CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO DE MODELOS DE SIMULAÇÃO NO PROJETO DE REATOR ANAERÓBIO HORIZONTAL DE LEITO FIXO
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- Leandro Costa Farinha
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1 CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO DE MODELOS DE SIMULAÇÃO NO PROJETO DE REATOR ANAERÓBIO HORIZONTAL DE LEITO FIXO Marcelo Zaiat (1) Engenheiro Químico e Mestre em Engenharia Química pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Doutor em Hidráulica e Saneamento pela Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) / Universidade de São Paulo (USP). Pesquisador do Laboratório de Processos Anaeróbios, EESC/USP. Eugenio Foresti Engenheiro civil formado pela Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) / Universidade de São Paulo (USP), Mestre e Doutor em Hidráulica e Saneamento pela EESC/USP, Professor Titular do Departamento de Hidráulica e Saneamento da EESC/USP. Endereço (1) :Departamento de Hidráulica e Saneamento - Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo - Avenida Dr. Carlos Botelho, São Carlos - SP - CEP: Brasil. RESUMO A grande maioria dos reatores contendo lodo anaeróbio imobilizado tem sido desenvolvida baseada em critérios empíricos. A predominância de tais critérios sobre os critérios racionais é conseqüência da variedade e complexidade dos processos interativos que ocorrem nos reatores. Dessa forma, o estudo de fenômenos fundamentais pode ser muito difícil. Entretanto, fenômenos tais como transferência de massa na fase líquida e na fase sólida, cinética intrínseca e hidrodinâmica do reator devem ser estudados visando a simulação, aumento de escala e, principalmente, a otimização de reatores anaeróbios contendo biomassa imobilizada. Este trabalho teve como objetivo principal fornecer elementos para a simulação de desempenho e projeto sob bases racionais de uma nova configuração de reator anaeróbio, o Reator Anaeróbio Horizontal de Leito Fixo (RAHLF), que utiliza espuma de poliuretano como suporte de imobilização da biomassa anaeróbia. O desenvolvimento do reator, sob critérios racionais, fundamentou-se no estudo dos fenômenos de transferência de massa e de cinética bioquímica, levando-se em conta as características hidrodinâmicas do reator. O estudo demonstrou a grande importância na escolha da velocidade superficial do líquido e do tamanho da partícula utilizada com influência direta sobre as resistências à transferência de massa externa e interna e, consequentemente, sobre o fator de efetividade global e sobre as eficiências de remoção de demanda química de oxigênio. PALAVRAS-CHAVE: Tratamento Anaeróbio de Águas Residuárias, Reator Anaeróbio Horizontal de Leito Fixo, Simulação de Desempenho, Projeto. 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 852
2 INTRODUÇÃO A primeira geração de biorreatores anaeróbios consistia de reatores de mistura sem reciclo de sólidos biológicos, nos quais, o tempo de residência celular ( c ) era igual ao tempo de residência hidráulico (h). A partir do melhor entendimento dos processos biológicos, desenvolveram-se unidades nas quais os valores de c eram muito superiores aos de h, através da introdução de decantadores secundários e de sistema de recirculação do lodo biológico. No final da década de 60 foram desenvolvidas novas configurações de reatores anaeróbios cuja característica principal era a capacidade de reter, em seu interior, a biomassa aderida em suporte fixo ou nos interstícios do material de recheio. Os filtros anaeróbios com escoamento ascendente deram origem a unidades semelhantes de fluxo descendente, desenvolvidas para se evitar os inconvenientes de possíveis entupimentos do leito. Outras unidades, como os reatores de leito fluidizado e os reatores anaeróbios de manta de lodo e fluxo ascendente, ampliaram as opções tecnológicas de uso de processos anaeróbios. O primeiro por eliminar problemas de entupimento do leito e o segundo por permitir o desenvolvimento de lodo auto-imobilizado na forma de grânulos. Outras configurações, como o reator de chicanas e o reator de membranas, foram propostas, mas não podem ser consideradas tecnologias estabelecidas. Portanto, os reatores contendo biomassa imobilizada, principalmente contendo lodo auto-imobilizado, foram responsáveis pelo grande avanço da biotecnologia anaeróbia para tratamento de águas residuárias. O desenvolvimento de novas configurações de reatores anaeróbios passa, necessariamente, pelo melhor aproveitamento do volume útil reacional, com a conseqüente diminuição do volume total e pela melhoria do desempenho, estabilidade e facilidade de operação. Nesse sentido, após o sucesso da concepção do reator anaeróbio de manta de lodo e fluxo ascendente que permite o desenvolvimento de lodo granulado, poucas propostas de novas configurações foram apresentadas. Entretanto, há muitas incertezas quanto ao fenômeno da granulação devido a diferentes características das águas residuárias, geometria do reator e operação. Portanto, torna-se muito difícil a previsão da granulação em vários sistemas, pois o conhecimento de tal fenômeno é insuficiente para garantir a ocorrência e controle da auto-imobilização. A utilização de suportes inertes para imobilização de biomassa pode resultar em sistemas mais estáveis e controláveis. Entretanto, a escolha do suporte adequado e do método de imobilização é de fundamental importância. Os suportes devem ser resistentes à degradação biológica e a forças mecânicas e os métodos de imobilização devem ser simples para viabilizar operação em escala industrial. Além disso, o custo do material suporte deve ser levado em consideração na sua escolha. A grande maioria dos reatores contendo lodo anaeróbio imobilizado tem sido desenvolvida baseada em critérios empíricos. A predominância de tais critérios sobre os critérios racionais é conseqüência da variedade e complexidade dos processos interativos que ocorrem nos reatores. Dessa forma, o estudo de fenômenos fundamentais pode ser muito difícil. Entretanto, fenômenos tais como transferência de massa na fase líquida e na fase sólida, cinética intrínseca e hidrodinâmica do reator devem ser estudados visando a simulação, aumento de escala e, principalmente, a otimização de reatores anaeróbios contendo biomassa imobilizada. 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 853
3 Este trabalho teve como objetivo principal fornecer elementos para a simulação de desempenho e projeto sob bases racionais de uma nova configuração de reator anaeróbio, o Reator Anaeróbio Horizontal de Leito Fixo (RAHLF), que utiliza espuma de poliuretano como suporte de imobilização da biomassa anaeróbia. A configuração proposta foi concebida visando o aumento do volume útil reacional através da redução do volume destinado à separação do gás gerado. O desenvolvimento do reator, sob critérios racionais, fundamentou-se no estudo dos fenômenos de transferência de massa e de cinética bioquímica, levando-se em conta as características hidrodinâmicas do reator. INSTALAÇÃO EXPERIMENTAL O Reator Anaeróbio Horizontal de Leito Fixo (RAHLF) em escala de bancada foi confeccionado em vidro boro silicato com 99,8 cm de comprimento e 5,04 cm de diâmetro perfazendo uma relação comprimento por diâmetro (L/D) de aproximadamente 20. Um tubo perfurado com diâmetro de 0,9 cm foi instalado na parte superior do reator para captação do gás gerado. A produção de gás foi monitorada por dispositivo de deslocamento de líquido. O esquema das instalações experimentais para ensaios com RAHLF é apresentado na Figura 1. Figura 1: Esquema de Reator Anaeróbio Horizontal de Leito Fixo (RAHLF) em escala de bancada. (1) Reservatório de substrato, (2) Bomba peristáltica Watson-Marlow, (3) Amostradores, (4) Medidor de produção de gás. O reator possui capacidade total de 1991 ml, sendo 1735 ml de volume útil reacional e 256 ml (13% do total) destinados à separação do gás. Amostradores intermediários ao longo do comprimento do reator foram alocados em posições correspondentes a L/D de 4, 8, 12 e 16. ESTUDOS FUNDAMENTAIS O desenvolvimento de Reator Anaeróbio Horizontal de Leito Fixo (RAHLF) compreendeu uma série de experimentos visando a obtenção de parâmetros fundamentais e estabelecimento de metodologias para estimativa dos mesmos além de experimentos para avaliação do desempenho global do reator. O planejamento experimental envolveu as seguintes etapas: avaliação de metodologia para imobilização do lodo anaeróbio em espuma de poliuretano (1); avaliação do desempenho do RAHLF no tratamento de água residuária de indústria de papel reciclado (2); estudo de arraste de células das matrizes de espuma de poliuretano (3); estudos de transferência de massa intraparticular (4); estudos de transferência de massa na fase líquida (5); estimativa de parâmetros cinéticos intrínsecos (6; 7) e verificação da variação temporal e espacial de 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 854
4 parâmetros de monitoramento no RAHLF (8). SIMULAÇÃO DE DESEMPENHO DO RAHLF Foi realizada a simulação da operação do RAHLF tratando água residuária sintética à base de glicose (concentração inicial de substrato de 2090 mg DQO.l -1 ) com tempo de detenção hidráulico de 8 horas (8). A simulação de desempenho do RAHLF foi realizada considerando-se que o reator apresenta características de escoamento semelhante ao reator tubular ideal, conforme relatado por Cabral (9). Considerou-se, também, modelo cinético de primeira ordem. Dessa forma, o balanço de massa em estado estacionário resultou em: E DQO -(L / D).X. k1.. D =1- exp (1). vs Nessa expressão, E DQO é a eficiência de remoção de DQO, L é o comprimento do reator, D é o diâmetro do reator, k 1 é a constante cinética de primeira ordem, X é a concentração de biomassa baseada no volume útil do reator, é o fator de efetividade global, é a porosidade do leito e v s é a velocidade superficial de líquido no leito. Para a simulação de desempenho do RAHLF deve-se ter como parâmetros de entrada no modelo: o diâmetro do reator (D), o diâmetro do tubo separador de gás (D TS ), a vazão volumétrica (Q), a constante cinética intrínseca (k 1 ), a difusividade efetiva do substrato principal (D e ), o raio da biopartícula (R p ) e a porosidade do leito (). Se for utilizada alguma correlação da literatura para estimativa do coeficiente de transferência de massa na fase líquida (k s ), devese conhecer a viscosidade e a densidade do líquido. A seqüência de cálculos para previsão da eficiência foi a seguinte: - Cálculo do volume total (V T ) V =.D 2.L T 4 (2) Nessa expressão, D é o diâmetro e L é o comprimento do reator. - Cálculo do volume útil do reator (V u ) O volume útil do reator foi considerado como o volume realmente ocupado pelas biopartículas, excluído o volume destinado à separação do gás. A expressão para cálculo de V u é a seguinte: V u = VT -. R R 2.( 2. R).( R ) R.arcsen. L R (3) Sendo a área da seção transversal do reator (A): 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 855
5 A = V L u (4) Nessas expressões, R é o raio e L o comprimento do reator. é definido como: = D - D TS 2 (5) Sendo D TS o diâmetro do tubo separador de gás. - Cálculo da velocidade superficial de líquido (v s ) A velocidade superficial de líquido através do leito foi calculada através da expressão v = Q s.a (6) Nessa expressão, Q é a vazão volumétrica de líquido, é a porosidade do leito e A é a área da seção transversal do reator obtida pela expressão (4). - Cálculo do tempo de residência hidráulico ( h ) O tempo de residência foi obtido através da expressão: h =.V Q u (7) Nessa expressão, é a porosidade do leito, V u é o volume útil do reator obtido pela expressão (3) e Q é a vazão volumétrica do líquido. - Estimativa do coeficiente de transferência de massa na fase líquida (ks) (a) Utilizando a expressão proposta por Zaiat et al. (5) O coeficiente de transferência de massa na fase líquida (ks) foi calculado através da porosidade do leito (), raio equivalente da partícula (R p ) e do coeficiente volumétrico (k s a) como: k =. k s a. R p s 3.( 1 ) (8) O valor do coeficiente volumétrico de transferência de massa (k s a) foi calculado pela expressão proposta por Zaiat et al. (5): ka s = -0,244 +0,271. e (1,796.v s) (9) 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 856
6 Nessa expressão, ksa está em h -1 e vs em cm.s -1. (b) Utilizando-se expressões da literatura Os valores de k s são, geralmente, correlacionados em função das propriedades físicas do líquido, vs e características geométricas das biopartículas. As correlações são obtidas empiricamente ou através de considerações teóricas. Neste trabalho utilizou-se correlação proposta por Perry & Chilton (10) JD. ( 0, 81 0, 05).(Re p) 0 50 (10) Nessa expressão, J D é o fator de Colburn para transferência de massa e Re p é o número de Reynolds de partícula baseado na área da seção transversal líquida do reator, definido como: Re = v.. d p s L p L (11) J D / Sh.( Sc). (Re p) (12) Nessa expressão, Sh é o número de Sherwood que relaciona a transferência de massa por convicção com a transferência difusional na fase líquida, Sc é o número de Schmidt que relaciona as transferências de quantidade de movimento e massa. Tais grandezas são definidas como: Sh = k s.d DL Sc = L L p. DL (13) (14) - Cálculo do número de Biot (Bi) O número de Biot foi obtido através da expressão (15) de acordo com Bailey & Ollis (11): k s.rp Bi (15) De Nessa expressão, k s é o coeficiente de transferência de massa na fase líquida, D e é a difusividade efetiva de substrato e R p é o raio da biopartícula. - Estimativa da concentração média de biomassa (X ) Experimentalmente observou-se que a espuma é capaz de reter biomassa a uma razão média de 23 mg SSV.ml -1 espuma. Através desse valor pôde ser estimado o valor de X em termos de volume útil do reator como: 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 857
7 X 23.( 1 ) (16) - Cálculo do módulo de Thiele ( ) O módulo de Thiele foi obtido através da expressão (17), adaptada para cinética de primeira ordem (11): = R p. 3 k1. X De (17) - Cálculo do fator de efetividade ( ) O fator de efetividade foi calculado através da expressão: = Bi. tgh Bi 1... / tgh. (18) - Estimativa da E DQO A estimativa da E DQO, para cada L/D, foi feita através da expressão de balanço (1). - Previsão da produção de gás metano (P CH4 ) A produção de gás metano (em litros.dia -1 ) foi estimada considerando-se uma produção teórica de 0,43 l CH 4.g -1 DQO Removida, através da seguinte expressão: P CH 4 = 0,43. w. EDQO (19) Nessa expressão, w é a vazão mássica do substrato. O parâmetro cinético intrínseco utilizado foi o determinado por Vieira (12), estimado utilizandose lodo imobilizado em biopartículas obtidas do RAHLF operando com substrato sintético a base de glicose. Tal parâmetro apresentou o valor de 7,12 x 10-5 l.mg -1 SSV.h -1. A velocidade superficial de líquido no leito foi de 0,0035 cm.s -1. A densidade do líquido foi considerada 1,186 g.ml -1, conforme determinado previamente em picnômetro e a viscosidade do líquido de 0,008 Poise. A difusividades efetiva do substrato nas biopartículas e a difusão do mesmo no meio líquido foram consideradas iguais, como sendo 0,75 x 10-5 cm 2.s -1 (13). O raio da esfera equivalente foi de 0,31 cm. As eficiências experimentais obtidas por Zaiat et al. (8) e teóricas estimadas pelo modelo proposto utilizando a expressão (9) proposta por Zaiat et al. (5) para previsão de k s, são apresentadas na Tabela 1. Os valores de E DQO e de produção de gás metano foram muito inferiores aos valores observados experimentalmente, pois o valor de é subestimado quando se utiliza a correlação (9) para previsão de k s. A utilização de tal expressão para projeto do RAHLF resultaria em 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 858
8 unidades superestimadas. Por exemplo, esse modelo prevê um RAHLF de, aproximadamente, 21 l para obtenção de E DQO de 98% nas mesmas condições experimentais descritas, resultando num tempo de residência de 84 horas. Tabela 1: Perfis de eficiência de remoção de DQO em RAHLF tratando água residuária sintética à base de glicose com tempo de detenção hidráulico de 8,03 horas. L/D E DQO * (%) E DQO ** (%) *Eficiência obtida através do modelo utilizando a expressão (9) para estimativa de k s. **Eficiência experimental (8) As eficiências experimentais obtidas por Zaiat et al. (8) e teóricas estimadas pelo modelo proposto utilizando a expressão (10) proposta por Perry & Chilton (10) para previsão de ks, são apresentadas na Tabela 1. Tabela 2: Perfis de eficiência de remoção de DQO em RAHLF tratando água residuária sintética à base de glicose com tempo de detenção hidráulico de 8,03 horas. L/D E DQO * (%) E DQO ** (%) * Eficiência obtida através do modelo utilizando a expressão (10) para estimativa de k s. ** Eficiência experimental Neste caso, os valores de E DQO gerados pelo modelo foram superiores aos experimentais, pois o valor de está superestimado em 192% pela utilização da correlação (10) para previsão de k s. O modelo prevê que, praticamente, em L/D de 8 o substrato será completamente consumido. A produção de gás metano foi apenas 20% superior pelo fato do modelo prever eficiência máxima (100%) e, experimentalmente, ter-se observado o alto valor de 98%. Esse modelo prevê um RAHLF de, aproximadamente, 0,6 l para obtenção de EDQO de 98% nas mesmas condições experimentais descritas, resultando num tempo de residência de 2,8 horas. Portanto, a utilização de tal modelo para projeto do RAHLF a baixas v s resultaria em unidades subestimadas. Os valores gerados pelo modelo são sumarizados na Tabela 3. O ajuste do modelo aos pontos experimentais é apresentados na Figura 2 para valores de S b e na Figura 3 para valores de E DQO. 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 859
9 Através dos valores gerados pode-se concluir que o modelo falhou na previsão de eficiências de remoção de DQO e de concentrações de substrato ao longo do RAHLF. Essa falha se deveu principalmente à dificuldade de previsão de k s na faixa de v s estudada. No entanto, pode-se observar que o coeficiente de transferência de massa na fase líquida é um parâmetro chave e limitante do processo às baixas vs aqui aplicadas. É conveniente que, para projeto de unidades maiores, se apliquem velocidades superficiais maiores a fim de diminuir tal resistência; para altas v s, as correlações da literatura prevêem valores de k s mais confiáveis. Entretanto, a aplicação de altas v s estará limitada por valores críticos, acima dos quais pode haver arraste de biomassa das biopartículas. Tabela 3: Valores experimentais e gerados pelo modelo teórico de concentração de substrato na fase líquida (S b ) e de eficiência de remoção de DQO (E DQO ) ao longo do RAHLF tratando substrato sintético, operando com de 0,4 e h de 8,03 horas. L/D S b exp. (mg DQO.l -1 ) S b * (mg DQO.l -1 ) S b ** (mg DQO.l -1 ) E DQOexp. (%) E DQO * (%) E DQO ** (%) *Valores gerados pela utilização da expressão (9) para estimativa de k s. **Valores gerados pela utilização da expressão (10) para estimativa de k s Sb (mg DQO.l -1 ) L/D Figura 2: Variação de Sb ao longo do RAHLF tratando substrato sintético, operando com de 0,4 e h de 8,03 horas ( ) e modelo teórico ajustado utilizando a correlação 9 (---) e 10 ( ) para previsão de ks. 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 860
10 EDQO (%) L/D Figura 3: Variação de E DQO ao longo do RAHLF tratando substrato sintético, operando com de 0,4 e h de 8,03 horas ( ) e modelo teórico ajustado utilizando a correlação 9 (---) e 10 ( ) para previsão de k s. Para o projeto do RAHLF é sugerido que se fixe, inicialmente, a velocidade superficial de líquido (v s ) e a relação entre o diâmetro do tubo separador destinado à separação do gás (D TS ) e o diâmetro do reator (D). Além disso, deve-se impor a eficiência de remoção de DQO (E DQO ) desejada. Adicionalmente, deve-se conhecer as concentrações de substrato na água residuária, a vazão máxima de líquido, a constante cinética intrínseca, a difusividade efetiva do substrato principal, o raio equivalente médio das biopartículas, a porosidade do leito, a viscosidade e densidade da água residuária. Para avaliação do modelo para projeto, foi realizado um estudo de caso visando o projeto de um RAHLF para tratamento de água residuária de indústria de papel reciclado. Os dados de vazão e concentração foram obtidos da São Carlos S/A, Indústria de Papel e Embalagens, onde se encontra instalado um reator de manta de lodo e escoamento ascendente de 600 m 3 operando com eficiência variando de 80% a 85%. A concentração inicial média de substrato, após tratamento primário, é de, aproximadamente, 3000 mg DQO.l -1 e sendo 26 m 3.h -1 a vazão média. A temperatura média foi considerada como 25C e a difusividade efetiva do substrato nas biopartículas (D e ) a essa temperatura foi considerado igual a 0,48 x 10-5 cm.s -2. A viscosidade da água residuária foi admitida como sendo a da água a 25C e a densidade de 1,188 g.cm -3 foi determinada em picnômetro. Considerou-se, também, leito com porosidade de 0,4 composto por matrizes cúbicas de espuma de poliuretano com 1 cm de lado. Dessa forma, o raio da esfera equivalente foi de 0,62 cm. A constante cinética intrínseca de primeira ordem (k 1 ) para a água residuária e lodo proveniente do reator de manta de lodo operando na própria indústria foi determinado como 1,26 x 10-5 l.mg -1 SSV.h -1 (12). A estimativa de k s foi feita através da correlações apresentadas na literatura. A velocidade superficial de líquido no leito deve ser alta o suficiente para minimizar o efeito da resistência à transferência de massa externa. Entretanto, tal valor está limitado por um valor crítico, à partir do qual poderá haver arraste considerável de biomassa do suporte. De acordo com os estudos de arraste de biomassa, é conveniente que o valor de v s esteja abaixo de 1,5 cm.s -1 (3). Inicialmente foi fixado o valor de 0,5 cm.s -1 que garante, com segurança, a fixação da biomassa. 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 861
11 A relação entre o diâmetro do reator e o diâmetro do tubo separador (D/DTS) no reator de bancada foi de 0,19. É conveniente, portanto, que tal valor seja fixado entre 0,1 e 0,2. O menor valor garantirá um menor volume total de reator devido ao menor volume disponível para separação do gás gerado. Foi adotado, nesse estudo de caso, um valor intermediário de 0,15. Os cálculos de projeto visam a obtenção de valores de comprimento e diâmetro do reator, além do diâmetro do tubo destinado à separação do gás. O comprimento do reator foi calculado através da expressão de balanço no reator tubular ideal. Para obtenção de eficiência de 85%, com concentração afluente média de 3000 mg DQO.l -1 e vazão volumétrica de 26 m 3.h -1, deve-se utilizar um RAHLF com volume total de 396,89 m 3 com diâmetro de 2,25 m e 99,57 m de comprimento, perfazendo um L/D de 44. O tempo de residência médio será de 5,53 horas e o diâmetro do tubo separador de 0,34 cm. Dessa forma, o RAHLF deveria ser 1,5 vezes menor que o reator de manta de lodo instalado para obtenção da mesma eficiência de remoção de DQO. Além disso, o tempo de residência aplicado seria muito inferior. Deve-se ressaltar, entretanto, que o reator projetado não foi testado e o projeto aqui apresentado serve apenas para um estudo de caso e para avaliação preliminar do modelo proposto. Os valores de diâmetro do reator e do tubo separador devem ser aproximados para valores encontrados no mercado a fim de facilitar a construção do RAHLF. O grande comprimento de tubo obtido no projeto pode dificultar operações de limpeza no leito e manutenção. Configurações em módulos ou reatores em paralelo podem minimizar estes problemas. O valor do diâmetro do reator projetado pode ser diminuído através da escolha de v s maior. Por exemplo, para vs de 1 cm.s -1, o Volume total do reator seria de 394 m 3 com diâmetro de 1,6 m. Observou-se que, quanto menor o tamanho da biopartícula, menor o volume total do reator para resultar em EDQO de 85%, devido ao maior fator de efetividade global. Entretanto, biopartículas pequenas podem resultar em grande perda de carga no leito, sendo esse um fator limitante. No caso estudado, v s acima de 0,1 cm.s -1 resultam em pequenas variações no volume do reator para o mesmo tamanho de partícula. Nessa faixa, a velocidade global do processo está limitada, principalmente, pela velocidade de transferência de massa intraparticular e pelas velocidades das reações bioquímicas no caso estudado. Esse estudo demonstra a grande importância na escolha da v s e do tamanho da partícula utilizada com influência direta sobre as resistências à transferência de massa externa e interna e, consequentemente, sobre o fator de efetividade global. Por exemplo, ao se aplicar uma v s de 0,5 cm.s -1, o volume do reator será de 397 m 3 se forem utilizadas biopartículas com 1 cm de lado e de 796 m 3 se as partículas utilizadas tiverem 3 cm. Para projeto do RAHLF, todos os parâmetros devem estar adequadamente determinados, pois as resistências limitantes dependerão da ordem de grandeza dos parâmetros cinéticos e de transferência de massa para cada sistema em particular. 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 862
12 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Zaiat, M.; Cabral, A.K.A.; Foresti, E. Reator anaeróbio horizontal de leito fixo para tratamento de águas residuárias: concepção e avaliação preliminar de desempenho; Revista Brasileira de Engenharia - Caderno de Engenharia Química, v. 11, n. 2, p , Foresti, E.; Zaiat, M.; Cabral, A.K.A.; Del Nery, V. Horizontal-flow anaerobic immobilized sludge (HAIS) reactor for paper industry wastewater treatment, Brazilian Journal of Chemical Engineering, v. 12, p , Zaiat, M.; Cabral, A.K.A.; Foresti, E. Cell wash-out and external mass transfer resistance in horizontal-flow anaerobic immobilized sludge (HAIS) reactor, Water Research, v. 30, n. 10, p , Vela, F.J.; Foresti, E.; Zaiat, M. Estimativa de difusividade efetiva de substratos em partículas de bactérias anaeróbias imobilizadas, Anais do 1 o Congresso Brasileiro de Engenharia Química - IC, São Carlos, SP ( Eds. J. T. Freire e A. M. da Silveira), p , Zaiat, M.; Vieira, L.G.T.; Foresti, E. Liquid -phase mass transfer in fixed-bed of polyurethane foam matrices containing immobilized anaerobic sludge, Biotechnology Techniques, v. 10, n. 2, p , Vieira, L.G.T.; Zaiat, M.; Foresti, E. Estimation of intrinsic kinetic parameters in immobilised cell systems for anaerobic wastewater treatment, Biotechnology Techniques, v. 10, n. 9, p , Zaiat, M.; Vieira, L.G.T.; Foresti, E. Intrinsic kinetic parameters of substrate utilization by immobilized anaerobic sludge, Biotechnology and Bioengineering, v. 53, n. 2, p , Zaiat, M.; Vieira, L.G.T.; Foresti, E. Spatial and temporal variations of monitoring performance parameters in horizontal-flow anaerobic immobilized sludge (HAIS) reactor treating synthetic substrate, aceito para publicação no periódico Water Research, Cabral, A.K.A. Caracterização Hidrodinâmica de um Reator Anaeróbio Horizontal de Leito Fixo. São Carlos, SP. Dissertação - Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) / Universidade de São Paulo (USP), Perry, R.H. & Chilton, C.C. Chemical Engineers Handbook. 50th ed., McGraw-Hill, New York, Bailey, J.E., & Ollis, D.F. Biochemical Engineering Fundamentals. 2nd edition. McGraw-Hill, New York, Vieira L.G.T. Estimativa de Parâmetros Cinéticos Intrínsecos de Utilização de Substrato por Lodo Anaeróbio Imobilizado. São Carlos, SP. Dissertação - Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) / Universidade de São Paulo (USP), Vela, F.J.; Zaiat, M., Foresti, E. Estimation of substrate effective diffusivities in anaerobic bioparticles, submetido à publicação no periódico Water Research em maio de o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 863
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