LARVAS DE Contracaecum sp. (NEMATODA: ANISAKIDAE) EM Hoplias RESERVATÓRIOS DE ABASTECIMENTO NO ESTADO DO PARANÁ

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1 LARVAS DE Contracaecum sp. (NEMATODA: ANISAKIDAE) EM Hoplias malabaricus (OSTEICHTHYES: ERYTHRINIDAE) PROVENIENTES DE TRÊS RESERVATÓRIOS DE ABASTECIMENTO NO ESTADO DO PARANÁ Marcelo Mazzucco Cechinel*, Fábio Kis Almada, Maurício Laterça Martins, Gabriela Tomas Jerônimo, Natália da Costa Marchiori e Felipe do Nascimento Vieira * Laboratório de Diagnóstico e Patologia em Aqüicultura (LADPAq), CCA/UFSC, Rod SC 404, Km 3, CEP Florianópolis, SC. samurai.mazzucco@gmail.com Resumo Foram larvais de Contracaecum sp. (Nematoda: Anisakidae) foram observadas em Hoplias malabaricus capturados em reservatórios de Usinas Hidrelétricas no Estado do Paraná. Popularmente conhecida como traíra, H. malabaricus é carnívoro, predador e muito resistente às variações ambientais, sendo, por isso, considerado uma espécie com potencial para a piscicultura. Para avaliar o parasitismo dessas larvas de nematóides na traíra, um total de 80 peixes foram coletados em três reservatórios de Usinas Hidrelétricas, Iraí (n=42), Passaúna (n=13) e Piraquara (n=25), no período entre o inverno e a primavera de Dados referentes à qualidade de água como temperatura, transparência, oxigênio e ph foram medidos com termômetro, disco de Secchi, oxímetro e peagâmetro, respectivamente. Os índices de prevalência (P%), intensidade média de infecção (IMI) e desvio padrão foram calculados para cada reservatório, no inverno e primavera, separadamente. A concentração de oxigênio dissolvido na água de fundo em Iraí foi ligeiramente menor no inverno em relação aos outros dois reservatórios, bem como a sua transparência. Todos os peixes analisados encontraram-se parasitados, com intensidade média de 20,5±9,11 (7 a 36) em Iraí (inverno) e 32,47±13,46 (6 a 49) Iraí (Primavera), 20,47±17,98 (2 a 76) em Piraquara (Inverno) e 50,45±32,78 (9 a 137) (Primavera) e 58,57±80,70 (16 a 223) Passaúna (Inverno) e 18,57±14,81 (2 a 44) (Primavera). Tanto em Iraí quanto em Piraquara houve aumento na intensidade média da parasitose com o início da primavera, o mesmo não se confirmando em Passaúna. Os altos índices de prevalência e intensidade média podem sugerir que H. malabaricus esteja atuando como principal recurso hospedeiro intermediário deste parasito. Registros prévios evidenciando potencial zoonótico em outras espécies da Família, atribuem importância à essa parasitose. Introdução O aumento no número de reservatórios nas últimas décadas, com o objetivo principal de armazenamento de água, possibilitou durante muito tempo a prática da pesca esportiva nestes ambientes. Contudo, os impactos dessas grandes construções influenciam a biologia de diversas espécies de peixes e, conseqüentemente, a dos parasitos. Como a maioria dos endoparasitos apresenta complexo ciclo de vida, envolvendo hospedeiros intermediários e definitivos e é transmitido ao longo da cadeia alimentar, esses organismos podem ser indicadores de mudanças ocorridas tanto no ambiente como na comunidade de peixes. (Takemoto et al., 2005). Hoplias malabaricus, comumente conhecido como traíra, distribuem-se nas regiões tropicais e subtropicais da América do Sul (Paiva, 1974). São peixes carnívoros, predadores e com alta rusticidade, sendo considerado uma espécie de grande potencial para a piscicultura.

2 Alguns parasitos também são uma ameaça para a saúde publica (Smith & Noga, 1993). Existem nematóides de peixes que, se ingeridos pelo homem, podem trazer conseqüências desde brandas até mesmo severas. Segundo Moraes & Martins (2004) a ocorrência dessas zoonoses está diretamente relacionada ao hábito alimentar do ser humano, ou seja, o consumo de peixes contendo formas larvais de parasitos que podem desenvolver-se no, ou ter o comportamento do tipo larva migrans. No Brasil, nematóides do gênero Contracaecum sp. foram observados em Pimelodella lateristriga e Acestrorhamphus sp. (Travassos et al., 1928); em Astyanax bimaculatus, A. fasciatus e A. schubarti do rio Mogi Guaçu, São Paulo (Kloss, 1966); em Scomberomorus cavalla e S. maculatus do Ceará (Klein, 1973); em Harengula clupeola da Bahia (Guimarães & Cristofaro, 1974); em Macrodon ancylodon do Maranhão (Vicente & Fernandes, 1978); em Hoplias malabaricus do Rio de Janeiro (Fabio, 1982); em Pomatomus saltatrix do Rio de Janeiro (Rego et al., 1983); em Acestrorhamphus macrolepis, Bergiaria sp., Crenicichla lepidota, Geophagus brasiliensis, H. malabaricus e Pimelodus ortmanni da Bacia do rio Iguaçu (Kohn et al., 1988); em Pseudoplatystoma fasciatum do Mato Grosso (Eiras & Rego, 1989); em Galeocharax humeralis, G. knerii, Rhaphiodon vulpinus, H. malabaricus, Plagioscion squamosissimus e C. lepidota do rio Paraná (Moravec et al., 1993); em P. corruscans e Cichla monoculus da região de Porto Rico, rio Paraná (Machado et al., 1996, 2000); em Pagrus pagrus e Caranx latus do Rio de Janeiro (Luque & Alves, 2001); em Lutjanus purpureos e Coryphaena hippurus do litoral Nordeste do Brasil (Barros & Cavalcanti, 1998), e em H. malabaricus e Hoplerythrinus unitaeniatus no Maranhão (Martins et al., 2003, 2005). Portanto, o conhecimento das relações entre parasito/hospedeiro/ambiente fornece informações sobre a aquisição de formas infectantes e de como o peixe influencia e é influenciado pelas populações de parasitos que hospeda, assim como, informações do próprio meio ambiente em que estão inseridos. O presente estudo teve como objetivo caracterizar a infecção por larvas de Contracaecum sp. em traíra, Hoplias malabaricus, dos três principais reservatórios de abastecimento de água da Região Metropolitana de Curitiba. Material e Métodos Em julho de 2006 iniciaram-se coletas mensais nos reservatórios de Iraí, Piraquara e Passaúna até ao final da primavera. Os peixes foram capturados com rede identificados, medidos e pesados, para exame parasitológico segundo Ghiraldelli et al. (2006). As amostras já identificadas foram encaminhadas ao Setor de Parasitologia do Laboratório de Diagnóstico e Patologia em Aqüicultura (CCA) da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC, para caracterização da população parasitária e análise estatística. Durante todas as coletas a campo também foram registrados os seguintes parâmetros físico-químicos da água local: temperatura; ph; oxigênio dissolvido, e transparência. Os valores da taxa de prevalência e intensidade média foram calculados segundo Bush et al. (1997).

3 Resultados e Discussão Os valores referentes aos dados biométricos de H. malabaricus estão na Tabela 1. Tabela 1. Valores médios e desvio padrão dos dados biométricos de Hoplias malabaricus capturados nas três usinas hidrelétricas, Paraná. Iraí Peso (g) Comprimento (cm) Inverno 403,2±198,4 31,5±5,8 Primavera 355,0±140,76 30,4±3,84 Passaúna Peso (g) Comprimento (cm) Inverno 622,3±353,5 127,7± 217,24 Primavera 407,7±185,0 32,2 ±4,5 Piraquara Peso (g) Comprimento (cm) Inverno 325,1±143,6 30,0±3,9 Primavera 432,2±161,5 33,27± 3,5 A concentração de oxigênio dissolvido na água de fundo em Iraí foi ligeiramente menor no inverno em relação aos outros dois reservatórios, bem como a sua transparência (Tabela 2). Os demais parâmetros permaneceram constantes nas duas estações. Tabela 2. Parâmetros físico-químicos da água das três usinas hidrelétricas, Paraná. Estações T C superfície T C fundo Transparência (m) Oxigênio (mg/l) sup Oxigênio (mg/l) fundo Ph superfície ph fundo Iraí Inverno 17,2±2,2 16,4±1,7 0,4±0,1 8,9±0,5 6,6±2,8 8,3±0,7 8,1±0,7 Pirmavera 22,4±3,0 21,4±2,1 0,3±0,1 9,6±2,4 8,3±2,6 9,4±0,4 9,2±0,3 Passaúna Inverno 18,2±1,6 17,4±1,4 2,3±0,5 8,3±1,0 8,3±1,3 7,9±0,3 8,0±0,7 Pirmavera 22,8±3,9 22,3±3,0 2,6±0,7 10,3±1,7 10,2±1,1 8,9±0,6 8,8 ±0,6 Piraquara Inverno 18,1±1,4 18,9±1,4 2,0±0,1 8,2±1,0 8,1±0,9 7,9±0,6 7,2±0,6 Pirmavera 21,2±1,4 21,2±1,1 2,2±0,4 9,6±1,4 9,1±1,3 7,3±0,3 7,4±0,3 As reservas de Iraí e Piraquara apresentaram um aumento na intensidade média da parasitose (20,5 para 32,47) e (20,47 para 50,45), respectivamente (Tabela 3). Larvas de Contracaecum sp. são comumente encontradas em traíras do litoral brasileiro (Martins et al., 2005; Martins et al., 2003; Weiblen & Brandão, 1992; Fabio, 1982). Martins et al. (2003), estudando Contracaecum sp. em H. malabaricus, relatou prevalência de 70% e intensidade média de 9.5 para essa parasitose, sendo mais elevada do que as descritas por outros autores (Wootten, 1978; Valtonen et al., 1988; Moravec et al., 1995, 1997 APUD Martins et al., 2003). Weiblen & Brandão (1992) relataram valores de até 66,9%. O presente trabalhou encontrou prevalência (100%) e intensidade média (58,57), valores superiores aos citados por outros autores.

4 Tabela 3. Índices parasitários das três usinas hidrelétricas. Prevalência Iraí Intensidade Média Inverno 100% 20,5 ±9,91 (7 a 36) Primavera 100% 32,47 ±13,46 (6 a 49) Piraquara Prevalência Intensidade Média Inverno 100% 20,47 ±19,98 (2 a 76) Primavera 100% 50,45 ±32,78 (9 a 137) Passaúna Prevalência Intensidade Média Inverno 100% 58,57 ±80,7 (16 a 223) Primavera 100% 18,57 ±14,81 (2 a 44) É conhecido (Martins et al., 2005; Wharton et al., 1999) o potencial zoonótico que larvas Anisakídeas adquirem quando parasitando humanos. Tais larvas, normalmente encontradas no mesentério dos peixes, podem migrar para os músculos após a morte de seu hospedeiro. Isso pode ter implicações importantes em humanos, visto seu grau de patogenicidade, incluindo diarréias, vômitos e náuseas (Bouree et al., 1995). Conclusão Os altos índices de intensidade média e prevalência encontrados no presente trabalho sugerem que Hoplias malabaricus esteja atuando como o principal recurso hospedeiro intermediário desse parasito. Registros prévios evidenciando potencial zoonótico em outras espécies da Família, atribuem importância à parasitose. Referências BARROS, G.C.; CAVALCANTI J.W. Larvas infectantes de anisakídeos em peixes de elevado consumo, provenientes do litoral do Nordeste do Brasil. Higiene Alimentar, v. 12, n. 58, p , BOUREE, P.; PAUGAN, A.; PETITHORY, J. C Anisakidosis: report of 25 cases and review of the literature. Comp. Immunol. Micro-biol. Inf. Dis., v. 18, p , BUSH, A.O.; LAFFERTY, K.D.; LOTZ, J.M.; SHOSTAK, A.W. Parasitology meets ecology on its own terms. Margolis et al. Revisited. J. Parasitol., v. 83, n. 4, p , EIRAS, J.C; REGO, A.A. Histopatologia em peixes resultante de infecções parasitárias. Publicações do Instituto de Zoologia Dr. Augusto Nobre, Portugal, v. 208, p. 1-11, FABIO, S. P. Sobre alguns Nematoda Parasitos de Hoplias malabaricus. Arq. Univ. Fed. Rur. Rio de Janeiro, Itaguaí, v. 5, n. 2, p , GHIRALDELLI, L.; MARTINS, M.L.; JERONIMO, G.T.; YAMASHITA, M.M.; ADAMANTE, W. B. Ectoparasites communities from Oreochromis niloticus cultivated in the State of Santa Catarina, Brazil. Journal Of Fisheries And Aquatic Sciences, New York, v. 1, p , 2006.

5 KLEIN, V. L. Helmintos parasitos das espécies Scomberomorus cavalla (Cuvier) e Scomberomorus maculatus (Mitchill) do litoral Cearense. Contracecum fortalezae sp. n. (Nematoda, Ascaridoidea). Mem. Ist. Oswaldo Cruz, v. 71 n. 1/2, p , KLOSS G.R., Helmintos parasitos de espécies simpátricas de Astyanax (Pisces: Characidae). Pap. Avulsos Dep. Zool. SP, v. 18, p , KOHN, A.; FERNANDES, B.M.M.; PIPOLO, H.V; GODOY, M.P. Helmintos parasitos de peixes das Usinas Hidrelétricas Eletrosul (Brasil). II. Reservatórios de Salto Osório e de Salto Santiago, Bacia do Rio Iguaçu. Mem. Inst. Oswaldo Cruz, v. 83, n. 3, p , LUQUE, J.L.; ALVES, D.R. Ecologia das comunidades de metazoários parasitos do xaréu, Caranx hippos (Linnaeus) e do xerelete, Caranx latus Agassiz (Osteichthyes, Carangidae) do litoral do Estado do Rio de Janeiro, Brasil. Rev. Bras. Zool., v. 18, n. 2, p , MACHADO, M.H.; PAVANELLI, G.C.; TAKEMOTO, R.M. Structure and diversity of endoparasitic infracommunities and the trophic level of Pseudoplatystoma corruscans and Schizodon borelli (Osteichthyes) of the High Paraná River, Brazil. Mem. Inst. Oswaldo Cruz, v. 97, n. 4, p , MACHADO, P.M.; ALMEIDA, S.C.; PAVANELLI, G.C.; TAKEMOTO, R.M. Ecological aspects of endohelminths parasitizing Cichla monoculus Spix, 1831 (Perciformes: Cichlidae) in the Paraná River near Porto Rico, State of Paraná, Brazil. Comp. Parasitol., v. 67, n. 2, p , MARTINS M.L., SANTOS R.S., MARENGONI N.G., TAKAHASHI H.K., FUJIMOTO R.Y. Infection and susceptibility of three fish species from the Paraná River, Presidente Epitácio, SP, Brazil to Contracaecum sp. larvae (Nematoda: Anisakidae). Acta Scientiarum, v. 25, n. 1, p , MARTINS, M.L.; ONAKA, E.M.; FENERICK JR., J. Larval of Contracaecum sp. (Nematoda: Anisakidae) in Hoplias malabaricus and Hoplerythrinus unitaeniatus (Osteichthyes: Erythrinidae) of economic importance in occidental marshlands of Maranhão, Brazil. Vet. Parasitol., v. 127, p , MORAES, F. M; MARTINS, M. L. Condições predisponentes e principais enfermidades de teleósteos em piscicultura intensiva. In: CYNIRO, J. E. O; URBINATI, E. C. ; FRACALOSSI, D. M. e CASTAGNOLLI, N. Tópicos Especiais em Piscicultura de Água Doce Tropical Intensiva. São Paulo: TecArt, cap 12. p MORAVEC, F.; KOHN, A.; FERNANDES, B.M.M. Nematode parasites of fishes of the Paraná River, Brazil. Part 2. Seuratoidea, Ascaridoidea, Habronematoidea and Acuarioidea. Folia Parasitologica, v. 40, p , PAIVA, M. P. Crescimento, alimentação e reprodução da traíra, Hoplias malabaricus (Bloch), no nordeste brasileiro. Tese de Doutorado. Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, Ceará. 32p, REGO, A.A.; VICENTE, J.J.; SANTOS, C.P.; WEKID, R.M. Parasitas de achovas Pomatomus saltatrix (L.) do Rio de Janeiro. Ci. Cult., v. 35, n. 9, p , 1983.

6 SMITH, S.A.; NOGA, E.J.; LEVY, M.G.; Gerig T.M. Effect of serum from the fish, Oreochromis aureus, immunized with dinospores of the parasitic dinoflagellate, Amyloodinium ocellatum, on the motility, infectivity and growth of the parasite in cell culture. Diseases of Aquatic Organisms, v. 15, p , TAKEMOTO, R.M.; PAVANELLI, G.C.; LIZAMA, M.L.A.P.; LUQUE, J. L.; POULIN, R. Host density as a major determinant of endoparasite species richness in fishes of floodplain of the upper Parana River, Brazil. Journal of Helminthology, Carolina do Norte, v. 79, n. 1, p , TRAVASSOS, L.; ARTIGAS, P.; PEREIRA C. Fauna helmintológica dos peixes de água doce do Brasil. Arch. Inst. Biol., v. 1, p. 5-67, VICENTE, J.J.; FERNANDES G.L. Contribuição ao conhecimento de Bagre bagre (Linnaeus, 1766) Fowler, 1841 e de Macrodon ancylodon (Bloch, 1801) Jordan, Evermann e Clark, 1930 no litoral da ilha de São Luís, Estado do Maranhão, Brasil. Bol. Lab. Hidrobiol., v. 2, n. 1, p , WEIBLEN, A. M., BRANDÃO, D. A. Levantamento parasitológico em Hoplias malabaricus, Bloch. (1794) (traíra) de águas da região de Santa Maria RS. Ciência Rural, Santa Maria, v. 22, n. 2, p , WHARTON, D. A.; HASSAL, M. L.; AALDERS, O. Anisakis (Nematoda) in some New Zealand inshore fish. N. Z. J. Mar. Freshwater Res., v. 33, p , 1999.