O PROJETO PARALELA - ROMPENDO FRONTEIRAS E A BUSCA PELA EFETIVIDADE DA LEI MARIA PENHA NA COMARCA DE CORUMBÁ/MS

Documentos relacionados
SUMÁRIO. 1. Por que Maria da Penha? O ciclo da violência... 25

SUMÁRIO CÓDIGOS ESTATUTOS. Dispõe sobre o Estatuto de Defesa do Torcedor e dá outras providências LEGISLAÇÃO COMPLEMENTAR

ESTADO DE SANTA CATARINA CÂMARA MUNICIPAL DE BALNEÁRIO PIÇARRAS CNPJ: /

PROJETO DE LEI DE DE DE 2016.

CAPACIDADE À LUZ DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

CONSIDERAÇÕES JURÍDICAS SOBRE A SENILIDADE: OS AVANÇOS DECORRENTES DA IMPLEMENTAÇÃO DO ESTATUTO DO IDOSO

Direito Penal. Lei nº /2006. Violência doméstica e Familiar contra a Mulher. Parte 1. Prof.ª Maria Cristina

DIREITO CONSTITUCIONAL

LEI MARIA DA PENHA. o Processo Penal no caminho da efetividade. Valéria Diez Scarance Fernandes. Abordagem jurídica e multidisciplinar

ENUNCIADOS DO FONAVID, atualizados até o FONAVID VIII, realizado em Belo Horizonte/MG, entre 09 e 12 de novembro/2016.

II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

Plano de Atuação Defensoria Pública de MS Mato Grosso do Sul

ATIVISMO JUDICIAL E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS: UM CENÁRIO CONTROVERTIDO. Ariane Daruichi Coelho de Souza 1 Silvia Araújo Dettmer 2 RESUMO:

Palavras-chave: Violência, Gênero, Mulher, Lei Maria da Penha, Feminicídio.

SUMÁRIO. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL Publicado no Diário Oficial da União nº 191-A de 5 de outubro de 1988

Direitos da Pessoa com Deficiência

AS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA NA DINÂMICA DO NUMAPE/UEPG

2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE PARANAGUÁ/PR

PODER JUDICIÁRIO ESTADO DE MATO GROSSO - COMARCA DE VÁRZEA GRANDE JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL JUSTIÇA EM ESTAÇÕES TERAPÊUTICAS E PREVENTIVAS

POLÍTICA CRIMINAL ALTERNATIVA À PRISÃO: A CONCEPÇÃO DE UMA POLÍTICA DE SEGURANÇA PÚBLICA E DE JUSTIÇA

RESOLUÇÃO N 044/ 2010.

COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E DE CIDADANIA

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL Publicado no Diário Oficial da União nº 191-A, de 5 de outubro de 1988

Núcleo de Facilitação ao Diálogo DIALOGAR Dialogar para prevenir Educar é o caminho

MAPA DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER. Profa. Adriana Galvão

Violência contra as Mulheres: o caso Maria da Penha. Apresentação

A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO

PORTARIA N.15, DE 8 DE MARÇO DE 2017

ENUNCIADOS DO FONAVID, atualizados até o FONAVID X, realizado em Recife/PE, entre 12 e 15 de novembro de 2018.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

SUMÁRIO 2. COMENTÁRIOS À LEI /2006 ARTIGO POR ARTIGO LEI , DE 7 DE AGOSTO DE 2006

LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL

Agenda Nacional de Gênero no âmbito do Desenvolvimento Sustentável até Brasil

Resolução CONANDA nº 117 de 11/07/2006

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 554, DE

SUMÁRIO. Língua Portuguesa

Identificando entraves na articulação dos Serviços de Atendimento às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar em cinco capitais*

ANAIS DO II SEMINÁRIO SOBRE GÊNERO: Os 10 anos da lei Maria da Penha e os desafios das políticas públicas transversais

UMA CULTURA INTOLERÁVEL UM RETRATO DA VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

TERMO DE ACORDO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA ESPECIFICA. representado por seu Presidente Desembargador Ivan Ricardo Garisio Sartori, RG no

Mapa dos Feminicídios no maranhão ( )

PÓS GRADUAÇÃO PENAL E PROCESSO PENAL Legislação e Prática. Professor: Rodrigo J. Capobianco

ASSUNTO EDITAL VERTICAL E PASSO A PASSO DOS CICLOS DISCIPLINA O QUE + CAI. 4. Estudo e interpretação de textos de conteúdo literário ou informativo.

COORDENADORIA DA MULHER DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SERGIPE PROJETO INTERIOR EM REDE

MANIFESTO DA MAGISTRATURA E MINISTÉRIO PÚBLICO NEGROS PELA IGUALDADE RACIAL

A SEGURANÇA É HOJE A PRINCIPAL PREOCUPAÇÃO DO BRASILEIRO. Diversos fatores levaram à situação atual

OAB 1ª Fase Final de Semana. 1. A Constituição de determinado país veiculou os seguintes artigos:

Supremo Tribunal Federal

MANUAL DE DIRETRIZES NACIONAIS PARA EXECUÇÃ ÇÃO O DE MANDADOS JUDICIAIS DE MANUTENÇÃ

O suspeito, o acusado e o condenado frente aos direitos humanos fundamentais - II

DEVISA_VE_DANT_ VIGILÂNCIA VIOLÊNCIA

A INTERNACIONALIZAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS E SEU REFLEXO NO DIREITO BRASILEIRO 1. Mateus Schmidt 2.

O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, O MÍNIMO EXISTENCIAL E O ACESSO À JUSTIÇA 1

Direito Penal. Lei nº /2006. Violência doméstica e Familiar contra a Mulher. Parte 3. Prof.ª Maria Cristina

DEPCA (Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente) Paulo Sérgio Lauretto titular da DEPCA Campo Grande/MS

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 768, DE 2 DE FEVEREIRO DE 2017.

RESOLUÇÃO TJ/OE/RJ Nº11/2016 (TEXTO CONSOLIDADO)

SUMÁRIO. Capítulo I Teoria da Constituição...1

Centro de Referência de Atendimento à Mulher em Situação de Violência CRAMSV

CONSIDERANDO que o art. 73 da Lei n.º 9.504/97 dispõe sobre as Condutas Vedadas aos Agentes Públicos em Campanhas Eleitorais:

Tribunal de Justiça de Minas Gerais

DEFENSORIA PÚBLICA DE MATO GROSSO DO SUL DEFENSORIA PÚBLICA-GERAL DO ESTADO RESOLUÇÃO DPGE Nº 093/2015, DE 19 DE MAIO DE 2015.

COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E DE CIDADANIA

Direito Constitucional

CONSELHO SUPERIOR DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO

CONCURSO DE INVESTIGADOR - POLÍCIA CIVIL DA BAHIA

O PRINCIPIO DA IGUALDADE E A LEI MARIA DA PENHA

POLÍTICA DE ALTERNATIVAS PENAIS: A CONCEPÇÃO DE UMA POLÍTICA DE SEGURANÇA PÚBLICA E DE JUSTIÇA 1

6 - Réu Lídio Laurindo: restou absolvido de todas as acusações; 7 - Réu Cildo Ananias: restou absolvido de todas as acusações.

TÍTULO: O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E SEU IMPACTO NO FENÔMENO DA APLICAÇÃO DO DIREITO SOB A PERSPECTIVA CONSTITUCIONAL E PRINCIPIOLÓGICA.

A EXTRADIÇÃO DE BRASILEIRO NATO: UMA ANÁLISE DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E SUA APLICABILIDADE

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL DO MUNÍCIPIO DE CASCAVEL/PR NO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES

SEJUDH SUMÁRIO. Noções Básicas de Direito Constitucional. Direitos e deveres fundamentais Direitos e deveres individuais e coletivos...

PÓS GRADUAÇÃO PENAL E PROCESSO PENAL Legislação e Prática aula 1. Professor: Rodrigo J. Capobianco

CARTA DE BRASÍLIA DO ENFRENTAMENTO À EXPLORAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES PARA FINS COMERCIAIS.

Pós Penal e Processo Penal. Legale

CONVENÇÃO INTERNACIONAL DE DIREITOS DAS PESSOAS IDOSAS

A LEI MARIA DA PENHA E AS FORMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER RESUMO

PENAS ALTERNATIVAS. Discriminação Racial e as Penas Alternativas

ENUNCIADOS. Suspensão Condicional do Processo. Lei Maria da Penha e Contravenções Penais

O suspeito, o acusado e o condenado frente aos direitos humanos fundamentais I

TÍTULO: OS DESAFIOS DA VIOLÊNCIA: A APLICAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA NAS UNIÕES HOMOAFETIVAS MASCULINAS

SUMÁRIO DIREITO CONSTITUCIONAL

SUMÁRIO 1. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA) LEI 8.069/ Introdução 2. Direitos fundamentais 2.1 Direito à vida e à saúde 2.2 Direito à

Lei Maria da Penha completa 8 anos

NOTA DE ATUALIZAÇÃO/ERRATA MARÇO/2018

DIREITO INTERNACIONAL

MATÉRIA CONTEÚDO SITUAÇÃO

TEMAS INTRODUTÓRIOS Vídeo: Prisão Parte I do início até 1:29:58

Política Nacional de Segurança Pública - PNaSP

CARGA HORÁRIA SEMANAL: 03 CRÉDITO: 03 CARGA HORÁRIA SEMESTRAL: 45 NOME DA DISCIPLINA: DIREITO PENAL V (LEGISLAÇÃO ESPECIAL) NOME DO CURSO: DIREITO

Direito Penal. Lei nº /2006. Violência doméstica e Familiar contra a Mulher. Parte 4. Prof.ª Maria Cristina

PROFESSORA RAQUEL TINOCO

DEFENSORIA PÚBLICA. VADE mecum DIOGO ESTEVES FRANKLYN ROGER ALVES SILVA

SMAB Nº (Nº CNJ: ) 2017/CRIME

Lei de Execução Penal Lei 7.210/84. Prof. Gladson Miranda

Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Décima Sexta Câmara Cível

DIREITO PENAL. Exame de Ordem Prova Prático-Profissional 1 PEÇA PROFISSIONAL

Transcrição:

O PROJETO PARALELA - ROMPENDO FRONTEIRAS E A BUSCA PELA EFETIVIDADE DA LEI MARIA PENHA NA COMARCA DE CORUMBÁ/MS Maria Angélica Biroli Ferreira da Silva 1 Emilly Ferreira da Silva Sakurai 2 RESUMO: O presente trabalho apresenta uma reflexão sobre a efetividade da Lei Maria da Penha e o seu papel jurídico-social no combate a violência doméstica por meio do Projeto Paralelas Rompendo Fronteiras, convenio firmado em novembro de 2016, entre o Ministério Público do Estado do Mato Grosso do Sul (6ª Promotoria de Justiça de Corumbá), o Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul (2ª Vara Criminal de Corumbá) e o Município de Corumbá, e tem como escopo buscar romper o ciclo de violência domestica, familiar e intima de afeto. Palavras-chave: direitos humanos da mulher; Lei Maria da Penha; efetividade; Projeto Paralelas-Rompendo Fronteiras Grupo de Trabalho 5. Fundamentos teóricos e contemporaneidade dos Direitos Humanos Problema da Pesquisa: O presente trabalho aborda os direitos fundamentais da mulher e seu desenvolvimento ao longo direito constitucional brasileiro, até o advento da lei 11.340/2006, mais conhecida como Lei Maria da Penha, que completou 10 anos em 2016, e nesse contexto, centra-se, notadamente, na busca pela sua efetividade jurídico-social através da implantação na Comarca de Corumbá/MS do Projeto Paralelas Rompendo Fronteiras. O projeto tem por escopo romper o ciclo de violência doméstica, familiar e intima de afeto, através de um acompanhamento humanizado, oferecido de forma compulsória ao agressor numa perspectiva reflexiva e responsabilizante, permitindo, assim, uma mudança de comportamento nos relacionamentos a partir do acompanhamento e orientação de profissionais técnicos especializados, mediante dialogo e o relacionamento interpessoal. Objetivo Objetivou-se com o presente estudo apurar a efetividade da Lei Maria da Penha à luz da implantação na Comarca de Corumbá do Projeto Paralelas-Rompendo Fronteira que impõe ao agressor a participação em reuniões que visam uma mudança de comportamento a partir da sua conscientização. 1 Professora Mestre do Curso de Direito da UFMS-Campus do Pantanal 2 Graduanda do Curso de Direito do Curso de Direito da UFMS-Campus do Pantanal

2 Referencial Teórico metodologia: Na lição de Barroso (2014, p. 231) Uma das grandes mudanças de paradigma ocorridas ao longo do século XX foi a atribuição a norma constitucional do status de norma jurídica. A Constituição deixou de ser apenas uma Carta Política, e passou a atuar como centro gerador das normas jurídicas do Estado, a ocupar o espaço de Lei Maior do Estado. Sarlet, Marioni e Mitidiero (2016, p. 198) salientam que os dispositivos constitucionais são parâmetro para a interpretação, integração e aplicação das demais normas jurídicas, influenciando, nesse sentido, toda a ordem jurídica, ademais de implicarem um dever de interpretação conforme a Constituição. Ainda seguindo o pensamento de Barroso (2014, p. 233), em sendo a Lei Maior do Estado brasileiro à Constituição de 1988 está imbuída uma série de características singulares, dentre elas destacamos a superioridade jurídica e a efetividade. Lecionam Sarlet, Marioni e Mitidiero (2016, p. 193): A efetividade das normas constitucionais diz respeito, portanto, a pretensão de máxima realização, no plano da vida real, do programa normativo abstratamente estabelecido (embora tal programa normativo seja ele próprio fruto de uma articulação com o mundo dos fatos, da economia, dos movimentos sociais etc.), em outras palavras, como também pontua Luís Roberto Barroso, ao processo de migração do dever ser normativo para o do plano do ser da realidade social. Apelidada de Constituição Cidadã pelo Deputado Constituinte Ulisses Guimaraes, a Constituição Federal de 1988, também inova ao positivar uma série de Direitos Fundamentais e dispõe logo em seu art. 1º, inciso III, a Dignidade da Pessoa Humana como fundamento do Estado Brasileiro. Como leciona Sarlet (2009, p. 69), o constituinte de 1988, de forma clara e inequívoca outorgou aos princípios fundamentais a qualidade de normas embasadoras e informativas de toda a nossa ordem constitucional, e assim, os direitos fundamentais passaram a ser considerados como núcleo essencial da nossa Constituição Federal de 1988. Como já mencionado, a Constituição Federal de 1988, tratou de positivar uma série de Direito Fundamentais tendo como fundamento maior o princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Vários desses direitos fundamentais estão concentrados no art. 5º, mas não fechados num rol taxativo, sendo assim, encontramos vários dispositivos que versam sobre direitos fundamentais além dos enunciados no art. 5º. Dessa forma, invocamos o art. 226, 8 da Constituição Federal para inaugurarmos a primeiras falas acerca da Lei Maria da Penha. O artigo em debate está localizado no Titulo VIII, que trata da Ordem Social, e no Capítulo VI, que dispõe de várias normas programáticas acerca da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso. O 8º, do art. 226, da Constituição Federal dispõe que o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. Bastos (2002, p 790), enfatiza que O importante é reter a ideia de que a nossa Constituição vela pela integridade da família na pessoa de cada um de seus integrantes, criando até mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.

3 A Constituição Federal de 1988 elenca como objetivos da Republica Federativa do Brasil, a realização da justiça social, a construção de uma sociedade livre, justa e solidaria, o desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3o, I a IV, da Constituição Federal). Não há como se falar em justiça social sem erradicar a discriminação e a violência contra as mulheres e a família. (Fernandes, p. 40) Fernandes (2015, p. 40) salienta ainda, que, no âmbito das relações de gênero e das relações familiares, a Constituição Federal prevê a igualdade entre homens e mulheres (art. 5o, I, da Constituição Federal) e a família como base da sociedade, com proteção do Estado. Na Constituição Federal de 1988, previu-se, expressamente, a igualdade de homens e mulheres em direitos e obrigações (art. 5o, I), rompendo-se, assim, pelo menos, no tocante a igualdade formal, como o sistema patriarcal que imperava no ordenamento jurídico pátrio. Em 2006, foi sancionada a Lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha. A Maria da Penha era uma farmacêutica, casada com um professor universitário. Após anos de violência domestica, foi vitima de duas tentativas de homicídio praticadas por seu marido e ficou paraplégica em 1983. Houve dois julgamentos pelo Tribunal do Júri, mas o agressor de Maria da Penha somente foi preso em 2002 e cumpriu dois anos de pena. Fernandes, p. 16) Para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), ficou clara a falta de compromisso do Brasil, país signatário de tratados internacionais sobre defesa de Direitos da Mulher, quanto à eficiência dos procedimentos policiais e jurídicos para reagir de forma adequada à violência doméstica, uma vez que as providências tomadas não eram providas de praticidade e de efeitos positivos, causando, por vezes mais dores às vitimas que recorriam ao Poder Judiciário no intuito de ver solucionado um problema tão delicado, por ter origem no ambiente familiar, e ao mesmo tempo em que causa tanta dor as suas vitimas. (OLIVEIRA, Elisa Rezende e CAMACHO, Henrique, 2012, 98-99). No caso da Maria da Penha o Brasil foi condenado a pagar vinte mil dólares de indenização tendo por base o descumprimento do art. 7º da Convenção de Belém do Pará e dos artigos 1º, 8º e 25 da Convenção Americana de Direitos Humanos, fato que gerou além da condenação em dinheiro a Maria da Penha, um dever de reformular todo o sistema processual vigente voltado à defesa das vitimas de violência doméstica. (OLIVEIRA, Elisa Rezende e CAMACHO, Henrique, 2012, 98-99). Na busca pela efetividade da Lei Maria da Penha, após dez anos de sua promulgação e de um olhar, quase, exclusivamente, voltado às vitimas da violência doméstica, a rede de proteção à mulher vitima de agressão passou a considerar que o agressor também precisava fazer parte desse processo e não apenas como agente ativo da agressão e merecedor de uma punição por parte do Estado. O agressor recebia do Poder Publico a condenação ao fim do processo ou, durante o curso do mesmo, lhe eram impostas medidas restritivas como, por exemplo, o afastamento do lar. Todavia pelos números aferidos a cada ano era visível que havia uma falha quanto à efetividade da Lei no combate e prevenção da violência doméstica e familiar, com a clara percepção de que a Lei não estava, de fato, cumprindo o seu papel.

4 A partir dessa percepção, depois de dez anos de vigência da Lei Maria da Penha, a rede de proteção sentiu a necessidade de ampliar o foco de visão e passou a considerar que não era somente a mulher que era vitima da agressão, mas também a sua família, a Lei estava tendo um papel, na maioria das vezes, apenas paliativo, já que cuidava apenas dos sintomas e não das causas. Partindo dessa premissa verificou-se a necessidade de mudar a forma como vinha sendo tratado o agressor, passando a considerá-lo, não somente como sujeito ativo de um delito e merecedor de receber a sua punição, mas também de receber ajuda psicossocial numa perspectiva reflexiva e responsabilizante de seus atos. Com o intuito de tornar a Lei Maria da Penha mais efetiva no seu papel de combate e prevenção à violência doméstica e familiar que foi firmando em novembro de 2016, um convenio entre o Ministério Publico, o Poder Judiciário de Mato Grosso do Sul e a Prefeitura de Corumbá para atender aos agressores que por meio de uma medida imposta pela 2ª Vara Criminal de Corumbá são obrigados a frequentar durante cinco semanas, sendo uma reunião por semana, um grupo formado por psicólogos e assistentes sociais, bem como um operador do direito com o objetivo de levar esses agressores a refletir sobre seus atos, permitindo a eles uma mudança de comportamento em seus relacionamentos. Conforme Convênio de Cooperação Técnica firmado com base na Lei 8.666/93 e suas alterações pelo Decreto n. 11.261 de 16 de junho de 2003, Processo n. PGJ/10/3619/2016, o Projeto desenvolve encontro semanais para os grupos de homens agressores, contra os quais foi aplicada medida protetiva, abordando temas como gênero, família, violência, sentimento, machismo, alcoolismo, resolução de conflitos dentre outros. Após a abordagem desses temas será realizado um intervalo de 30 dias, para se avaliar o impacto do trabalho para os participantes. O presente estudo foi realizado em Corumbá, Mato Grosso do Sul, promovendo-se levantamento de dados perante o Ministério Público do Trabalho, Polícia Federal, Polícia rodoviária Federal, bem como perante a Justiça Federal e a Justiça do Trabalho local, além pesquisa bibliográfica. O presente estudo foi realizado em Corumbá, Mato Grosso do Sul, promovendo-se levantamento de dados perante o Ministério Público e Poder Judiciário do Mato Grosso do Sul, Prefeitura Municipal de Corumbá e revisão bibliográfica. Resultados Alcançados: O Projeto Paralelas - Rompendo Fronteira vem sendo realizado desde março de 2017, encontra-se na quarta turma, tendo sido finalizada a ultima turma em julho de 2017. O comparecimento do agressor de violência doméstica é obrigatório, por determinação do Juiz da 2ª Vara Criminal de Corumbá, com base no art. 152, único, da Lei de Execução Penal quando se trata de agressores já condenados e nos termos do art. 22, 1º e 4º da Lei Maria da Penha em caso de medida protetiva. Referencia bibliográfica: BARROSO, Luis Roberto. Direito Constitucional Contemporâneo Os Conceitos Fundamentais E A Construção Do Novo Modelo. 2- edição. São Paulo. Saraiva, p. 231, 233. 2010.

5 BASTOS, Celso Ribeiro de Bastos. Curso de Direito Constitucional. Editora Celso Bastos. São Paulo. p. 790. 2002; FERNANDES, Valéria Dies Scarance. Lei Maria da Penha: O Processo Penal no caminho da efetividade. Tese. Doutorado em Processo Penal. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo-PUC-SP, 2013. Disponível em: https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/6177/1/valeria%20diez%20scarance%20ferna ndes.pdf. OLIVEIRA, Elisa Rezende e CAMACHO, Henrique. Lei Maria da Penha e Política Criminal: Uma constante luta em prol da efetivação dos direitos humanos das mulheres., 2012, p. 98-99. Ed. 9, Revista do Laboratório de Estudos da Violência e Segurança. Unesp/Marilia/SP, 2012. Disponível em: http://www2.marilia.unesp.br/revistas/index.php/levs/article/view/2239 PIOVEZAN, Flavia. Temas de Direitos Humanos. 7ª edição. São Paulo. Editora Saraiva. 2014. SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. 7ª ed. Porto Alegre. Livraria do Advogado. p. 69. 2009. SARLET, Ingo, MARIONINI, Luiz Guilhermo, Mitiero Daniel. Curso de Direito Constitucional. 4. ed. ampl., incluindo novo capítulo sobre princípios fundamentais São Paulo. Saraiva, p. 193, 198. 2015;