A ESTRUTURA REPRESENTACIONAL DE ENFERMEIROS ACERCA DA ENFERMAGEM:



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Transcrição:

Estrutura representacional da enfermagem para enfermeiros A ESTRUTURA REPRESENTACIONAL DE ENFERMEIROS ACERCA DA ENFERMAGEM: NOVOS MOMENTOS E ANTIGOS DESAFIOS REPRESENTATIONAL STRUCTURE ON NURSING BY NURSES: NEW MOMENTS AND OLD CHALLENGES Antonio Marcos Tosoli Gomes * Denize Cristina de Oliveira ** RESUMO: Definiu-se como objetivo deste estudo analisar a estrutura representacional de enfermeiros acerca da enfermagem. Trata-se de uma pesquisa qualitativa baseada na Teoria das Representações Sociais em sua abordagem estrutural e desenvolvida com 83 enfermeiros de um município do Estado do Rio de Janeiro. Os dados foram coletados através de evocações livres ao termo indutor enfermagem e analisados pelo software EVOC, durante o segundo semestre de 2002. Observa-se um núcleo estruturado no amor e na dedicação, ao mesmo tempo em que os elementos de contraste apresentam léxicos como cuidado, realização e profissionalismo. Esta estrutura representacional revela uma forte carga sentimental e ideológica dos enfermeiros no tocante à profissão, bem como expõe representações ligadas a dimensões como atitude. Os dados demonstram a transição vivenciada pela enfermagem, observando-se dimensões hegemônicas em determinados momentos históricos, como religiosidade e altruísmo, e aponta outras atuais, como o conhecimento e o profissionalismo. Palavras-chave: Enfermagem; psicologia social; pesquisa qualitativa; enfermeiro. ABSTRACT: This research aims at analyzing the representational structure on nursing by nurses. It is a qualitative piece of research based on the structural approach integrating the Social Representations Theory and developed with 83 nurses within a municipality of the State of Rio de Janeiro. Data were collected through free evocations to the term nursing and analyzed by the EVOC software in the second half of 2002. A nucleus structured on love and dedication co-exist with contrasting lexical elements such as care, accomplishment and professionalism. This representational structure unveils a strong sentimental and ideological investment by nurses in their profession as well as it exposes representations connected to dimensions such as attitude. Data show transitions experienced by nursing, disclosing, on the one hand, hegemonic dimensions at specific historical moments, as religiousness and altruism and, on the other hand, pointing to recent dimensions, as knowledge and professionalism. Keywords: Nursing; social psychology; qualitative research; nurse. INTRODUÇÃO A enfermagem vive, nesses últimos tempos, conflitos históricos e momentos desafiadores. Os conflitos históricos possuem suas raízes no cuidar realizado primordialmente pela família e, mais especificamente, pela mãe, como forma direta de manutenção da vida individual e coletiva e perpassa os diversos momentos históricos definidores dos paradigmas de nossa civilização 1. O início da era cristã, por exemplo, instala uma nova concepção de cuidados na profissão que nega a inter-relação corpo-espírito, dando supremacia ao espírito e conferindo ao corpo um status inferior. A enfermagem é, então, exercida por mulheres consagradas que adotavam a submissão às ordens como atitude de valor e objetivavam mais a salvação da alma do que a cura do corpo 2. A partir do século passado, surgem na enfermagem diversas teorias que conferem um rosto intelectual à profissão. Contudo, apesar dessas teorias conferirem um arcabouço interno de sustentação à enfermagem, não a insere numa relação de mercado, nem mostra sua praticidade como sendo imprescindível à sociedade. Essas teorias conceituam o homem em um nível de generalização muito grande, tornando-o abstrato e a-histórico, ao mesmo tempo em que não consideram as contradições do processo de trabalho na enfermagem, tornando-se, portanto, acríticas 3. p.168 R Enferm UERJ, Rio de Janeiro, 2007 abr/jun; 15(2):168-75.

Gomes AMT, Oliveira DC Um último aspecto da problemática a ser destacado refere-se ao conflito histórico existente na profissão, ou seja, o eixo científico no qual a enfermagem se insere. A prática de enfermagem é exercida, em sua maioria, no âmbito hospitalar e possui suas bases racionais na biologia, na medicina e na estatística. Por isso, a profissão se apropria de conhecimentos científicos, objetivos e quantitativos a fim de produzir uma atividade específica numa determinada instituição e contexto, e o uso efetivo dessas áreas de conhecimento possibilitou a execução de procedimentos cada vez mais complexos no seu diaa-dia. A enfermagem se encontra, portanto, integrada às ciências biomédicas e a problemática se estabelece entre essa ciência e as bases teóricas da profissão, que se alimentam também, e principalmente, das ciências sociais e humanas. Por conseguinte, o cotidiano do profissional sobrevive à tensão entre o biológico e o social, o biomédico e as ciências sociais e humanas 4. Por outro lado, a enfermagem enfrenta os desafios que a atualidade impõe. Tanto a Classificação Internacional da Prática de Enfermagem (CIPE) proposta pelo International Council of Nurses (ICN) quanto o desenvolvimento da consulta de enfermagem dentro dos Programas Básicos de Assistência à Saúde na rede básica propõem modelos diferenciados de ações/estratégias para os profissionais enfermeiros. Em seu trabalho dentro da programação em saúde, o enfermeiro tem encontrado um amplo espaço de desenvolvimento para sua atuação diária. Esse espaço se concretiza no âmbito da consulta de enfermagem através do atendimento direto à clientela, com o suporte dos exames laboratoriais de rotina e da prescrição medicamentosa padronizada, ou através da educação em saúde, desenvolvida em nível individual ou na comunidade onde o profissional está inserido. Em vista disso, objetiva-se, neste trabalho, analisar a estrutura da representação social de enfermeiros acerca da enfermagem através do termo indutor enfermagem. REFERENCIAL TEÓRICO- METODOLÓGICO O estudo foi desenvolvido segundo a Teoria das Representações Sociais 5 no âmbito da psicologia social, utilizando, inclusive, uma proposta teórica complementar, qual seja, a abordagem estrutural ou a teoria do núcleo central 6,7. Dessa maneira, a representação é constituída por um conjunto de crenças, informações, opiniões e atitudes a propósito de um dado objeto social. Esse conjunto de elementos se organiza, estrutura e se constitui em um sistema sociocognitivo de tipo específico 6. Nesse sentido, a organização de uma representação social apresenta uma característica específica, a de ser organizada em torno de um núcleo central, constituindo-se em um ou mais elementos que dão significado à representação. Essa teoria complementar propõe, então, a organização das representações sociais ao redor de seu núcleo central, sendo este o elemento que subsidia seu sentido fundamental e inflexível. Assim, como característica ontológica de um núcleo central de determinada representação, ressalta-se a natureza do objeto representado, o tipo de relações que o grupo mantém com este objeto e o sistema de valores e padrões sociais que constituem o ambiente de vida, em sua dimensão objetiva e subjetiva, do indivíduo e do grupo. Cenários e Sujeitos Foram definidos, como sujeitos, 83 enfermeiros que trabalham em uma cidade do interior do Estado do Rio de Janeiro. Desses, 42 desenvolvem suas atividades no contexto da atenção básica à saúde e 41 na rede hospitalar do município. Dos profissionais compreendidos na rede básica, 30 desenvolvem suas atividades no atendimento direto à clientela, atividades essas definidas, neste trabalho, como sendo a realização da consulta de enfermagem, e os outros 12 ocupam cargos diversos na estrutura gerencial da saúde coletiva do município em questão. Foram selecionadas três instituições hospitalares para a realização do estudo com os enfermeiros que desenvolvem suas atividades nesse contexto. Com relação às mesmas, duas são públicas e uma particular de cunho filantrópico. Dos públicos, um é definido como sendo um hospital de grande porte, geral, de referência para toda a localidade e se situando em um dos distritos da cidade; o outro se localiza no centro da cidade e restringe suas atividades aos tratamentos clínicos, tanto de urgência quanto de unidades intensivistas. O hospital particularfilantrópico é de grande porte, tendo enfermeiros em diversas funções gerenciais e assistenciais, sendo este, o primeiro hospital a ser fundado na cidade. Coleta e Análise de Dados Trata-se de estudo qualitativo que aplicou técnicas qualitativas e quantitativas para determinação dos elementos centrais e periféricos de uma repre- R Enferm UERJ, Rio de Janeiro, 2007 abr/jun; 15(2):168-75. p.169

Estrutura representacional da enfermagem para enfermeiros sentação, empregando a técnica de evocação ou associação livre para a coleta de dados, utilizando-se como termos indutores a expressão enfermagem, no transcorrer do segundo semestre do ano de 2002. A aplicação da técnica consistiu em solicitar aos sujeitos que falassem cinco palavras ou expressões que lhes ocorriam imediatamente à cabeça em relação ao termo referido, sendo as mesmas imediatamente registradas pelo pesquisador em impresso próprio, assim como as características socioculturais de cada sujeito. Essa técnica de coleta de dados permite colocar em evidência o universo semântico do objeto estudado, assim como a sua dimensão imagética de forma mais rápida e dinâmica que outros métodos com igual objetivo como, por exemplo, a entrevista 8,9. O produto das evocações foi organizado previamente, constituindo um corpus para análise. O material foi, então, tratado pelo software EVOC 2000 que calculou, para o conjunto do corpus, a freqüência simples de cada palavra evocada, as ordens médias de evocação de cada palavra e a média das ordens médias de evocação. Os dados foram analisados a partir de sua distribuição no quadro de quatro casas 10. Essa técnica, ao combinar dois atributos relacionados às palavras ou às expressões evocadas, que são a freqüência e a ordem em que foram evocadas, possibilita a distribuição dos termos produzidos segundo a importância atribuída pelos sujeitos. No alto e à esquerda (quadrante superior esquerdo) ficam situados os termos verdadeiramente significativos para os sujeitos e que constituem, provavelmente, o núcleo central da representação estudada. O quadrante superior direito denominase primeira periferia; no inferior esquerdo, localizamse os elementos de contraste; e as palavras localizadas no quadrante inferior direito constituem a segunda periferia da representação 7,10. Cabe ressaltar que essa técnica integrada à informática torna-se um importante instrumento facilitador para a análise da estrutura e organização de uma representação social 10. Além disso, cabe ainda destacar que os termos presentes no núcleo central possuem maior freqüência de evocações e menor rang que, como já referido, se refere à média das ordens médias de evocação. Entre os elementos periféricos ocorre o inverso, com palavras evocadas menos freqüentemente e com maior rang. Os de contraste e de primeira periferia apresentam variações nesses valores, com as palavras contidas no quadrante inferior esquerdo, com uma freqüência de evocação inferior à freqüência média das palavras e um rang inferior ao rang médio, ao passo que o quadrante superior direito possui uma freqüência maior que a freqüência média e um rang também maior. Questões Éticas Foram obedecidas, neste estudo, as orientações constantes da Resolução nº 196/96, do Ministério da Saúde, tanto no que concerne aos aspectos éticos com a instituição que autorizou a realização da pesquisa, quanto com os sujeitos que cederam as entrevistas após leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Foram respeitados também os imperativos relativos à autonomia, beneficência e não-maleficência com relação aos participantes do estudo. RESULTADOS E DISCUSSÃO Em relação ao corpus formado pelas evocações de todos os sujeitos ao termo enfermagem, destaca-se que foram evocadas 450 palavras, sendo 200 diferentes e 250 repetidas. A média das ordens médias de evocação, ou seja, o rang foi igual a 2,90, ao passo que a freqüência média ficou estabelecida em 14 e a mínima, 6. Como demonstra a Figura 1, os possíveis elementos centrais da representação de enfermagem dos entrevistados são amor e dedicação, presentes no quadrante superior esquerdo, e ambos com sentido ideológico muito forte. No sistema periférico, quadrante inferior direito, aparecem doação, luta, pouco-reconhecida e prazer. Na primeira periferia, isoladamente, aparece trabalho (quadrante superior direito) e nos elementos de contraste (quadrante inferior esquerdo) observam-se carinho, compromisso, conhecimento, cuidado, profissionalismo, realização, respeito, responsabilidade, saúde e vocação. Os componentes do núcleo central, amor e dedicação, comportam, para os profissionais, uma forte carga sentimental e ideológica que possui sua raiz possivelmente na história da profissão. Dessa maneira, cabe destacar que a enfermagem se estruturou em função do ser humano atendido e possui resquícios históricos que ainda ligam os profissionais à clientela a partir de sentimentos (amor) e atitudes (dedicação) que possuem marcante influência de conceitos e comportamentos altruístas e religiosos 1. O binômio amor-dedicação, como núcleo estruturante da construção mental dos enfermeiros acerca da própria profissão, tende a colocar a p.170 R Enferm UERJ, Rio de Janeiro, 2007 abr/jun; 15(2):168-75.

Gomes AMT, Oliveira DC Elementos Centrais Elementos Primeira Periferia Freqüência média > = 14 / Rang < = 2,90 Freqüência média > = 14 / Rang > = 2,90 FREQ RANG FREQ RANG Amor 21 2,40 Trabalho 14 3,30 Dedicação 39 2,80 Freqüência Média = 9,5 Elementos de Contraste Elementos Segunda Periferia Freqüência média < 14 / Rang < 2,90 Freqüência média < 14 / Rang > 2,90 Carinho 06 2,60 Doação 06 3,00 Compromisso 08 2,00 Luta 06 3,50 Conhecimento 06 2,60 Pouco-reconhecida 08 4,25 Cuidado 13 2,38 Prazer 11 3,00 Profissionalismo 06 2,50 Realização 13 2,46 Respeito 07 2,85 Responsabilidade 10 2,20 Saúde 06 2,33 Vocação 09 1,77 FIGURA 1: Quadro de quatro casas das evocações ao termo indutor enfermagem. Rio de Janeiro, 2002. enfermagem em uma situação em que dois posicionamentos são possíveis de serem concretizados. O primeiro refere-se à consubstanciação de uma prática dependente e abnegada, oriunda de princípios religiosos ou do recomendado para a posição de enfermeira que constrói o seu saber/fazer enfatizando o empírico e a inter-relação pessoal em detrimento da ciência, da evolução tecnológica e da construção de um espaço autônomo de atuação 1,11. Essa atitude profissional possui raiz também em uma compreensão ideológica da realidade em que se prioriza o crescimento interior e a possibilidade de ajuda ao ser humano nas diversas etapas que caracterizam a sua existência, especialmente naquelas em que a dor, o sofrimento e a morte se fazem presentes. Nesse contexto, acredita-se no crescimento mútuo entre o profissional e a clientela, normalmente direcionado para sentimentos de resignação e de aceitação do vivido, característicos da religiosidade brasileira em função da associação do catolicismo, protestantismo e espiritismo 12. A segunda refere-se à adoção do binômio no âmbito da prática profissional em um contexto de novas visões ecológicas, teológicas e antropológicas, em que alguns pensadores 5,13 consideram que o amor apresenta-se como o elemento essencial na relação humana, ao mesmo tempo em que possui a capacidade de transformação de situações vivenciadas e experienciadas pelos sujeitos. Nessa premissa, o profissional não faria pelo cliente ou para ele, mas desenvolveria uma atitude empática e de compaixão, colocando-se ao seu lado e permitindo a sua construção como sujeito de seu processo saúde-doença. Dessa maneira, pode-se apontar o amor como fonte de cura no cotidiano das instituições de saúde 14. Essa referência ao amor significa a capacidade de relacionamento humano que não coisifica, isto é, não transforma o ser relacionado em objeto, mas o impele a ser sujeito e a ter direitos de expressar-se e movimentar-se de acordo com sua visão de mundo 15. O amor, nesse sentido, não se refere ao sentimentalismo, mas à capacidade de empatia permeada pela ética de respeito ao ser humano. Neste sentido, a empatia é um dos elementos da cura e de ajuda no processo saúde-doença, especialmente através da comunicação sutil que envolve intercâmbio nãoverbal, crenças e atitudes 16. Esta última tendência tende a incluir a tecnologia desenvolvida em saúde, embora redimensione a sua importância e o seu papel no atendimento à clientela. Transpondo esses aspectos para a prática de enfermagem, ressalta-se que esta profissão apresenta duas dimensões do cuidar, que não são excludentes, mas complementares no exercício diário, quais sejam, a dimensão afetiva/expressiva e a dimensão técnica/instrumental 17. Dessa forma, as capacidades afetiva, emocional e empática encontram também uma forma de expressão nos R Enferm UERJ, Rio de Janeiro, 2007 abr/jun; 15(2):168-75. p.171

Estrutura representacional da enfermagem para enfermeiros cuidados necessários no cotidiano das instituições de saúde e que são importantes para a promoção da saúde, a prevenção das doenças ou, ainda, o restabelecimento da saúde dos indivíduos 18. Importa salientar que não existe um posicionamento certo ou errado, mas aquele que atende, de uma forma mais adequada, às demandas presentes na sociedade, na clientela e nos profissionais em um determinado momento histórico e em um contexto social. Destaca-se, contudo, que este último apresenta-se mais amplo e com uma capacidade de unir várias dimensões, como a espiritual, a religiosa, a humanística e a solidária. Ao mesmo tempo, percebe-se que a abordagem biomédica e a holística/integral à clientela se substituem e se complementam na concretização cotidiana da profissão. Os conhecimentos e as intervenções biomédicas são, por exemplo, extremamente úteis em unidades de emergência e de tratamentos intensivos, ou ainda na saúde pública, quando os profissionais necessitam da identificação imediata de alguma agressão física que requeira um atendimento necessário urgente 5. Por outro lado, a centralidade da ciência biomédica na construção da enfermagem e da terapêutica médica em sua concretização (especialmente a farmacológica) tem gerado um quadro de extremos em que a assistência de enfermagem se reduz à execução da prescrição medicamentosa e realização de procedimentos técnicos ou em ações empíricas que não possuem respaldos teóricos ou científicos, embora possuam eficácia na evolução do processo saúde-doença 5,11,19-21. No primeiro caso, a centralidade profissional permanece exterior a ela, o que faz com que a enfermagem se transforme (ou continue sendo) em uma profissão que aponte para outra, sem conseguir expressar a sua exclusivisidade; no segundo, a ação profissional não permite que um espaço de ação seja construído a partir de parâmetros considerados relevantes, quer em seus aspectos sociais, quer científicos, o que permite a continuidade de uma representação de submissão e de não autonomia aos profissionais. O sistema periférico apresenta as formas de interrelação entre o núcleo central e a prática, aparecendo doação como forma concreta da dedicação e do amor, ao mesmo tempo em que o prazer parece se referir ao ato de concretização da profissão. Percebe-se, nesse contexto, a presença de dimensões representacionais ligadas novamente à atitude (doação) e a sentimentos (prazer). A recorrência de questões ligadas a atitudes e sentimentos demonstra que, no arquétipo mental dos sujeitos, a profissão se apresenta relacionada a padrões que não se restringem ao âmbito técnico, mas englobam tendências ligadas ao altruísmo, à semelhança da medicina e do magistério, por exemplo 3. Este fato se torna importante, pois, diferente de outras profissões, a enfermagem, simultaneamente, valoriza e recusa tal dimensão em seu cotidiano, apesar de sua marcante presença histórica e na forma como a sociedade atual ainda apreende e representa essa profissão. Para tornar este quadro ainda mais complexo, a atualidade, no que tange aos enfermeiros, apresentase como sendo marcada pela evolução tecnológica e pela conquista de campos/espaços de atuação, tanto na área hospitalar, quanto na rede básica de saúde. No caso da primeira, a realização de procedimentos cada vez mais complexos e invasivos e a constante especialização (nefrologia, intensivista e neonatologia, entre outras) marcam este novo momento da profissão, ao passo que, na rede básica, a estratégia de saúde da família e os programas de saúde têm permitido uma atuação na assistência direta à clientela e um espaço de atuação mais amplo. Essa tensão entre o novo e o velho, ou seja, entre o desejo da profissão de se sentir inserida no âmbito de padrões científicos hegemônicos e a continuidade de uma representação que demonstra a presença de fortes elementos históricos, mostra o momento dúbio em que a enfermagem se encontra, no centro do processo de negação de uma identidade histórica, sem o alcance/construção de uma outra que a coloque em uma relação simbólica, mercadológica e social, em um patamar idêntico a algumas das demais profissões da equipe de saúde 11,22. Como já pontuado, outras profissões convivem com esse dilema, como a odontologia que se coloca entre o científico e a estética quando de seu atendimento à clientela, ou ainda, como trabalho de doação em face da difícil situação relativa à saúde bucal no Brasil; destacam-se, ainda, o serviço social, a psicologia, a medicina e o educador que possuem tensões internas semelhantes. Nesse sentido, a estrutura representacional da enfermagem parece estar intimamente relacionada ao ser profissional e às suas disposições internas. Esse fato, por um lado, oferece uma beleza própria à profissão, mas, por outro, dificulta a formação de contornos considerados científicos pela atualidade, bem como a adoção de padrões de pensar/fazer tidos como relevantes às profissões da área da saúde no mundo gobalizado e hodierno. p.172 R Enferm UERJ, Rio de Janeiro, 2007 abr/jun; 15(2):168-75.

Gomes AMT, Oliveira DC Dessa maneira, cabe reforçar que, na segunda periferia, parece existir o cruzamento de uma dimensão social que, possivelmente, possui origem na religiosidade característica da história da enfermagem e da abnegação necessária para a concretização deste perfil (doação), com um sentimento individual (prazer), conseqüência de uma relação pessoal do profissional com a enfermagem e a clientela e como esta relação é apreendida pelo self do enfermeiro. Embora sejam dimensões diferenciadas, ambas se entrecruzam tornando-se complementares na cartografia mental desses sujeitos em sua apreensão acerca da atividade laborativa que exercem. Ao mesmo tempo, luta parece demonstrar o cotidiano profissional em sua dimensão de equipe e institucional, demonstrando como a profissão acontece no dia-a-dia e as situações que são enfrentadas para que isto ocorra. Alguns estudos 11,23, de forma semelhante, apontam o conflito cotidiano necessário à conquista do espaço profissional, além das questões de poder ligadas aos aspectos técnicos, hierárquicos e políticos. Torna-se interessante a imagem de luta ao lado de características como amor, doação e dedicação, o que reforça a idéia de tensão interna à profissão à medida que aquele léxico tende a adquirir o sentido de necessidade de delimitação de espaço, mesmo que isso signifique o enfrentamento de outros profissionais e/ou profissões 24. Essa inferência parece ser confirmada pela presença da expressão pouco reconhecida, que expressa uma das facetas pelas quais a luta se torna necessária. Dessa maneira, o termo pouco reconhecida abrange a construção mental dos profissionais acerca da relação da profissão com o meio no qual está inserida, explicitando o modo como os enfermeiros captam a reação desse fator externo, que se refere tanto à população, quanto à equipe de saúde e à instituição em que trabalha. Nesse meio também estão localizadas as representações sociais acerca da profissão, o valor social que lhe é atribuída e como isto se reveste de benefícios diretos ao profissional, quer em questões concretas (salário, acomodações institucionais e acesso a bens de consumo, por exemplo) ou simbólicos (prestígio, reconhecimento e admiração, entre outras). Na primeira periferia, a palavra trabalho parece demonstrar, também, uma faceta imagética que expressa a própria enfermagem na concretização de suas ações e seus serviços, independentemente de sua inserção institucional. O modo como esses atores sociais se comunicam com a sociedade é através das atividades desenvolvidas em um contexto institucional. Os elementos de contraste apresentam a tensão estabelecida no bojo da representação em que vocação se estabelece como um outro extremo de profissionalismo. Essa nuança representacional parece reforçar a dualidade vivida no cotidiano profissional, em que o empírico e o científico, assim como o interrelacional e o tecnológico se misturam e se substituem. Outro aspecto interessante a ser destacado é a presença do léxico cuidado, que tem sido considerado como o objeto de trabalho do enfermeiro, bem como sua essência e sua manifestação mais característica. Se, por um lado, essa palavra possui maior freqüência (13) entre os elementos presentes na zona de contraste, chama a atenção a sua não-evocação entre os primeiros lugares (rang 2,38), o que parece indicar que a importância dada a este conceito se refere mais à academia (que o pensa) do que aos profissionais (que o executam), embora eles tenham absorvido, em grau variável, a centralidade do cuidar/cuidado no âmbito profissional 25,26. Os elementos de contrate também apresentam fatores ligados a atitudes e sentimentos relacionados aos profissionais que, em função de sua importância na cartografia mental dos sujeitos, fazem parte da estrutura representacional ora descrita e analisada. Dessa maneira, compromisso, profissionalismo, responsabilidade e vocação demonstram as dimensões atitudinais, enquanto carinho e respeito explicitam os sentimentos presentes nessa parte da estrutura representracional. CONSIDERAÇÕES FINAIS Considera-se que a estrutura representacional exposta demonstra um processo de conquista do espaço próprio de atuação, fenômeno este que parece estar em curso, ao menos para o grupo estudado. No entanto, esse espaço autônomo não se encontra plenamente estabelecido, o que justifica as tensões encontradas entre os diversos elementos da representação social. Um traço marcante e transversal à estrutura foi a presença de questões atitudinais e sentimentais dos enfermeiros na centralidade representacional. Isso pode estar relacionado à não consolidação do espaço autônomo de atuação, bem como à não explicitação do que é essencial à profissão, colocando-se a base de sustentação mais no perfil profissional do que na enfermagem como área de saber e campo de uma determinada prática social. Os dados demonstram o momento de transição vivenciado pela enfermagem, em que ainda se R Enferm UERJ, Rio de Janeiro, 2007 abr/jun; 15(2):168-75. p.173

Estrutura representacional da enfermagem para enfermeiros observa a presença de dimensões que foram hegemônicas em um determinado momento histórico da profissão, como a religiosidade e o altruísmo, e aponta outras oriundas da cientificidade atual, como o conhecimento e o profissionalismo. Dessa maneira, os enfermeiros vivenciam o já e o ainda não da autonomia em seus cotidianos, com avanços em áreas específicas da enfermagem e estagnação em outras. Cabe destacar, ainda, a importância da utilização da Teoria das Representações Sociais na apreensão e compreensão de facetas importantes da realidade que toca à enfermagem. Nesse sentido, este referencial pode ser útil não somente para o desenvolvimento de estudos ou tarefas acadêmicas, mas para fornecer respostas a demandas que os enfermeiros possuem em sua cotidianidade, na concretização da profissão em sua relação com a clientela a compreensão de determinados comportamentos em função da influência das representações nas práticas adotadas, por exemplo e com as rotinas estabelecidas pelas instituições de saúde a partir da relação de um núcleo central que possui características altruístas e, por isso, tensiona com o desenvolvimento tecnológico e as relações institucionalizadas de poder, entre outras coisas. REFERÊNCIAS 1. Collière MF. Promover a vida. Lisboa (Po): Sind. dos Enfermeiros Portugueses; 1989. 2. Waldow VR. Cuidado humano: o resgate necessário. Porto Alegre (RS): Sagra Luzzato; 1998. 3. Almeida MCP, Mishima SM, Silva EM, Mello DF. O trabalho de enfermagem e sua articulação com o processo de trabalho em saúde coletiva: rede básica de saúde. 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Gomes AMT, Oliveira DC LA ESTRUCTURA REPRESENTACIONAL DE LOS ENFERMEROS SOBRE EL OFICIO DE ENFERMERÍA: NUEVOS MOMENTOS Y VIEJOS DESAFÍOS RESUMEN: Analizar la estructura representacional de enfermeros sobre la enfermería fue el objetivo de este estudio. Esta es una investigación cualitativa basada en la Teoría de las Representaciones Sociales en su abordaje estructural y desarrollada con 83 enfermeros de un municipio del Estado de Río de Janeiro Brasil. Los datos fueron recopilados a través de evocaciones livres del término inductor enfermería y analizados por el software EVOC, durante el segundo semestre de 2002. Se observa un núcleo estructurado en el amor y en la dedicación, al mismo tiempo en que los elementos de contraste presentan léxicos como cuidado, realización y profesionalismo. Esta estrucutura representacional revela una fuerte carga sentimental e ideológica de los enfermeros en relación a su profesión, así como expone representaciones relacionadas a dimensiones como actitud. Los datos demuestran la transición vivida por la enfermería, observándose dimensiones hegemónicas en determinados momentos históricos, como religiosidad y altruismo, y señala otras actuales, como el conocimiento y el profesionalismo. Palabras Clave: Enfermería; psicología social; investigación cualitativa; enfermero. Recebido em: 23.01.2007 Aprovado em: 04.06.2007 Notas * Enfermeiro. Doutor em Enfermagem pela Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professor Assistente do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rua dos Artistas, 225, Apt. 301. Vila Isabel. CEP 20511-130. E-mail: mtosoli@yahoo.com.br ** Doutora em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da USP. Professora Titular do Departamento de Fundamentos de Enfermagem e do Programa de Pós-Graduação stricto sensu/mestrado da Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Pesquisadora do CNPq. R Enferm UERJ, Rio de Janeiro, 2007 abr/jun; 15(2):168-75. p.175