ACÓRDÃO. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ANTONIO CARLOS MALHEIROS (Presidente sem voto), MARREY UINT E CAMARGO PEREIRA.

Transcrição

1 Registro: ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de São Paulo, em que é apelado JOSÉ LUIZ CONTIERI (ESPÓLIO), são apelantes COORDENADOR DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO e TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SÃO PAULO e Apelado BENEDICTA APPARECIDA BERNARDI CONTIERI (INVENTARIANTE). ACORDAM, em do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ANTONIO CARLOS MALHEIROS (Presidente sem voto), MARREY UINT E CAMARGO PEREIRA. São Paulo, 26 de julho de 2016 KLEBER LEYSER DE AQUINO RELATOR Assinatura Eletrônica

2 Voto nº Apelação nº Apelante: COORDENADOR DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelado: JOSÉ LUIZ CONTIERI (ESPÓLIO) 5ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de São Paulo Magistrado: Dr. Luiz Fernando Rodrigues Guerra APELAÇÃO MANDADO DE SEGURANÇA ITCMD BASE DE CÁLCULO Imposto incidente sobre transmissão causa mortis de bem imóvel Incidência da lei vigente na abertura da sucessão Pretensão de utilização, como base de cálculo do tributo, do valor venal para fins de IPTU, afastando-se a utilização do valor de referência considerado para a base de cálculo do ITBI Possibilidade Aplicação dos artigos 9º, parágrafo 1º e artigo 13, inciso I, ambos da Lei Estadual nº , de 28/12/2.000, e artigo 16, inciso I, "a", do Decreto Estadual nº , de 01/04/2.002 Inaplicabilidade do Decreto Estadual nº , de 09/11/2.009 Base de cálculo, que somente pode ser alterada por meio de lei Sentença mantida Apelação não provida. Trata-se de apelação interposta pelo Coordenador da Administração Tributária do Estado de São Paulo, na vigência do Código de Processo Civil de (Lei n 5.869, de 11/01/1.973), contra a r. sentença (fls. 218/223) que, nos autos do mandado de segurança, impetrado pelo Espólio de José Luiz Contieri em face de ato do apelante, Página 2 de 10

3 concedeu a segurança, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil de (Lei n 5.869, de 11/01/1.973), impondo à autoridade coatora, ora apelante, o dever de emitir guia de recolhimento do ITCMD considerando o valor venal do imóvel para fins de recolhimento do IPTU. Deixou de condenar a autoridade coatora em honorários advocatícios, com fundamento na Súmula nº 512 do E. STF e na Súmula nº 105 do E. STJ. O mandado de segurança preventivo impetrado pelo apelado visava obter ordem judicial que o autorizasse a proceder ao recolhimento do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos), incidente sobre a transmissão de bens, adotando como base de cálculo o valor venal do IPTU do imóvel adquirido por força de sucessão causa mortis e objeto de inventário, para a regularização dominial. Postulava, liminarmente, a cobrança do tributo com base no valor venal do imóvel e a suspensão do andamento do inventário, até a ulterior decisão do mandamus. O pedido liminar foi deferido em parte, para autorizar o recolhimento do ITCMD considerando o valor venal de referência para o cálculo do IPTU (fls. 171/173). Sobreveio a r. sentença de primeiro grau que confirmou a liminar e concedeu a ordem pleiteada, contra a qual se insurge a apelante. Alega a apelante, em síntese, que a r. sentença de primeiro grau julgou a ação como se a Lei Estadual nº de 28/12/2.000, tivesse determinado a incidência do ITCMD sobre os valores adotados como base de cálculo do IPTU e o Decreto Estadual nº , de 09/11/2.009, tivesse alterado ou exorbitado o alcance da aludida norma legal, o que não aconteceu. Insiste que desde a edição da Lei Estadual nº , de Página 3 de 10

4 28/12/2.000, a base de cálculo do ITCMD é o valor venal do bem, entendido este como o valor de mercado. Pondera que o referido decreto impugnado pelo apelado, apenas regulamentou, explicitou o que já estava expresso na referida lei vigente e também nos artigos 35 e 38 do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25/10/1.966). Assevera a inexistência de ofensa a qualquer princípio constitucional (fls. 233/242). Regularmente processado o recurso (fls. 259), foram apresentadas contrarrazões, rebatendo os argumentos do apelante e pedindo pela manutenção da r. sentença de 1º grau (fls. 243/252). decidir. Relatado de forma sintética, passo a fundamentar e Ressalto inicialmente que o presente recurso foi interposto sob as regras do Código de Processo Civil de (Lei n 5.869, de 11/01/1.973). A questão litigiosa central gira em torno da legalidade da aplicação do Decreto Estadual n , de 09/11/2.009, para o cálculo do valor venal do imóvel para fins de recolhimento do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos ITCMD. Acerca do referido imposto dispõe o artigo 155, inciso I e parágrafo 1, inciso I, da Constituição Federal: sobre: Art. 155 Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; 1º O imposto previsto no inciso I: Página 4 de 10

5 I relativamente a bens imóveis e respectivos direitos, compete ao Estado da situação do bem, ou ao Distrito Federal;. prevê o Código Tributário Nacional: Na esteira da disciplina constitucional, acerca do ITCMD, Art. 38. A base de cálculo do imposto é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos. (negritei) No caso do Estado de São Paulo, a matéria é disciplinada pela Lei Estadual nº , de 28/12/2.000, que dispõe: Art. 9º A base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou em UFESPs (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo). 1º Para os fins de que trata esta lei, considera-se valor venal o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação. Art. 13 No caso de imóvel, o valor da base de cálculo não será inferior: I em se tratando de imóvel urbano ou direito a ele relativo, ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana IPTU; (negritei) Da leitura dos dispositivos acima referidos infere-se que a base de cálculo do ITCMD, no caso de bem imóvel, guarda estreita correlação com o valor venal valor de mercado adotado pelo Município para a cobrança do IPTU, nos termos dos referidos artigos 9º, parágrafo 1º e 13, inciso I, ambos da já mencionada Lei Estadual nº , de 28/12/2.000, que Página 5 de 10

6 determina que a base de cálculo do ITCMD não seja inferior ao valor venal valor de mercado adotado para o cálculo do IPTU. Na lição do ilustre Professor Kiyoshi Harada 1 : O valor venal de imóvel urbano é aquele encontrado segundo a legislação pertinente ao imposto predial e territorial urbano e é revisto ou atualizado anualmente. De fato, a legislação do IPTU dispõe de critério objetivo para apuração do valor venal, bem como de mecanismo para manter atualizado esse valor apurado em 1º de janeiro de cada exercício. Nada justifica apuração de outro valor venal para o mesmo imóvel, só para o efeito de ITBI. A própria legislação estadual para cobrança do imposto sobre transmissão causa mortis determina a utilização da base de cálculo do IPTU ou do ITR, conforme se trate, respectivamente, de imóvel urbano ou rural, ressalvado aos interessados o direito de requererem avaliação judicial (art. 15 da Lei nº 9.591, de ) (negritei) O Regulamento do ITCMD, qual seja, o Decreto Estadual nº , de 01/04/2.002, confirma tal entendimento, dispondo: Art. 16. O valor da base de cálculo, no caso de bem imóvel ou direito a ele relativo será (Lei nº /00, art. 13): I em se tratando de: a) Urbano, não inferior ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana IPTU; (negritei) Posteriormente, contudo, o referido parágrafo único foi alterado pelo Decreto Estadual nº , de 09/11/2.009, passando a ter a seguinte redação: 1 In Direito Tributário Municipal; 2ª Edição; São Paulo; Editora Atlas; pag. 94 e 96. Página 6 de 10

7 Parágrafo único Poderá ser adotado, em se tratando de imóvel: 2. urbano, o valor venal de referência do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis ITBI divulgado ou utilizado pelo município, vigente à data da ocorrência do fato gerador, nos termos da respectiva legislação, desde que não inferior ao valor referido na alínea a do inciso I, sem prejuízo da instauração de procedimento administrativo de arbitramento da base de cálculo, se for o caso. (negritei) A regra introduzida pelo referido decreto acerca do valor venal de referência do imóvel, não deve prevalecer. Em nenhum momento a Lei Estadual nº , de 28/12/2.000 permitiu que o legislador estabelecesse a opção em favor do Fisco entre o valor venal valor de mercado considerado para a base de cálculo do IPTU e o valor venal de referência considerado para a base de cálculo do ITBI. Destarte, a alteração conferida pelo referido Decreto Estadual nº , de 09/11/2.009 caracteriza afronta direta ao princípio da legalidade, porquanto se trata de modificação da base de cálculo de tributo por meio de decreto, o que não é permitido pelo Código Tributário Nacional, que, no seu artigo 97, inciso II, e parágrafo 1º, dispõe: Art. 97. Somente a lei pode estabelecer: II a majoração de tributos, ou sua redução, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65; 1º Equipara-se à majoração do tributo a modificação da sua base de cálculo, que importe em torná-lo mais oneroso. (negritei) Diante de tal quadro, em que pese o fato gerador do Página 7 de 10

8 tributo ter ocorrido após a publicação do Decreto Estadual nº , de 09/11/2.009 (morte do autor da herança em 05/04/2.015), este não tem o condão de alterar a base de cálculo do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos, em se tratando de espécie normativa inadequada para tanto, extrapolando seu limite constitucional. Nesse sentido, julgados deste E. Tribunal de Justiça: APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO Mandado de segurança ITCMD Base de cálculo Lei Estadual nº /00 Valor venal apontado no IPTU Decreto nº /09 ITBI Valor venal de referência Majoração da base de cálculo Ilegalidade Sentença mantida. RECURSO VOLUNTÁRIO E REEXAME NECESSÁRIO DESPROVIDOS. A base de cálculo do ITCMD é aquela apontada na legislação paulista (IPTU), não podendo ser adotado critério diverso daquele utilizado pela própria Administração Pública para propriedade do bem, observada que a criação de base de cálculo pelo Decreto nº /09 em referência ao ITBI consiste em ofensa ao princípio da legalidade. (Apelação nº , Rel. Des. Vicente de Abreu Amadei; Comarca: São Paulo; Órgão julgador: 1ª Câm. de Direito Público; Data do julgamento: 24/05/2.016; Data de registro: 25/05/2.016) (negritei) E, especialmente desta E. : APELAÇÃO CÍVEL MANDADO DE SEGURANÇA ITCMD BASE DE CÁLCULO: VALOR VENAL DO IMÓVEL (NÃO VALOR VENAL DE REFERENCIA DO ITBI) - Princípio da legalidade e da tipicidade tributária Sentença mantida Recurso não provido (Apelação nº , Rel. Des. Marrey Uint; Comarca: Araraquara; Data do julgamento: 24/05/2.016; Data de registro: 03/06/2.016). APELAÇÃO MANDADO DE SEGURANÇA TRIBUTÁRIO ITCMD BASE DE CÁLCULO Inventário Aplicação da lei vigente na abertura da sucessão Página 8 de 10

9 Pretensão de utilização como base de cálculo do tributo do valor venal para fins de IPTU, afastando-se a utilização do valor de referência (valor de mercado) Cabimento Incidência dos artigos 9º, 1º e artigo 13, inciso I ambos da Lei Estadual nº /00 e artigo 16, inciso I, "a" do Decreto Estadual nº /02 Inaplicabilidade do Decreto Estadual nº /09 Ilegalidade da alteração da base de cálculo do imposto por meio de decreto Precedentes Sentença mantida Recurso Improvido. (Apelação nº , Rel. Des. Maurício Fiorito; Comarca: São Paulo; Data do julgamento: 29/03/2016; Data de registro: 29/03/2016). (negritei) APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO MANDADO DE SEGURANÇA ITCMD Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação Base de cálculo alterada pelo Decreto 55002/09 NÃO CABIMENTO O Decreto Estadual nº /09, ao permitir o uso do valor venal do bem como sendo o "valor venal de referência do ITBI", extrapolou o limite regulamentar, estabelecendo base de cálculo diversa da prevista na Lei /2000, afrontando o disposto no art. 99 do CTN, pelo qual o conteúdo e o alcance dos decretos restringem-se aos das leis em função das quais foram expedidos Afronta ao princípio da legalidade Irretroatividade do decreto à data do falecimento do autor da herança Sentença que concedeu a segurança almejada pelos impetrantes que há de ser mantida Liquidez e certeza do direito estampado na exordial mandamental Recursos oficial e voluntário não providos. (Apelação nº , Rel. Des. Ronaldo Andrade; Comarca: São Paulo; Data do julgamento: 02/02/2.016; Data de registro: 05/02/2.016). (negritei) APELAÇÃO MANDADO DE SEGURANÇA IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO DE QUAISQUER BENS OU DIREITOS (ITCMD) Base de Cálculo ITBI Inadmissibilidade Adoção de critério diverso daquele estabelecido pela lei que configura maltrato ao postulado da reserva legal Segurança concedida Sentença mantida A base de cálculo do ITCMD, nos termos da lei é o valor venal do bem ou direito transmitido na época da abertura da sucessão RECURSOS DESPROVIDOS. (Apelação nº , Rel. Des. Amorim Cantuária; Comarca: São Paulo; Data do julgamento: 13/12/2011; Data de registro: 16/12/2011). Página 9 de 10

10 (negritei) Assim, desnecessários mais argumentos. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação para manter a r. e bem lançada sentença, por seus próprios fundamentos, acrescidos dos aqui expostos. KLEBER LEYSER DE AQUINO RELATOR Página 10 de 10