MONITORAMENTO DE VERTEBRADOS ATROPELADOS EM DOIS TRECHOS DE RODOVIAS NA REGIÃO CENTRAL DO RIO GRANDE DO SUL - BRASIL
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- Sílvia Castanho Alcaide
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1 REVISTA DE CIÊNCIAS AMBIENTAIS - RCA (ISSN ) Canoas, vol. 7, n. 1, jul MONITORAMENTO DE VERTEBRADOS ATROPELADOS EM DOIS TRECHOS DE RODOVIAS NA REGIÃO CENTRAL DO RIO GRANDE DO SUL - BRASIL Darliane Evangelho Silva 1,2 Luiz Liberato Costa Corrêa 1,2 Stefan Vilges de Oliveira 2,3 Lize Helena Cappellari 4 RESUMO Os atropelamentos de animais em rodovias atualmente configuram-se uma importante ameaça à fauna silvestre. Por meio do monitoramento de vertebrados atropelados em trechos de duas rodovias localizadas na região central do Estado do Rio Grande do Sul, realizado entre 2008 e 2009, listamos as espécies registradas e a representatividade dos grupos. Foram realizadas, 104 incursões as áreas de estudo, totalizando um esforço de 3016 km de rodovias percorridos em 12 meses. Foram encontradas 49 espécies silvestres atropeladas, distribuídas em 29 famílias, totalizando 419 espécimes atropelados, sendo que os grupos mais representativos foram mamíferos e aves. Palavras-chave: fauna silvestre, mortalidade, atropelamentos, Bioma Pampa ABSTRACT Monitoring of road-killed vertebrates in two highway sections in the central region of Rio Grande do Sul, Brazil. The run over of animals on roads currently represent a pronounced threat to the wild fauna. Through road-killed vertebrate monitoring in sections of two roads in the central region of Rio Grande do Sul, between 2008 and 2009, we listed the species and the groups most involved. 104 incursions in the study sections were done, totalizing 3,016 km of roadways traveled in 12 months. 49 road-killed wild species were found, belonging to 29 families in a total of 419 specimens. The most representative groups were mammals and birds. Keywords: wildlife, mortality, road run-over, Pampa biome 1 PPG em Ambiente e Desenvolvimento, Centro Universitário UNIVATES, Lajeado RS, Brasil. 2 Organização Não Governamental Interação de Trabalhos Ambientais Caçapava do Sul RS, Brasil. para correspondência: ds_evangelho@yahoo.com.br 3 PPG em Medicina Tropical, Epidemiologia das Doenças Infecciosas e Parasitárias Núcleo de Medicina Tropical, Universidade de Brasília, Brasília DF, Brasil. 4 Universidade da Região da Campanha URCAMP, Campus Caçapava do Sul RS, Brasil.
2 28 Darliane E. Silva, Luiz Liberato C. Corrêa, Stefan V. de Oliveira, Lize H. Cappellari INTRODUÇÃO As estradas estão entre as principais alterações antrópicas ao meio ambiente e configuram como grande ameaça à fauna (Spellberg, 1998; Trombulak e Frissel, 2000), principalmente devido aos efeitos das colisões com animais silvestres (Van Der Zande et al., 1980; Kuiken, 1988; Philcox et al., 1999; Trombulak e Frissel, 2000). No Brasil, as colisões representam uma parcela importante da perda local de biodiversidade, podendo gerar declínios significativos em população de muitas espécies silvestres (Bencke e Bencke, 1999; Tumeleiro et al., 2006; Cherem et al., 2007; Hengemühle e Cademartori, 2008; Costa e Sperber, 2009; Kunz e Junior, 2009; Turci e Bernarde, 2009; Sousa e Miranda, 2010; Souza et al., 2010; Camargo et al., 2011; Costa, 2011; Hegel et al., 2012; Oliveira e Silva, 2012) e principalmente quando tratamos de espécies que apresentam baixas densidades, como as ameaçadas de extinção (Fontana et al., 2003; Sousa e Miranda, 2010). O presente estudo apresenta a composição de vertebrados encontrados atropelados em duas rodovias do Rio Grande do Sul, e contribui com informações sobre a fauna silvestre no Estado. MATERIAL E MÉTODOS Este estudo foi realizado em dois trechos de rodovias entre os Municípios de São Sepé (BR- 392) e Formigueiro (RS-149), situados na região central no Estado do Rio Grande do Sul, Brasil (Figura 1). Os municípios estão inseridos em uma região natural do bioma Pampa, que ocupa a metade sul do estado (IBGE, 2004). Figura 1. Localização dos municípios de São Sepé e Formigueiro, Região Central do estado do Rio Grande do Sul, Brasil.
3 MONITORAMENTO DE VERTEBRADOS ATROPELADOS EM DOIS TRECHOS DE RODOVIAS NA REGIÃO CENTRAL DO RIO GRANDE DO SUL - BRASIL 29 Durante o período de abril de 2008 a março de 2009, estes dois trechos rodoviários foram percorridos em duas expedições semanais, com a finalidade de localizar os vertebrados mortos por atropelamentos. O trecho no Município de São Sepé, na BR 392 (entre Km 293 e Km 304), apresenta 10 km de extensão, onde se liga a RS-149, que segue ao Município de Formigueiro, com 19 km, o que totaliza 29 km monitorados de rodovia (Figura 2). Este percurso foi realizado em uma motocicleta, a uma velocidade média entre 50 km/hora, ocupada por dois observadores. A vegetação presente nas duas malhas rodoviárias é constituída de campos, áreas úmidas, fragmentos florestais nativos e monoculturas. Um fragmento nativo nas proximidades das duas rodovias com cerca de 400 hectares (Corrêa et al., 2010) é importante para a manutenção da biodiversidade local. Conforme Costa (2011), nas averiguações de campo foram checados quaisquer restos de carcaças de animais silvestres sobre a pista ou acostamento, as quais foram retiradas da via, a fim de evitar a atração de carniceiros que poderiam vir a ser atropelados, além de evitar nova contabilização. Os animais atropelados durante o percurso foram identificados e alguns fotografados, para posterior comparação em livros guias: répteis (Lema, 2002; Deiques et al., 2007), aves (Sick, 1997; Narosky e Yzurieta, 2003), mamíferos (Silva, 1994; Oliveira e Cassaro, 2005; Achaval et al., 2007), sendo que todos os espécimes encontrados estavam em condições de identificação. Figura 2. Trecho indicando trajeto percorrido para as amostragens, entre os municípios de São Sepé e Formigueiro, Região Central do estado do Rio Grande do Sul, Brasil (Fonte: Google Earth, 2008). Os espécimes foram agrupados por hábitos alimentares: para aves, conforme Sick (1997) e Corrêa et al. (2012), mamíferos, segundo Silva (1994), Achaval et al. (2007) e Plagia et al. (2012), répteis, de acordo com Lema (2002) e Deiques et al. (2007), nas seguintes guildas: carnívoros - alimentam-se de carne;
4 30 Darliane E. Silva, Luiz Liberato C. Corrêa, Stefan V. de Oliveira, Lize H. Cappellari frugívoros - alimentação baseada em frutos; granívoros - baseada em sementes; herbívoros - a dieta baseada em brotos, partes florais, e folhas; piscívoros - alimentação baseada em peixes; onívoros - apresentam dieta variada (frutos, artrópodes e vertebrados); insetívoros - baseada principalmente em insetos; necrófagos - alimentam-se de carcaças, animais em decomposição. Os espécimes agrupados serão apresentados por meio de proporções. Para os cálculos, utilizamos no numerador a somatória das observações e no denominador se considerou o número total de animais registrados. Os cálculos foram feitos através do software Microsoft Office Excel Foi realizada a análise de variância para verificar as diferenças significativas entre o número de vertebrados atropelados conforme as estações, utilizando Anova pelo software Bioestat 5.0 (Ayres et al., 2007). A nomenclatura para padronização dos grupos taxonômicos encontrados seguiu: Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos (CBRO, 2011) para aves, Bérnils e Costa (2012) para répteis e Paglia et al. (2012) para mamíferos. O status de conservação das espécies foi baseado em Fontana et al. (2003), de acordo com a lista disponível das espécies da fauna ameaçada no Rio Grande do Sul. RESULTADOS E DISCUSSÃO No total, foram realizadas 104 incursões à área de estudo, totalizando km percorridos. Foram registradas 49 espécies, inseridas em 21 ordens e 29 famílias (Tabela 1), totalizando 419 animais atropelados e uma média de 0,14 indivíduos por km percorridos. Essa média foi superior a outros trabalhos, como por exemplo, os realizados por Rosa e Mauhs (2004) e Turci e Bernarde (2009) com uma média de 0,082 e 0,078 indivíduos atropelados por km, respectivamente. O grupo mais representativo foi o de mamíferos (223 animais), seguido de aves (118 indivíduos), répteis (75 exemplares) e anfíbios (três espécimes).
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6 32 Darliane E. Silva, Luiz Liberato C. Corrêa, Stefan V. de Oliveira, Lize H. Cappellari Cavia aperea foi o mamífero mais encontrado no atual estudo (25%), dado também registrado por Tumeleiro et al. (2006), para a região sudeste do Rio Grande do Sul, Município de Uruguaiana. C. aperea é um roedor diurno e muito comum no Estado e pode ser encontrado em ambientes de vegetação baixa e fechada. São facilmente observados à beira das estradas quando saem para se alimentar (Silva, 1994). Ao analisarmos o encontro de animais atropelados ao longo dos meses, notamos que novembro e março foram os meses com maior registro de animais atropelados, junho e janeiro tiveram a menor frequência (Figura 3). Figura 3. Distribuição sazonal da fauna atropelada na área de estudo. Com base nos dados analisados, verificamos que os mamíferos foram mais abundantes em quase todos os meses de amostragem, com exceção de dezembro, em que aves e répteis foram os grupos mais abundantes (Figura 4). Por meio dos registros das espécies atropeladas, comparando por estações, os resultados da análise de variância indicam não haver diferença significativa no número de animais atropelados entre as estações (F = 0, 5132; p = 0, 678).
7 MONITORAMENTO DE VERTEBRADOS ATROPELADOS EM DOIS TRECHOS DE RODOVIAS NA REGIÃO CENTRAL DO RIO GRANDE DO SUL - BRASIL 33 Figura 4. Número de espécimes encontrados atropelados, separados por classes, durante um ano. O maior número de aves registradas em março, provavelmente, ocorreu devido ao período de transporte da safra de arroz e de soja na região, que ocasiona uma perda de grãos na rodovia pelos caminhões, e pode estar relacionado ao aumento de atropelamentos desse grupo, sendo que a grande maioria das aves registradas nesse mês possui hábitos alimentares baseado em sementes (Granívoros) (Sick, 1997). Entre os répteis, o grande número de espécimes de Salvator merianae encontrados atropelados deve-se, possivelmente, ao seu hábito de utilizar o asfalto para regulação térmica (Melo e Santos-Filho, 2007). Cabe salientar o registro de quatro espécies atropeladas que estão listadas como ameaçadas no Rio Grande do Sul (Fontana et al., 2003), estando classificadas na categoria de Vulnerável: Leopardus geoffroy, Mazama gouazoubira e Alouata guariba clamitans e em perigo de extinção Leopardus braccatus. O registro da última espécie ampliou o conhecimento da área de sua distribuição para região central do estado (Silva et al., 2011). De acordo com Oliveira e Cassaro (2005), todas as espécies de felinos silvestres encontrados em território brasileiro estão ameaçadas de extinção devido à destruição do meio ambiente, sendo que estudos recentes no sul do Brasil (Cherem et al., 2007; Camargo et al., 2011, Hegel et al., 2012, Oliveira e Silva, 2012) citam felinos em suas listas de espécies atropelados em rodovias, alertando que as rodovias estão atualmente entre os principais meios para o declínio desse grupo. O número muito reduzido de anfíbios encontrados e a ausência de registro de pequenos roedores, como ratos e camundongos, eram esperados. Este fenômeno pode ser explicado pela frequente presença de avifauna predadora encontrada na região (por exemplo, Heterospizias meridionalis, Geranoeatus albicaudatus, Caracara plancus, Milvago chimachima, Rupornis magnirostris). A avifauna da guilda carnívoros pode utilizar como base de sua dieta algumas pequenas presas encontradas atropeladas na rodovia. De maneira direta ou indireta, espécies pertencentes a esta guilda podem remover, nas primeiras horas
8 34 Darliane E. Silva, Luiz Liberato C. Corrêa, Stefan V. de Oliveira, Lize H. Cappellari na manhã, um grande número de espécimes de pequeno porte recém-atropelados, deixando as demais e maiores carcaças para a guilda de Necrófagos, por exemplo, os urubus Cathartes aura e Coragyps atratus (obs. pess.). Adicionalmente, podemos atribuir parte da remoção das carcaças de pequenos vertebrados a mamíferos de hábitos carnívoros e onívoros com hábitos noturnos. Como último fator da ausência ou reduzido registro de roedores e anfíbios atropelados apresenta-se a deterioração das carcaças decorrente da passagem de veículos pesados sobre as mesmas (Souza et al., 2010). CONCLUSÃO Os dados apresentados sugerem que os atropelamentos de vertebrados nas rodovias da região central do Estado do Rio Grande do Sul podem estar causando impacto negativo sobre a fauna local. Torna-se necessário adotar algumas medidas para uma redução desses impactos, como o uso de placas de sinalização indicativas, alertando a presença de animais silvestres na pista e a implantação de sonorizadores e radares em pontos estratégicos, uma vez que a redução de velocidade poderia minimizar os impactos sobre a fauna silvestre. Sugerimos, também, a formação de um programa de Educação Ambiental para informação e sensibilização aos usuários das rodovias da região. AGRADECIMENTOS Somos gratos pela colaboração de Guilherme Freitas Kelling, Eduardo Périco e Maria H. Pires e à URCAMP - Campus de Caçapava do Sul, por disponibilizar bolsa de iniciação científica. REFERÊNCIAS ACHAVAL, F.; CLARA, M.; OLMOS, M. C Mamíferos de la República Oriental del Uruguay, guia fotográfica. 2. Ed. Montevideo, Uruguay: Zonalibro Industria Gráfica, 216p. AYRES, M.; AYRES, D. L.; SANTOS, A. A. S BioEstat 5: aplicações estatísticas nas áreas das Ciências Biológicas e Médicas. 5. ed. Belém: Publicações Avulsas do Mamirauá, 361p. BENCKE, G. A.; BENCKE, C. S. C The potential importance of road deaths as cause of mortality for large forest owls in southern Brazil. Cotinga, 11: BÉRNILS, R. S.; COSTA, H. C. (Org.) Répteis brasileiros: lista de espécies. Versão Disponível em: < Acesso em: out CAMARGO, M. B.; MAZIM, F. D. ; GARCIAS, F. M Variação sazonal na composição, riqueza e abundância de vertebrados silvestres atropelados em três rodovias localizadas no pampa brasileiro. In: L. P. Deble; A. S. O. Deble; A. L. S. Leão. (Org). O Bioma Pampa Contribuições Científicas. Bagé: Ediurcamp, p
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