RESERVATÓRIO DE ÁGUA DE CHUVA: DIMENSIONAMENTO E ECONOMIA DE ÁGUA POTÁVEL RAINWATER RESERVOIR: DIMENSIONING AND DRINKING WATER ECONOMY

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1 RESERVATÓRIO DE ÁGUA DE CHUVA: DIMENSIONAMENTO E ECONOMIA DE ÁGUA POTÁVEL Gedson Silva Cunha 1 *; Marllus Gustavo Ferreira Passos das Neves 2 Resumo A discussão sobre o uso racional da água vem se intensificando nesses últimos tempos, onde uma das formas de racionalizar esse recurso é sua substituição por água de chuva, prática essa considera milenar. Porém, em áreas urbanas, essa técnica de coleta de água de chuva não encontra-se bem difundida. Nesse trabalho, a partir de técnicas recomendadas pela norma NBR /07, foi realizado o dimensionamento de reservatórios de água de chuva, considerando uma série de precipitação de aproximadamente 55 anos e uma demanda por essa água de 42 litros por dia, equivalente 7 acionamentos diários de descarga de caixa acoplada de 6 litros, em um lote real. Em seguida foram realizadas simulações (balanço hídrico) onde foi avaliada o potencial de economia de água potável a partir da substituição dessa pela água de chuva. Os resultados do dimensionamento, a partir dos diferentes métodos, apontaram divergências. Foi possível observar uma economia considerável, entre 7,22 a 9,07 %, de água potável mesmo considerando como demanda apenas do acionamento da descarga. Palavras-Chave água de chuva, reservatório, economia. RAINWATER RESERVOIR: DIMENSIONING AND DRINKING WATER ECONOMY Abstract The discussion about the rational use of water has been intensifying in recent times, where one of the ways to rationalize this resource is its replacement by rainwater, a practice considered millenarian. However, in urban areas, this technique of rainwater harvesting is not widespread. In this work, from the techniques recommended by NBR / 07, the design of rainwater reservoirs was carried out, considering a series of precipitation of approximately 55 years and a demand for this water of 42 liters per day, equivalent to 7 drives 6 liters coupled box discharge daily, in a real lot. Simulations were then carried out (water balance), where the potential of saving potable water was evaluated by replacing it with rainwater. The results of the design, from the different methods, indicated divergences. It was possible to observe a considerable saving, from 7.22 to 9.07%, of potable water even considering as demand only the triggering of the discharge. Keywords rainwater, reservoir, economy. 1 Mestrando do Programa de pós-graduação em recursos hídricos e saneamento Ufal, gedsoncunha@gmail.com. 2 Professor do Programa de pós-graduação em recursos hídricos e saneamento Ufal, marllus.neves@ctec.ufal.br. XX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 1

2 INTRODUÇÃO A discussão sobre o uso racional da água vem se intensificando nesses últimos tempos, onde cada vez mais se ouve falar sobre as crises hídricas, causadas pelo uso crescente desse recurso, agravada também pela contaminação das fontes naturais de água potável, como nascentes, rios e aquíferos. Dessa forma, o aproveitamento de águas pluviais é uma opção que pode se mostrar muito atrativa para a minimização dos efeitos de escassez de água nos grandes centros urbanos e também dos custos, gerados pelo consumo de água obtida a partir de fontes tradicionais (Dornelles, 2012; Mierzwa et al., 2007). O uso de cisternas para captar e armazenar água de chuva é praticado há milênios em diversas regiões do mundo (Gnadlinger, 2006). No Brasil, o uso de água de chuva captada e armazenada, embora seja uma prática secular e popular no meio rural, ainda não está bem difundida em áreas urbanas (Andrade Neto, 2013). Um estudo realizado na Alemanha concluiu que a utilização de sistemas de aproveitamento de água de chuva podem reduzir significativamente o consumo de água potável, causando a redução ou até mesmo a eliminação do escoamento superficial (Hermann e Schmida, 2000). Nesse trabalho pretende-se avaliar os efeitos de um reservatório dimensionado para armazenamento de água de chuva, com finalidade de uso para fins não potáveis, em um lote residencial, de forma a diminuir o consumo de água das fontes tradicionais, consequentemente gerando racionalização desse recurso e economia financeira. MATERIAIS E MÉTODOS O primeiro passo do trabalho foi o dimensionamento do reservatório, para isso foram utilizados diferentes métodos apresentados pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), seguindo a NBR /07. Esses métodos utilizam dados como precipitação, demanda, área de superfície de coleta de água, entre outros que serão explicados mais a diante. Quanto aos dados de precipitação, embora exista um pluviômetro no lote onde foi avaliado a implantação do reservatório para águas de chuva, a sua série histórica é muito curta, com pouco mais de um ano. Visto isso, foi avaliada a possibilidade de utilização de um pluviômetro com uma série maior e que pudesse representar a precipitação no local. Para tanto, foi analisado a correlação entre as precipitações do pluviômetro do lote e um pluviômetro mais afastado, porém com uma série histórica maior, de aproximadamente 55 anos. Detalhes sobre os dados de precipitação assim como a correlação entre os postos serão mostrados mais à frente. Após dimensionado o reservatório, foi feito uma simulação, utilizando um balanço hídrico simplificado, considerando como entrada o volume inicial do reservatório e o coletado pela chuva, limitando o volume máximo pelo volume do reservatório, e como saída a demanda de água. Para o início de cada evento de chuva foi desconsiderando o seu primeiro milímetro (considerando como a chuva que lava o ar e a superfície de coleta). Para tal foram utilizados os dados mensais do pluviômetro instalado no lote. Com o resultado da simulação e dados de consumo de água potável no lote (dados mensais), foi possível avaliar a economia de água potável quando substituída pela água de chuva coletada. Esse cálculo foi realizado a partir do produto entre a eficiência do atendimento à demanda e a demanda, seguido da razão entre esse produto e o consumo médio mensal de água potável no lote. Área de estudo A área escolhida para a implantação do reservatório de armazenamento de água de chuva foi a de um lote que encontra-se inserido na bacia hidrográfica do rio Reginaldo, no bairro do Feitosa, XX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 2

3 Maceió-AL. A residência possui duas águas (telhado), um jardim à frente com muro baixo e grades (incluído os portões), conforme a Figura 1, onde se representa as características de uso do solo deste lote, o sentido do escoamento e a localização de equipamentos de monitoramento hidrológico realizado para diversas pesquisas. Material Área (%) Telhado 45,9 Lajota de concreto 43,5 Jardim 1,3 Grama 9,3 Total 100 Figura 1 - Caracterização do local de estudo A partir das informações do lote, determinou-se a área de coleta da água de chuva como sendo de 20,19 m², equivalente à porção do telhado que escoa a água de chuva para a área coberta por lajota de concreto (Figura 2). Dados de precipitação Figura 2 - Área para coleta da água de chuva Os dados de precipitação, utilizados para o dimensionamento do reservatório, foram obtidos do sistema de informações hidrológicas da ANA (HidroWeb), do posto Tabuleiro (código: ), operado pelo INMET, de coordenadas -9:33:4 latitude e -35:46:12 longitude. Esse posto foi escolhido por possuir uma série histórica maior dentre aqueles próximos ao lote. Foram utilizados também os dados de precipitação do pluviômetro indicado na Figura 1. Tratase de um pluviômetro de báscula com registrador automático, com uma série histórica curta de 30/03/2014 a 30/04/2016. Seus dados foram utilizados para um estudo de correlação entre as XX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 3

4 precipitações ocorridas no lote e no posto Tabuleiro. A distância entre esses dois pluviômetros é de aproximadamente 10,3 quilômetros (Figura 3). Consumo mensal de água do lote Figura 3 - Distância entre os pluviômetros Tabuleiro ( ) e Feitosa. O consumo mensal de água na residência pode ser verificado na Tabela 1 abaixo, os dados foram obtidos a partir das medições realizadas pela Companhia de Saneamento de Alagoas (CASAL), as aferições ocorreram numa periodicidade de 30 dias, e as leituras aconteceram, geralmente, no 15º dia do mês. Tabela 1 Consumo mensal de água na residência (m³/mês) Consumo (m³/mês) Período Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez ,00 13,00 14,00 15,00 13,00 12,00 10,00 12,00 13,00 11,00 16,00 14, ,00 14,00 16,00 16,00 13,00 17, Dimensionamento do reservatório Como a série do pluviômetro Feitosa possuía informações de precipitação de um curto período (de 30/03/2014 a 30/04/2016), foi analisada a sua proximidade com a série do Tabuleiro (de 01/01/1961 a 30/04/2016), dentro do mesmo intervalo de tempo, a fim de avaliar a possibilidade da utilização da série do pluviômetro Tabuleiro no dimensionamento do reservatório no lote, onde está instalado o pluviômetro Feitosa. XX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 4

5 Posto - Feitosa Precipitação adimensional Gráfico 1- Precipitação medida no pluviômetro tabuleiro Precipitação (mm) Comum com pluviômetro Feitosa Média 800,00 600,00 400,00 200,00 0, Número do mês Ao criar um gráfico de dispersão entre as medições de precipitação em um período comum nos dois pluviômetros (Gráfico 1), obteve-se um R²=0,87 (Gráfico 2), possibilitando a utilização dos dados mensais do posto do Tabuleiro para o dimensionamento do reservatório. Gráfico 2 Dispersão da precipitação mensal: posto do Tabuleiro x Feitosa Precipitação (mm) y = 1,07x - 1,65 R² = 0, Posto - Tabuleiro O dimensionamento seguiu as recomendações feitas pela NBR /07: Água de chuva Aproveitamento de coberturas em áreas urbanas para fins não potáveis Requisitos (ABNT, 2007). Detalhes sobre essas técnicas podem ser vistos em um estudo feito anteriormente que avaliou as técnicas de dimensionamento (Dornelles et al., 2010). Esses métodos levam em consideração a precipitação, área de coleta da água de chuva, demanda, coeficiente de escoamento superficial, número de meses secos por ano, interceptação da água que molha as superfícies e perdas por evaporação. Os dados de precipitação foram obtidos do pluviômetro Tabuleiro (código: ); a área de coleta da água de chuva foi obtida a partir de levantamentos feitos em estudos anteriores no lote; a demanda foi de 42 L/dia, determinada pelo consumo diário de um vaso sanitário com caixa acoplada (Barreto, 2008); o coeficiente de escoamento superficial foi adotado a partir de valores indicados na literatura para telhados cerâmicos (Tucci et al., 1995; Tomaz, 2003); o número de meses secos por ano foi definido pelo número de meses com precipitações inferiores a 100 milímetros; para o valor de interceptação da água que molha as superfícies e perdas por evaporação foi utilizado o caso geral, 2 milímetros. XX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 5

6 RESULTADOS E DISCUSSÃO Dimensionamento do reservatório O resultado da aplicação dos métodos de dimensionamento de reservatório, em litros e litros por metro quadrado de captação, recomendados pela NBR /07, para a série de precipitação, com dados mensais do posto Tabuleiro encontram-se na Tabela 2. Tabela 2 - Volume do reservatório dimensionado (L) e (L/m²) Litros (L) Volume do reservatório dimensionado Litros por metro quadrado (L/m²) Método da simulação 1.876,31 92,9 Método de Azevedo Neto 8.199,70 406,1 Método prático alemão 919,80 45,6 Método prático inglês 1.626,93 80,6 Método prático australiano 1.876,31 92,9 Como pode-se observar, os métodos da simulação e prático australiano resultaram nos mesmos volumes para o reservatório. Isso aconteceu porque esses métodos são balanços hídricos que levaram em consideração os mesmos parâmetros e simplificações. O dimensionamento feito pelo método de Azevedo Neto foi o que apresentou o maior volume. Considerando bombonas de 100 L facilmente encontradas no comércio, o método de Azevedo Neto é o único que prevê mais de uma bombona por m², conforme Tabela 2. Eficiência quanto ao atendimento da demanda O percentual de dias em que a demanda adotada é atendida a partir do volume dimensionado em cada método, nas diferentes séries de precipitação, pode ser visto na Tabela 3, a seguir. Essa simulação foi realizada a partir de um balanço hídrico considerando os dados mensais de precipitação medidos pelo pluviômetro instalado no lote (Feitosa). Tabela 3 Eficiência no atendimento à demanda Eficiência no atendimento à demanda Método da simulação 89,00% Método de Azevedo Neto 100,00% Método prático alemão 79,56% Método prático inglês 86,90% Método prático australiano 89,00% Os métodos que apresentaram melhores rendimentos e não superdimensionaram o volume do reservatório foram os métodos da simulação e prático australiano, ambos consistem em um balanço hídrico. Essa técnica permite um dimensionamento a partir da variação das condições do volume de controle ao longo do tempo, resultando em melhores estimativas de volume. XX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 6

7 Análise da economia de água potável A Tabela 4 ilustra a economia de água potável promovida pela sua substituição por água de chuva na utilização da descarga com caixa acoplada. Os valores foram calculados em função do consumo médio mensal de água potável, 13,89 m³/mês, calculado a partir da média das medições realizadas pela Companhia de Saneamento de Alagoas (CASAL) de Jan/2015 a Jun/2016; da demanda mensal de água de chuva (1,26 m³/mês) e das eficiências do reservatório quanto ao atendimento dessa demanda (Tabela 3). Tabela 4 - Economia de água potável Economia de água potável Método da simulação 8,07% Método de Azevedo Neto 9,07% Método prático alemão 7,22% Método prático inglês 7,88% Método prático australiano 8,07% CONCLUSÕES Os resultados do dimensionamento do reservatório pelos métodos escolhidos, dentre os recomendados pela NBR /07, foram bastante divergentes. Exceto o método da simulação e prático australiano, que consistem em balanços hídricos e onde foram tomadas as mesmas considerações, resultando em valores iguais para o volume do reservatório. Dentre os métodos de dimensionamento de reservatórios recomendados pela NBR /07, escolhidos para o estudo, os que apresentaram um melhor percentual de atendimento à demanda, sem superdimensionar o volume do reservatório, foram aqueles que utilizaram o balanço hídrico como princípio (método da simulação e prático australiano). Nesse trabalho foi possível observar que mesmo considerando apenas como demanda de água de chuva, em substituição à água potável, o volume diário utilizado em um vazo sanitário de caixa acoplada em uma residência com 3 pessoas, foi obtida uma economia de água considerável, entre 7,22 a 9,07%. Uma adoção mais abrangente de uso da água de chuva em substituição à água potável para outros fins pode aumentar ainda mais essa economia. A utilização de um intervalo diário no dimensionamento do reservatório a partir de balanços hídricos poderia melhor representar o comportamento do reservatório, para isso seria necessário uma série histórica de precipitação longa e com intervalo discretizado, no mínimo, diariamente. Isso seria um interessante objeto de estudo em trabalhos futuros. No dimensionamento de reservatórios, um fator importante que deve-se levar em consideração é a relação volume vs eficiência do atendimento da demanda, pois para aumentar um pouco da eficiência é necessário um acréscimo significativo do volume, aumento o custo da implantação de um sistema de aproveitamento de água de chuva, cabendo ao responsável pelo projeto decidir até onde essa relação é satisfatória. XX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 7

8 REFERÊNCIAS ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), NBR 15527: Água de chuva - aproveitamento de áreas urbanas para fins não potáveis requisitos. Rio de Janeiro: 2007, 8 p. AGARWAL, A.; NARAIN, S. Dying wisdom: The rise, fall and potential of India s traditional water harvesting systems, New Deli: State of India's Environment, 1997, v.4, ANA (Agência Nacional de Águas). O balanço das águas. n. 4, Brasília, DF: Agência Nacional de Águas, ANDRADE NETO, C. O. Aproveitamento imediato da água de chuva. Revista Eletrônica de Gestão e Tecnologias Ambientais (GESTA), Salvador, BA, v.1, n.1, p , ISSN: X. BARRETO, D. Perfil do consumo residencial e usos finais da água. Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 8, n. 2, p ISSN DORNELLES, F.; TASSI, R.; GOLDENFUM, J. A. Avaliação das técnicas de dimensionamento de reservatórios para aproveitamento da água de chuva. Revista Brasileira de Recursos Hídricos (RBRH), v. 15, n. 2, p , Porto Alegre, RS, DORNELLES, F. Aproveitamento de água de chuva no meio urbano e seu efeito na drenagem pluvial f. Tese (doutorado), Instituto de Pesquisas Hidráulicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, GNADLINGER, J. Tecnologias de captação e manejo de água de chuva em regiões semi-áridas. Tecnologias apropriada para terras secas: manejo sustentável de recursos naturais em regiões semiáridas no Nordeste do Brasil., Fortaleza, CE, p , HERRMANN, T.; SCHMIDA, U. Rainwater utilization in Germany: efficiency, dimensioning, hydraulic and environmental aspects. Urban Water. Elsevier: 1999, v.1, p MIERZWA, J. C.; HESPANHOL, I.; SILVA, M. C. C.; RODRIGUES, L. D.B. Águas pluviais: método de cálculo do reservatório e conceitos para um aproveitamento adequado. Revista de Gestão de Água da América Latina (REGA)., Porto Alegre, RS, v.4, p , ISSN NEVES, M. G. F. P.; ARAÚJO, L. M.; ALVES, J. W. T. Implantação de monitoramento de lota real para estudo de medidas simplificadas de controle na geração do escoamento superficial. In: Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, 21., 2015, Brasília. Anais...Porto Alegre, RS: ABRH, TOMAZ, P. Aproveitamento de água de chuva: para áreas urbanas e fins não potáveis. 2. Ed. São Paulo: Navegar Editora, p. TUCCI; C. E. M. Drenagem Urbana. Porto Alegre: ABRH/Editora da Universidade/UFRGS, p. XX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos 8