Vitória, 30 de maio de Mensagem n º 111/2007. Senhor Presidente:
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1 Vitória, 30 de maio de Mensagem n º 111/2007 Senhor Presidente: Comunico a V. Exa. que vetei totalmente o Projeto de Lei n 114/2006, de autoria do Deputado Euclério Sampaio, por entendê-lo inconstitucional, na forma do parecer infra transcrito da douta Procuradoria Geral do Estado, que aprovo. Inconstitucionalidade formal. Invasão da competência privativa do Chefe do Poder executivo para legislar sobre órgãos da administração pública. Violação do art. 61, 1º, II, e, da Constituição Federal e do art. 63, único, inciso VI, da Constituição Estadual Em consonância com a vencedora jurisprudência do Supremo Tribunal Federal 1, compete privativamente ao Chefe do Poder Executivo a iniciativa de leis que disponham sobre matéria tipicamente administrativa, isto é, acerca da criação de órgãos da administração pública (CF, art. 61, 1º, II, e ) 2. Também é entendimento corrente da Suprema Corte que as regras básicas do processo legislativo previstas pela Constituição Federal aplicam-se igualmente aos Estados-membros, em particular as que tratam da iniciativa legislativa privativa atribuída ao Executivo. Assim, a iniciativa parlamentar nesse campo constitui ato de transgressão constitucional e denota a inconstitucionalidade formal das normas editadas: 1 Na ADIN/MC 1.846, rel. Min. Carlos Velloso, DJ: , a Corte considerou juridicamente relevante a argüição de ofensa à iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo para a propositura de leis que versam sobre matéria administrativa, e de invasão da esfera de atribuições deste, a quem cabe a direção e o funcionamento da Administração. grifo nosso. 2 Art A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição. II - disponham sobre: e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observado o disposto no artigo 84, VI;
2 A disciplina normativa pertinente ao processo de criação, estruturação e definição das atribuições dos órgãos e entidades integrantes da Administração Pública estadual traduz matéria que se insere, por efeito de sua natureza mesma, na esfera de exclusiva iniciativa do Chefe do Poder Executivo local, em face da cláusula de reserva inscrita no art. 61, 1º, II, e, da Constituição da República, que consagra princípio fundamental inteiramente aplicável aos Estados-membros em tema de processo legislativo. Precedentes do STF. - O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo de positivação do Direito, gerado pela usurpação do poder sujeito à cláusula de reserva, traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete típica hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do ato legislativo eventualmente editado. 3 No âmbito estadual o processo legislativo foi disciplinado de acordo com o modelo federal, como se pode observar pela leitura do art. 63, parágrafo único, inciso VI, da Carta Capixaba. 4 Pois bem. A análise cuidadosa da presente proposição legal revela a atribuição de funções e criação de novas despesas à Secretaria de Estado de Desenvolvimento de Infra-Estrutura e dos Transportes, interferindo nas tarefas executadas por este órgão do Poder Executivo, violando frontalmente a competência privativa do Governador do Estado, a quem cabe deflagrar o processo normativo de leis que disponham sobre o tema. Vê-se que ao Chefe do Executivo compete - privativamente - dispor sobre o funcionamento da máquina estadual, por meio de serviços públicos, fomento ou mesmo intervenção na ordem econômica. É o Executivo que possui técnica e instrumentos propícios para tal função. Disso decorre também que somente é concebível ao Governador do Estado legislar a respeito de matéria concernente a atribuições e despesas de Secretarias e órgãos que lhe são diretamente vinculados. Vale dizer, a criação e extinção de órgãos da administração pública dependem de 3 ADI-MC 1391/SP - SÃO PAULO. MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Relator(a): Min. CELSO DE MELLO Julgamento: 01/02/1996 Órgão Julgador: Tribunal Pleno. 4 Art. 63. Parágrafo único. São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que disponham sobre: VI - criação, estruturação e atribuições das Secretarias de Estado e órgãos do Poder Executivo.
3 Lei de iniciativa do Poder Executivo. E, uma vez criado o órgão, sua organização e funcionamento será regulado por Decreto (art. 84, VI). 5 De que adiantaria ao Poder Executivo deter a iniciativa das leis sobre órgãos da administração pública, se, depois, sem sua participação no processo de formação legislativa, outra norma pudesse alterar todas as suas atribuições e até suprimi-las ou desvirtuá-las? Dessa forma, a iniciativa parlamentar nesse campo constitui ato de transgressão constitucional e denota a inconstitucionalidade formal das normas editadas: Esse é o atualizado entendimento do Excelso Supremo Tribunal Federal, em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade, vejamos: EMENTA: Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Lei Do Estado do Rio Grande do Sul. Instituição do Pólo Estadual da Música Erudita. 3. Estrutura e atribuições de órgãos e Secretarias da Administração Pública. 4. Matéria de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo. 5. Precedentes. 6. Exigência de consignação de dotação orçamentária para execução da lei. 7. Matéria de iniciativa do Poder Executivo. 8. Ação julgada procedente. 6 EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 7.755, DE , DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. TRÂNSITO. INVASÃO DA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DA UNIÃO PREVISTA NO ART. 22, XI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INICIATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. USURPAÇÃO. ARTS. 61, 1º, II, E E 84, VI, DA CARTA MAGNA. 1. É pacífico nesta Corte o entendimento de que o trânsito é matéria cuja competência legislativa é atribuída, privativamente, à União, conforme reza o art. 5 Art Compete privativamente ao Presidente da República: VI - dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; 6 ADI 2808 / RS - RIO GRANDE DO SUL AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - Relator(a): Min. GILMAR MENDES - Julgamento: 24/08/ Órgão Julgador: Tribunal Pleno
4 22, XI, da Constituição Federal. Precedentes: ADI 2.064, rel. Min. Maurício Corrêa e ADI MC, rel. Min. Sepúlveda Pertence. 2. O controle da baixa de registro e do desmonte e comercialização de veículos irrecuperáveis é tema indissociavelmente ligado ao trânsito e a sua segurança, pois tem por finalidade evitar que unidades automotivas vendidas como sucata - como as sinistradas com laudo de perda total - sejam reformadas e temerariamente reintroduzidas no mercado de veículos em circulação. 3. É indispensável a iniciativa do Chefe do Poder Executivo (mediante projeto de lei ou mesmo, após a EC 32/01, por meio de decreto) na elaboração de normas que de alguma forma remodelem as atribuições de órgão pertencente à estrutura administrativa de determinada unidade da Federação. 4. Ação direta cujo pedido se julga procedente. 7 CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE - LIMINAR. Há o sinal do bom direito e o risco de manter-se com plena eficácia o quadro quando o diploma atacado resultou de iniciativa parlamentar e veio a disciplinar programa de desenvolvimento estadual - submetendo-o à Secretaria de Estado - a dispor sobre a estrutura funcional pertinente. Segundo a Carta da República, incumbe ao chefe do Poder Executivo deflagrar o processo legislativo que envolva órgão da Administração Pública - alínea "e" do 1º do artigo 61 da Constituição Federal. 8 Sendo assim, ao editar normas sobre organização administrativa, o legislador estadual atuou fora de seu âmbito de competência, fazendo com que o autógrafo de lei em análise esteja eivado de inconstitucionalidade formal insanável, por ofensa ao artigo 61, 1º, II, e, da Constituição Federal, bem como ao artigo 63, único, inciso VI, da Lei Maior Estadual. Desta forma, infere-se que projeto legislativo ora analisado deve ser vetado em sua integralidade, por usurpar irremediavelmente a competência legislativa do Chefe do Poder Executivo para legislar sobre criação, estruturação e atribuições das Secretarias de Estado e órgãos do Poder Executivo, ocorrendo irremediável violação ao art. 61, 1º, II, e, da Constituição Federal e do art. 63, único, inciso VI, da Constituição Estadual. Inconstitucionalidade material. Interferência na seara de competência administrativa do Poder 7 ADI 3254 / ES - ESPÍRITO SANTO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Relator(a): Min. ELLEN GRACIE. Julgamento: 16/11/2005. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Grifo Nosso 8 ADI-MC 2799 / RS - RIO GRANDE DO SUL - MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO - Julgamento: 01/04/2004.
5 Executivo. Violação do princípio da harmonia dos poderes. (CF, arts. 2º e 84, II e VI, a ) Resta óbvio que como conseqüência do vício formal no tópico anterior, há que se reconhecer também à violação ao princípio da harmonia dos poderes. Além disso, vislumbra-se que a examinada proposição legal não só almeja delegar funções e criar despesas para órgão afeto ao Poder Executivo, mas também espera instituir atribuições para o próprio Governador do Estado, visto que o artigo 1º da lei em nascimento sub examine, determina que ele próprio seja responsável pela divulgação na Internet e no Diário Oficial do Estado das informações relativas ao arrecadação de recursos através da cobrança de pedágio nas rodovias estaduais, violando frontalmente o principio da harmonia entre os poderes. O princípio da harmonia dos poderes (CF, art. 2 9 ), cláusula pétrea no sistema da Constituição de 1988 (CF, art. 60, 4, III 10 ), assenta-se em algumas idéias fundamentais. A principal delas é a que estabelece competências privativas a cada um dos poderes estatais e a impossibilidade de os demais nelas interferir (salvo se houver expressa autorização constitucional). Justamente por isso é que compete privativamente ao Chefe do Poder Executivo a direção superior da Administração, conforme se observa dos arts. 84, II e VI, a, da Constituição Federal 11. Esse dispositivo expressa o postulado constitucional da reserva da administração. O Supremo Tribunal Federal tem rechaçado reiteradamente leis estaduais que afrontem a reserva da administração e, portanto, o princípio da harmonia dos poderes. A orientação da corte, conforme se observa da ADI/MC 2364-AL, 12 9 Art. 2 : São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. 10 Art. 60, 4 : Não será objeto de deliberações a proposta de emenda tendente a abolir: (...) III a separação dos Poderes; 11 Art. 84: Compete privativamente ao Presidente da República: (...) II exercer, com o auxilio dos Ministros de Estado, a direção superior da administração federal; (...) VI dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; (grifos acrescidos.) 12 ADI-MC 2364 / AL ALAGOAS. MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Relator(a): Min. CELSO DE MELLO. Julgamento: 01/08/2001 Órgão Julgador: Tribunal Pleno
6 é que o princípio constitucional da reserva de administração impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência administrativa do Poder Executivo. Do voto do relator dessa ADI se extrai a seguinte passagem: Vê-se, desse modo, que a intervenção normativa do Poder Legislativo, mediante lei, em área constitucionalmente reservada à atuação administrativa do Poder Executivo, qualifica-se como procedimento incompatível com os padrões ditados pêlo princípio da separação de poderes. É que não se pode ignorar, presente o contexto ora em exame, que, em tema de desempenho concreto, pelo Poder Executivo, das funções tipicamente administrativas que lhe são inerentes, incide clara limitação material à atuação do legislador, cujas prerrogativas institucionais sofrem as restrições derivadas do postulado constitucional da reserva de Administração. A reserva de administração - segundo adverte J. J. GOMES CANOTILHO ( Direito Constitucional, p. 810/811, a ed., 1991, Almedina, Coimbra) - constitui limite material à intervenção normativa do Poder Legislativo, pois, enquanto princípio fundado na separação orgânica e na especialização funcional das instituições do Estado, caracteriza-se pela identificação, no sistema constitucional, de um núcleo funcional (...) reservado à administração contra as ingerências do parlamento, por envolver matérias, que, diretamente atribuídas à instância executiva de poder, revelam-se insuscetíveis de deliberações concretas por parte do Legislativo, desvestido, portanto, sob tal perspectiva, de qualquer prerrogativa que lhe permita praticar, com repercussão sobre os servidores públicos vinculados ao Poder Executivo, verdadeiros atos administrativos referentes à investidura funcional ou à sua eventual invalidação. Assim, se a Corte Suprema já repudia a intervenção normativa do Poder Legislativo, mediante lei, em área constitucionalmente reservada à atuação administrativa do Poder Executivo, ainda mais gravoso ocorre quando a esta intervenção delega função ao próprio Chefe do Executivo. Em suma, portanto: é inconstitucional o Projeto de Lei analisado, por afronta ao princípio da harmonia entre os poderes (CF, arts. 2º e 84, II e VI, a ). Resumindo, concluo pelo veto total ao PL 114/2006 pelas seguintes razões: a) por vício formal, já que trata de matéria tipicamente administrativa, cuja iniciativa é privativa do Chefe do Poder Executivo. (CF art. 61, 1º, II, e, e CEES art. 63, único, inciso V); b) por vício material, decorrente da violação do princípio da harmonia entre poderes (CF, arts 2º e 84, II e VI, a ), já que dispõe sobre direção e funcionamento da Administração Pública e delegação de atribuições para o Chefe do Poder Executivo. Atenciosamente
7 PAULO CESAR HARTUNG GOMES Governador do Estado
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