Direitos Humanos e Soberania. na Emergência de uma Comunidade Transnacional Multicultural

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1 Direitos Humanos e Soberania na Emergência de uma Comunidade Transnacional Multicultural

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3 ALESSANDRA PEARCE DE CARVALHO MONTEIRO Doutoranda em ciências jurídico-filosóficas, mestre em direito constitucional e pós-graduada em Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra Especialista em Direito Tributário pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR) Direitos Humanos e Soberania na Emergência de uma Comunidade Transnacional Multicultural Belo Horizonte 2019

4 Álvaro Ricardo de Souza Cruz André Cordeiro Leal André Lipp Pinto Basto Lupi Antônio Márcio da Cunha Guimarães Bernardo G. B. Nogueira Carlos Augusto Canedo G. da Silva Carlos Bruno Ferreira da Silva Carlos Henrique Soares Claudia Rosane Roesler Clèmerson Merlin Clève David França Ribeiro de Carvalho Dhenis Cruz Madeira Dircêo Torrecillas Ramos Emerson Garcia Felipe Chiarello de Souza Pinto Florisbal de Souza Del Olmo Frederico Barbosa Gomes Gilberto Bercovici Gregório Assagra de Almeida Gustavo Corgosinho Gustavo Silveira Siqueira Jamile Bergamaschine Mata Diz Janaína Rigo Santin Jean Carlos Fernandes CONSELHO EDITORIAL Jorge Bacelar Gouveia Portugal Jorge M. Lasmar Jose Antonio Moreno Molina Espanha José Luiz Quadros de Magalhães Kiwonghi Bizawu Leandro Eustáquio de Matos Monteiro Luciano Stoller de Faria Luiz Henrique Sormani Barbugiani Luiz Manoel Gomes Júnior Luiz Moreira Márcio Luís de Oliveira Maria de Fátima Freire Sá Mário Lúcio Quintão Soares Martonio Mont Alverne Barreto Lima Nelson Rosenvald Renato Caram Roberto Correia da Silva Gomes Caldas Rodolfo Viana Pereira Rodrigo Almeida Magalhães Rogério Filippetto de Oliveira Rubens Beçak Vladmir Oliveira da Silveira Wagner Menezes William Eduardo Freire É proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio eletrônico, inclusive por processos reprográficos, sem autorização expressa da editora. Impresso no Brasil Printed in Brazil Arraes Editores Ltda., Coordenação Editorial: Fabiana Carvalho Produção Editorial e Capa: Danilo Jorge da Silva Imagem de Capa: Pexels (Pixabay.com) Revisão: Raquel Rezende Monteiro, Alessandra Pearce de Carvalho. M775d Direitos humanos e soberania na emergência de uma comunidade transnacional 2019 multicultural / Alessandra Pearce de Carvalho Monteiro. Belo Horizonte: Arraes Editores, p. ISBN: ISBN: (E-book) 1. Direito internacional. 2. Direitos humanos. 3. Direitos humanos internacionais. 4. Anistia Brasil. 5. Brasil Lei de Anistia. I. Título. CDDir CDD(23.ed.) 323 Elaborada por: Fátima Falci CRB/6-700 Matriz Av. Nossa Senhora do Carmo, 1650/loja 29 - Bairro Sion Belo Horizonte/MG - CEP Tel: (31) Filial Rua Senador Feijó, 154/cj 64 Bairro Sé São Paulo/SP - CEP Tel: (11) arraes@arraeseditores.com.br Belo Horizonte 2019

5 Para minha mãe, que me ensinou a olhar o Outro com respeito, noção que estrutura todo o meu pensamento intelectual. Para meu pai, que me transmitiu a sua paixão pelo mundo e por outras culturas. Para Isabella, que me ensinou a estudar e abriu as portas do mundo acadêmico para mim. Para Daniel, que é meu Sócrates. V

6 Sumário APRESENTAÇÃO... VIII Capítulo 1 A RELATIVIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SOBERANIA EM RAZÃO DOS DIREITOS HUMANOS A SOBERANIA UM CONCEITO DE FATO OU DE HISTÓRIA? RELATIVIZAÇÃO DO CONCEITO NO SÉCULO XX A POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO HUMANITÁRIA REFLEXÕES FINAIS Capítulo 2 A SOBERANIA EM XEQUE: O CONFRONTO ENTRE O STF E A CIDH A RESPEITO DA VALIDADE DA LEI DE ANISTIA BRASILEIRA O INSTITUTO DA ANISTIA A ANISTIA NO BRASIL A ADPF 153 E A DECISÃO DO STF Questionamento sobre a interpretação da Lei nº 6.683/1979 crimes políticos e conexos Violação do direito fundamental à verdade Violação aos princípios democráticos e republicanos Legitimidade da autoanistia A Emenda Constitucional nº 26/ Violação à dignidade da pessoa humana diante do acordo celebrado A ANISTIA PERANTE O DIREITO INTERNACIONAL A soberania estatal perante os crimes contra a humanidade A prescrição de crimes contra a humanidade O sistema interamericano de proteção aos direitos humanos e a lei de anistia brasileira VI

7 A decisão da corte interamericana de direitos humanos Caso Araguaia REFLEXÕES FINAIS Capítulo 3 OS DESAFIOS ÉTICOS E POLÍTICOS DA CONSTRUÇÃO DE COMUNIDADES TRANSNACIONAIS O PROJETO DE HABERMAS PARA UM ESTADO-NAÇÃO EUROPEU AS FALHAS DAS CONCEPÇÕES PROCEDIMENTAIS (RAWLS E HABERMAS) E DESCONSTRUTIVISTAS (DERRIDA) PARA FUNDAMENTAR A POLÍTICA E O DIREITO TRANSNACIONAL Capítulo 4 ENCONTRANDO UM SIGNIFICADO PARA A TOLERÂNCIA QUE POSSIBILITE A CONSTRUÇÃO DE UMA JUSTIÇA NO MUNDO MULTICULTURAL JÜRGEN HABERMAS E A TOLERÂNCIA COMO CONDIÇÃO PARA O DIÁLOGO AXEL HONNETH E O RECONHECIMENTO DO OUTRO RAINER FORST E A TOLERÂNCIA COMO VIRTUDE DA JUSTIÇA. 84 REFLEXÕES FINAIS REFERÊNCIAS VII

8 Apresentação Ao fim da primeira metade do século XX, a civilização ocidental se viu diante de um problema jurídico-político paradoxal: de um lado, os horrores do fascismo e nazismo reacenderam nas elites acadêmicas ideias tipicamente jusnaturalistas de que existem certos valores e concepções éticas que são válidos ou inválidos em qualquer lugar, a qualquer tempo, para qualquer povo. Surgiu, então, a doutrina eticamente universalista dos direitos humanos. Por outro lado, os horrores do nazismo e do fascismo também revelaram a perversidade das ideias discriminatórias, que possuem em sua base a crença de que existem, justamente, concepções éticas que são superiores às outras. Lembre-se, por exemplo, de que os colonizadores europeus se consideravam povos civilizados superiores aos selvagens. Assim, parte da elite acadêmica caminhou em outra direção, passando a defender o igual respeito às diversas concepções de justiça e vida boa em um discurso em favor do multiculturalismo e do relativismo ético que o acompanha. Com a globalização, a tensão entre o universalismo dos direitos humanos e o relativismo ético das doutrinas multiculturalistas extrapolou a escala nacional e passou a ser um problema de natureza transnacional. Se, por um lado, a interferência internacional em assuntos internos se tornou prática corriqueira, por outro lado, as reações comunitárias contra essa interferência têm se fortalecido a partir da primeira década do século XXI, gerando eventos como o Brexit, o terrorismo religioso islâmico e a eleição de Donald Trump para presidente dos Estados Unidos. Esta obra busca discutir alguns problemas oriundos dessa disputa entre a doutrina dos direitos humanos que pretende ser universalizada e as compreensões éticas e políticas de comunidades nacionais que exigem respeito à sua soberania e sua forma de vida. O primeiro capítulo irá situar o leitor diante de um dos problemas centrais: é possível relativizar a soberania de uma nação inclusive, no que VIII

9 diz respeito aos seus entendimentos éticos para forçá-la a respeitar os direitos humanos? Ao responder essa pergunta, buscaremos mostrar as justificativas morais e condições procedimentais que tornariam tal intervenção legítima, ao menos em tese. No segundo capítulo, analisaremos um caso prático em que houve essa disputa entre direitos humanos e soberania. É o exemplo dos julgamentos contraditórios da Lei de Anistia brasileira pelo STF e pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, que resultou em um mal-estar ainda não resolvido entre os representantes políticos do país e as autoridades internacionais. No terceiro capítulo, analisaremos a possibilidade de se construir uma comunidade política transnacional com base no artigo The European Nation State, de Habermas, verificando se a proposta conseguiria superar as dificuldades oriundas da diversidade ética existente entre os povos. Nesse ponto, veremos que mesmo as concepções procedimentais (ou seja, aquelas que são intencionalmente despidas de particularismo ético) e desconstrutivistas de justiça (aquelas que questionam os dogmas axiológicos ocidentais) estão impregnadas das marcas da civilização ocidental, ferindo, de qualquer forma, a soberania de incontáveis povos na escolha de suas concepções de justiça e de vida boa. Essas dificuldades só poderiam ser resolvidas se considerassemos que essa comunidade transnacional não precisaria ser constituída por vínculos políticos rígidos nos moldes de um Estado soberano. Com isso, o direito também não teria o caráter estatal e positivista consolidado na modernidade, derivando mais dos entendimentos deliberativos entre os povos e organizações do que da vontade de uma autoridade formal. A violência latente do processo de universalização das normas, assim, seria potencialmente diminuída pela assunção de um direito que fosse legítimo por atender às necessidades reais das nações e grupos envolvidos e não simplesmente por repetir as soluções dos direitos humanos já praticadas nos países ricos do ocidente. A formação de tal confluência deliberativa exigiria, por sua vez, uma ética de tolerância entre os povos que diminuísse os ruídos nos diálogo intercultural e intercivilizacional. Contudo, como a tolerância é uma categoria que possui múltiplos significados, fecharemos esta obra com uma discussão sobre qual significado ela deve assumir para que seja possível conciliar as particularidades éticas dentro de uma comunidade globalmente unida por vínculos de respeito. IX