Verificação da concordância inter e intra-examinadores no controle radiográfico de lesões periapicais

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Transcrição:

Verificação da concordância inter e intra-examinadores no controle radiográfico de lesões periapicais Verification of inter and intraoperator agreement in radiographic control of periapical injuries Glauco dos Santos Ferreira* Rosana Maria Coelho Travassos** Márcia da Silva Schmitz*** Ângelo Melo**** Com este estudo verificou-se a concordância inter e intra-examinadores na avaliação radiográfica de lesões periapicais. O material consistiu de 114 radiografias periapicais provenientes de 57 tratamentos endodônticos realizados na FOP/UPE. Foram selecionadas, de cada tratamento, a radiografia inicial ou final do caso e a radiografia de controle, realizada dois anos após a conclusão do tratamento. Três endodontistas, três radiologistas e três cirurgiões-dentistas clínicos gerais foram questionados para avaliar os pares de radiografias quanto à evolução das lesões periapicais. O mesmo procedimento foi repetido após um mês, pelos mesmos avaliadores, com as mesmas radiografias. Essas avaliações foram realizadas sob condições padronizadas de interpretação. Verificou-se que, entre os endodontistas, a concordância interexaminadores variou de 59,6% a 62,3%, média de 60,5% (Kappa = 0,48); entre os radiologistas, de 50,0% a 64,0%, média de 55% (Kappa = 0,42); e entre os clínicos variou de 43,0% a 57,9%, média de 52,6% (Kappa = 0,39). Já a concordância intra-examinadores, variou de 63,2% a 86,0%, média de 74,3% (Kappa = 0,66), entre os endodontistas; de 66,7% a 73,7%, média de 69,6% (Kappa = 0,60) entre os radiologistas; de 56,1% a 73,7%, média de 64,3% (Kappa = 0,54), entre os clínicos gerais. A melhor concordância inter e intraexaminadores foi obtida no grupo dos endodontistas, ao passo que entre os clínicos gerais os resultados foram menos satisfatórios. Palavras-chave: Endodontia. Radiografia periapical. Patologia periapical. Avaliação radiográfica. Variações entre observadores. Introdução O método tradicional de avaliação do sucesso da terapia endodôntica envolve o exame clínico e o uso de radiografias de controle. Algum tempo após o término do tratamento endodôntico realiza-se um exame radiográfico, que é comparado à radiografia final de tratamento. Com base nas alterações dessas imagens radiográficas, os profissionais procuram determinar o aumento ou diminuição das lesões periapicais tratadas. O diagnóstico com relação ao sucesso ou ao fracasso do tratamento é importante porque determina a decisão subseqüente do caso. Embora existam algumas variáveis que interferem na interpretação radiográfica, conferindo um caráter subjetivo à análise, este exame é o método mais utilizado no estudo dos resultados de tratamentos endodônticos e do seu padrão técnico. De acordo com Smith et al. 1 (1993), a radiografia periapical consiste no mais importante método de diagnóstico disponível para o endodontista, mas sua confiabilidade tem sido questionada, uma vez que a interpretação dos resultados torna-se mais consistente quando mais de um examinador a avalia e quando as condições de visualização são padronizadas. A forma mais comum de se medir a confiabilidade de uma medida ou avaliação é verificar sua reprodutibilidade, ou seja, realizar diferentes medições ou avaliações repetidas e verificar o grau de concordância entre elas. Essa concordância pode ser estabelecida pela comparação de medidas obtidas pelo mesmo examinador (concordância intra-exami- * Mestre e aluno do curso de doutorado em Endodontia FOP/UPE. ** Professora Adjunta; Doutora em Endodontia FOP/UPE. *** Professora Assistente. Mestre em Endodontia UFSM. **** Mestre e aluno do curso de doutorado em Endodontia FOP/UPE. 37

nador) ou por diferentes examinadores (concordância interexaminadores) 2. Ferreira et al 3. (2004) verificaram a concordância inter e intra-examinadores em estabelecer o limite apical de odontometrias, não obtendo uma concordância como a desejada na prática clínica. Em novo trabalho, Ferreira et al. 4 (2004) avaliaram a concordância em determinar o limite de obturações endodônticas, não observando, novamente, uma concordância satisfatória. Tais observações fornecem subsídios para que diversos estudos sejam desenvolvidos a fim de analisar as diferenças inter e intra-observadores na avaliação de radiografias que verificam a efetividade dos tratamentos endodônticos, pois o exame radiográfico pode levar a interpretações errôneas sobre as suas informações, em virtude das limitações da imagem radiográfica, o que confere subjetividade ao método. Assim, com o presente trabalho propõe-se verificar a concordância inter e intra-observadores na avaliação radiográfica de lesões periapicais, após dois anos da conclusão dos tratamentos endodônticos, entre radiologistas, endodontistas e clínicos gerais. Materiais e método O material consistiu de 114 radiografias periapicais provenientes de 57 tratamentos endodônticos realizados na Clínica de Endodontia do curso de gradua ção da Faculdade de Odontologia da Universidade de Pernambuco em 1998 e 1999. Os casos foram selecionados a partir do estudo original de Travassos 5 (2002), sendo obtidas de cada tratamento a radiografia inicial ou final, além da radiografia de controle, realizada dois anos após a conclusão do tratamento. A utilização das radiografias desta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da FOP/UPE. Três cirurgiões-dentistas clínicos gerais, três endodontistas e três radiologistas, todos com um mínimo de dez anos de experiência clínica e professores universitários, foram solicitados a avaliar as radiografias dos 57 dentes tratados endodonticamente. As radiografias iniciais ou finais e as radiografias de controle, devidamente numeradas e identificadas, foram analisadas individualmente pelos profissionais quanto a presença, evolução e desaparecimento da radiotransparência óssea apical ou lateral durante o período de controle. O procedimento foi repetido pelos mesmos observadores após um mês com as mesmas radiografias, a fim de verificar a variabilidade intra-examinador. A análise das radiografias foi realizada sob condições padronizadas 1, com o auxílio de uma lupa Classic Magnifier 8750G (Sosecal Indústria e Comércio Ltda., Barra Funda, SP, Brasil), com 50 mm de diâmetro e uma magnitude de cinco vezes. As películas foram montadas numa máscara de papel preto que ocupava toda a extensão do negatoscópio, diminuindo-se, assim, as interferências de luminosidade laterais 5-7. Com a finalidade de reduzir a fadiga dos examinadores e, conseqüentemente, de evitar a variabilidade nos resultados das interpretações radiográficas, cada examinador foi orientado a realizar repouso entre as avaliações, de acordo com sua necessidade de descanso mental e visual 8. Todos os examinadores realizaram as avaliações pela manhã, antes de suas atividades diárias, também com o objetivo de padronizar a interpretação. Cada examinador avaliou uma única vez cada tratamento endodôntico, isoladamente, sem ocorrer comunicação entre eles. Os avaliadores foram orientados a classificar cada tratamento de acordo com uma das seis condições estabelecidas por Travassos 5 (2002): imagem radiolúcida apical ou lateral presente na radiografia de controle e ausente na radiografia de tratamento; persistência de imagem radiolúcida apical ou lateral de extensão semelhante nas radiografias de controle e de tratamento; diminuição da imagem radiolúcida apical ou lateral na radiografia de controle em relação à radiografia de tratamento; desaparecimento da imagem radiolúcida apical ou lateral na radiografia de controle, que estava presente na de tratamento; ausência de imagem radiolúcida apical ou lateral nas radiografias de controle e tratamento; aumento da imagem radiolúcida apical ou lateral na radiografia de controle em comparação à de tratamento. Com o propósito de facilitar a interpretação das radiografias, foi entregue aos examinadores um gabarito com desenhos simulando as seis condições radiográficas estabelecidas para classificação, pois, de acordo com Orstavik et al. 9 (1986), o uso de desenhos contribui para a melhor interpretação radiográfica. Para a análise dos dados, foram obtidas as freqüências absolutas e percentuais dos resultados das avaliações inter e intra-examinadores, além do escore de concordância Kappa. Os intervalos de confiança foram obtidos com nível de 95,0%. Os dados foram digitados na planilha eletrônica Microsoft Excel 2002 (Microsoft Corporation, Redmond, EUA) e o software utilizado para a obtenção dos cálculos estatísticos foi o SAS (Statistical Analysis System) na versão 8.0 (SAS Inc., Cary, Carolina do Norte, EUA). Resultados Na Tabela 1 são apresentados os resultados da concordância entre os dois exames, por examinador, por grupo de especialistas e no total dos nove examinadores. Na tabela observa-se que o percentual de concordância variou de 56,1% a 86,0% no geral e, entre os grupos, de 64,3% a 74,3%. Para os endodontistas, a concordância variou de 63,2% a 86,0%, com média de 74,3%, correspondendo a um coeficiente Kappa de 0,66; no grupo dos radiologistas, variou de 66,7% a 73,7%, com média de 69,6% (Kappa = 0,60); no grupo dos clínicos gerais, a variação foi de 56,1% a 73,7%, com média de 64,3% (Kappa = 0,54). Analisando-se os nove profissionais, obteve-se uma concordância intraexaminadores média de 69,4% (Kappa = 0,60). Para os casos em que foi possível obter o valor Kappa, esta medida oscilou de 0,52 (concordância moderada) ao valor máximo de 0,77 (concordância expressiva). Todos os 38

intervalos para o Kappa populacional por examinador, por grupo de especialistas e no total de examinadores excluem o valor zero; portanto, a hipótese de que o Kappa populacional é nulo é rejeitada, indicando o grau de concordância entre os dois exames. Tabela 1 - Resultados da concordância intra-examinadores entre as especialidades avaliadas Concordância Examinadores Observada Kappa n % Valor IC (95%) Endodontista 1 (1) 42 73,7 * Endodontista 2 (1) 36 63,2 * Endodontista 3 (1) 49 86,0 0,77 0,67 a 0,92 Endodontistas (2) 42,33 74,3 0,66 0,57 a 0,74 Radiologista 1 (1) 38 66,7 * Radiologista 2 (1) 42 73,7 * Radiologista 3 (1) 39 68,4 0,60 0,45 a 0,75 Radiologistas (2) 39,67 69,6 0,60 0,51 a 0,69 Clínico geral 1 (1) 36 63,2 0,52 0,36 a 0,68 Clínico geral 2 (1) 42 73,7 0,66 0,52 a 0,80 Clínico geral 3 (1) 32 56,1 * Clínicos gerais (2) 36,66 64,3 0,54 0,45 a 0,63 Total para os nove 39,55 69,4 0,60 0,55 a 0,65 examinadores (3) IC - Intervalo de confiança. (*) - Não foi possível determinar devido à ocorrência de freqüência nula em pelo menos uma das categorias. (1) - Os percentuais foram obtidos com base em 57 avaliações. (2) - Os percentuais foram obtidos com base em 171 avaliações realizadas pelos três examinadores. (3) - Os percentuais foram obtidos com base em 513 avaliações realizadas pelos nove examinadores. Na Tabela 2 apresenta-se a concordância entre os pares de examinadores da mesma especialidade (interexaminadores) por avaliação, resultados que são também analisados no grupo total. Na tabela observase que o percentual de concordância variou de 42,1% a 64,9% (média = 54,8% / Kappa = 0,41) na primeira avaliação e de 43,9% a 66,7% (média = 57,3% / Kappa = 0,43) na segunda. Entre os pares de endodontistas, a concordância variou de 57,9% a 64,9% (média = 62%) na primeira avaliação e de 56,1% a 61,4% (média = 59,1%) na segunda; no grupo dos radiologistas ocorreu concordância variando de 49,1% a 61,4% (média = 54,4%) para a primeira avaliação e 49,1% a 66,7% (média = 55,6%) para a segunda; entre os clínicos gerais a variação foi entre 42,1% a 50,9% (média = 45,3%) na primeira e 43,9% a 64,9% (média = 67,3%) na segunda avaliação. Considerando-se os 36 pares de examinadores, independentemente da especialidade, obteve-se uma concordância interexaminadores de 54,4% (Kappa = 0,41) na primeira avaliação e 55,1% (Kappa = 0,41) na segunda. Tabela 2 - Resultados da concordância entre examinadores (interexaminadores) por especialidade e exame realizado Concordância Exame Examinadores Observada Kappa n (1) % Valor IC (95%) Primeiro endodontista 2 (1) 26 63,2 * endodontista 3 (1) 37 64,9 * Endodontista 2 x endodontista 3 (1) 33 57,9 0,46 0,30 a 0,61 endodontistas (2) 32 62,0 * radiologista 2 (1) 35 61,4 * radiologista 3 (1) 30 52,6 * Radiologista 2 x radiologista 3 (1) 28 49,1 0,36 0,20 a 0,51 radiologistas (2) 31 54,4 0,41 0,32 a 0,50 clínico geral 2 (1) 29 50,9 0,37 0,22 a 0,53 clínico geral 3 (1) 24 42,1 0,27 0,12 a 0,43 Clínico geral 2 x clínico geral 3 (1) 29 50,9 0,38 0,22 a 0,53 clínicos gerais (2) 27,33 45,3 0,34 0,25 a 0,43 Média (entre os 9 pares) (3) 31,22 54,8 0,41 0,36 a 0,47 Total entre os 36 pares de examinadores (4) 1118 54,4 0,41 0,38 a 0,44 Segundo endodontista 2 (1) 32 56,1 * endodontista 3 (1) 34 59,6 0,46 0,30 a 0,62 Endodontista 2 x endodontista 3 (1) 35 61,4 * Total entre os endodontistas (2) 33,66 59,1 0,45 0,36 a 0,55 radiologista 2 (1) 38 66,7 0,54 0,38 a 0,70 radiologista 3 (1) 28 49,1 * Radiologista 2 x radiologista 3 (1) 29 50,9 * Total entre os radiologistas (2) 31,66 55,6 * clínico geral 2 (1) 36 63,2 0,53 0,38 a 0,68 clínico geral 3 (1) 25 43,9 * Clínico geral 2 x clínico geral 3 (1) 37 64,9 * Total entre os clínicos gerais (2) 32,66 57,3 0,44 0,35 a 0,53 Total (entre os 9 pares) (3) 294 57,3 0,43 0,38 a 0,49 Total entre os 36 pares de examinadores (4) 1131 55,1 0,41 0,39 a 0,44 IC - Intervalo de confiança. (*) - Não foi possível determinar devido à ocorrência de freqüência nula em pelo menos uma das categorias. (1) - Os percentuais foram obtidos com base em 57 avaliações. (2) - Os percentuais foram obtidos com base em 171 avaliações realizadas pelos três examinadores. (3) - Os percentuais foram obtidos com base em 513 avaliações realizadas pelos nove pares de examinadores da mesma especialidade. (4) - Os percentuais foram obtidos com base em 2 052 avaliações realizadas pelos 36 pares de examinadores. 39

Discussão Os dados da presente pesquisa confirmam que existe uma variabilidade na interpretação radiográfica das lesões periapicais, corroborando os achados de trabalhos clássicos 10-17. Apenas no estudo de Goldman et al. 10 (1972) pôde ser observada uma concordância interexaminadores em menos de 50% dos casos. Em relação ao trabalho de Lambrianidis 13 (1985), pequena diferença foi observada, uma vez que os endodontistas concordaram em 53,8% dos casos, os radiologistas, em 55,2% e os clínicos gerais, em 48,9% das respostas, ao passo que no presente trabalho os endodontistas apresentaram melhor desempenho do que os radiologistas. No estudo realizado por Paim et al. 17 (2000) a concordância nas interpretações radiográficas também foi um pouco inferior à da presente pesquisa, sendo de 45,33% quando analisadas as radiografias nas mesmas condições deste trabalho e de 51,34% com o auxílio da imagem em computador. Observou-se na presente pesquisa um nível de concordância mais elevado do que aqueles encontrados por Ferreira et al. 18 (2003), fato que confirma a influência da experiência profissional na capacidade de interpretar imagens radiotransparentes periapicais ou laterais. Faz-se tal afirmação em virtude da pouca experiência dos examinadores envolvidos no trabalho citado, visto que foi realizado com alunos de um curso de especialização em endodontia, ao passo que, no presente estudo, as interpretações foram realizadas por endodontistas, radiologistas e clínicos gerais experientes. Em outra pesquisa realizada por Ferreira et al. 19 (2004) encontrou-se pequena concordância quando realizadas avaliações com radiologistas, muito abaixo dos resultados obtidos neste estudo. No estudo citado os radiologistas obtiveram uma concordância interexaminadores de apenas 36,7% e intra-examinadores de 58,3% dos casos, ao passo que no presente estudo os radiologistas obtiveram concordâncias de 55,0% e 69,6%, inter e intra-examinadores, respectivamente. Esta maior concordância pode ser justificada pelo estabelecimento de critérios radiográficos mais consistentes com o intuito de facilitar a adequada interpretação, bem como em razão de uma melhor orientação fornecida aos examinadores. Com base nas considerações expostas, fica evidente que a interpretação radiográfica apresenta limitações que vão muito além da qualidade técnica das radiografias. Não se pode negar que exames executados de forma padronizada contribuem para o estabelecimento do diagnóstico. No entanto, torna-se necessário para a correta interpretação um conjunto de fatores relacionados ao examinador e aos métodos de visualização, como examinadores experientes e com capacidade e treinamento adequados, aumentando, assim, a possibilidade de interpretação radiográfica correta. Conclusão Por meio do presente estudo observou-se que a concordância inter e intra-examinadores no controle de lesões periapicais após dois anos de controle do tratamento endodôntico não apresentou os índices desejados na prática clínica, sendo o melhor grau de concordância obtido no grupo dos endodontistas, seguido pelo dos radiologistas e pelo dos clínicos gerais. Abstract This study verified the inter and intraoperator agreement in radiographic evaluation of the periapical lesions. The material was consisted of 114 periapical radiographs provenient from 57 endodontic treatments accomplished at FOP/UPE. An initial or final radiograph and control radiograph, made two years after the end of the treatment, were selected. Three endodontists, three radiologists and three practitioner surgeon dentists were questioned to evaluate the pairs of radiographs as for their evolution on periapical lesions. The same procedure was repeated after one month with the same radiographs. These analysis were accomplished under standardized conditions of interpretation. It was seen that among the endodontists and inter-examiners the agreement varied from 59,6% to 62,3%, an average of 60,5% (Kappa = 0,48); among the radiologists varied from 50,0% to 64,0%, an average of 55,0% (Kappa = 0,42); and among the practitioners, varied from 43,0% to 57,9%, an average of 52,6% (Kappa = 0,39). When the intra-examiners agreement was checked, it was seen that among the endodontists, the agreement varied from 63,2% to 86,0%, an average of 74,3% (Kappa = 0,66). In the group of radiologists, it varied from 66,7% to 73,7%, an average of 69,6 (Kappa = 0,60). In the group of practitioners, the variation was from 56,1% to 73,7%, an average of 64,3% (Kappa = 0,54). The better inter and intraperator agreement was obtained from the group of endodontists, whereas among the practitioners the results were less satisfactory. Key words: Endodontics. Periapical radiography. Periapical pathology. Radiographic evaluation. Variations among observers. Referências 1. Smith CS, Setchell DJ, Harty FJ. Factors influencing the success of conventional root canal therapy a five year retrospective study. Int Endod J 1993; 26:321-33. 2. Leles CR. Princípios de bioestatística. In: Estrela C. Metodologia Científica: ensino e pesquisa em odontologia. 1. ed. São Paulo: Artes Médicas; 2001. p. 277-305. 3. Ferreira GS, Travassos RMC, D`Assunção FLC. Verificação da concordância inter e intra-examinadores em odontometria. Rev ABO Nac 2004; 12(1)Suppl:78. 4. 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