo).

7 Dos autos dessa acc;ao resulta claro que a ora Recorrente (inquilina) contestou a qualidade de proprietaria da autora e que esta nao fez prova da existencia de contrato de arrendamento entre ambas. Por assim ser e constar dos autos, e entendimento do Tribunal Constitucional que o Saneador sentenc;a nao esta conforme 0 principio constitucional do processo justo e as garantias de protecc;ao dos direitos fundamentais, na medida em que nao se pronuncia sobre as quest6es invocadas pela ora Recorrente nem da como provada a qualidade de senhoria da autora, nem 0 valor da renda eventualmente em divida. Ainda que assim nao fosse, foi determinado 0 despejo imediato da Recorrente sem que the tivesse sido dada a oportunidade legalmente prevista de pagamento das rendas eventualmente em divida, 0 que sacrifica de modo inconstitucional, porque desproporcional, 0 dire ito fundamental a habitac;ao e a dignidade human a que a Constituic;ao reconhece a Recorrente e a sua familia (artigos 1.0 e 85. da CRA). Nestes termos, lu~ r;$ - Custas pel a Recorrente (artigo 15 da Lei n.03/08, de 17 de Junho, L.P.C). Notifique. Tribunal Constitucional, em Luanda, aos 06 de Julho de 2016.

8 os rutzes CONSELHEIROS ~ ~ Dr. Rui Constantino da Cruz Ferreira (presidente) ~, _, L. Dr. Ant6nio Carlos Pinto Caetano de Sousa (dec1arou-se impedido). Dr. Carlos Magalhaes --t-=.+---t~r :r_-----==::-...=_ ~ Dr.a Guilhermina Prata ----\li:~-++,~i_~.' ' Dr" Luzia Bebiana de Almeida ebastiiio r~""', ~:-\QU Lx )..J:!kr~ I / ' r. Dr" Maria da Imacu!ada L. da C. Melo (Rblatora) ~:ajkj~ Jb~ Dr. Simao de Sousa Victor ~ 1-"'--_""')...L,=tJbJ "c..:...:...l_ =b"-4,--~-----_ Dr. Onofre Martins dos Santos_----.f--_---"-"--'- Dr. Raul Carlos Vasques Araujo --F--""""""s...o.~>+_'=_=_t:t Dr.a Teresinha Lopes ~::::=:~~==::::::_-{----~