A REFORMA DO ESTADO E O PANORAMA ATUAL DO ENSINO SUPERIOR PRIVADO NO BRASIL



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Transcrição:

1 A REFORMA DO ESTADO E O PANORAMA ATUAL DO ENSINO SUPERIOR PRIVADO NO BRASIL OSVALDO ELIAS DE ALMEIDA Núcleo de Estudo e Pesquisa: Política e Gestão da Educação Mestrando Orientadora: Profª Drª Selma Borgui Venco O presente texto é parte integrante da dissertação em curso A escola não é uma empresa: contradições na relação educação e trabalho sob o novo espírito do capitalismo, a qual visa debater a transformação que vem ocorrendo no ensino superior brasileiro, particularmente com maior intensidade desde os anos 1990 quando a opção política nacional fomentou a privatização da educação. Assim, esta comunicação aborda a opção pela Reforma do Estado no período, que passa da burocratização ao modelo gerencialista e seus reflexos para essa modalidade de ensino. Procurou-se investigar, portanto, se o ensino superior privado assumiu as características de uma empresa, ou seja, se a lógica deste ensino acompanhou ou tem acompanhado as ações mais gerais das empresas capitalistas. E diante disso, se é possível afirmar que há similitudes entre as operações de fusões que ocorreram em algumas empresas, a exemplo do ocorrido no setor bancário no período da reorganização da economia nos anos de 1990, vêm ocorrendo de forma tardia nas instituições de ensino privado. A hipótese que norteia o presente texto parte do pressuposto que a orientação política de caráter neoliberal, tal como analisada por Christian Laval (2004) sustenta os pilares para a profusão de ações de privatização acentuada no Brasil, visto que o neoliberalismo de forma geral contesta a ingerência do Estado na produção de bens e serviços, quer se trate de saúde, transporte ou educação (2004, p. 94). Breve histórico: nacional e internacional A pesquisa em andamento analisa em um dos seus capítulos o panorama do ensino superior privado no Brasil, a partir do chamado Plano Diretor do Aparelho do Estado, criado pelo então Ministro da Administração Federal e Reforma do Estado, no governo FHC, em 1995 Luiz Carlos Bresser Pereira e cujo papel principal foi definir os objetivos e estabelecer as diretrizes para a reforma da administração pública ocorrida a partir da década de 1990. Um dos objetivos principais desta ação governamental foi levar à prática, reformas econômicas orientadas para o mercado, que, acompanhadas de uma política industrial e tecnológica, garantiriam a concorrência interna e criassem as condições para o enfrentamento da competição internacional (PDRE, 1995, P. 11). De acordo com o próprio documento tal reforma englobaria toda a estrutura organizacional do Estado formada pelos seus três poderes, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, como partes componentes do aparelho do Estado em seus três níveis de atuação, a União, os Estados membros e os Municípios. Numa análise articulada acerca do objetivo e do conceito de aparelho do Estado, à luz da contribuição teórica de Laval (2004), verificou-se a amplitude dessa reforma que atingiu as esferas do poder governamental em todos os seus níveis e, por consequência entendeu-se que, reformar o Estado, na perspectiva do governo federal significou, à época, a necessidade da transferência para o mercado das atividades controláveis pelo mercado. À educação caberia o que foi conceituado pelo então ministro como publicização, ou a descentralização para o

setor público não estatal da execução de serviços que envolvam o exercício do poder do Estado, mas que devem ser subsidiados pelo Estado (PDRE, 1995, p. 12-13). Evidenciou-se, a partir daí, uma forte tendência do Estado brasileiro a se voltar para uma orientação político-econômica liberal, cujos princípios básicos são: a liberdade econômica (livre mercado) e a mínima participação do Estado nos assuntos econômicos da Nação (Estado mínimo), análise central do presente texto. Bresser Pereira (1997) passou a classificar, a partir desse Plano, a administração pública de gerencial, denominada por ele, como a nova administração pública tendo-a definido a partir de inúmeros critérios, mas que por ora, apenas cabe-nos destacar: a transferência, para o setor público não estatal, dos serviços sociais e competitivos (BRESSER PEREIRA, 2007, p. 42). Os principais pontos da Reforma demandaram a aprovação de mudanças na Constituição Brasileira para a sua completa implementação o que veio a abranger, também, a revisão de outras leis e normas aliadas à concepção de novos instrumentos de gestão e de formas inovadoras, segundo a concepção do documento, de organização da administração. (BRESSER PEREIRA, 1997, p. 8 e 9). A partir dessa visão que sustentou a Reforma do Estado e das metas 1 estabelecidas pode-se verificar que essas, explicitaram gradativamente, o modelo de ensino demandado em função dos ajustes econômicos internacionais em que, não somente o Brasil, mas grande parte dos países da América Latina se viram obrigados a adotar, dada a situação de dependência econômica firmada junto a eles. Concebida, em grande parte, nos anos de 1980 no governo norte-americano de Ronald Reagan a orientação política pautava-se na premissa que soluções de mercado e a privatização deveriam ser amplamente adotadas como meios para acelerar o desenvolvimento econômico do país e de redução dos gastos públicos, sendo, igualmente no seu governo que houve também um forte apoio ao capital financeiro, concomitante, à Grã Bretanha sob o governo Thatcher (1979-1990) que adotou igualmente, uma série de medidas políticas favoráveis às privatizações. Quanto a tais medidas, esclarece Laval (2004, p. 91): 2 desemba Ronald Reagan em seu programa eleitoral de 1980, prometia (...) As escolas deveriam se transformar em empresas com fim lucrativo na medida em que a eficiência do mercado seria presumidamente capaz de melhorar o acesso à educação e à qualidade do ensino, desembaraçando-o dos regulamentos burocráticos e dos sindicatos. Tais opções políticas nos Estados Unidos e na Grã Bretanha repercutiram também no Brasil e neste cenário destacamos dois agentes, aqui considerados relevantes, para a análise: o Estado e o mercado que, num sistema capitalista 2, direta ou indiretamente são as duas instituições centrais que operam na coordenação dos sistemas econômicos, e de acordo 1 Dentre as doze metas propostas pela Reforma do Estado destacam-se: 1. Estímulo ao planejamento estratégico em todos os órgãos e entidades, compreendendo a definição de missão, objetivos e metas, conjugada à implantação de indicadores de desempenho e de processos contínuos de melhoria da gestão; 2. descentralização e melhoraria no desempenho gerencial na prestação de serviços públicos na área social, mediante implantação de Organizações Sociais, sem vinculação administrativa com o Estado, mas fomentadas com recursos públicos e controladas por contratos de gestão; 3. Fortalecimento da capacidade regulatória do Estado, particularmente sobre os setores produtivos objeto de privatização de empresas estatais, mediante criação de Agências Regulatórias, especialmente nas atividades exploradas por concessão estatal. (Caderno 6, MARE, p. 8 e 9, 1997) 2 Entre as diferentes caracterizações do capitalismo (ou, frequentemente hoje, dos capitalismos) feitas no último século e meio, escolheremos uma fórmula mínima que enfatiza a exigência de acumulação ilimitada de capital por meios pacíficos. Trata-se de repor perpetuamente em jogo o capital no círculo econômico com o objetivo de extrair lucro, ou seja, aumentar o capital que será, novamente, reinvestido, sendo esta a principal marca do capitalismo, aquilo que lhe confere a dinâmica e a força de transformação que fascinaram seus observadores, mesmo os mais hostis. (Boltanski e Chiapello, 2009)

com Motta (1990, p. 69) à luz do pensamento de Weber, demonstra que o pensamento jurídico-formal burocrático implica determinada ética associada às condições de produção capitalista. Segundo o economista Luiz Carlos Bresser Pereira (1977) o Estado é composto por três elementos: uma elite política, uma burocracia ou tecnoburocracia e a sociedade civil 3, compreendido nestes termos, o Estado é, assim, um sistema de poder organizado que se relaciona dialeticamente com outro poder difuso, mas efetivo a sociedade civil. (Bresser Pereira, 1977, p. 78) 3 O ensino superior no Brasil De acordo com os dados do Censo da Educação Superior (MEC/Inep), no ano de 2001 foram registradas no total 5.127.642 matrículas em cursos de graduação presenciais, sendo 3.036.113 destas em Instituições de Ensino Superior (IES) públicas e 2.091.529 em IES privadas. Já no ano de 2010 os números registrados no total foram: 11.115.300, sendo 6.379.299 destas em IES públicas e 4.736.001 em IES privadas num crescimento de 137,40% na década, conforme tabela abaixo: Tabela 1 - Crescimento das matrículas de ensino superior por dependência administrativa Brasil: 2001 2010. ANO PÚBLICO* % PRIVADO % TOTAL 2001 3.036.113 31,1 2.091.529 68,9 5.127.642 2002 3.520.627 30,8 2.434.650 69,2 5.955.277 2003 3.936.933 29,9 2.760.759 70,1 6.697.692 2004 4.223.344 28,8 3.009.027 71,2 7.232.371 2005 4.567.798 27,3 3.321.094 72,2 7.888.892 2006 4.883.852 25,6 3.632.487 74,4 8.516.339 2007 5.250.147 25,4 3.914.970 74,6 9.165.117 2008 5.808.017 26,7 4.255.064 73,3 10.063.081 2009 5.954.021 25,6 4.430.157 74,4 10.384.178 2010 6.379.299 25,8 4.736.001 74,2 11.115.300 *Federal, Estadual e Municipal FONTE: MEC Censo da Educação Superior divulgado em 07/11/2011 Analisando a trajetória histórica da expansão do ensino superior no Brasil, Saviani (2010, p. 11), aponta: institui como inter É essa situação que estamos vivendo hoje quando vicejam os mais diferentes tipos de instituições universitárias oferecendo cursos os mais variados em estreita simbiose com os mecanismos do mercado. Aprofunda-se, assim, a tendência a tratar a educação superior como mercadoria entregue aos cuidados de empresas de ensino que recorrem a capitais internacionais com ações negociadas na Bolsa de Valores. 3 Importa, de qualquer forma, ficar bem clara a distinção entre (a) povo, que inclui toda a população politicamente participante de uma nação ou país, (b) sociedade civil, que é constituída pelas classes e grupos sociais que dispõem de efetivo poder político, e (c) Estado, que é a organização burocrática constituída por uma elite política representante do bloco histórico que detém o poder político, por um corpo de funcionários e por uma força pública que dispõe do monopólio da violência sobre determinada população em determinado território. A todo Estado assim restritamente entendido corresponderá, nos termos modernos, um Estado-Nação, ou seja, um país juridicamente soberano. (Bresser Pereira, 1977)

A existência das IES tem amparo na Constituição de 1988 e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB Lei 9394 de 20 de dezembro de 1996). Cabe destacar que estão incluídas no setor privado: as particulares, as comunitárias, as confessionais e as filantrópicas. Os dados apresentados no Censo indicam que a última década (2001-2010), trouxe a efetiva expansão de matrículas no ensino superior, sendo o crescimento na ordem de 110% 4, sendo que, em 2010, são 74,2% nas IES Privadas e de 25,8% nas IES Públicas, hipoteticamente, como resultado da política de expansão das IES privadas adotadas no Brasil, a partir da promulgação da LDB 9.394/96 bem como do decreto lei 2.306, de 19 de agosto de 1997, artigo 1º, o que possibilitou a constituição dessas instituições como empresas com fins lucrativos: 4 no das como As pessoas jurídicas de direito, mantenedores de instituições de ensino superior, previstas no inciso II, do art. 19, da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, poderão assumir qualquer das formas admitidas em direito, de natureza civil ou comercial 5 e, quando constituídas como fundações, serão regidas pelo disposto no art. 24 do Código Civil Brasileiro. Tomando-se como objeto de análise a Anhanguera Educacional apreende-se o caráter mercantil presentes em instituições dessa natureza, conforme nos esclarece Romualdo Portela de Oliveira (2009) que a educação assumiu uma face mercantil, à medida que passa a ser um produto comercializado como outro qualquer. Tal constatação é observável, o jornal O Estado de São Paulo (02 de setembro de 2013), divulgou que essas redes de ensino superior, referindo-se à Kroton Educacional e à Anhanguera Educacional, que anunciaram uma fusão em 22 de abril de 2013, estavam entre as maiores valorizações da BM&F Bovespa, sendo que no ano, junto com a concorrente Estácio de Sá 6, elas estão também entre as companhias que mais propiciaram retorno aos acionistas. Ademais o avanço territorial dessas empresas de ensino superior num contexto de mudanças profundas no mundo do trabalho decorrentes das reformas na educação, que ocorreram e vem ocorrendo, nacional e internacional leva-nos a outra hipótese a ser verificada: a presença de uma orientação política baseada nos grandes princípios do liberalismo econômico averiguando-se que no Brasil o que tem se efetivado, na área da educação e do ensino superior privado, enquanto políticas governamentais e de Estado, em tese, é consoante às transformações que vêm ocorrendo no mundo da produção, haja vista que a lógica do capitalismo global, que repousa na acumulação do capital, e que de acordo com Harvey (2001) orienta-se na ideologia do crescimento tem fortalecido tais reformas; sendo esse outro referencial teórico, que sustenta a pesquisa em curso, a fim de analisar o pressuposto de Marx (1969) de que o avanço do capitalismo é baseado na conquista do território e no desenvolvimento das comunicações. Segundo BOLTANSKI e CHIAPELLO (2009, p. 43): O espírito do capitalismo é justamente o conjunto de crenças associadas à ordem capitalista que contribuem para justificar e sustentar essa ordem, legitimando os modos de ação e as disposições coerentes com ela. 4 A modalidade EAD (Ensino à Distância) e os cursos tecnológicos são um dos fatores que explicam o crescimento; segundo o MEC a modalidade à distância representou 15% do total em 2010. 5 Grifo nosso. 6 A Estácio anunciou a aquisição da Uniseb por 615,3 milhões de reais em dinheiro e em ações na quinta-feira (12/09/2013), cinco meses após a união entre Kroton e Anhanguera, que criou um grupo de 13 bilhões de reais. (Reuters Brasil, 13/09/2013)

Os autores que sustentam a análise, ora apresentada, partem do pressuposto que a ideologia neoliberal traçada para a reforma da escola tem confirmado uma política neoliberal que traz consigo o objetivo de transformá-la em empresa ou quase empresa o que tem amparado os pilares para a profusão de ações de privatização acentuada no Brasil. As primeiras análises na presente pesquisa apontam para a configuração da educação como importante setor de investimento por parte do setor privado, mas com vistas exclusivamente à acumulação de capital e distanciando-se do papel que esse segmento deveria trazer para o desenvolvimento dos cidadãos e na construção de uma Nação. 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BOLTANSKI, Luc e CHIAPELLO, Ève. O novo espírito do capitalismo. São Paulo: Martins Fontes, 2009. BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos. A reforma do Estado nos anos 90: lógica e mecanismos de controle. In: Cadernos MARE de Reforma do Estado, Brasília, n. 6, Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado, 1997. BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos. Paulo: Editora Brasiliense, 1977. Estado e subdesenvolvimento industrializado. São HARVEY, David. A produção capitalista do espaço. São Paulo: Annablume, 2005. LAVAL, Christian. A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. Londrina: Planta, 2004. MÉSZÁROS, István. Educação para além do capital. São Paulo: Boitempo Editorial, 2005. MOTTA, Fernando Claudio Prestes. Organização e Poder: Empresa, Estado e Escola. São Paulo: Editora Atlas S.A, 1990. OLIVEIRA, Romualdo Portela. Educação e Sociedade, vol. 30, n. 108, p. 739-760, out. 2009. SAVIANI, D. A expansão do Ensino Superior no Brasil: Mudanças e Continuidades. Poiésis Pedagógica, v. 8, n. 2, pp. 4-17, ago/dez. 2010. SCHULTZ, Theodore W. O capital humano: investimentos em educação e pesquisa. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1973. SGUISSARDI, Valdemar. Pós-graduação (em Educação) no Brasil: conformismo, neoprofissionalismo, heteronomia e competitividade. (In) MANCEBO. D; SILVA. JR; OLIVEIRA, J.F. (Orgs.) Reformas e políticas: educação superior e pós-graduação no Brasil. Campinas, SP: Editora Alínea, 2008. TRAGTENBERG, Maurício. Administração, Poder e Ideologia. São Paulo: Cortez Editora, 1989.