ACÓRDÃO Registro: 2018.0000220441 Vistos, relatados e discutidos estes autos do Agravo de Instrumento nº 2204857-81.2017.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é agravante GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA, são agravados E-VORTICE PRODUÇAO FOTOGRÁFICA LTDA EPP, RODRIGO MARTINS TOMASEVIC, LAURA AKEMI ISHIGURO SILVA, ANDRESSA DOS SANTOS CIZICOV, ELISÂNGELA DE MELO RODRIGUES e MARCELA RENATA DA SILVA. ACORDAM, em do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores DONEGÁ MORANDINI (Presidente) e BERETTA DA SILVEIRA. Marcia Dalla Déa Barone RELATOR Assinatura Eletrônica São Paulo, 27 de março de 2018.
VOTO Nº 19.878 Agravante: Google Brasil Internet Ltda. Agravados: E-vortice Produção Fotográfica Ltda Epp e Outros Comarca: São Paulo (Foro Central - 20ª Vara Cível) Juiz: Elaine Faria Evaristo Ação de obrigação de fazer Decisão que ampliou o decreto de antecipação de tutela para impor à agravante a obrigação de identificar os usuários dos IPs e fornecimento da porta lógica de origem em relação aos IPs referidos nos autos Ausência do dever da agravada de identificar o usuário do IP ou a porta lógica de origem Empresa agravante que não figura como provedor de conexão tampouco como provedor de aplicação Recurso provido. Vistos, Cuida-se de recurso de agravo de instrumento tirado contra a decisão de fls. 630/631 que em sede de ação de obrigação de fazer, entre outras deliberações, deferiu o pedido de complementação de informações, determinando que a requerida Google forneça as portas lógicas de origem referentes aos IPs fornecidos. A decisão de fls. 656 rejeitou os embargos de declaração opostos pela empresa agravante. Argumenta a agravante Google que não pode ser a si imposta a obrigação que extrapola a determinação contida no Artigo 22 do Marco Civil da Internet, vez que se trata de provedor de VOTO Nº 19.878 2
aplicação e não de conexão. Esclarece que forneceu as informações que se encontravam a si disponíveis, o que permitirá aos autores a identificação dos usuários, concluindo não ter o dever de fornecer a porta lógica de origem. Houve deferimento do pedido de concessão de efeito suspensivo. Contraminuta a fls. 667/675. A agravante se opôs ao julgamento virtual do presente recurso (fls. 665). É o relatório. Antes de adentrar ao mérito propriamente dito, cumpre fazer uma breve explanação acerca do dado controvertido (porta lógica de origem) solicitado na ação de obrigação de fazer. De acordo com informações colhidas por esta Relatoria no sítio eletrônico da Anatel verificou-se que diante do crescimento e expansão da rede mundial de computadores no Brasil está se esgotando a quantidade de IPs disponíveis (Internet Protocol ou Protocolo Internet) sendo este um endereço de numeração única na rede que permite a identificação do dispositivo e, consequentemente, a individualização do usuário que o utilizou para acessar a rede, questão primordial nas hipóteses de uso indevido de dados como no caso em exame. Para que se possa expandir a utilização de IPs será necessária a transição do protocolo IPv4 para a versão IPv6, que suporta a criação de uma quantidade maior de endereços de IP. VOTO Nº 19.878 3
E para regulamentar a transição entre os sistemas IPv4 e IPv6 foi adotada como medida paliativa a possibilidade de compartilhamento do mesmo IP no sistema IPv4 por mais de um usuário, ou seja, de maneira simultânea mais de um usuário poderá acessar a internet com a utilização do mesmo número de IP. Nesse contexto, para possibilitar a individualização do usuário é necessário que se verifique a porta lógica de origem fornecida individualmente a cada um deles durante a utilização do IP compartilhado. As informações adrede mencionadas foram retiradas do relatório final de atividades do Grupo de Trabalho criado pela Anatel para discutir a implantação do IPv6 na internet brasileira (disponível em:http://www.anatel.gov.br/portal/verificadocumentos/documento.asp?numeropublicacao=325769&assuntopublicacao=null&caminhorel=nu ll&filtro=1&documentopath=325769.pdf). Por se tratar de uma questão transitória até que seja totalmente implantada a rede IPv6 no Brasil, cuida-se de matéria que não está expressamente regulada no marco civil da internet (Lei n. 12.965/2014) no que tange à responsabilidade dos provedores de conexão e de aplicação pelo armazenamento e fornecimento de dados. Contudo, se revela de suma importância uma vez que sem a porta lógica de origem não é possível individualizar a pessoa que utilizou determinado IP de maneira compartilhada. Ainda de acordo com o teor do relatório elaborado pelo Grupo de Trabalho instaurado perante a Anatel, que VOTO Nº 19.878 4
contou com a participação de provedores de conexão e de aplicação foi solicitado que todos empreendam esforços para armazenamento da porta lógica de origem. Verifica-se que a porta lógica de origem se trata de dado que está intimamente ligado à conexão à Internet, vez que para cada sessão de navegação aberta pelo usuário é utilizada uma porta lógica para comunicação, sendo oportuno transcrever um trecho do relatório do Grupo de Trabalho da Anatel: CG-NAT44 e a quebra de sigilo nos casos previstos em lei: Com relação à guarda da porta, requisito necessário para que se viabilize a quebra de sigilo nos casos previstos legalmente, foi apontado pelas prestadoras a necessidade de padronização do LOG de registros de conexão, da forma que os pedidos de quebra de sigilo são gerados pelos demandantes e a conscientização dos provedores de conteúdo/aplicações para também guardar a porta de origem da conexão além das prestadoras. Ademais, a Anatel ponderou que a redução da proporção dos endereços IPv4 público/privado adotada no CG-NAT44 ajudaria na redução de problemas neste cenário. (grifei). Da leitura do trecho acima se pode extrair que embora em tese seja possível aos provedores de aplicação o armazenamento da porta lógica de origem, não se trata de obrigação primordial dos provedores de aplicação, como no caso da empresa agravada, mas dos provedores de conexão. A transcrição do debate ocorrido em dezembro de 2015 pela Comissão Temática de Conteúdos em Meios de VOTO Nº 19.878 5
Comunicação do Senado Federal às fls. 613/669 não agrega elementos de convicção que possam alterar o entendimento desta Relatoria acerca da matéria, apenas reforça que a porta lógica de origem é um dado de suma importância na identificação dos usuários de IP's compartilhados e que os provedores de conexão e de aplicação devem reunir esforços para solucionar essa questão, contudo, cuida-se apenas de um debate que não tem força normativa ou vinculante. A jurisprudência desta C. Corte de Justiça possui julgados que seguem referida orientação, atribuindo a responsabilidade de armazenamento e fornecimento da porta lógica de origem somente aos provedores de conexão: 2189710-83.2015.8.26.0000 Agravo de Instrumento / Direito de Imagem Relator(a): Ana Lucia Romanhole Martucci Comarca: São Paulo Órgão julgador: 6ª Câmara de Direito Privado Data do julgamento: 27/11/2015 Data de registro: 28/11/2015 Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA ANTECIPADA. Ação de obrigação de fazer. Decisão agravada que determina que a agravante forneça informação acerca de usuário de internet que tem violado direitos da autora. Inconformismo apenas no fornecimento de "porta lógica de origem", já que, como provedor de aplicação, não tem obrigação de fornecer tais dados. Provedores de aplicação que têm obrigatoriedade de coleta e armazenamento de informações referentes à data e hora de uso de uma determinada aplicação de internet a partir de um determinado endereço IP. Aplicabilidade dos artigos 5, VIII cumulado com 15 da Lei 12.965/14 (Marco Civil da Internet). Dados já fornecidos. Informações referentes à "porta lógica de origem" que são próprias dos provedores de conexão. Transição entre o modelo IPv4 e IPv6 para expansão da Internet no Brasil que, em um primeiro momento, não justifica imposição de obrigação não prevista em lei. Decisão reformada. Recurso provido. 2150710-76.2015.8.26.0000 Agravo de Instrumento / Responsabilidade Civil Relator(a): Alexandre Marcondes Comarca: São Paulo VOTO Nº 19.878 6
Órgão julgador: Data do julgamento: 31/08/2015 Data de registro: 01/09/2015 Ementa: INTERNET. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. Comercialização ilícita de plano de serviços de operadora de telefonia celular. Tutela antecipada concedida em agravo de instrumento determinando a remoção da internet dos anúncios ilícitos dos sites da agravante e das interessadas e o fornecimento dos dados cadastrais e registros eletrônicos que permitam a identificação dos fraudadores. Preliminares de suspensão do recurso, não conhecimento, preclusão e conversão em agravo retido afastadas. Decisão recorrida que determina que a agravante forneça os dados das "portas lógicas" utilizadas para o acesso à internet. Google. Provedora de aplicação de internet. Obrigatoriedade de coleta e armazenamento de "informações referentes à data e hora de uso de uma determinada aplicação de internet a partir de um determinado endereço IP" (arts. 5º, VIII e 15 da Lei nº 12.965/14 Marco Civil da Internet). Dados já fornecidos. Não obrigatoriedade de coleta e armazenamento dos dados das portas lógicas utilizadas nos acessos à internet. Informação própria do provedor de conexão. Esgotamento dos endereços IP no protocolo IPv4 que, no entanto, não justifica a imposição de obrigação não prevista em lei. AGRAVO PROVIDO. Assim, embora não haja prova inequívoca da alegada impossibilidade técnica de fornecimento do dado solicitado, é possível reconhecer que a agravante não tem a obrigação legal de fornecer a porta lógica de origem, vez que referido dado está essencialmente ligado à conexão à internet. Em face do exposto, pelo voto, Dá-se provimento ao agravo para o fim de não impor à agravante a obrigação de identificação dos usuários dos IPs ou de fornecimento da porte lógica de origem. MARCIA DALLA DÉA BARONE Relatora VOTO Nº 19.878 7