Autor: Nicolas Ciancio COSIT: INCIDÊNCIA DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE OS VALORES PAGOS A DIRETORES ESTATUTÁRIOS A TÍTULO DE PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS DA EMPRESA (PLR) A Coordenação-Geral de Tributação (COSIT), por meio da Solução de Consulta n. 368, de 18.12.2014, analisou discussão envolvendo a incidência da contribuição previdenciária prevista no art. 22 da Lei n. 8212, de 24.7.1991, sobre os valores pagos a diretores estatutários a título de participação nos lucros e resultados da empresa. A solução foi assim ementada: CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PREVIDENCIÁRIAS EMENTA: DIRETOR DE SOCIEDADE ANÔNIMA. CONDIÇÃO DE SEGURADO. PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS. LEI Nº 10.101, DE 2000. SALÁRIO-DE-CONTRIBUIÇÃO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. O diretor estatutário, que participe ou não do risco econômico do empreendimento, eleito por assembleia geral de acionistas para o cargo de direção de sociedade anônima, que não mantenha as características inerentes à relação de emprego, é segurado obrigatório da previdência social na qualidade de contribuinte individual, e a sua participação nos lucros e resultados da empresa de que trata a Lei nº 10.101, de 2000, integra o salário-decontribuição, para fins de recolhimento das contribuições previdenciárias. SEGURADO EMPREGADO. O diretor estatutário, que participe ou não do risco econômico do empreendimento, eleito por assembleia geral de acionistas para cargo de direção de sociedade anônima, que mantenha as características inerentes à relação de emprego, é segurado obrigatório da previdência social na qualidade de empregado, e a sua participação nos lucros e resultados da empresa de que trata a Lei nº 10.101, de 2000, não integra o salário-de-contribuição, para fins de recolhimento das contribuições previdenciárias. 1
Segundo relatado na referida Solução de Consulta, a consulente implementou plano de participação nos lucros e resultados, do qual participam todos os trabalhadores que prestem serviços, de forma habitual, pessoal, com subordinação e mediante remuneração. Nesse sentido, aduz a consulente que a análise dos arts. 1º e 2º da Lei n. 10101, de 19.12.2000, em conjunto com o art. 28, inciso I e parágrafo 9º, alínea j da Lei n. 8212/91, deixam dúvidas a respeito da possibilidade de pagamento de PLR aos diretores estatutários e sobre a respectiva tributação dos referidos valores. No entender da consulente, em que pese o inciso I, do art. 28 da Lei n. 8212/91 trate do salário-de-contribuição dos empregados e trabalhadores avulsos, a não incidência da contribuição previdenciária sobre os valores pagos a título de PLR, prevista na alínea j, do parágrafo 9º, do art. 28 desta mesma lei, não se limita apenas a estes sujeitos, mas a todos os trabalhadores de um modo geral, dentro dos quais se encontram os diretores estatutários. Em outros termos, sustenta que os valores pagos ou creditados a título de PLR aos diretores estatutários, mesmo não sendo eles empregados ou trabalhadores avulsos, estão abarcados pela regra da alínea j, do parágrafo 9º, do art. 28 da Lei n. 8212/91. Isso porque a referida regra determina que não integra o salário-de-contribuição, para efeitos de incidência da contribuição previdenciária, a PLR paga ou creditada de acordo com lei específica que, no caso, é Lei n. 10101/00, que trata da PLR dos trabalhadores genericamente e não apenas dos empregados. Ao apreciar a questão, a COSIT afirmou que o art. 12 da Lei n. 8212/91 definiu como segurados obrigatórios da Previdência Social, dentre outros, (i) aqueles que contribuem na qualidade de segurado empregado, como por exemplo, os que prestam serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado; e (ii) aqueles que contribuem na qualidade de contribuinte individual, como por exemplo, o titular de firma individual, o diretor não empregado e o membro de conselho de administração de sociedade 2
anônima, o sócio solidário, o sócio de indústria, o sócio gerente e o sócio cotista que recebam remuneração decorrente de seu trabalho em empresa urbana ou rural. Assim, dentre aqueles que contribuem na qualidade de segurado empregado está o diretor empregado, ao passo que o diretor não empregado tal qual o estatutário contribui na qualidade de contribuinte individual. Nesse contexto, o art. 9º do Regulamento da Previdência Social (Decreto n. 3048, de 6.5.1999) assim define o diretor empregado e o diretor não empregado: Diretor empregado: aquele que, participando ou não do risco econômico do empreendimento, seja contratado ou promovido para carga de direção das sociedades anônimas, mantendo as características inerentes à relação de emprego (art. 9º, parágrafo 2º). Diretor não empregado: aquele que, participando ou não do risco econômico do empreendimento, seja eleito, por assembleia geral dos acionistas, para cargo de direção das sociedades anônimas, não mantendo as características inerentes à relação de emprego (art. 9º, parágrafo 3º). À luz destas disposições, afirmou a COSIT que é segurado obrigatório da previdência social, como empregado, o diretor de sociedade anônima que, participando ou não do risco econômico do empreendimento, é contratado ou promovido para o cargo de direção, mantendo as características inerentes à relação de emprego. Por sua vez, depreende-se que é segurado obrigatório, como contribuinte individual, o diretor não empregado, o diretor de sociedade anônima que, participando ou não do risco econômico do empreendimento, é eleito para exercer o cargo de direção, sem manterás características inerentes à relação de emprego. Pois bem. Superada essa primeira premissa, a COSIT consignou que a alínea j, do parágrafo 9º, do art. 28 da Lei n. 8212/91 estabelece que não 3
integra o salário-de-contribuição para efeitos de incidência da contribuição previdenciária somente a PLR paga ou creditada de acordo com lei específica. Nesse sentido, considerando que a lei específica de que trata a referida alínea é a n. 10101/00, a COSIT afirmou que a PLR da empresa deve ser objeto de negociação entre empresa e seus empregados e o valor a ser pago em decorrência dessa participação não pode substituir ou complementar a remuneração devida a qualquer empregado. Assim, à luz da Lei n. 10101/00, o entendimento daquele órgão foi no sentido de que a PLR se destina especificamente aos empregados da empresa. Logo, o diretor estatutário de sociedade anônima - por não ser empregado - terá sua participação nos lucros e resultados inseria na base de cálculo da contribuição previdenciária, nos termos do art. 28 da Lei n. 8212/91. Por sua vez, a COSIT também destacou que o diretor estatutário que exerce o cargo mantendo as características inerentes à relação de emprego, será enquadrado como segurado obrigatório na qualidade de empregado e sua PLR não integrará o salário contribuição para efeitos de incidência da contribuição previdenciária. Desta feita, vale registrar que o mesmo entendimento da COSIT a respeito da incidência da contribuição previdenciária sobre a PLR paga ou creditada aos diretores estatutários já foi objeto de alguns precedentes do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF). Exemplificadamente são os acórdãos n. 2401-003.487, de 15.3.2014 e n. 2401-003.571, de 17.7.2014. De forma similar também já se posicionou o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, conforme apelação n. 0001306-05.2008.4.04.7201, de 1.9.2009, bem como o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, conforme se verifica da apelação em mandado de segurança n. 0006227.97-2012.403.6100, de 29.7.2014. Contudo, não se pode descartar que o CARF também já se manifestou em sentido diverso e por diferentes argumentos que não foram objeto da solução de consulta ora destacada. 4
É o caso do acórdão n. 2402-002.883 1, de 10.7.2012, cujo entendimento se deu no sentido de que aos diretores estatutários aplicam-se os arts. 145 e 152 da Lei n. 6404/76, que regem a relação entre acionistas e diretores/administradores e não as disposições do art. 28 da Lei n. 8212/91, que rege a relação entre empregador e empregado. Art. 152. A assembléia-geral fixará o montante global ou individual da remuneração dos administradores, inclusive benefícios de qualquer natureza e verbas de representação, tendo em conta suas responsabilidades, o tempo dedicado às suas funções, sua competência e reputação profissional e o valor dos seus serviços no mercado. (Redação dada pela Lei nº 9.457, de 1997) 1º O estatuto da companhia que fixar o dividendo obrigatório em 25% (vinte e cinco por cento) ou mais do lucro líquido, pode atribuir aos administradores participação no lucro da companhia, desde que o seu total não ultrapasse a remuneração anual dos administradores nem 0,1 (um décimo) dos lucros (artigo 190), prevalecendo o limite que for menor. 2º Os administradores somente farão jus à participação nos lucros do exercício social em relação ao qual for atribuído aos acionistas o dividendo obrigatório, de que trata o artigo 202. A esse respeito, também registra o precedente que a participação dos diretores estatutários é contabilizada em conta de patrimônio líquido, mediante redução do lucro acumulado, e não paga pela empresa em si, por meio de escrituração em conta de resultado. Daí, portanto, a posição pela inaplicabilidade do art. 28 da Lei n. 8212/91 aos diretores estatutários, pois os valores por eles recebidos não se inserem na relação jurídica entre empregado e empregador, mas entre acionista e diretor estatutário, o que inviabiliza a incidência da contribuição previdenciária nos moldes da Lei n. 8212/91. 1 No mesmo sentido, acórdão n. 2402-003.995, de 19.3.2014 e n. 2301-003.473, de 17.4.2013. 5
Por sua vez, também merece destaque o acórdão n. 2403-002.336, de 19.11.2013, cujo entendimento se deu de forma similar ao precedente acima, no sentido de que os pagamentos realizados aos administradores de sociedade anônima não se enquadram no conceito de salário-de-contribuição, por se tratarem de ganhos não eventuais e se reportarem à Lei n. 6404, de 15.12.1976 e não à Lei n. 10101/00. O referido precedente também consignou que nem a Lei supramencionada [Lei n. 10101/00] nem o art. 28, 9º da Lei 8212/91 fazem ressalva de que somente os segurados empregados podem ser beneficiados com o pagamento da PLR. E, após analisar os dispositivos da Lei n. 10101/00, da CLT e da Constituição Federal, concluiu no sentido de que: Como se pode observar, todos os diplomas legais que regulam a matéria, garantem aos trabalhadores o direito à participação nos lucros das empresas. Em nenhum momento há a definição de que trabalhadores são exclusivamente segurados empregados, Logo, analisando o conceito de trabalhador com as respectivas normas legais, não se pode afirmar que diretores, gerentes e executivos não sejam considerados como tal. Em consonância com os julgados acima e com maior riqueza de detalhes também é o voto vencido proferido no acórdão n. 9202-003.196, de 7.5.2014, da 2ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF). Contudo, importante registrar que o voto vencedor proferido neste precedente da CSRF entendeu pela incidência da contribuição previdenciária sobre os valores pagos a título de PLR aos administradores/diretores estatutários. Dentre os fundamentos do voto vencedor tem-se que o art. 152 da Lei n. 6404/76 não tem o condão de regulamentar a regra prevista no inciso XI, do art. 7º da Constituição Federal, que desvincula a PLR da remuneração. No entendimento proferido no acórdão, o art. 152 regula parcelas de participação no lucro da companhia para os diretores sem vínculo empregatício e a regra do inciso XI, do art. 7º é destinada especialmente aos trabalhadores com vínculo empregatício. 6
De acordo com o voto vencedor proferido pela CSRF, o fato de a assembleia geral ter poderes para deliberar sobre a concessão da PLR aos diretores estatutários, nos moldes do art. 152 da Lei n. 6404/76, não significa que pode ela desnaturar a relação jurídica laboral existente entre a companhia e o diretor estatutário, tampouco a natureza remuneratória da verba paga ou creditada. Por isso a incidência da contribuição previdenciária. Seja como for, em que pese o entendimento majoritário atual acompanhe a essência do posicionamento da COSIT, no sentido da incidência da contribuição previdenciária sobre os valores pagos ou creditados aos diretores estatutários a título de PLR, por certo que existem fundamentos jurídicos e alguns precedentes em sentido contrário. O tema ainda não está pacificado, merecendo acompanhamento constante da evolução jurisprudencial. 7