A efetividade das formas de reparação civil do dano ambiental ecológico ao meio e ao agente causador 1

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Transcrição:

A efetividade das formas de reparação civil do dano ambiental ecológico ao meio e ao agente causador 1 Eloísa Trevisan Capaverde 2 Resumo: O meio ambiente ecologicamente equilibrado possui grande destaque na atualidade, uma vez que é direito e dever de todos A responsabilidade civil ambiental imputada ao agente causador de um dano ecológico é objetiva e deve ser efetivamente imposta através das formas de reparação previstas no ordenamento jurídico brasileiro Fundamental se faz a reparação dos danos causados ao meio ambiente, pois afetam o equilíbrio ecológico e consequentemente, a todos Palavras-chave: Responsabilidade civil ambiental - Dano ecológico Efetividade - Formas de reparação Abstract: Nowadays the ecologically balanced environment has had great prominence since it is the right and duty of everybody The environmental civil responsibility imputed to an agent of ecological damage is objective and must be effectively enforced through the legal remedies provided for in Brazilian law It has become crucial for compensation for damage caused in the environment, since they affect the ecological balance consequently all of us Keywords: Environmental civil responsibility - Ecological damage Effective - Legal remedies Introdução A questão ambiental é atualmente tema de ampla repercussão social, estando inserida nas discussões que versam sobre a sobrevivência humana no planeta, economia, educação, saúde Há tempos são realizados eventos mundiais sobre Meio Ambiente, como a Conferencia de Estocolmo em 1972, a Rio 92, onde, em 1992, 108 países do mundo se reuniram no Rio de Janeiro visando encontrar medidas de diminuição da degradação ambiental, sem nos esquecermos do Relatório de Brundtland, elaborado em 1987, antes da Rio 92, o qual se preocupou com o desenvolvimento sustentável O viés preventivo do direito ambiental fortalece os atos presentes para não influenciarem na degradação futura, restando ao instituto da responsabilidade civil ambiental sua materialização através das formas de reparação do dano ambiental previstas no ordenamento jurídico brasileiro Questões sociais como o crescimento natural da população, emissão de gases e poluição trazem problemas à preservação 1 Trabalho de Curso apresentado ao Curso de Direito da Faculdade Cenecista de Osório, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito, orientado pela Professora Mestre Fernanda Mallmann Pacheco 2 Acadêmica do 9º semestre do Curso de Direito da Faculdade Cenecista de Osório Página 21

ao meio ambiente, importando na aceitação de responsabilidade por parte dos cidadãos para a garantia da qualidade ambiental O aparato técnico para prevenção do dano ambiental é também vasto Existe o Licenciamento Ambiental, a Auditoria Ambiental, o Estudo Prévio de Impacto Ambiental, as Audiências Públicas, campanhas de preservação, dentre outros, que formam um conjunto de medidas de prevenção e precaução do dano ambiental que deve ser reparado O crescimento das demandas judiciais torna necessária a atualização do operador do Direito reinterpretando institutos a fim de garantir a efetividade dos instrumentos jurídicos que responsabilizem civilmente o agente causador do dano ambiental A abordagem do assunto traz uma reflexão sobre a efetividade da responsabilidade civil por dano ambiental ecológico através das formas de reparação previstas no ordenamento jurídico brasileiro Temos como tema, portanto, A efetividade das formas de reparação civil do dano ambiental ecológico ao meio e ao agente causador Com a constitucionalização da proteção ao meio ambiente (VENOSA, 2009), houve um avanço na garantia às presentes e futuras gerações de um meio ambiente equilibrado e saudável, encontrando nas formas de reparação do dano ambiental ecológico um meio, um instrumento para a tentativa de resgatar algo supostamente irreversível Trabalharemos com o conceito de meio ambiente através de uma visão estrita, como sendo [] a expressão do patrimônio natural e as relações com e entre os seres vivos Tal noção, é evidente, despreza tudo aquilo que não diga respeito aos recursos naturais (MILARÉ, 2011, p 143), ou seja, trataremos do meio ambiente ecológico Desta forma, o problema que norteia esta pesquisa é a verificação e análise da efetividade das formas de reparação do dano ambiental ecológico ao meio e ao agente causador do dano Página 22

Duas hipóteses foram o ponto de partida para a realização deste estudo: a primeira, de que a evolução da responsabilidade civil de subjetiva para objetiva garante a responsabilização do agente causador do dano e salvaguarda o Direito Ambiental, bem como partimos da premissa de que as formas de reparação do dano ambiental ecológico são instrumentos jurídicos de efetivação da responsabilidade civil objetiva, as quais buscam a responsabilização do agente e o consequente restabelecimento ecológico e a preservação ambiental A responsabilidade civil é o instituto que remete o agente causador do dano a repará-lo, fazendo-o compreender a ideia que deve sustentar a sociedade em geral hoje, que é a de proteção e preservação do meio ambiente para a consequente qualidade ambiental para as presentes e futuras gerações Através da responsabilização, ou seja, da resposta do agente causador do dano em relação aos seus atos, aplica-se a norma ao caso concreto, que gerará efeitos jurídicos, ocorrendo então a efetividade do resultado decorrente da decisão e aplicação da norma Considerando que a sobrevivência da espécie humana em sociedade é imprescindível a todos, necessária se faz a efetividade da proteção ambiental, impondo ao agente causador do dano a obrigação de repará-lo para a garantia de um meio ambiente ecologicamente equilibrado Assim, o Direito Ambiental apresenta instrumentos passíveis de darem respostas à sociedade e aos fatos ocorridos Necessitamos do estudo de mecanismos jurídicos que possibilitem a conciliação dos interesses discutidos: o desenvolvimento das inovações tecnológicas e a proteção ambiental, pois o progresso da ciência, da tecnologia e da inovação vem promover a prosperidade da qualidade de vida dos seres humanos na sociedade, mas esse progresso também resulta em riscos e consequências irreversíveis à vida no planeta Precisamos indicar as bases teóricas para o estudo da efetividade do Direito, especialmente do Direito Ambiental, ao amparo da seguridade das inovações tecnológicas, demonstrando maior interesse à aplicação do princípio da precaução na construção desses modelos (PACHECO, 2009, p 18) Importante referir que abordaremos somente questões que envolvem o dano ambiental ecológico, muito embora, é sabido, que não necessariamente precisa existir um dano ambiental para haver responsabilização, o risco que a atividade Página 23

humana, empresária oferece já implica em responsabilização, ou seja, responsabilidade civil pelo dano ambiental futuro Em síntese, o dano ambiental futuro é a expectativa de dano de caráter individual ou transindividual ao meio ambiente Por se tratar de risco, não há dano atual nem certeza científica absoluta de sua ocorrência futura, mas tão-somente a probabilidade de dano às futuras gerações [] (CARVALHO, 2008, p127) Este estudo traz inicialmente um apanhado sobre a evolução histórica da responsabilidade civil, ressaltando a passagem da responsabilidade subjetiva para a objetiva Focaremos no instituto da responsabilidade civil objetiva por dano ambiental ecológico no sentido de ser ela o instrumento de efetividade da imputação ao agente causador, responsabilidade esta que assume caráter coercitivo, dissuatório e pedagógico Voltaremos os olhos para a difícil conceituação legal da palavra dano e, finalmente, verificaremos e analisaremos os instrumentos jurídicos de imputação da responsabilidade civil ao agente e, paralelamente, o efeito restaurador no caso concreto Para a elaboração deste estudo, foram avaliadas as legislações ambientais no âmbito nacional reconhecidamente importantes para este instituto O estudo conta com pesquisa de acórdãos do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul e do Tribunal Regional Federal da 4ª Região para o fim de analisar a efetividade das formas de reparação civil do dano ambiental ecológico ao meio e ao agente causador 2 A responsabilidade civil e sua evolução A responsabilidade é um dos institutos jurídicos mais antigos, por isso, quando se aborda este assunto, indispensável se faz compreender sua origem, tendo em vista que a mesma se amolda a diversos ramos do Direito brasileiro No princípio, adotouse a teoria da responsabilidade civil subjetiva trazida pelo Código Civil de 1916 no artigo 159 3, momento em que o Brasil ainda era identificado como país característico de um sistema agrário e colonial 3 Artigo 159 do Código Civil de 1916: Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano A verificação da culpa e a avaliação da responsabilidade regulam-se pelo disposto neste código Página 24

Em 2002, houve uma alteração no diploma legal datado de 1916, a qual recepcionou a regra geral da responsabilidade civil como subjetiva Os dispositivos passaram a ser o 186 4 e 927 5 do Código Civil, que inovou dizendo que quem causar dano, por ato ilícito, fica obrigado a reparar A responsabilidade civil tem por função impor a reparação por dano causado, calcada num sentimento de justiça, além de trazer a certeza da imputação numa vocação preventiva (CANOTILHO, 2010) Na temática ambiental, há a necessidade de restabelecer-se o equilíbrio ecológico recolocando o bem lesado no status quo ante Como espécies de responsabilidade civil, a doutrina e a legislação trazem a responsabilidade contratual e a extracontratual (LEMOS, 2010) A primeira advém de um contrato, de um negócio jurídico, a segunda tem foco no que diz respeito aos direitos difusos e coletivos, não está prevista em contrato ou negocio jurídico como a primeira A responsabilidade civil extracontratual está de forma genérica preceituada no artigo 927 do atual Código Civil, apontando para a infração, violação de um dever legal Há, portanto, a obrigação de indenizar oriunda de uma violação de um dever de conduta, pois, em relação ao meio ambiente, não há um contrato com a coletividade, há sim um dever e um direito de todos ao meio ambiente equilibrado O instituto da responsabilidade civil em geral deve ser analisado através de duas teorias: a teoria da responsabilidade civil subjetiva, que considera a culpa do agente causador do dano cuja conduta culposa vem eivada ou de imprudência, ou de negligência ou de imperícia e a teoria da responsabilidade civil objetiva, que não analisa culpa do agente Como a responsabilidade civil é matéria dinâmica e bastante divergente na doutrina e jurisprudência, este instituto sofre constantes transformações sociais e novas 4 Artigo 186 do Código Civil de 2002: Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito 5 Artigo 927 caput do Código Civil de 2002: Aquele que, por ato ilícito (artigos 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo Página 25

relações são desencadeadas entre os seres humanos, novas demandas judiciais vão surgindo e multiplicidade de interações tornou a responsabilidade civil subjetiva insuficiente para cumprir e atender as demandas de cada dia, assim, [] as atividades humanas já não podiam mais ser baseadas somente em resultados certos e concretos, deveríamos visualizar os prováveis riscos de qualquer atividade [] (PACHECO, 2009, p 27) O surgimento de novas tecnologias, a evolução da ciência, a natureza difusa do Direito Ambiental, a pluralidade de vítimas atingidas, a característica do dano ambiental, dentre outros fatores (BINDA, 2009), fizeram com que a responsabilidade civil subjetiva perdesse sua força, não atendendo aos fatos em si Eis que, frente à ineficácia desta forma de responsabilização, a responsabilidade civil objetiva passou a preponderar quando se fala em questões ambientais, uma vez que o pressuposto da culpa não mais atendia as necessidades da sociedade moderna 21 A responsabilidade civil objetiva pelo dano ambiental ecológico Ao tratarmos de responsabilidade civil por dano ambiental, em geral há que se referir às três esferas de imputação de responsabilização do agente causador do dano, dentre elas a administrativa, a penal e a civil (VENOSA, 2009) Consideramos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado um direito fundamental do homem, uma vez que o escopo da norma é a tutela do direito à vida das presentes e futuras gerações Desta forma, [] todo aquele que atue de forma contrária a esse direito deve ser responsabilizado [] (LEMOS, 2010, p155) Uma mesma conduta pode incidir na responsabilização do agente de forma administrativa, penal e através de uma sanção civil, de natureza reparatória e que será a forma analisada neste estudo Diante do histórico da legislação, observamos que a lei da Política Nacional do Meio Ambiente, de número 6938 de 1981, anterior à atual Constituição Federal, já previa a responsabilidade civil ao agente causador do dano ambiental A referida lei em seu artigo 14, parágrafo 1º, diz: Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou Página 26

correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores: Parágrafo 1º: Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar pos danos causados ao meio ambiente e a terceiro, afetados por suas atividades [] Posteriormente à lei citada, em 1988 a atual Constituição Federal trouxe em seu artigo 225, parágrafo 3º 6, o tema da responsabilidade civil pelo dano ambiental elegendo a forma objetiva, neste dispositivo, está consagrada a responsabilidade civil objetiva [] (VENOSA, 2009, p 214) As normativas de reparação também estão previstas no atual Código Civil, que as refere no artigo 927 parágrafo único e diz: Haverá obrigação de reparar o dano, independente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem O referido artigo é norma aberta para a responsabilidade civil objetiva no ordenamento jurídico brasileiro, realçando o poder discricionário e análise do julgador Neste contexto, a responsabilidade civil pelo dano ambiental ecológico é objetiva e não faz menção à existência de culpa na conduta do agente causador do dano ambiental, tão somente considera sua conduta, o nexo de causalidade e o dano ambiental ocorrido, como podemos observar, Mención expressa merece el nuevo tratamiento de la responsabilidad por daños ambientales, en lo que ha influido la progressiva efectividad de los dictados del principio contaminador-pagador, dando lugar a la entrada em este campo de la responsabilización extra culpa (MATEO, 2003, p 66-67) Outrossim, é rica a jurisprudência que demonstra o caráter objetivo da responsabilidade civil por dano ambiental ecológico com fulcro na práxis dos magistrados do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul Senão vejamos: APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO CIVIL PÚBLICA DANO AMBIENTAL QUEIMADA EM CAMPO NATIVO RECUPERAÇÃO DA ÁREA DEVASTADA OU COMPENSAÇÃO RESPONSABILIDADE OBJETIVA Comprovada a ocorrência do dano ambiental, decorrente de queimada em campo nativo, surge a obrigação de reparação ou de compensação, bem definidas na sentença, especialmente por se tratar de responsabilidade objetiva Observância de dispositivos constitucionais e infraconstitucionais que buscam a preservação do meio ambiente APELAÇÃO DESPROVIDA (Apelação Cível Nº 70043178524, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Almir Porto da Rocha Filho, Julgado em 13/07/2011) (grifo nosso) 6 Artigo 225, 3º da Constituição Federal de 1988: As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados Página 27

Com efeito, a adoção da teoria objetiva de responsabilidade civil constitui um avanço, pois imputa ao agente causador do dano o dever de repará-lo, não exigindo a análise da culpa (CAVALIERI FILHO, 2010) Se fosse necessária tal discussão, mais morosa seria a efetivação da responsabilização prejudicando a especificidade das questões ambientais 3 Dano ambiental A origem da palavra dano está no latim e significa damnum, que quer dizer: [] todo mal ou ofensa que se cause a alguém e do qual resulte uma deterioração ou destruição à sua coisa ou um prejuízo ao seu patrimônio [] (BARROS, 2008 p 220) O dano ambiental é transfronteiriço (TEIXEIRA, 2006), pois não respeita as fronteiras geopolíticas demarcadas pelo homem Em razão da natureza difusa do direito ambiental em atingir vítimas indeterminadas, é tarefa difícil identificar os sujeitos que sofreram a degradação ambiental (VENOSA, 2009) Ilustramos referindo o acidente nuclear de Chernobyl, ocorrido em 26041986 na antiga União Soviética, onde uma nuvem radioativa afetou a Finlândia Decorridos mais de vinte anos, algumas espécies ainda apresentam sinais de toxicidade por césio 137, substância cancerígena (BELTRÃO, 2011) A Lei 6938/81 trata da Política Nacional do Meio Ambiente e não traz um conceito de dano ambiental, apenas no artigo 3º, incisos II e III, define, de forma abrangente, poluição e da degradação 7 Está expresso no artigo 225 8, caput e incisos, da Carta Magna que o meio ambiente é direito fundamental e o mesmo artigo impõe a todos o dever de preservá-lo, protegê-lo e defendê-lo para as presentes e futuras gerações Além disso, o 7 Artigo 3º da Lei 6938/81: Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: II:degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do meio ambiente; III:poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a)o prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos 8 Artigo 225 caput da Constituição Federal de 1988: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações Página 28

parágrafo 2º 9 do mesmo artigo traz condições para reparabilidade e, como primeira medida a ser preterida pelo agente causador do dano, a recuperação do meio ambiente afetado A literatura jurídica tem encontrado dificuldades para ter uma definição Uma das justificativas está no sentido de que a própria Constituição Federal não traz um conceito explicito de meio ambiente, que está sujeito a ser compreendido de acordo com a realidade concreta (MILARÉ, 2011) Por a lei não trazer um conceito de dano ambiental, buscamos na construção doutrinária alguns conceitos: [] o dano ambiental será a degradação do meio ambiente, como tal, independentemente das repercussões nas pessoas e nos seus bens [] (STEIGLEDER, 2004, p120) Ainda sobre o mesmo conceito, dano do ponto de vista jurídico, é a lesão a um bem juridicamente protegido, ou seja, lesa um direito da vítima e não um simples interesse, havendo para sua configuração um prejuízo e a violação ao direito (BECHARA, 2009, p49) Destacamos neste sentido o entendimento que [] dano ambiental significa uma alteração indesejável ao conjunto de elementos chamados meio ambiente, como, por exemplo, a poluição atmosférica; seria, assim, lesão a um direito fundamental [] (LEITE, 2003, p 94) A existência do dano deve ser vista como pressuposto necessário da obrigação de reparar, uma vez que é elemento imprescindível para configuração da responsabilidade civil Como podemos observar em outra definição, dano ambiental pode ser entendido como: [] toda degradação do meio ambiente, incluindo aspectos naturais, culturais e artificiais que permitem e condicionam a vida, visto como bem unitário imaterial coletivo e indivisível, e dos bens ambientais e seus elementos corpóreos e incorpóreos específicos que o compõem, caracterizadora da violação do direito difuso e fundamental de todos a sadia qualidade de vida em um ambiente são e ecologicamente equilibrado (MIRRA, 2004, p 94) Configurada a existência do dano, este deve se submeter a determinadas condições para se falar em reparação O dano deve ser certo quanto a sua existência, atual no 9 Artigo 225, 2º da Constituição Federal de 1988: Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei Página 29

sentido de ter sido consumado ou pelo menos iniciado e direto, bem como o resultado deve ter sido danoso (MIRRA, 2004) O dano ambiental deve ser entendido como a violação ao direito da coletividade ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (BELTRÃO, 2011) e isso implicará a aplicação imediata de uma ou mais formas de reparação previstas no ordenamento jurídico Diante da dificuldade em pontuar especificamente a concepção de dano ambiental, alguns aspectos devem ser considerados, tais como: a amplitude do bem protegido, a reparabilidade, o interesse envolvido e a extensão do dano ambiental 10 Em relação à amplitude do bem protegido, focaremos no dano ecológico puro, ou seja, relacionado apenas com os componentes naturais do ecossistema, pois [] dano ambiental significaria dano ecológico puro e sua proteção estaria sendo feita em relação a alguns componentes essenciais do sistema [] (LEITE, 2003, p 95), danos que atingiriam bens da natureza, apenas No que diz respeito à reparabilidade e ao interesse envolvido, a classificação pode ser feita em relação ao dano ambiental de reparabilidade direta, quando interesses próprios e individuais estão envolvidos Na reparabilidade indireta, o foco está nos interesses difusos, coletivos e eventualmente individuais, a reparação diz respeito à capacidade funcional ecológica do meio ambiente, [] a reparação indica uma ideia de ressarcimento, ou compensação do dano sofrido; é assim um dos efeitos da responsabilidade civil [] (LEITE, 2003, p 208) A palavra recuperação traz em seu significado a ideia de obter novamente o estado, a coisa, a condição que se perdeu, reabilitar, indenizar, ressarcir (FERREIRA, 2004) A reparação ambiental em geral pressupõe um dano já causado, alvo de providência ressarcitória ou compensatória desejada como meio de obter a cessação ou diminuição de prejuízo, ocorrendo então a supressão do fato danoso Ela é um dos efeitos da responsabilidade civil objetiva perseguida quando se quer agir sobre o prejuízo, é uma medida de rigor e justiça, considerando a relevância da tutela ambiental 10 Classificação conforme a obra DANO AMBIENTAL: do individual ao coletivo extra patrimonial do doutrinador José Rubens Morato Leite, p 95 Página 30

[] Ora, a reparação do prejuízo ambiental significa a adaptação do meio ambiente degradado e dos seus elementos atingidos a uma situação que possa ser a mais próxima possível daquela anterior à realização do dano ou daquela em que estariam se o prejuízo não tivesse se verificado A questão, uma vez mais, e como sempre, se resume em encontrar, em cada caso concreto, a melhor forma de compensar o prejuízo causado e de efetivála[] (MIRRA, 2004, p 307) O dano ambiental afeta o equilíbrio ecossistêmico, ao qual toda coletividade faz jus, está sempre ligado ao aniquilamento de um direito, ratificando que se trata sempre de uma lesão não autorizada 11 Dentro do caráter difuso do dano ambiental e de acordo com a previsão legal, não cabe ao Estado exclusividade na propositura de ação para a tutela do meio ambiente O direito à ação judicial está na Ação Popular e na Ação Civil Pública (BELTRÃO, 2011) A Constituição Federal, no artigo 5º, LXXIII 12, aponta a Ação Popular como instrumento jurídico na defesa ao meio ambiente, podendo ser proposta por qualquer cidadão para anular ato lesivo ao meio ambiente e também prevê dispositivos à tutela ambiental de modo coletivo, conforme expressa o artigo 129, III 13 da Carta Magna Em 1985, com a Lei 7347, foi instituída a Ação Civil Pública, dando ao Ministério Público a legitimidade para agir em prol do meio ambiente 31 Espécies de dano ambiental Duas são as perspectivas que devem ser consideradas em relação ao dano ambiental: o dano ambiental coletivo, que atinge o meio ambiente como um direito transindividual, que pertence a todos e cuja indenização reverte a um fundo impessoal para a reconstituição dos recursos ambientais atingidos, conforme a Lei 11 Salientamos que não se pode confundir lesão não autorizada com atividade não autorizada, como bem fundamenta Bechara, a seguir: [] quando falamos em lesão não autorizada, não estamos aludindo à atividade não autorizada, visto que muitas vezes a atividade causadora do dano tem autorização para funcionar, muito embora não tenha autorização para causar prejuízos à qualidade ambiental [] (BECHARA, 2009, p50) 12 Artigo 5º, LXXIII da Constituição Federal de 1988: qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência 13 Artigo 129 da Constituição Federal de 1988 São funções institucionais do Ministério Público: inciso III: promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos Página 31

da Ação Civil Pública no artigo 13 14, e o dano ambiental individual, relacionado com o patrimônio ou com a moral do sujeito afetado (BELTRÃO, 2011) No dano ambiental coletivo e eminentemente público, o objeto material é o patrimônio de titularidade difusa, de característica insubstituível, essencial, representativo, ocorrendo, então, lesão a um interesse público, de natureza difusa também São danos coletivos atinentes a grupos ou massas de pessoas, que não dizem respeito à perda da qualidade ambiental, embora sejam causados por conta de uma modificação adversa, uma agressão a direitos transindividuais (coletivos e difusos) como à saúde, à dignidade, à paz social, dentre outros (BECHARA, 2009) Deste modo, o dano ambiental lesa o direito difuso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado Por outro lado, o dano ambiental também pode ser individual, atingindo o patrimônio de uma pessoa, o conjunto de seus bens e direitos individuais Neste sentido, a lesão aos bens individuais se dá por intermédio do meio ambiente, sendo ele o elemento condutor (CARVALHO, 2008) Assim, um mesmo acontecimento pode gerar danos ambientais e danos individuais, estes últimos não protegidos pelo escopo ambiental Outra característica específica do dano ambiental ecológico que enseja a reparação é o dano em ricochete, que acarreta um prejuízo reflexo do próprio dano sofrido pela vítima imediata O dano é direto e pessoal, e o sujeito que o sofreu é terceiro à relação Ocorrerá, por exemplo, entre dois pólos, mas atingirá direta e pessoalmente um terceiro (CARVALHO, 2008) A fonte do prejuízo não é o meio ambiente, mas sim o fato danoso ocorrido e no dano ricochete os elementos da natureza (água, ar, solo) nada mais são aqui do que os intermediários entre a atividade danosa e o dano (MIRRA, 2004) O dano ricochete reflete e recai sobre o patrimônio pessoal, individual da vítima 15, este dano mediato resultante da agressão imediata ao meio 14 Artigo 13 da lei 7347/85: Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participarão necessariamente o Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados 15 Mirra (2004, p 74) traz como exemplo o caso de despejo de substâncias poluentes nas águas de um rio, onde há um dano imediato causado ao meio aquático, mas os mecanismos da responsabilidade civil, no âmbito estrito do dano reflexo, somente serão desencadeados a partir do Página 32

ambiente pode ser privado ou público Será privado quando atingir a esfera patrimonial do particular e público quando atingir patrimônio público ou de entidades do Poder Público A Constituição Federal traz princípios que englobam a obrigação de reparar o dano ambiental, a questão da restauração, recuperação, reparação do meio ambiente são por ela expressados O direito ambiental, na Constituição, valorizou a prevenção, mas não esqueceu a reparação (MACHADO, 2010, p 154) A recuperação do meio ambiente passou a fazer parte da própria exploração ambiental que inevitavelmente é causadora de lesão a um direito e um dever difusos Ela também incumbe ao Poder Público assegurar a efetividade do direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, como preceitua no artigo 225, 1º, IV 16 A dimensão do dano ambiental aponta para a sua existência material e de seu reconhecimento e, portanto, traz consigo os requisitos de sua reparabilidade A dimensão fica visível em casos como a contaminação das águas por óleo, como a última ocorrida no Litoral Norte Gaúcho no verão 17 do corrente ano, a contaminação de lençóis freáticos em virtude dos aterros de resíduos sólidos que não se detém na preparação do solo para depósito dos resíduos, a poluição atmosférica em todos os graus, o desmatamento, os impactos provocados por extração de minérios, os danos contra a fauna, as contaminações por material radioativo, nuclear, agrotóxicos, dentre outras inúmeras situações que afetam diretamente o equilíbrio ecológico (STEIGLEDER, 2004) Essas são situações que ultrapassam a relação de direito privado, pois a vítima e muitas vezes a causa da degradação também são difusas A reparação do dano ambiental ecológico tem no prejuízo seu fundamento necessário e suficiente, para que a forma de reparação eleita atue sobre a fonte do dano, evitando-se, assim, a sua renovação ou agravamento devido à continuidade momento em que um terceiro (um pescador, um agricultor ou um entidade publica interessada) tiver necessidade de usar a água de um rio poluído ou se encontrar impossibilitado de continuar se servindo do curso d água, que já utilizava, devido à produção 16 Artigo 225, 1º, IV da Constituição Federal de 1988: exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade 17 http://zerohoraclicrbscombr/rs/noticia/2012/01/vazamento-de-oleo-em-tramandai-pode-ser-omaior-no-estado-nos-ultimos-10-anos-3645106html acessado em 20/05/2012 Página 33

da atividade nociva O efeito de sucedâneo da reparação propicia um novo estado de coisas, [] O problema posto pela reparação do dano é solucionado de maneira satisfatória quando se consegue adaptar a nova realidade àquela situação anterior tida ideal [] (MIRRA, 2004, p307) Busca-se estabelecer o status quo ante, (LEITE, 2003) o que para parte da doutrina não é possível pela questão da irreparabilidade do dano A degradação do meio ambiente, na sua dimensão de bem imaterial, e dos diversos elementos corpóreos e incorpóreos que o integram, seja no meio natural, seja no meio cultural, seja no artificial, não permite em absoluto o retorno ao estado inicial e é invariavelmente definitiva A natureza, ao ter a sua composição física e biológica modificada por agressões que ela não consegue absorver ou tolerar, não pode jamais ser verdadeiramente restabelecida do ponto de vista ecológico (MIRRA, 2004, p 307) Ao tratar de reparação de dano ambiental ecológico salientamos que o principal objetivo dos instrumentos jurídicos de efetivação da responsabilidade civil do agente causador do dano deve ser alcançar a reparação integral do dano Conforme referido, não existe uma reparação integral eficaz para o restabelecimento do equilíbrio ecológico (PINHO, 2010) A responsabilização do agente causador do dano encontra supedâneo doutrinário e jurisprudencial, como observamos em decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: DIREITO AMBIENTAL SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO LEGALIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO RECUPERAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA OBRIGAÇÃO PROPTER REM DANO MORAL INOCORRÊNCIA AVERBAÇÃO NO REGISTRO DE IMÓVEIS DESNECESSIDADE 1 No caso em tela, a presunção de legalidade, veracidade e certeza do auto de infração - emanado pela autarquia responsável pela fiscalização ambiental - foi confirmado através da realização de laudo pericial 2 Comprovada a ocorrência de dano ambiental na propriedade do réu em duas modalidades: corte raso (desmatamento) e corte seletivo de imbuia e araucária, há o dever de RECUPERAR INTEGRALMENTE a área degradada, com o cultivo de espécies nativas da região, bem como RESTAURAÇÃO DA FAUNA e flora e demais bens ambientais atingidos, mediante projeto aprovado e fiscalizado pelo órgão ambiental competente 3 O prejuízo difuso e coletivo deve estar evidenciado nos autos Se o prejuízo moral não estiver demonstrado, e ausente indicação de violação do sentimento coletivo da comunidade, não há que se falar em responsabilização por danos morais No presente caso, a importação dos pneus usados, ainda que seja passível de poluição grave, não atinge a esfera íntima da sociedade, não havendo necessidade de repressão pela condenação em valor, a título de dano moral ambiental 4 Diante da inexistência de previsão legal no inciso II do art 167 da Lei de Registros Públicos (Lei nº 6015/73) e considerando a obrigação ser de natureza propter rem, aderindo à propriedade e transferindo-se a futuros proprietários independente de qualquer ato registral, não se verificam motivos para a referida a averbação da obrigação de reparação de dano ambiental na matrícula do imóvel 5 Apelação e recurso adesivo Página 34

improvidos (TRF4, AC 0001671-8320044047012, Terceira Turma, Relator João Pedro Gebran Neto, DE 23/08/2011) (grifo nosso) Observamos que, por mais ineficaz que seja a forma de reparação do dano para o meio ambiente ecológico, pois não temos dados sobre o cumprimento da sanção imposta, houve efetividade na aplicação do instrumento jurídico para o agente causador, tendo sido imposta a ele a responsabilidade pelo dano causado e a obrigação de recuperar integralmente a área degradada 4 Instrumentos jurídicos de imputação da responsabilidade civil ao agente causador x o efeito restaurador no caso concreto O ordenamento jurídico brasileiro traz as formas de reparação do dano ambiental ecológico como instrumentos de efetivação da responsabilidade civil com foco no agente causador do dano, não se olvidando da finalidade, garantida pela Constituição Federal, da reparação que é a recuperação propriamente dita do meio ambiente Em sentido estrito, são elas: a reparação natural, a compensação ecológica e a indenização pecuniária 41 A reparação natural do dano ambiental ecológico Dentre as formas de reparação do dano ambiental ecológico, a natural é a forma de reparação considerada mais adequada a agir sobre o prejuízo causado pelo dano, é um meio de compensar o prejuízo e visa ao restabelecimento do equilíbrio ecológico, possibilitando a neutralização dos impactos ocasionados (PINHO, 2010) Sempre que possível, deverá ser aplicada pelo judiciário, como ilustramos a seguir, uma forma de reparação ao dano que vise o restabelecimento ecológico da área afetada Ementa: APELAÇÃO CÍVEL DIREITO PÚBLICO AÇÃO CIVIL PÚBLICA DANO AMBIENTAL QUEIMADA SUPRESSÃO DE MATA NATIVA REPARAÇÃO DO DANO RESPONSABILIDADE OBJETIVA CUMULATIVIDADE DE SANÇÕES EXCEPCIONALIDADE 1 Responsabilidade objetiva A lei prevê a responsabilidade objetiva para fins de reparação de dano causado ao meio ambiente, bastando que se verifique o nexo de causalidade entre a ação (atividade) e resultado (dano ambiental) 2 Reparação do dano Cumulatividade de sanções In natura e pecuniária A pena pecuniária, que é uma reparação econômica, somente se mostra aplicável, via de regra, e a não ser em casos extremos, quando a reparação in natura não se mostra possível Página 35

Não é este o caso dos autos Precedentes RECURSOS DESPROVIDOS (Apelação Cível Nº 70035337112, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Roberto Lofego Canibal, Julgado em 15/12/2010) (grifo nosso) A reparação in natura atua de forma pontual e prioritária sobre o prejuízo efetivo causado e engloba diretamente as técnicas de compensação materialmente equivalentes ao interesse lesado A recomposição da qualidade ambiental degradada também é foco desta forma de reparação (MIRRA, 2004) e tem como conteúdo uma obrigação de fazer, visando o restabelecimento do status quo ante do bem lesado A Política Nacional do Meio Ambiente prevê a recuperação das áreas degradadas no seu artigo 2º, VIII 18, e a imposição ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar/indenizar os danos causados, conforme refere o artigo 4º, VII 19, cuidando dessa forma da efetividade da aplicação da norma jurídica ao agente causador do dano ambiental ecológico Quando for impossível a aplicação desta forma de reparação, admitir-se-á uma alternativa compensatória excepcional (MILARÉ, 2011) Esclarecemos que o autor/réu de uma demanda ambiental não pode escolher a forma de reparação a ser aplicada ao dano, senão um particular estaria dispondo de um bem que é coletivo, difuso A imposição da reparação natural nem sempre é viável pela própria natureza do dano ao meio ambiente, razão pela qual não é aplicada isoladamente, por isso, vem geralmente acompanhada de uma indenização, como podemos observar na jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça deste Estado: Ementa: APELAÇÃO CÍVEL DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO AÇÃO CIVIL PÚBLICA MEIO AMBIENTE DEGRADAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E DE PROTEÇÃO AMBIENTAL 18 Artigo 2º, VIII da lei 6938/81: A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana, atendidos os seguintes princípios: VIII - recuperação de áreas degradadas 19 Artigo 4º da lei 6938/81: A Política Nacional do Meio Ambiente visará: VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos Página 36

MUNICIPAL DEPÓSITO DE AREIA E CONSTRUÇÃO DE ATERRO SEM PRÉVIO LICENCIAMENTO AMBIENTAL RECOMPOSIÇÃO DOS DANOS INDENIZAÇÃO Estando amplamente comprovada nos autos a degradação ambiental em área de preservação permanente, também objeto de proteção ambiental instituída por lei municipal, situada às margens do Rio Taquari, em virtude do funcionamento de empreendimento destinado ao comércio de areia, a descoberto do devido licenciamento ambiental, impõe-se a obrigação de reparar os danos Evidenciada a impossibilidade de reparação in natura de alguns dos danos apontados, tem lugar o dever de indenizar Responsabilidade de natureza objetiva, orientada pelos princípios da prevenção e do poluidor- pagador A omissão do Município, que deixou de fiscalizar o empreendimento, concedeu alvará de funcionamento à empresa e emprestou auxílio material para a construção do aterro, mesmo estando a atividade irregular, enseja a responsabilização do ente público pela participação na produção dos danos APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA VOTO VENCIDO EM PARTE (Apelação Cível Nº 70023627862, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rejane Maria Dias de Castro Bins, Julgado em 12/06/2008) (grifo nosso) O interesse na recuperação ambiental visando à proteção do bem jurídico tutelado é público, pois é direito e dever de todos a existência de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, assim sempre deve haver preferência pela reparação natural do dano, embora nem sempre seja possível, senão vejamos: [] sabemos que reconstruir o estado do bem tal como ele se encontraria caso não tivesse ocorrido a lesão pode revelar-se impossível do ponto de vista fáctico, ou económico; ou a reconstituição pode protelar-se no tempo, devendo existir disponibilidade de meios financeiros para ir realizando [] (GOMES, 2010, p 346) O inicio da reparação in natura deve ser sempre através de um projeto de recuperação ambiental assinado por profissional responsável (PINHO, 2010) Uma vez aplicada a imposição desta forma de reparação e cumpridas as medidas solicitadas, o agente causador do dano sofreu a devida sanção por ter causado o prejuízo Ocorre que a execução da medida deveria ser fiscalizada e acompanhada pelo órgão público legitimado, quer seja municipal, estadual ou federal, e uma possível falha nesta fiscalização tornaria sem efeito, para o meio ambiente, a medida imposta ao agente que causou o dano e foi devidamente responsabilizado, tendo cumprido o que lhe foi imposto como sanção civil 42 A compensação ecológica Trataremos da compensação ecológica como solução substitutiva ou complementar à reparação natural, dada a complexidade dos danos ecológicos e na hipótese de Página 37

estar demonstrada a irrecuperabilidade parcial ou total do ambiente afetado Ocorrerá em local diverso do lesado e consiste em [] uma forma de restauração natural do dano ambiental que se volta para uma área distinta da área degradada, tendo por objetivo assegurar a conservação de funções ecológicas equivalentes [] (STEIGLEDER, 2004, p 249) Haverá uma substituição por bens equivalentes, garantindo a qualidade do patrimônio ecológico A medida compensatória deve ter por escopo preservar a capacidade funcional ecológica do ecossistema a ser recuperado É uma forma ressarcitória específica não pecuniária A compensação ecológica [] é uma medida compensatória que se volta para a restauração de uma área distinta da degradada, tendo por objetivo contribuir para a melhoria do patrimônio global natural[] (PINHO, 2010, p 396) Esta espécie de reparação pode acontecer de mais de uma forma Uma delas é a compensação ecológica jurisdicional através de sentenças judiciais já transitadas em julgado que obrigam o agente causador do dano a substituir o bem lesado por equivalente ou pagar certa quantia em dinheiro Em contrapartida, a compensação extrajudicial é formalizada através de um Termo de Ajustamento de Conduta 20, com eficácia de titulo executivo extrajudicial, (VENOSA, 2009) caso seja descumprido, firmado entre órgãos públicos legitimados 21 e os causadores do dano ambiental 20 Salienta-se que o TAC tem caráter preventivo que mediante cominações ajusta a conduta do agente às exigências legais, teoricamente, portanto não poderia ser considerado uma forma de reparação de dano ambiental, mas como é eventualmente utilizado com este fim, José Rubens Morato Leite o considera subespécie de forma de reparação de dano ambiental 21 Artigo 5º da lei 7347/85: Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: I - o Ministério Público; II - a Defensoria Pública; III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista; V - a associação que, concomitantemente: a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; 1º O Ministério Público, se não intervier no processo como parte, atuará obrigatoriamente como fiscal da lei; 2º Fica facultado ao Poder Público e a outras associações legitimadas nos termos deste artigo habilitar-se como litisconsortes de qualquer das parte; 3º Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa; 4 O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido; 5 Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida esta lei; 6 Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial Página 38

Uma terceira forma alternativa de compensação são os fundos autônomos de compensação ecológica para solucionar, através de indenização, o dano ambiental Esses fundos são financiados por potenciais agentes poluidores que pagam cotas de financiamento para a reparação (LEITE, 2003) A compensação traz consigo a ideia de equivalência ecológica 22 dos bens naturais tutelados, o que, por vezes, torna inviável sua aplicabilidade e eficácia, uma vez que existem bens naturais únicos, impossíveis de serem inseridos novamente na natureza, quer seja por suas características, quer seja pela extinção de sua espécie, enfim, impossível de serem compensados [] Muitas vezes, a degradação de um determinado local implicou a extinção de uma espécie vegetal, por exemplo [] (ANTUNES, 2010, p 253) A compensação ecológica apresenta vantagens no que diz respeito à reparação efetiva no caso concreto em relação à indenização no sentido de que tem como foco a conservação do meio ambiente e permite a adequada importação ao patrimônio do causador (STEIGLEDER, 2004) Devemos considerar que, quando os danos são passíveis de reparação, muitas vezes o custo e o tempo para a concretização da medida são demasiadamente altos e não há a garantia de êxito na reparação O ideal seria criar medidas preventivas contra novos danos (PINHO, 2010) Estando diante de um dano ambiental ecológico, o responsável pela aplicação da medida reparatória deverá eleger a que mais se adapte à realidade local, a que se mostrar mais relevante para a defesa do meio ambiente e que apresente um valor ecológico equivalente Uma decisão que não considere a realidade concreta poderá ser precipitada e não ser efetiva na recuperação do dano causado Nem sempre a compensação poderá ser feita na mesma área degradada, devendo por vezes ser procedida em outro local que se mostre estrategicamente relevante (PINHO, 2010) Salientamos que esta forma de reparação também deve ser precedida de um projeto técnico de restauração visando à garantia do equilíbrio ecológico Uma vez identificada a área de intervenção seguindo o plano Diretor do município e demais legislações, avaliado o custo operacional, elaborado o plano de 22 Equivalência entendida como a substituição do bem lesado por bem equivalente e não como a restauração do bem afetado Página 39

recuperação da área degradada e o tempo a ser considerado na operacionalização da medida, procede-se ao que foi traçado pela equipe multidisciplinar que elaborou o projeto técnico às expensas do poluidor (BECHARA, 2009) Um fator que possivelmente traria o insucesso parcial da medida seria o tempo da recuperação que pode, conforme o caso, durar anos Percebemos então que por vezes a elaboração do projeto de recuperação é viável, porém não efetiva a recuperação do meio ambiente, bem como a fiscalização e o acompanhamento da execução do projeto por vezes são deficitários 43A indenização pecuniária Como terceira forma de reparação de dano ambiental ecológico, temos a indenização pecuniária, que será subsidiária (PINHO, 2010) e cabível quando o dano for irreversível e não for possível a compensação ecológica Deverá ser a última alternativa, pois jamais proporcionará a recuperação integral do dano A transformação de um dano ambiental em valor econômico está sujeita aos obstáculos inerentes à própria complexidade do dano e requer avaliação técnicocientífica interdisciplinar, não cabendo somente à economia quantificar Neste sentido, [] a apuração do custo total do projeto e da implantação da restauração natural hipotética da área degradada parece ser o critério mais adequado, pois permitirá a compensação ecológica em outro local, a ser gerida pelo Poder Público na administração do Fundo de Bens Lesados [] (STEIGLEDER, 2004, p 256) O valor econômico do meio ambiente pode ser calculado, segundo a doutrina, considerando o valor de uso atribuído pelas pessoas que utilizam os recursos naturais, o valor de opção onde se relaciona o risco da perda dos benefícios que o ambiente proporciona às presentes e futuras gerações e, por fim, o valor de existência dentro de uma dimensão ética pelas qualidades que o meio ambiente oferece, ainda que estas não possuam valor atual ou futuro (LEITE & PILATI, 2006) Visando diminuir o impacto causado pela degradação à natureza e à comunidade prejudicada, o montante pago deve ser destinado ao local afetado É uma Página 40

indenização revertida ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos Neste sentido, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul: APELAÇÃO CIVEL DIREITO PUBLICO AÇÃO CIVIL PUBLICA DANO AMBIENTAL INCONSTITUCIONALIDADE DO 4º DO ART 16 DA LEI 4771/65 E DA MP 2166-67/01 INOCORRENCIA AREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE QUEIMADA E CULTIVADA OBRIGAÇÃO DE RECUPERAÇÃO DA AREA DEGRADADA OBRIGAÇÃO DE COMPENSAÇÃO DE DEGRADAÇÃO IRRECUPERÁVEL MULTA CABIMENTO A alegação de que a reserva legal imposta na lei n 4771/65 ofende a constituição, porque torna inviável a exploração econômica da propriedade exige prova A tão só previsão de restrição administrativa à propriedade não conduz necessariamente à inviabilidade de sua exploração, notadamente quando a restrição abrange 20% da área definida como de preservação e esta ocupa apenas parte da propriedade do recorrente Comprovado, por meio de perícia, que na área de preservação permanente foram cavados valor e realizado o cultivo agrícola, está demonstrado o dano e caracterizado o dever de recuperá-lo A sentença que impõe ao autor do dano a obrigação de recuperar a área degradada por meio do REPLANTIO OU DA REALIZAÇÃO DE AÇÕES DE COMPENSAÇÃO refere-se, naturalmente, aos danos existentes, e corretamente atribui ao autor do dano os ônus da elaboração de projeto de recuperação O fato de o autor recorrente espontaneamente recuperar parte dos danos causados não inibe a aplicação da multa, porque sua consciência ambiental não foi suficiente para conduzi-lo à obediência da lei APELAÇÃO DESPROVIDA (Apelação Cível nº 70034880823, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em 23/02/2011) (grifo nosso) A indenização pecuniária é uma espécie de compensação ambiental de forma a contrabalancear um dano ambiental causado e, neste caso, consiste no pagamento em dinheiro ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos conforme prevê o artigo 13 da Lei 7347/85 23 Os recursos deverão ser aplicados em bens, projetos e atividades relacionadas aos direitos difusos em geral No que tange à aplicação dos recursos, a Lei 9008/95 24 traz no artigo 1º parágrafo 3º 25 a devida regulamentação (BECHARA, 2009) 23 Artigo 13 da Lei 7347/85: Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participarão necessariamente o Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados 24 Cria, na estrutura organizacional do Ministério da Justiça, o Conselho Federal de que trata o artigo 13 da lei 7347, de 24 de julho de 1985, altera os artigos 4, 39, 82, 91 e 98 da lei 8078, de 11 de setembro de 1990, e da outras providencias 25 Artigo 1º da lei 9008/95: Fica criado, no âmbito da estrutura organizacional do Ministério da Justiça, o Conselho Federal Gestor do Fundo de Defesa de Direitos Difusos (CFDD) 3º Os recursos arrecadados pelo FDD serão aplicados na recuperação de bens, na promoção de eventos educativos, científicos e na edição de material informativo especificamente relacionados com a natureza da infração ou do dano causado, bem como na modernização administrativa dos órgãos públicos responsáveis pela execução das políticas relativas às áreas mencionadas no 1º deste artigo Página 41

Notamos que, com esta forma de recuperação do dano ambiental, não há uma real efetividade na reparação do dano, tendo em vista que há um desacordo com o fim a que se propõem as formas de reparação do dano ambiental, ou seja, de restabelecimento do equilíbrio ecológico Como não há uma hierarquia entre as formas de reparação do dano ambiental, a possibilidade da aplicação desta medida por vezes é feita de forma desenfreada, porém é a medida que mais faz o agente causador do dano se sentir responsabilizado, uma vez que este terá que desembolsar quantia em dinheiro para recuperar o que causou Conforme decisão exarada recentemente pelo Tribunal de Justiça gaúcho, a indenização pecuniária deve refletir sobre o patrimônio do agente causador do dano no momento em que lhe imputa a sanção indenizatória, sendo efetiva a medida aplicada, senão vejamos: APELAÇÃO CÍVEL RESPONSABILIDADE CIVIL PRESCRIÇÃO INOCORRÊNCIA INSTALAÇÃO DE ESTAÇÃO DE TRATAMENTO DE ESGOTO A CÉU ABERTO CORSAN RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR VIOLAÇÃO DE NORMAS SANITÁRIAS MAU CHEIRO CONDIÇÕES INSALÚBRES DANO MORAL AMBIENTAL INDIVIDUAL CONFIGURAÇÃO MAJORAÇÃO HONORÁRIOS MANUTENÇÃO - PRESCRIÇÃO - INOCORRÊNCIA A pretensão de reparação civil prescreve em 3 (três) anos contados do ato ilícito, nos termos dos artigos 189 e 206, 3º, V, ambos do Código Civil Caso em que não restou configurada a implementação do prazo prescricional - SERVIÇO PÚBLICO E DIREITO SUBJETIVO AO SANEAMENTO BÁSICO - O direito público subjetivo ao saneamento básico decorre do próprio direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e do direito à saúde Compreensão dos artigos 196 e 225 da Constituição Federal A Lei Orgânica da Saúde (Lei 8080/90) disciplina a saúde como direito fundamental, impondo ao Poder Público, incluídas ai as concessionárias de serviços públicos, o dever de redução de riscos de doenças e outros agravos, decorrentes da prestação do serviço Ações destinadas a garantir às pessoas condições de bem-estar físico, mental e social Conceito de cidade sustentável (Lei 10257/01) relacionado com o direito ao saneamento ambiental e à infra-estrutura urbana - RESPONSABILIDADE CIVIL DAS CONCESSIONÁRIAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS DE SANEAMENTO - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa Aplicação do artigo 37, 6º, da CF Incidência dos artigos 14 e 22 do CDC O dano ambiental individual caracteriza-se quando o interessado tem por finalidade direta a tutela de proteger a lesão ao patrimônio e demais valores as pessoas e, de forma mediata e incidental, o meio ambiente da coletividade Lei 6938/81 Arts 2º, 3º e 14, 1º - ATO ILÍCITO E DANO AMBIENTALINDIVIDUAL - A prova dos autos revelou que a empresa de saneamento não está prestando adequadamente o serviço público de tratamento de água no bairro Parque Marinha da cidade de Rio Grande Dano consistente na sujeição dos moradores da área a uma série de transtornos, a exemplo do mau cheiro, insetos e exposição a condições insalubres Dano moral individual relaciona-se com todo prejuízo não- Página 42