Nacionalização Partidária e Concentração Estadual dos Partidos Brasileiros 1

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1 Nacionalização Partidária e Concentração Estadual dos Partidos Brasileiros 1 Introdução Carlos Machado 2 Universidade Federal de Minas Gerais Brasil Filipe Recch 3 Fundação João Pinheiro - Brasil Dentro do debate sobre a nacionalização dos partidos brasileiros é recorrente a abordagem a partir da observação do padrão de coligações (Krause, 2005; Ribeiro, 2005). Entretanto, são poucos os estudos que compreendem a capacidade de participação ou mesmo a efetividade eleitoral dos diversos partidos brasileiros em meio às eleições municipais. Para considerar a dispersão ou concentração da força política dos partidos brasileiros no embate político-partidário foi desenvolvido o índice de efetividade eleitoral (IEE), aplicados às eleições municipais ocorridas em 2000 e O IEE permitirá avaliar o impacto que cada partido possui dentro e cada estado, indicando a ocorrência de concentração estadual ou dispersão nacional dos partidos. A avaliação longitudinal permitirá perceber a fluidez ou cristalização dos contextos políticos locais, contribuindo para o refinamento das medidas que buscam caracterizar a existência de sub-sistemas partidários dentro da organização federativa brasileira (Lima Júnior, 1982). O presente trabalho busca prover mais uma dimensão descritiva para a interpretação do sistema partidário brasileiro, com o intuito de futuramente utilizar a medida aqui 1 A proposta inicial do estudo abordaria as eleições de 2008, porém, até o momento da finalização deste paper os dados do Tribunal Superior Eleitoral ainda apresentavam grandes inconsistências, como a indicação de mais de um prefeito eleito para um mesmo município, o que impossibilitou a inclusão da referida eleição no estudo. Também era previsto a utilização de um índice que considerasse a capacidade dos partidos concorrerem às eleições, porém os resultados desse índice não apresentaram diferença relevante em comparação com o índice de efetividade eleitoral utilizado no presente texto. 2 Estudante de doutorado da pós-graduação em ciência política daufmg e bolsista Fapemig. 3 Estudante de mestrado da pós-graduação em administração pública da Fundação João Pinheiro e bolsista CNPq.

2 proposta para explicar o comportamento dos partidos políticos e também do eleitorado. Ainda cabe ressaltar que o estudo ainda se encontra na fase inicial de sua elaboração. Sistemas partidários e nacionalização O sistema partidário brasileiro se caracteriza pela existência de uma grande quantidade de partidos políticos e pela elevada fragmentação eleitoral. Por essas características, a interpretação sobre o formato do sistema partidário brasileiro e as implicações que esse possui sobre a vida político-partidária surge como um desafio de grande complexidade ao qual se soma a magnitude territorial brasileira e a diversidade sócio-econômica existente nesse cenário. Para abordar a variação entre os sistemas partidários no mundo, Sartori (1976) busca distinguir duas dimensões: o número de partidos e a polarização entre os mesmos. A partir da tipologia criada por essa abordagem, é possível classificar o sistema partidário brasileiro como altamente fragmentado e com alto grau de polarização. Entretanto, o objetivo principal por trás do estudo de Sartori não era abordar o conceito específico de sistema partidário, mas diferenciar sistemas pluralistas competitivos de sistemas de partido único (Bardi e Mair, 2008: 150). Segundo Bardi e Mair (2008: 151), por trás da abordagem de Sartori há o pressuposto de que a existência de mais de um partido político em um sistema implicaria, necessariamente, na interação entre estas organizações, premissa recorrente nos estudos partidários. Entretanto, atribuir e ter a expectativa de que as organizações partidárias apresentem ações segundo pressupostos não analisados empiricamente pode levar a erros de interpretação nos estudos partidários (Panebianco, 1982). O conceito de sistema partidário não designa apenas o conjunto de partidos em dados cenários políticos, mas trata também das relações e interação entre estas organizações (Bardi e Mair, 2008: 151), inclusive com variações de subsistemas. Bardi e Mair (2008) ressaltam a importância de observar diferentes dimensões para se compreender a ação e relação dos partidos dentro de países distintos, sendo essas: vertical decorrente do apoio eleitoral baseado em clivagens sociais, horizontal variações

3 territoriais e de nível de governo; e funcional relativa aos constrangimentos impostos à ação partidária devido a regras da arena em que se a atua. O presente estudo busca trabalhar a dimensão horizontal, enquanto componente da caracterização dos sistemas partidários. O efeito horizontal se caracteriza pela existência de vários níveis de governo (e de competição eleitoral) 4 (Bardi e Mair, 2008: 156), contexto do qual podem ocorrer ou o predomínio do nível nacional, enquanto principal orientação do comportamento dos partidos políticos, ou haver variação regional. Dessa última possibilidade é possível distinguir duas situações; na primeira existiriam partidos inexpressivos nacionalmente com força regional, na segunda mesmo quando os partidos coexistissem em todas as esferas poderia haver a distribuição desigual da força dos partidos entre os níveis de concorrência política. A dimensão horizontal já faz parte dos questionamentos dos estudiosos brasileiros desde que Souza (1976) buscou tratar da questão da nacionalização dos partidos políticos e observou forte variação regional do impacto dos partidos políticos nos estados durante o período democrático de 1945 a Krause (2005), por sua vez, observou baixa correlação entre as coligações para governador e presidente realizados pelos partidos políticos, com o intuito de avaliar a nacionalização dos partidos políticos. Porém, a própria autora ressalta ser necessário considerar também a força política dos partidos em cada eleição (Krause, 2005: 116). Ribeiro (2005) aborda a questão da nacionalização através do índice de nacionalização (INA) por meio do qual observa haver um alto grau de nacionalização entre os partidos políticos ao se considerar os 800 municípios de maior parte no Brasil. Como já observou Lima Júnior (1983), é possível falar de subsistemas partidários no Brasil, o que caracteriza a relevância da dimensão horizontal para compreender a dinâmica interpartidária. Os partidos brasileiros se encontram dentro da estrutura federativa, e apresentam variação em suas estratégias de acordo com o contexto específico do nível em que ocorre a disputa ou do tipo de eleição, se majoritário ou proporcional. Se para um observador desatento essas condições atestam um sistema político caótico, deve-se ressaltar que o resultado da pesquisa social na área da política deve ser orientado pela 4 Tradução do autor.

4 compreensão dos mecanismos lógicos que orientam a ação dos agentes compreender a lógica da ação dos agentes políticos. O objetivo deste estudo é abordar a dimensão horizontal, considerada por Bardi e Mair, e especificá-la de forma a se poder trabalhar com ela empiricamente no nível municipal brasileiro. A inclusão desse fator na análise do sistema partidário brasileiro permitirá acrescentar a força político-eleitoral dos partidos nos trabalhos que investiguem a dinâmica dos subsistemas partidários no Brasil. A princípio a força política pode ser expressa como a porcentagem de votos recebidos por um partido político. Entretanto, ao se considerar que um partido concorre em mais de um nível e em diferentes distritos, evidencia-se que a quantidade de votos não é suficiente para retratar a realidade da competição partidária. É possível distinguir sobre a força política dos partidos a partir da forma como participam das eleições a prefeito. Uma vez sendo possível realizar coligações nas eleições brasileiras, é razoável considerar que há diferença no fato de um partido ganhar isoladamente uma eleição ou ganhar apoiando um candidato de outro partido. Uma vez que o cargo de prefeito possui muito mais impacto político na vida municipal do que os vereadores, devido às restrições legais, é crucial considerar a participação eleitoral dos partidos na eleições majoritária municipal. Índice de Efetividade Eleitoral Foram selecionados para a pesquisa os três maiores partidos nas eleições de 2000 e o PT, por ser um partido com forte crescimento nos últimos anos no nível municipal, o que é atestado pela eleição do atual presidente brasileiro, Luís Inácio Lula da Silva, em Como já foi exposto anteriormente, será dado um peso diferenciado para os valores referentes à eleição para prefeito, por este cargo possuir maior impacto sobre a política local do que o posto de vereador. O índice é composto pela combinação dos resultados eleitorais para prefeito e para vereador. Uma vez que o índice trata especificamente da força eleitoral do partido, só foram considerados para a composição do índice os resultados em que os candidatos do partido

5 foram vitoriosos. A forma como o partido se apresentou para a disputa de prefeituras foi tomada em consideração ao atribuir maior ou menos peso à vitória obtida pelo partido. Ao concorrer isoladamente à prefeitura, era dado o valor (1,00), concorrer como cabeça-dechapa de uma coligação equivalia a (0,75) e concorrer em uma coligação encabeçada por outro partido ganha-se (0,25). É dado peso dois ao valor atribuído à força do partido na eleição para prefeito. Soma-se a esse fator a proporção de cadeiras ganhas pelo partido na eleição da câmara de vereadores, à qual se atribui peso um. Do somatório de ambos os valores faz-se uma divisão por três, da qual o resultado é o índice de efetividade de eleitoral, que possui uma variação teórica entre (0) e (1), sendo o valor (1) o equivalente ao predomínio total do partido, tanto na eleição para vereador como na de prefeito, enquanto o valor (0) indica à fraqueza eleitoral máxima, sem contar ao menos com um representante no legislativo local. É necessário considerar duas questões conjunturais para compreender melhor o contexto analisado. Nas eleições ocorridas em 2000, o PT pode ser considerado um partido de pequeno porte no nível municipal, apesar de sua relevância nos demais níveis, em especial no âmbito federal. Assim sendo, é de se esperar que os valores da força eleitoral desse partido sejam bastante reduzidos quando comparado às demais organizações selecionadas. A passagem da chefia do executivo federal do PSDB, em 2000, para o PT, em 2004, também afeta consideravelmente a distribuição da força política dos partidos, inclusive com um forte declínio da avaliação da popularidade do presidente Fernando Henrique Cardoso durante o ano de 2000 (Machado, 2007). Nas eleições de 2000, o PMDB se apresenta como o partido mais relevante eleitoralmente na região Sul, assim como na Sudeste exceto em São Paulo, onde ocorre um predomínio do PSDB. O Nordeste do país apresenta a distribuição da principal força eleitoral entre PFL e PDMB. As regiões Centro-Oeste e Norte não apresentam predomínio de nenhum partido em particular, de modo que é na região Norte que se encontra o único estado da federação onde o PT exerce predomínio nas eleições municipais, o Acre menor unidade da federação do ponto de vista populacional.

6 Tabela 1: média do índice de efetividade eleitoral dos partidos selecionados em 2000, por estado uf PMDB PFL PSDB PT PR 0,20 0,21 0,16 0,05 RS 0,28 0,05 0,06 0,07 SC 0,34 0,21 0,14 0,05 ES 0,21 0,17 0,12 0,04 MG 0,24 0,19 0,19 0,05 RJ 0,16 0,10 0,10 0,05 SP 0,18 0,16 0,24 0,06 AL 0,16 0,15 0,16 0,02 BA 0,12 0,26 0,08 0,02 CE 0,10 0,09 0,32 0,03 MA 0,20 0,27 0,09 0,02 PB 0,34 0,28 0,19 0,03 PE 0,22 0,22 0,16 0,05 PI 0,21 0,27 0,18 0,01 RN 0,31 0,21 0,06 0,01 SE 0,20 0,24 0,12 0,04 GO 0,24 0,18 0,28 0,03 MS 0,27 0,13 0,15 0,14 MT 0,18 0,21 0,13 0,05 AC 0,22 0,15 0,08 0,26 AM 0,20 0,24 0,14 0,03 AP 0,12 0,09 0,08 0,06 PA 0,21 0,08 0,24 0,06 RO 0,22 0,17 0,15 0,11 RR 0,12 0,26 0,03 0,02 TO 0,13 0,36 0,18 0,03 média 0,22 0,19 0,17 0,05 d.p. 0,25 0,23 0,23 0,12 Fonte: o autor, a partir dos dados eleitorais disponibilizados pelo TSE Na média de todos os municípios PMDB se apresenta como aquele mais forte eleitoralmente, enquanto o PT praticamente inexiste nesse nível eleitoral. É importante ressaltar que em 2000 PMDB era o único partido a concorrer na quase totalidade dos municípios (Machado, 2007), o que favorece com que tenha um resultado melhor que os demais partidos. Ao se comparar os resultados de 2000 com os de 2004, observam-se duas situações importantes.

7 Tabela 2: média do índice de efetividade eleitoral dos partidos selecionados em 2004, por estado uf PMDB PFL PSDB PT PR 0,25 0,12 0,16 0,11 RS 0,27 0,05 0,06 0,12 SC 0,34 0,18 0,14 0,09 ES 0,15 0,11 0,12 0,11 MG 0,17 0,16 0,19 0,11 RJ 0,30 0,10 0,10 0,10 SP 0,16 0,15 0,24 0,10 AL 0,16 0,07 0,16 0,05 BA 0,08 0,29 0,08 0,06 CE 0,14 0,08 0,32 0,09 MA 0,18 0,21 0,09 0,08 PB 0,21 0,21 0,19 0,07 PE 0,20 0,21 0,16 0,09 PI 0,20 0,23 0,18 0,07 RN 0,22 0,19 0,06 0,04 SE 0,13 0,28 0,12 0,08 GO 0,19 0,12 0,28 0,09 MS 0,18 0,12 0,15 0,21 MT 0,12 0,17 0,13 0,10 AC 0,10 0,08 0,08 0,34 AM 0,14 0,13 0,14 0,09 AP 0,11 0,06 0,08 0,15 PA 0,16 0,10 0,24 0,12 RO 0,17 0,12 0,15 0,15 RR 0,13 0,11 0,03 0,13 TO 0,16 0,20 0,18 0,14 média 0,19 0,16 0,16 0,10 d.p. 0,22 0,20 0,21 0,16 Fonte: o autor, a partir dos dados eleitorais disponibilizados pelo TSE A primeira é a de que há pouca variação quanto a qual o partido predominante em cada estado. Do total de 26 estados, apenas em quatro ocorreu modificação do partido mais relevante eleitoralmente no nível municipal. Outro dado interessante é que apesar de se poder falar de um quadro razoavelmente estável nos estados, ocorreram variações consideráveis do IEE, tal como o declínio do PFL e do PMDB no Amazonas e na Paraíba, respectivamente, bem como o aumento da força do PT em todos os estados, mesmo que ainda numa posição fraca.

8 Nos dois anos analisados também fica evidente que os partidos políticos possuem ênfase muito diversificada nas diferentes unidades da federação. Em termos da nacionalização dos partidos talvez seja possível considerar que o PT possui uma capacidade eleitoral mais homogênea em todos os estados, porém ainda assim insípida do ponto de vista do sucesso eleitoral. PMDB, PFL e PSDB apresentam maior variação quanto à capacidade eleitoral. PSDB apresenta um padrão diferenciado desse conjunto de partidos por apresentar claramente bastiões eleitorais no Ceará, São Paulo, Goiás e Pará, onde apresenta valores médios do IEE muito superiores à média nacional do partido. Entretanto a média esconde fortes variações existentes da força de cada partido em um mesmo estado. Para abordar essa questão com maior precisão foram acrescentados box plot da variação do IEE por região para cada partido político em anexo.

9 Bibliografia BARDI, Luciano; Peter Mair. (2008), The Parameters of party systems. Party Politics, v. 14, n. 2, pp KRAUSE, Silvana, (2005), KRAUSE, Silvana; SCHMITT, Rogério (orgs.), Partidos e coligações eleitorais no Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Konrad Adenauer; São Paulo: Fundação Editora da Unesp. LIMA JÚNIOR, Olavo Brasil. (1983), Os Partidos Políticos Brasileiros: a experiência federal e regional ( ). Rio de Janeiro: Graal. MACHADO, Carlos. (2007), Identidades Diluídas: coligações para prefeito no Brasil. (2000 e 2004). Brasília: UnB. (Dissertação) PANEBIANCO, Angelo. (2005 [1982]), Modelos de Partido. Organização e poder nos partidos políticos. São Paulo: Martins Fontes. RIBEIRO, José Floriano. (2005), Acordos Partidários nacionais, reflexos locais: o presidencialismo de coalizão enquanto fator estruturante das alianças eleitorais. Comunicação apresentada na 1ª Sessão do GT nº 7 - Estudos Legislativos, XXIX Encontro Anual da ANPOCS. SARTORI, Giovanni. (1982 [1976]). Partidos e sistemas partidários. Rio de Janeiro: Zahar Editores; Brasília: Editora Universidade de Brasília. SOUZA, Maria do Carmo Campello de. (1976), Estado e partidos políticos no Brasil (1930 a 1940). São Paulo: Alfa-Ômega.

10 Anexo 1 Box Plot do IEE das eleições de 2000

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12 Anexo 2 Box Plot do IEE das eleições de 2004

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