RELATÓRIO TÉCNICO - CIENTÍFICO
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- Therezinha Amaro Quintão
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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO DIRETORIA DE PESQUISA PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA PIBIC; CNPq, CNPq/AF, UFPA, UFPA/AF, PIBIC/INTERIOR, PRODOUTOR, PIBIT E FAPESPA Período : outubro/2014 a julho/2015. ( ) PARCIAL (x) FINAL RELATÓRIO TÉCNICO - CIENTÍFICO IDENTIFICAÇÃO DO PROJETO Título do Projeto de Pesquisa (ao qual está vinculado o Plano de Trabalho): Empoderamento, ethos local e recursos naturais: a cartografia social como estratégia para a elaboração de planos de ação em RESEX s marinhas do salgado paraense (Edital PE-Interdisciplinar 2014, Coordenação Voyner Ravena Cañete) Nome do Orientador: Voyner Ravena Cañete Titulação do Orientador: Doutora Faculdade : Biologia Instituto/Núcleo: Instituo de Ciências Biológicas - ICB Laboratório: Laboratório de Biologia Pesqueira e Manejo de Recursos Aquáticos Título do Plano de Trabalho: Diagnóstico participativo da atividade de pesca esportiva no município de São Caetano de Odivelas. Nome do Bolsista: Flávia Domitila de Lima Souza Tipo de Bolsa: ( x ) PIBIC/UFPA
2 INTRODUÇÃO De acordo com Barthem et.,al (1997), a pesca na região amazônica é dividida em 5 categorias, sendo elas então a pesca de subsistência, comercial, industrial, ornamental e esportiva. Este trabalho trata a respeito da pesca esportiva no município de São Caetano de Odivelas, localizado no Nordeste do Pará, costa norte do Brasil, onde se mostra forte essa modalidade de pesca, haja vista que o município é considerado um gradne polo pesqueiro do salgado paraense. Segundo estudo realizado pelo ICMBio (2014) a atividade de pesca esportiva foi inserida no município através da prefeitura do mesmo, a qual visava atrair turistas para a região e consequentemente benefícios econômicos, alegando geração de emprego para os pescadores com a chegada dos visitantes atraídos por tal atividade. No entanto, a população não é beneficiada com a atividade, sendo que a mesma acontece de forma predatória no município. Nesse sentido, ALBANO & VASCONCELOS (2013, p.77) afirmam: A pesca esportiva é uma atividade de lazer importante no Brasil que gera recursos e com diversos praticantes. A atividade é favorecida pela biodiversidade de peixes e variedade de ambientes encontrados no país. No entanto, a gestão inadequada do setor pode gerar impactos maiores do que outras modalidades de pesca, pois os adeptos acessam habitats considerados críticos para diversas espécies de peixes. Pensar na modalidade de pesca esportiva como uma atividade de lazer, sem levar em consideração a realidade como a qual vem se desenvolvendo de fato em diferentes regiões do Brasil, é desconsiderar os prejuízos de espécie socioambiental que a mesma pode e tem ocasionado devido, principalmente, à ausência ou inexistência de uma gestão que olhe para além dos benefícios econômicos da atividade, bem como de políticas locais específica, acompanhada de uma fiscalização eficaz. Quando se trata de um município que possui uma reserva extrativista, caso de São Caetano de Odivelas, tal atividade gerida de forma desordenada torna-se ainda mais preocupante à medida que a existência de populações tradicionais 1, as quais possuem um 1 De acordo com Diegues, As comunidades tradicionais estão relacionadas com um tipo de organização econômica e social com reduzida acumulação de capital, não usando força de trabalho assalariado. Nela produtores independentes estão envolvidos em atividades econômicas de pequena escala, como agricultura e pesca, coleta de mariscos e artesanato. Economicamente, portanto, essas comunidades se baseiam no uso de recursos naturais renováveis. Uma característica importante desse modo de produção mercantil é o conhecimento
3 modo de vida baseado numa relação de proximidade com a natureza e dependência dos recursos aquáticos, encontra-se ameaçada ao passo que o próprio recurso pode vir à escassez. Sendo assim, o presente trabalho partiu de uma inquietação quanto ao exercício dessa modalidade de pesca em São Caetano de Odivelas, buscando responder o seguinte problema de pesquisa: Qual a visão da comunidade local do município de São Caetano de Odivelas a respeito da pesca esportiva que ocorre na região e em que medida a pesca esportiva influencia no meio ambiente e no modo de vida dessas populações? JUSTIFICATIVA A microrregião do salgado, mais conhecida como zona do salgado, faz parte da mesorregião do Nordeste paraense e compreende um total de 11 municípios, sendo eles Colares, Curuçá, Magalhães Barata, Maracanã, Marapanim, Salinópolis, São Caetano de Odivelas, São João da Ponta, São João de Pirabas, Terra Alta e Vigia (SANTOS & LISBOA, 2008). Essa microrregião é marcada pela presença de extensas áreas de ecossistema de manguezal e exerce um papel de suma importância na atividade pesqueira, haja vista sua considerável riqueza em recursos aquáticos. Nesse contexto, destaca-se o município de São Caetano de Odivelas, o qual encontra - se localizado na Costa Atlântica do Pará, na mesorregião do nordeste paraense, mais precisamente na microrregião do salgado, ficando a uma distância de 93 km da capital do estado em linha reta e pela rodovia a uma distância de 120 km (IBGE, 2010 apud ALMEIDA et. al, 2012). Atualmente, o município possui em torno de habitantes (IBGE, 2014). O município de São Caetano de Odivelas está situado entre os municípios de Santo Antônio do Tauá e Vigia de Nazaré e seu contato com o Oceano Atlântico se dá através rio Mojuim, o qual banha a cidade e se constitui de um ecossistema rico em fauna e flora (ALMEIDA et. al, 2012). As principais atividades econômicas da população residente dessa que os produtores tem dos recursos naturais, seus ciclos biológicos, hábitos alimentares, etc. Esse Know-how tradicional, passado de geração em geração, é um instrumento importante para a conservação. Como essas populações em geral não tem outra fonte de renda, o uso sustentável dos recursos naturais é de fundamental importância. Seus padrões de consumo, baixa densidade populacional e limitado desenvolvimento tecnológico fazem com que sua interferência no meio ambiente seja pequena.(...) (DIEGUES, 1992 apud DIEGUES 2001).
4 área, a pesca e a coleta de mariscos 2, estão relacionadas com as águas, acontecendo o mesmo com as atividades culturais que incluem lazer, culinária e religiosidade (ICMBIO, 2014). Dentre as atividades relacionadas ao lazer no município, destaca-se a pesca esportiva, tendo em vista que São Caetano de Odivelas é considerado importante polo pesqueiro do salgado paraense e, portanto, tornou-se o principal destino para essa atividade e para o turismo fluvial (DOL, 2011). Porém, sabendo-se que a pesca constitui uma importante atividade social e econômica para aqueles que dela dependem para a geração de renda e subsistência (CANÃS, 2012) e os pescadores artesanais ressentem-se com a presença dos pescadores esportivos no município, dada a forma desordenada e acelerada de exploração dos recursos pesqueiros que vem ocorrendo por essa modalidade de pesca na região. Lopes (2009), no Plano de uso para a pesca esportiva da reserva de desenvolvimento sustentável Uatumã, define a pesca esportiva como uma atividade de pesca sem fins lucrativos, praticada somente pelo prazer de pescar, fundamentada pelo lazer, recreação e turismo. Tem como princípio a filosofia do pesque e solte, sendo a soltura dos peixes a prática que mais a caracteriza. Cabe ressaltar aqui que de acordo com a Portaria nº 4, de 2009 do IBAMA existe divergência entre a pesca esportiva e amadora, pois enquanto na primeira é obrigatória a prática do pesque e solte, na segunda é permitido um limite de captura do pescado (IBAMA, 2009). Já o Ministério da Pesca e Aquicultura, em instrução normativa Nº 9, de 13 de junho, de 2012 não difere as práticas 3. Independente da existência dessa diferenciação, o fato é que não se percebe hoje, na região, a ocorrência de nenhuma das práticas acima citadas. Logo, segundo os pescadores do município, a pesca esportiva acontece de forma predatória, uma vez que ocorre a captura do pescado fora do padrão permitido pelo IBAMA (ICMBIO, 2014). Hoje, São Caetano de Odivelas possui uma Resex Reserva Extrativista Marinha Mocapajuba, criada em outubro 10 de 2014 com o objetivo de assegurar a conservação da biodiversidade dos ecossistemas existentes na área, bem como o uso sustentável dos recursos naturais e o modo de vida das populações tradicionais que ali vivem (BRASIL, 2015). No entanto, a mesma ainda carece de um plano de manejo. Diante deste cenário de exploração desenfreada dos recursos aquáticos; ausência de política ou normas locais, bem como de uma fiscalização voltada para a ocorrência da pesca 2 Os principais mariscos coletados na região são o siri, camarão, ostra, mexilhão, sururu, turú e principalmente o caranguejo - crustáceo coletado em todas as comunidades para o consumo e venda (ICMBIO, 2014). 3 De acordo o 1º da instrução normativa nº 9 de 13 de junho de 2012, a pesca amadora ou esportiva é considerada de natureza não comercial, no que se refere ao produto de sua captura, sendo vedada a comercialização do recurso pesqueiro capturado.
5 esportiva e insatisfação da população local perante a forma desregulada como tem se desenvolvido esta modalidade de pesca no município, percebeu-se a necessidade de um ordenamento quanto à prática da pesca esportiva na cidade de São Caetano de Odivelas. OBJETIVOS O trabalho teve como objetivo central Identificar e compreender, através de um diagnóstico participativo com as comunidades do município de São Caetano de Odivelas, a visão das mesmas a respeito da atividade de pesca esportiva que ocorre na região, assim como sua influência no meio ambiente, no cotidiano ou no modo de vida dessas populações locais. A partir do objetivo proposto: 1. Identificou-se que a modalidade de pesca esportiva ocorre de forma bastante intensa na sede do município. Porém, ainda está sendo investigada a presença ou ausência desta atividade nas demais comunidades locais; 2. Verificou-se que a pesca realizada por pescadores esportivos é vista pela população local como predatória e que a presença desses praticantes no município é de pouco ou nenhum significado para economia do mesmo; 3. Identificou-se que os maiores impactos ocasionados pela pesca esportiva são de origem socioambiental e estão relacionados principalmente à exploração desordenada do recurso pesqueiro, bem como aos prejuízos causados por tais pescadores às embarcações e instrumentos de pesca dos pescadores artesanais. MATERIAIS E MÉTODOS Este trabalho foi desenvolvido através de pesquisa do tipo exploratória e para tanto se utilizou de Levantamento bibliográfico e survey, o qual permitiu por meio das entrevistas semiestruturadas e entrevista aberta identificar a visão dos diferentes atores entrevistados a respeito da modalidade de pesca esportiva, bem como conhecer a atual realidade como a qual vem se desenvolvendo no município. Além disso, foi utilizada para a coleta de dados a abordagem quantiqualitativa, por meio da qual se buscou compreender a realidade estudada e dar precisão às informações coletadas, tendo em vista que a utilização conjunta de ambas as pesquisas condicionam um melhor resultado.
6 A coleta de dados ocorreu em dois momentos diferentes e alcançou um total de 32 entrevistas. O primeiro campo foi realizado nos dias 25 e 26 de abril, enquanto o segundo ocorreu no período de 10 a 12 de julho de 2015 e teve como público alvo 18 pescadores artesanais; 12 comerciantes; o representante da Resex Marinha Mocapajuba e o ex-prefeito de São Caetano de Odivelas. Trabalhos referentes à atividade de pesca esportiva, bem como sobre a pesca artesanal; populações tradicionais; conflitos socioambientais e desenvolvimento sustentável foram de grande relevância e fundamental para a compreensão e elaboração dos resultados. RESULTADOS A pesca esportiva tornou-se, ao longo dos anos, uma realidade em São Caetano de Odivelas. Ocorrendo há mais de cinco anos no município, constatou-se, a partir da coleta de dados, que essa modalidade de pesca passou a existir de forma espontânea na região, sendo a sua vocação pesqueira, assim como a ausência de fiscalização e a divulgação a respeito do polo pesqueiro que o município dispõe fatores que permitiram e colaboraram para que a atividade acontecesse. No entanto, a figura do ex-prefeito Rubens Barbalho, o qual esteve como gestor do município no período de 2008 a 2012, é recorrente nos discursos dos entrevistados, onde hora aparece como responsável pela inserção da pesca esportiva na região, hora como incentivador e fortalecedor dessa atividade durante sua gestão. A relação feita por 40,9% dos entrevistados a respeito da atividade de pesca esportiva como iniciativa da prefeitura remete ao fato de associarem o seu início com o TOPESCO (Torneio de Pesca Esportiva de São Caetano de Odivelas), evento criado e organizado pela prefeitura na época da gestão do ex-prefeito citado acima. Quando interrogado sobre quando e como essa atividade foi inserida na região e se teve participação no desenvolvimento da mesma, o senhor Rubens Barbalho esclareceu que a atividade já existia antes da sua gestão, porém confirma que quando teve a oportunidade de atuar como prefeito do município a pesca esportiva recebeu uma atenção especial, tendo em vista que a mesma foi considerada o segmento carro chefe do Turismo a ser desenvolvido no município. Em relato a seguir, discorre: (...) Então essa atividade da pesca esportiva ela já é bem antiga. Quando eu tive a oportunidade de estar como prefeito, sem dúvida alguma nós demos um upgrade na pesca esportiva. Primeiro por eu ser um apaixonado pela atividade; segundo porque eu vi na pesca esportiva, no
7 turismo um dos maiores segmentos econômicos para a viabilidade do município. Então nós trabalhamos muito o turismo e dentro do turismo a pesca esportiva era o carro chefe. A criação do torneio foi na minha gestão, então eu acredito que isso tenha sido um upgrade. Lógico que quando nós criamos o torneio a quantidade de pescadores esportivos já era bem significativa. Eu digo que o TOPESCO deu um incentivo a mais, uma publicidade a mais na pesca esportiva de São Caetano. (Rubens Barbalho) Caracterizada como uma atividade de lazer e que tem como princípio a prática do pesque e solte, os adeptos da pesca esportiva, segundo Lopes (2009), tem se preocupado cada vez mais com a conservação da natureza para a manutenção e perpetuação do seu esporte. Características estas, porém, não encontradas na pesca esportiva difundida em São Caetano de Odivelas, logo o pesque e leve e a captura de peixes em quantidade e tamanho inadequado tem sido a prática mais comum dos pescadores esportivos frequentadores do município. Nesse sentido, constataram-se problemas socioambientais, decorrentes dessa modalidade de pesca na medida em que seus praticantes tem ido contra aos princípios da mesma. Com relação a isso, se faz necessário atentar para a sustentabilidade, não da atividade em si, mas para a forma como os seus adeptos a vem gerindo, pois de acordo com Cavalcanti (1995), sustentabilidade significa comportamento em obediência às leis da natureza, logo só é possível a partir de atitudes, limites, enfim de comportamento sustentável. O primeiro problema está relacionado à grande quantidade e ao tamanho indevido de peixes capturados pelos pescadores esportivos, pois de acordo com os relatos dos entrevistados a maioria preza pela quantidade e não pela qualidade do peixe. Além disso, capturam peixes ovados e ainda juvenis, podendo desta forma prejudicar a reprodução e manutenção dos estoques pesqueiros, uma vez que a área explorada, caracterizada como estuário 4, funciona como local de reprodução, berçário e alimentação dos peixes (BARROS et. al, 2011). 4 Os estuários são de acordo com Miranda et.,al (2002) um ecossistema de transição entre oceano e continente, sendo este termo utilizado genericamente para indicar o encontro do rio com o mar. Os estuários apresentam funções vitais, dentre as quais constituem hábitat natural de aves, mamíferos e peixes; ambiente de desova e de criação de muitas comunidades biológicas e desempenham papel importante nas rotas migratórias de peixes de valor comercial (KETCHUM, 1983 apud MIRANDA et,.al 2002).
8 Contrariamente, as populações tradicionais - categoria em que se enquadra a pesca artesanal - desenvolvem sistemas de manejo dos recursos naturais que garantem a manutenção e uso sustentado dos ecossistemas naturais através do respeito aos ciclos naturais e à sua explotação dentro da capacidade de recuperação das espécies de animais e plantas utilizadas (DIEGUES, 2001). Outros problemas oriundos da pesca esportiva dizem respeito à poluição do rio e à utilização por esses pescadores de um tipo de malhadeira pequena, para a captura de iscas, que têm provocado a morte e o desperdício do recurso ao passo que capturam uma quantidade acima do necessário e em seguida despejam os peixes mortos na água. Acrescenta-se a isso, as implicações de natureza socioeconômica decorrentes da imprudência e desrespeito dos pescadores esportivos com relação aos artesanais, tendo em vista que a alta velocidade com que as voadeiras dos turistas percorrem o rio - provocando a destruição das embarcações que ficam ancoradas na beira, de apetrechos de pesca e currais, assim como acidentes - tem colocado em risco a vida e comprometido os meios de trabalho dos pescadores. Tais problemas acima podem estar contribuindo para a diminuição do pescado e tem resultado na incidência do conflito entre a pesca esportiva e artesanal, na medida em que os pescadores do município, insatisfeitos diante do exposto, percebem a pesca amadora como uma ameaça à reprodução das espécies e ao modo de vida daqueles que buscam na atividade pesqueira suprir suas necessidades básicas. Litlle (s/s) define três tipos de conflitos, sendo que o primeiro deles ocorre a partir da disputa em torno recurso; o segundo decorre dos impactos socioambientais causados pela ação humana e o terceiro advém do embate de valores e ideologias envolvendo o uso da natureza. Desse modo, o conflito entre a pesca artesanal e esportiva em São Caetano de Odivelas caracteriza-se pelo prejuízo de caráter material e econômico ocasionado por tal modalidade aos ribeirinhos, assim como pela disputa em relação ao espaço e ao recurso, a qual tem sido evidenciada através da insatisfação a respeito da quantidade e tamanho de peixes capturados e da disparidade tecnológica entre os instrumentos utilizados por pescadores artesanais e esportivos. De acordo com Terramoto (2014) o conflito pela apropriação do recurso se instala quando diferentes formas de pesca exploram o mesmo espaço e interfere diretamente na reprodução do pequeno pescador, o qual possui pouca mobilidade no mar. O uso de tecnologias simples, constituída de embarcações a vela e outros apetrechos de pesca, em
9 geral confeccionados pelo próprio pescador, e o método de detecção dos cardumes, atribuem o caráter artesanal da atividade pesqueira no Pará (FURTADO, 1981). Os depoimentos 5 abaixo reforçam a respeito da desigualdade existente, entre pescadores artesanais e esportivos, com relação à facilidade desses últimos na apropriação do recurso pesqueiro, na medida em que detêm equipamentos de alto padrão tecnológico: Existe uma desigualdade muito grande em relação ao nosso ribeirinho que vive da pesca pra eles que são empresários com potencialidades, com equipamentos de ultima geração, tipo um sonar. Eles captam onde realmente tem o peixe e vão lá e pegam, sabe a localização do cardume do peixe, já o ribeirinho não tem nada disso. Então ele pesca mesmo na sorte e por algumas experiências de vida, como por exemplo, o conhecimento da maré. Aí rola uns comentários do tipo o cara vem aí e pega todo o nosso peixe e leva e a gente aqui não consegue pegar (...). (F. J.) (...) Pra gente encontrar um pesqueiro que tenha peixe tem que analisar bastante, observar o local, onde que tá dando peixe e eles não. E pra gente chegar lá fica difícil. Com uma rabeta dessa é mais ou menos umas meia hora e pra eles chegarem lá no pesqueiro é cinco minutos. Eles tem uma maior facilidade de buscarem pesqueiros longe do que nos. (D.). Sobre pesqueiros, Begossi (2013) corrobora descrevendo que são pontos de pesca onde há alguma forma de apropriação, regras de uso ou conflito, tratando-se nestes dois últimos casos de um território. Além disso, a autora acrescenta que, quanto mais escasso o recurso ou quanto maior for o número de pescadores numa área, maior será a probabilidade de se encontrar territórios pesqueiros. Probabilidade essa existente em São Caetano, à medida que o pescado tem diminuído nos últimos dez anos e o número de pescadores esportivos aumentado, evidenciando dessa forma a crescente disputa ou demanda pelo recurso numa mesma área. O gráfico 1 apresenta dados informados pelos pescadores artesanais acerca da diminuição do recurso, enquanto o 5 No texto usa-se apenas as iniciais para o nome dos entrevistados de forma a manter o sigilo sobre suas identidades.
10 gráfico 2 demonstra o crescimento do número de pescadores esportivos no município, considerando o universo de comerciantes e pescadores artesanais entrevistados. Gráfico 1. Percentagem acerca da quantidade de peixes nos ultimos dez anos (2015). Gráfico 2. Percentagem da quantidade de pescadores esportivos em São Caetano de Odivelas (2015). Terramoto (2014) considera que uma das características importantes da pesca amadora consiste na geração de emprego, e nesse sentido os condutores de pesca tornam-se peça chave do setor. No entanto, de acordo com os entrevistados, são poucos os que têm um
11 guia fixo e, exceto estes, a contratação só ocorre uma ou duas vezes quando os pescadores ainda não conhecem a região e os pontos de pesca. A respeito disso, o entrevistado relata: (...) eles já vem com a própria mercadoria deles de fora, já descem na lancha, já não pegam mais os nossos guias daqui da cidade. Eles só usam uma ou duas vezes as pessoas, aí aprende e não contratam mais os guias. As pessoas só são usadas. (S.) Cabe aqui uma reflexão acerca do conhecimento tradicional dos pescadores artesanais, que segundo Diegues (2004) não é pré-lógico ou pré-científico, mas é construído a partir de uma observação contínua dos fenômenos naturais, levando o pescador a construir seus próprios mapas mentais, os quais lhe orientam sobre onde e como pescar. Corrobora a autora, que resulta desse processo a habilidade cognitiva dos pescadores em identificar zonas produtivas de pesca. Percebe-se diante disso, a apropriação do conhecimento tradicional dos pescadores artesanais pelos pescadores esportivos, na medida em que estes últimos aproveitam-se da habilidade cognitiva dos primeiros para descobrir e ter acesso aos pesqueiros. Nesse contexto, 72,2% dos pescadores artesanais entrevistados percebem a pesca esportiva como uma atividade prejudicial ao recurso pesqueiro e aos pescadores (Gráfico 3), tendo em vista que a mesma tem ocorrido de forma desordenada, através da exploração predatória do recurso e da destruição dos seus meios de trabalho. Discurso esse, reafirmado na fala dos comerciantes ao ressaltarem que a atividade de pesca esportiva tem ocorrido de forma desorganizada e que, portanto, carece de uma espécie de controle por meio de fiscalização quanto ao tamanho e limite de peixes capturados; e da cobrança de taxa aos praticantes dessa modalidade. Por fim, além das implicações socioambientais, a pesca esportiva foi considerada de pouca importância econômica para o município (Gráfico 4). No entanto, tal dado ainda carece de uma investigação de maior profundidade para se obter informações mais detalhadas e precisas a respeito desse resultado.
12 Gráfico 3. Visão dos pescadores artesanais a respeito da pesca esportiva (2015). Gráfico 4. Retorno econômico gerado pela pesca esportiva (2015). PUBLICAÇÕES Durante esse período foi submetido e aprovado, no Congresso de Agroecologia 2015, um trabalho referente ao Conflito entre a pesca artesanal e esportiva em São Caetano de Odivelas, no qual figuro como autora. Tal trabalho além de ser apresentado no IX Congresso Brasileiro de Agroecologia, a ocorrer em Belém (PA) entre 29/09 e 01/10/2015, será também publicado na revista Cadernos de Agroecologia (ISSN: ), como consta no abaixo que acusa o aceite do referido artigo.
13 Imagem: Comprovante de aprovação do trabalho no Congresso de Agroecologia 2015.
14 (acesso em 10/08/2015). CONCLUSÃO A partir dos resultados apresentados buscou-se mostrar como a modalidade de pesca esportiva é percebida pelos moradores locais levando-se em consideração a forma como tem ocorrido - suas implicações socioambientais - em de São Caetano de Odivelas, município onde
15 a atividade pesqueira representa a base de subsistência e de reprodução social de parte considerável da população. Nesse sentido, a percepção de dois diferentes atores sociais - pescador artesanal e comerciante - foi de fundamental importância para se atingir os objetivos propostos e compreender o por quê da insatisfação e preocupação acerca dessa modalidade de pesca. Os problemas socioambientais que foram identificados afetam diretamente os pescadores artesanais. Dentre eles, a exploração desordenada do recurso e a destruição dos meios de trabalho dos pescadores artesanais estiveram entre os mais citados. No entanto, a disparidade tecnológica das embarcações e equipamentos utilizados para se chegar aos pesqueiros e capturar o recurso também apareceu nos discursos dos pescadores, os quais demonstraram insatisfação a respeito de tal situação. Além disso, a ausência de fiscalização, limites de captura e cobrança de taxas pelo pescado capturado são medidas ainda inexistentes e consideradas necessárias pelos entrevistados como estratégias de limite e ordenamento ao acesso dos pescadores esportivos ao recurso pesqueiro. Diante do exposto, diferentemente dos princípios difundidos pela legislação vigente e por diferentes autores sobre a pesca esportiva, em São Caetano de Odivelas essa modalidade de pesca tem tomado outro rumo, se apresentado de maneira desorganizada e insustentável à medida que se mostra predatória e perturbadora aos pescadores artesanais, sendo percebida não mais como uma atividade que tem por finalidade o esporte ou lazer. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALBANO, Cícero J.; VASCONCELOS, Eliane C. Análise de casos de pesca esportiva no Brasil e propostas de gestão ambiental para o setor. Revista Brasileira de Ciências Ambientais, n. 28, p , jun Disponível em: ALMEIDA, Neila J.; MORAES, Sérgio; FERNANDES, Daniel. Conservação do ecossistema manguezal, a partir dos modos de uso pela comunidade extrativista da Vila Sorriso, São Caetano de Odivelas/Pa. In: VI ENCONTRO NACIONAL DA ANPPAS, Belém, Belém: ANPPAS, p
16 BARTHEM, R.; GOULDING, M. The catfish connection: ecology, migration and conservation of Amazon predators. Columbia University Press, New York p. BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Estudo Socioambiental Referente à Proposta de Criação de Reserva Extrativista Marinha no Município de São Caetano de Odivelas, Estado do Pará. Pará: ICMBIO, p. BRASIL. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IBAMA. Portaria nº 4, de 19 de março de Define as regras para a prática da pesca amadora no Brasil. Disponível em: < Acesso em: 24 julho BRASIL. Instrução Normativa Interministerial MPA/MMA nº 9 de 13 de junho de Estabelece Normas Gerais para o Exercício da Pesca Amadora em Todo o Território Nacional. MPA, BRASIL. Decreto S/N, de 10 de outubro de Dispõe sobre a criação da Reserva Extrativista Marinha Mocapajuba, localizada no Município de São Caetano de Odivelas, Estado do Pará. In: DOL, BARROS, Daniela de França; TORRES, Marcelo Ferreira; FRÉDOU, Marcelo Lucena. Ictiofauna do estuário de São Caetano de Odivelas e Vigia (Pará estuário amazônico). Revista Biota Neotrópica, Campinas, v 11, n. 2, p , abr./jun BEGOSSI, Alpina. Áreas, pontos de pesca, pesqueiros e territórios na pesca artesanal. In: (Org) Alpina Begossi. Ecologia de Pescadores da Mata Atlântica e da Amazônia. 2 ed. São Paulo: Rima, p CAÑAS, Roberta Pessoa Aguilar. Conflitos Silenciosos: A Pesca Amadora no Lago de Balbina, Presidente Figueiredo, Amazonas p. Dissertação (Mestrado em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia) Programa de Pós-graduação em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia, Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2012.
17 CAVALCANTI, Clóvis. Sustentabilidade da economia: Paradigmas alternativos de realização econômica. In: (Org.) Clóvis Cavalcanti. Desenvolvimento e Natureza: estudos para uma sociedade sustentável. Recife, p DIEGUES, Antônio Carlos S. O mito moderno da natureza intocada. 3.ed. São Paulo: Hucitec, p. DIARIO ONLINE (DOL). São Caetano de Odivelas: Um polo pesqueiro Disponível em:< Acesso em: 24 julho DIEGUES, Antônio Carlos. Conhecimento Tradicional e Apropriação Social do Ambiente Marinho. São Paulo, Disponível em: < Acesso em: 01 agosto FURTADO, Lourdes Gonçalves. Pesca Artesanal: Um Delineamento de Sua História no Pará. Belém: Museu Goeldi, p. IBGE. Disponível em: < s ao-caetano-de-odivelas> Acesso em: 07/02/2015 LITLLE, Paul. A etnografia dos conflitos sócio-ambientais: bases metodológicas e empíricas. Brasília: UNB, s/d. LOPES, Kelven Stella. Plano de Uso para a Pesca Esportiva da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Uatumã. Amazonas, A etnografia dos conflitos socioambientais: bases metodológicas e empíricas. Disponível em: org.br/encontro_anual/encontro2/gt/gt17/gt17_little.pdf. Acesso em: 01 agosto 2015.
18 MIRANDA, L. B de. Princípios de Oceanografia Física de Estuários. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2002 (Acadêmica; 42). SANTOS, R. de C. P. dos; LISBOA, R. C. L. Musgos (Bryophyta) da microrregião do Salgado Paraense e sua utilização como possíveis indicadores de ambientes perturbados. Rodriguésia 59 (2): Disponível em: < Acesso em: 07/02/2015 TERRAMOTO, Carolina Sayuri. Conflitos entre pescadores artesanais e amadores de Bertioga/SP e adjacências p. Dissertação (Mestrado em Ciência Ambiental) Programa de Pós Graduação em Ciência Ambiental, Universidade de São Paulo, São Paulo, DIFICULDADES PARECER DO ORIENTADOR: Manifestação do orientador sobre o desenvolvimento das atividades do aluno e justificativa do pedido de renovação, se for o caso. Excelente bolsista, totalmente envolvida nas atividades do projeto e com boa carga de reflexão teórica. Apresenta responsabilidade, envolvimento e capacidade de amadurecimento teórico-metodológico. DATA : 10 / 08 / 2015 ASSINATURA DO ORIENTADOR ASSINATURA DO ALUNO
19 INFORMAÇÕES ADICIONAIS: Em caso de aluno concluinte, informar o destino do mesmo após a graduação. Informar também em caso de alunos que seguem para pós-graduação, o nome do curso e da instituição.
20 FICHA DE AVALIAÇÃO DE RELATÓRIO DE BOLSA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA O AVALIADOR DEVE COMENTAR, DE FORMA RESUMIDA, OS SEGUINTES ASPECTOS DO RELATÓRIO : 1. O projeto vem se desenvolvendo segundo a proposta aprovada? Se ocorreram mudanças significativas, elas foram justificadas? 2. A metodologia está de acordo com o Plano de Trabalho? 3. Os resultados obtidos até o presente são relevantes e estão de acordo com os objetivos propostos? 4. O plano de atividades originou publicações com a participação do bolsista? Comentar sobre a qualidade e a quantidade da publicação. Caso não tenha sido gerada nenhuma, os resultados obtidos são recomendados para publicação? Em que tipo de veículo? 5. Comente outros aspectos que considera relevantes no relatório 6. Parecer Final: Aprovado ( ) Aprovado com restrições ( Reprovado ( ) ) (especificar se são mandatórias ou recomendações) 7. Qualidade do relatório apresentado: (nota 0 a 5) Atribuir conceito ao relatório do bolsista considerando a proposta de plano, o desenvolvimento das atividades, os resultados obtidos e a apresentação do relatório. Data : / /. Capítulo 1 Assinatura do(a) Avaliador(a)
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