Quem descobre o carcinoma basocelular?



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Transcrição:

ARTIGO ORIGINAL Arq Med Hosp Fac Cienc Med Santa Casa São Paulo 2005; 50(3):104-109 Quem descobre o carcinoma basocelular? Who discovers the basal cell carcinoma? Karina Gonçalves Nunes 1, Marcus Maia 2 Resumo Introdução: Em nosso meio não se conhece, quem primeiro descobre o carcinoma basocelular. A compreensão dos modelos de descoberta poderia servir de base para os programas de educação pública e do profissional de saúde. Objetivo: Determinar o papel dos pacientes em encontrar as suas próprias lesões. Métodos: Foram entrevistados 257 pacientes com diagnóstico anterior de carcinoma basocelular, acompanhados na Clínica Dermatologia do Departamento de Medicina da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, no período entre junho de 2004 e janeiro de 2005. Além de pesquisar quem primeiro descobriu o carcinoma basocelular, outras variáveis foram anotadas, para avaliar as suas possíveis influências no resultado da descoberta: sexo; idade; antecedente familiar de câncer da pele; escolaridade; localização da lesão primária; e se realiza o auto-exame da pele. Resultados: Dos 257 pacientes, 149 (57,8%) notaram a própria lesão. Destes, 99 (66,4%) eram mulheres; 99 (66,4%) tinham mais de 60 anos; 123 (82,5%) não moravam sozinhos; 108 (72,5%) não referiram antecedente familiar de câncer da pele, 128 (85,9%) eram alfabetizados; 87 (58,4%) relataram fazer o auto-exame da pele. Os demais 108(42,2%) pacientes, 42 (16,3%) tiveram sua lesão descoberta por médico generalista, 26 (10,1%) pelo filho (a); 14 (5,4%) pelo cônjuge; 8 (3,1%) por outro parente; e o restante (7,3%) por outro convívio. Conclusão: Em 85% dos pacientes as lesões foram descobertas por leigos, isso faz acreditar que, em nosso 1 Acadêmica do 5 ano da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo 2 Professor Doutor, Chefe do Setor de Oncologia, Unidade de Melanoma da Clínica de Dermatologia do Departamento de Medicina da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo Trabalho realizado na Clínica de Dermatologia do Departamento de Medicina da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo Correspondência: Karina Gonçalves Nunes. Al. Belgrado, 254 Res 0 Alphaville - Barueri/SP Brasil - CEP 06475-050 - Tel: 8181-4688. E-mail: karinagnunes@.hotmail.com meio, alguma influência das campanhas públicas de saúde já possa ser notada. Descritores : Carcinoma basocelular/diagnóstico, carcinoma basocelular/epidemiologia Abstract Introduction: Basal Cell Carcinoma consists in a variety of skin disease, which possibly can be identified by many people. However, it is unknown, among our medical environment, who detects these lesions first. The understanding Carcinoma of our finding patterns could be used as basis for public education programs and for the health professional. Objective: To prompt the patients role to detect lesions by themselves, according to the way the basal cell carcinoma has been discovered. Methods: Two hundred and fifty and seven patients were selected with preceding diagnosis of basal cell carcinoma, regularly assisted by the Dermatological Clinic, from the Medicine Department of the Santa Casa de Misericórdia Hospital, in São Paulo, in the between June of 2004 the January of 2005. Within the selected group, despite researching who has firstly detected the basal cell carcinoma, other variations were annotated with the aim of evaluate possible influences in the results: sex, age, familiar antecedent of cancer of the skin, education degree, anatomical localization of the injury; and if carries through the auto-examination of the skin. Results: Of the 257 patients who are selected, 149 (57,8%) had the lesion detected by themselves. Of these, 99 (66,4%) were women; 99 (66,4%) had more than 60 years; 123 (82,5%) did not live alone; 108 (72,5%) had not related antecedent familiar of cancer of the skin, 128 (85,9%) were school degree; 87 (58,4%) had told to make the auto-examination of the skin. From the remaining 108 patients, 42 (16,3%) had their lesions detected for doctor, 26 (10,1%) for the son; 14 (5,4%) for the spouse; 8 (3,1%) for another relative; e the remain (7,3%) for another conviviality. Conclusion: 85% of the patients had the lesion detected by themselves, this make to believe that, in 104 04.pmd 104

our way, some influence of public health campaigns can be already perceived. Key words: Carcinoma, basal cell/diagnosis; Carcinoma, basal cell/epidemiology Introdução O carcinoma basocelular (CBC) é o tumor maligno da pele mais freqüente, representando cerca de 70% de todos os tipos (1,2). A incidência do CBC vem aumentando nos últimos anos. Estudos realizados no Reino Unido mostraram o aumento de 173,5/100.000 habitantes/ano para 265,4/100.000 habitantes no ano de 2000 (3,4). Essa tendência também foi detectada nos Estados Unidos, em outros locais da Europa e na Austrália, onde a incidência é a maior do mundo, da ordem de 726/ 100.000 habitantes/ano (5). No Brasil, segundo as estimativas sobre a incidência e mortalidade por câncer do Instituto Nacional de Câncer (INCA), dos 402.190 novos casos de câncer, no ano de 2003, o carcinoma basocelular foi responsável pelo diagnóstico de 61.616 novos casos (6). O número de casos novos de câncer da pele não melanoma estimados para o Brasil em 2006 é de 55.480 casos em homens e de 61.160 em mulheres. Estes valores correspondem a um risco estimado de 62 casos novos a cada 100 mil homens e 60 para cada 100 mil mulheres (6). Os homens são afetados mais freqüentemente do que as mulheres, independente da idade (7). A faixa etária de maior acometimento é entre a 3 a e 5 ª décadas de vida (1,8). Quanto à localização 80% dos casos de CBC acometem o pescoço e a cabeça; 12%, aproximadamente, ocorrem no tronco, 3% nos membros inferiores, 0,2% na área genital e os demais em outros locais (7). A ocorrência do CBC é mais comum em caucasianos com pele clara (tipo I e II) e o seu surgimento tem relação direta com a exposição solar, e por ser uma radiação, é de efeito cumulativa (7,9). Como em toda a neoplasia, o prognóstico do CBC é tanto melhor quanto mais precoce e corretamente ele for diagnosticado e tratado. Assim, tanto pacientes que procuram ajuda médica muito tardiamente, quanto médicos não adequadamente habilitados para tratar do problema, podem desempenhar um papel decisivo na evolução do caso. Daí a importância das campanhas educativas para a população e da educação médica continuada. O carcinoma basocelular é uma lesão visível, sendo assim, é potencialmente detectável por muitas pessoas. O seu diagnóstico precoce é importante para reduzir o porte cirúrgico, aumentar a efetividade terapêutica e evitar a possibilidade de recidiva ou maiores complicações de ordem funcional e/ou estética. Atualmente, é pouco conhecido sobre quem primeiro descobre uma lesão diagnosticada como carcinoma basocelular, especificamente, o papel do paciente em encontrar sua própria lesão. O conhecimento dos sinais clínicos do câncer da pele é importante sob o ponto de vista epidemiológico, principalmente, no sentido de reforçar ou modificar os esforços de prevenção secundária (diagnóstico precoce) de acordo com os modelos de descoberta. Este trabalho é uma pesquisa epidemiológica inédita, cujo objetivo é avaliar em uma população acometida por carcinoma basocelular quem primeiro notou a presença da lesão, e de acordo com os resultados conduzir uma discussão epidemiológica, no sentido de buscar subsídios para orientação quanto prevenção primária e secundária do carcinoma basocelular. Casuística E Métodos Após receber aprovação do Comitê de Ética da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, foram avaliados 257 pacientes que receberam diagnóstico anterior de Carcinoma Basocelular (CBC) e que normalmente são acompanhados na Clínica de Dermatologia do Departamento de Medicina da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. A observação foi feita entre junho de 2004 a janeiro de 2005. Para cada paciente foi aplicado um questionário perguntando-se especificamente quem primeiro notou a sua lesão cutânea. Os pacientes foram divididos em dois grupos: pacientes que descobriram a própria lesão e aqueles que tiveram a descoberta feita por outras pessoas. Esse último grupo composto por: médico, filho(a), cônjuge, outro parente, outro convívio. Para todos os pacientes foram anotados mais os seguintes itens: sexo; idade (divididos em pacientes com até 60 anos e mais de 60 anos); convívio social; antecedente familiar de câncer da pele; escolaridade; localização anatômica da lesão (separadas em fácil e difícil visualização); e se realiza o auto-exame da pele. Somente foram incluídos pacientes cujos todos os dados puderam ser anotados e com informações sobre a localização da lesão primária. Análise estatística: as variáveis foram apresentadas em tabelas de contingência contendo freqüências absolutas (n) e relativas (%). A associação destas variáveis com o grupo que descobre o próprio CBC foi avaliada com o teste qui-quadrado ou teste exato de Fisher. Os valores de p <0,05 foram considerados estatisticamente significativos. Resultados Foram avaliados 257 pacientes, sendo 159 (61,9%) 105 04.pmd 105

mulheres e 98 (38,1%) homens. A média de idade foi de 66 anos, sendo 68 anos para os homens 65 anos para as mulheres. Dos 257 pacientes entrevistados 149 (57,8%) referem ter descoberto a própria lesão, 42 (16,3%) foram descobertas por médico, 26 (10,1%) pelo filho (a); 14 (5,4%) pelo cônjuge; 8 (3,1%) por outro parente; e o restante (7,3%) por outro convívio (Tabela 1). Não houve diferença significante entre as descobertas realizadas pelo próprio paciente e outras pessoas. Tabela 1 Distribuição da pergunta: Quem descobre o Carcinoma Basocelular?, em 257 pacientes da Clínica de Dermatologia do Departamento de Medicina da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, entre junho 2004 a janeiro 2005. Freqüência (%) Próprio paciente 149 (57,8) Médico 42 (16,3) Filho (a) 26 (10,1) Cônjuge 14 (5,4) Outro parente 8 (3,1) Outro convívio 19 (7,3) Total 257 (100,0) Quanto à distribuição por sexo, dos 149(57,8%) pacientes que relataram ter descoberto sua própria lesão, 99(66,4%) eram mulheres; no grupo dos 108 (42,2%) pacientes que tiveram sua lesão notada por outras pessoas, 60 (55,5%) eram mulheres (Tabela 2). Quanto a distribuição por idade, dos 73(28,4%) Tabela 2 Distribuição por sexo entre o grupo de pacientes que descobriram o próprio CBC e os que tiveram sua lesão descoberta por outras pessoas. Não houve significância estatística entre os grupos ( p= 0,091) Quem descobriu o CBC Gênero Próprio Outras Total paciente pessoas Feminino 99 (66,4%) 60 (55,5%) 159 (100%) Masculino 50 (33,5%) 48 (44,5%) 98 (100%) Total 149 (100%) 108 (100%) 257 (100%) pacientes que tinham idade inferior a 60 anos, 50(68,5%) pacientes descobriram sua própria lesão; enquanto que apenas 23(31,5%) tiveram a sua lesão descoberta por outras pessoas (Tabela 3). Estas proporções são estatisticamente significantes. (p= 0,024) Os pacientes que referiram ter descoberto a própria lesão e o grupo onde outras pessoas descobriram a lesão têm a mesma distribuição em relação ao fato de morar ou não sozinho (p=0,349) (Tabela 3). Dos 58(22,5%) pacientes que relataram antecedente familiar de câncer da pele 41(70,7%) tiveram sua lesão descoberta pelo próprio paciente; enquanto o restante, 17(29,3%), a lesão foi descoberta por outras pessoas (Tabela 3). Estas proporções são estatisticamente significantes (p= 0,018). Quanto a distribuição segundo a escolaridade, dos 55(21,4%) pacientes considerados analfabetos, 34(61,9%) tiveram sua lesão descoberta por outras pessoas; enquanto dos 222(78,6%) pacientes com al- Tabela 3 Distribuição por idade, morar sozinho, antecedente familiar de câncer da pele, escolaridade, auto-exame da pele, entre o grupo de pacientes que descobriram o próprio CBC e o grupo dos que tiveram sua lesão descoberta por outras pessoas. Próprio paciente Quem descobriu N (257) p-valor Outras pessoas Idade < 60 anos 50 (68,5%) 23 (31,5%) 73 (28,4%) 0,024 60 anos 99 (53,8% ) 85 (46,2%) 184 (71,6%) Mora sozinho Sim 26 (61,9 %) 16 (38,1%) 42 (16,3%) 0,349 Não 123 (57,2%) 92 (42,8%) 215 (83,7%) Antecedente Sim 41 (70,7%) 17 (29,3%) 58 (22,5%) 0,018 Não 108 (54,3%) 91 (45,7%) 199 (77,5%) Escolaridade Analfabeto 21 (38,1%) 34 (61,9%) 55 (21,4%) 0,001 Alfabetizado 128 (63,3%) 74 (36,7%) 202 (78,6%) Auto exame Sim 87 (71,9%) 34 (28,1%) 121 (47,1%) 0,000 Não 62 (45,6%) 74 (54,4%) 136 (52,9%) 106 04.pmd 106

Tabela 4 Distribuição por sexo entre o grupo de pacientes que descobriram o próprio CBC e os que tiveram sua lesão descoberta por outras pessoas, segundo a variável visualização da lesão (dividida em fácil ou difícil visualização). Feminino Masculino Quem descobriu N (159) P-valor Quem descobriu Próprio Outras Próprio Outras N (98) P-valor paciente pessoas paciente pessoas Visualização fácil 85 (59,4%) 58 (40,6%) 143 (89,3%) 0,022 48 (55,2%) 39 (44,8%) 87 (88,7%) 0,021 difícil 14 (87,5%) 2 (12,5%) 16 (10,7%) 2 (18,2%) 9 (81,8%) 11(11,3%) gum grau de alfabetização, 128(63,3%) descobriram sua própria lesão (Tabela 3). Estas proporções são estatisticamente significantes. (p= 0,001) No item auto-exame da pele, dos 121(47,6%) pacientes que afirmaram fazer o auto-exame da pele, 87(71,9%) foi responsável pela descoberta da sua lesão. Naqueles que revelaram não fazê-lo (52,9%), 74(54,4%) tiveram sua lesão descoberta por outras pessoas (Tabela 3). Na analise quanto à facilidade de visualização da lesão, as lesões consideradas de fácil visualização, tiveram suas lesões descobertas pelo próprio paciente, em ambos os sexos. Das 143(89,3%) lesões de fácil localização, no sexo feminino, 85(59,4%) foram descobertas pela própria paciente; e das 87(88,7%) lesões de fácil localização no sexo masculino, 48(55,2%) foram descobertas pelo próprio paciente. Entretanto na variável difícil localização, das 16(10,7%) lesões consideradas de difícil visualização, no sexo feminino, 14(87,5%) foram descobertas pela própria paciente, enquanto que no sexo masculino essa realidade se inverte, sendo somente 2(18,2%) lesões de difícil visualização, das 11(11,3%), descobertas pelo próprio paciente (Tabela 4). Gráfico 1 - Distribuição por sexo entre o grupo de pacientes que descobriram o próprio CBC e os que tiveram sua lesão descoberta por outras pessoas, segundo a variável difícil visualização da lesão. Discussão A incidência do CBC em todo o mundo, inclusive no Brasil, vem aumentado nos últimos anos (6,10) dai a importância das campanhas de saúde pública, primeiro, no sentido de evitar o aparecimento da doença e depois em chamar a atenção para o diagnóstico precoce. O CBC, por ser uma lesão externa e quase sempre em localização de fácil visualização, faz com que diversas pessoas possam estar envolvidas em sua descoberta. O diagnóstico precoce está associado à efetividade terapêutica, evitando recidiva e conseqüente cura. Na casuística estudada, mais da metade dos CBC (57,8%) foram descobertos pelo próprio paciente, enquanto, nos demais, 16,3% foram descoberto por médicos; 10,1% pelo filho (a); 5,4% pelo cônjuge; 3,1% por outro parente; e o restante (7,3%) por outro convívio (Tabela 1). Apesar de não haver diferença significante entre as descobertas realizadas pelo próprio paciente e outras pessoas, é muito importante perceber que cerca de 85% dos casos foram descobertos por leigos (próprio paciente, cônjuge, filho (a), outro membro da família ou outro convívio). Este resultado poderia refletir os efeitos do Programa Nacional de Controle do Câncer da Pele implantados, em âmbito nacional, pela Sociedade Brasileira de Dermatologia desde 1999 (10). A análise isolada dos pacientes segundo o sexo, entre os grupos que descobriram sua própria lesão e os que tiveram sua lesão descoberta por outras pessoas, não evidenciou significância estatística (p = 0,091); isto é, tanto as mulheres quanto os homens foram aptos a descobrirem sua própria lesão. (Tabela 2). Normalmente, as mulheres são mais atentas em relação aos cuidados com a saúde, inclusive a literatura refere isto (11). Entretanto, na casuística estudada, não observamos tal tendência, ou seja, também os homens estão alertados quanto aos sinais clínicos de um câncer da pele. Quando foi avaliada a descoberta do CBC consi- 107 04.pmd 107

derando-se a idade, foi observado que os pacientes menores de 60 anos descobriram a sua lesão mais significativamente do que as descobertas por outras pessoas (p= 0,024) - Tabela 3. Isto está de acordo com a literatura (11) e faz sentido, pois é de se esperar que os mais jovens sejam mais atentos em relação a sua própria lesão. É importante ressaltar a necessidade de maior foco para o idoso em relação às campanhas do câncer da pele. O fato de o paciente morar sozinho ou não, não se mostrou relevante para a descoberta do CBC, pelo próprio paciente ou por outras pessoas (Tabela 3). Pacientes com antecedentes familiares de câncer da pele, por conheceram a história familiar e terem maior precaução, em sua maioria descobriram por si mesmo a própria lesão. Isto reflete no fato de que, o caráter genético do câncer da pele seja um fator de risco bem divulgado nas campanhas de câncer, e desta forma, revela a atenção dos pacientes em relação ao seu risco e diagnóstico precoce. Em relação à escolaridade, o analfabeto apresentou menor percentual de descoberta da lesão em relação aos alfabetizados, mostrando que a alfabetização teve importância na desconfiança do seu próprio carcinoma basocelular. Talvez outras formas de campanhas devam ser dirigidas aos analfabetos, que no Brasil é bastante significante. O carcinoma basocelular, apesar da localização externa, pode ser de difícil visualização para o paciente. Nas lesões de fácil visualização, observa-se que mais da metade dos pacientes descobriram seu CBC. Entretanto nas lesões de difícil visualização, as mulheres foram responsáveis pela descoberta da sua própria lesão; já nos homens, as lesões foram descobertas por outras pessoas. No auto-exame da pele, aqueles pacientes que o faziam descobriram o próprio CBC em uma proporção muito superior àqueles que não o faziam. Isto é de grande importância e comprova que o incentivo do exame da pele tem sido estimulado nas campanhas. Normalmente, a maioria das lesões estão em locais visíveis (7,8), permitindo que o paciente perceba a sua própria lesão, independente do sexo, como foi confirmado pela casuística estudada. Entretanto nas lesões consideradas de díficil vizualização, as mulheres foram responsáveis pela descoberta da sua própria lesão; já nos homens, as lesões foram descobertas por outras pessoas. Isto implica, no fato de alertar aos pacientes de risco para câncer da pele, quanto a localização do câncer de difícil visualização (dorso, face posterior dos braços, coxa, couro cabeludo e região da nuca). Este estudo foi realizado com um número de pacientes suficiente para uma análise estatística que permitiu várias observações, contudo, trata-se de uma avaliação localizada e de uma população do tipo assistencial. Fica, portanto, o convite para que outros autores repitam a observação, pois existe, em todo Brasil, uma grande diversidade populacional, tanto em função da localização geográfica como sócio-econômica. Um estudo mais amplo poderia ser de grande utilidade para orientação das próximas campanhas no Brasil. Conclusões Cerca de 85% dos casos, as lesões foram descobertas por leigos (o próprio paciente, cônjuge, filho (a), outro membro da família ou outro convívio). Isto de alguma forma poderia refletir os efeitos dos programas de controle do câncer da pele realizados, em âmbito nacional, pela Sociedade Brasileira de Dermatologia desde 1999. Surpreendentemente, os homens se mostram tão atentos quanto às mulheres para descobrir o seu CBC. Pacientes abaixo de 60 anos são mais aptos para descobrir o seu próprio CBC. Quando o carcinoma basocelular foi descoberto por terceiros, os pacientes estavam acima de 60 anos. Isto ressalta a necessidade de maior foco para o idoso em relação às campanhas de controle do câncer da pele. O caráter genético do câncer da pele é um fator de risco bem divulgado nas campanhas de câncer da pele, permitindo um diagnóstico precoce pelo próprio paciente. Campanhas de câncer da pele devem ser mais direcionadas aos analfabetos. O auto-exame da pele deve ser sempre estimulado Os pacientes devem ser alertados para localização do câncer da pele de difícil visualização. Referências bibliográficas 1. Bandeira AM, Bandeira V, Silva JF, Mazza, E. Carcinomas basocelulares: estudo antomopatológico de 704 tumores. An Bras Dermatol 2003; 78:23-7. 2. Neves RG, Talhari S, Soares Filho PJ. Carcinoma basocelular. In: Neves RG, Talhari S, Soares Filho PJ. Câncer da pele. Rio de Janeiro: Medsi; 2001. p.109-31. 3. Lefell DJ, Fitzgerald DA. Basal cell carcinoma. In: Freedlberg IM, Eisen AZ, Wolff K, Austen KF, Goldsmith LA, Katz SI, eds. 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