COMPORTAMENTO REOLOGICO DE POLPA DE CUPUAÇU (THEOBROMA GRANDIFLORUM SHUM) ADITIVADA COM O BIOPOLÍMERO XANTANA Gilvanete M. Ferreira 1, Maria José O. C. Guimarães, Maria Cristina A. Maia 1, * Departamento de Engenharia Bioquímica - EQ/ UFRJ, Rio de Janeiro/RJl - CEP 1949-900, mmgilv@yahoo.com Departamento de Processos Orgânicos - EQ/ UFRJ; mjg@eq.ufrj.br Rheological Behavior of Cupuassu Pulp (Theobroma grandiflorum shum) Aditivated with Xanthan Biopolymer The rhelogical behavior of xanthan gum in cupuassu fruit pulp was evaluated by mean of steady shear flow tests. The Ostwald-de-Waelle model fitted well the biopolymer flow behavior. In pulp fruit systems, xanthan gum showed more pseudoplasticity and consistency for CupX1%. Moreover, the effect of temperature on the consistency index values of xanthan in cupuassu fruit pulp was described by Arrhenius equation and discussed in terms of activation energy. Introdução A fruticultura poderá ser uma das atividades econômicas de maior importância da Amazônia, considerando a enorme diversidade de espécies fruteiras tipicamente regionais. Dentre esta grande variedade destaca-se o cupuaçuzeiro, Theobroma grandiflorum, uma fruteira pertence à família Sterculíaceae, gênero Theobroma, que vem surgindo como uma das alternativas para a indústria alimentícia (Schwan, 00, Garcia, 1994). A polpa tem sido utilizada como matéria prima para néctar; entretanto, é usada em sorvetes, geléias, bombons, doces, licores, purês e polpa enlatada. Os plantios de cupuaçu têm crescido em muitas áreas da Amazônia Brasileira devido ao aumento da demanda pela polpa, que vem sendo exportada, principalmente na forma congelada, para estados do Sudeste do Brasil e para países europeus (Bastos et al., 0). A adição de hidrocolóides em produtos alimentícios congelados atua como espessantes, proporcionando uma textura mais suave e agradável, devido à redução na taxa de crescimento de cristais de gelo. Além disso, esse ingrediente evita uma possível recristalização do gelo, quando o produto é submetido a oscilações de temperaturas durante estocagem e transporte. A adição de hidrocolóide em polpa de fruta ocasiona alterações significativas nas propriedades reológicas, sendo dessa forma, de grande importância o conhecimento de tais propriedades. A definição de modelos adequados à descrição de seu escoamento é
necessária ao projeto de tubulações, sistemas de bombeamento, sistemas de agitação e misturas, entre outras aplicações. Dentre os modelos reológicos, tem-se os de Ostwald-de-Waelle (Equação 1.1) e Herschel- Bulkley (Equação 1.) que são muito utilizados em produtos alimentícios. τ = Kγ n (1.1) τ = τ o +K γ n (1.) onde: K = índice de consistência (Pa.s n ); τ o = tensão de cisalhamento inicial (Pa); τ = tensão de cisalhamento (Pa); γ = taxa de deformação (s -1 ); n = índice de comportamento de fluxo (adimensional). O efeito da temperatura no índice de consistência (K), a uma taxa de deformação específica, foi expresso por uma equação do tipo Arrhenius (Equação 1.3) K =Aexp(Ea/RT) (1.3) onde: A = constante empírica (Pa.s) ;Ea = energia de ativação do fluxo (Kcal/g-mol) R = constante do gás ideal, (1,987.10-3 Kcal/g-mol.K); T = temperatura absoluta (K) O objetivo deste trabalho foi estudar os efeitos da temperatura, concentração de polissacarídeo dispersa na polpa de cupuaçu integral, em cisalhamento estacionário. Experimental Matérias-primas - Polpa de cupuaçu A polpa de cupuaçu (Theobroma grandiflorum Schum) foi obtida na Cooperativa dos Produtores de Cupuaçu do Pará. Foi acondicionada em sacos de polietileno, estocada e congelada, a temperatura de ºC em freezer. - Hidrocolóides Foi utilizada a goma xantana (um biopolímero) em pó, cedida pela CPKelco Brasil S/A (Limeira SP) Preparo das amostras A polpa de cupuaçu a 9ºBrix e ph 3,3 foi aditivada com a goma xantana (X) utilizando três concentrações diferentes (0,3; 0,7 e 1% em peso de goma/peso de polpa), sob lenta agitação. Foram acondicionadas em sacos de polietileno, estocada e congelada, à temperatura de ºC em freezer até o momento da análise.... Medidas reológicas No estudo reológico utilizou-se o reômetro Thermo Haake Rheo Stress 1, equipado com célula do tipo Couette modelo Z Din. O Tempo de cada corrida foi de 4 minutos, em taxa crescente (0,3 a 0s-1) e taxa decrescente (0 a 0,3 s-1). As medidas foram
realizadas nas temperaturas de 10,,,, 50 e ºC. Os dados de tensão e taxa de deformação obtidos foram ajustados aos modelos reológicos de Herschel-Bulkley e Ostwald-de-Waelle utilizando o software Origin 5.0. A polpa de cupuaçu a 9ºBrix e ph 3,3 foi aditivada com a goma xantana (X) utilizando três concentrações diferentes (0,3; 0,7 e 1% em peso de goma/peso de polpa), sob lenta agitação. Foram acondicionadas em sacos de polietileno, estocada e congelada a temperatura de ºC em freezer até o momento da análise. Resultados e Discussão Os parâmetros de escoamento relativos aos modelos de Herschel-Bulkley e Ostwald-de- Waelle estão mostrados na Tabela 3.1 e a Figura 3.1 (a e b) apresenta as curvas de escoamento Tabela 3.1 Parâmetros reológicos para polpa de cupuaçu com xantana (CupX) Ostwald-de-Waelle Herschel-Bulkley C (%p/p) T (ºC) 0,3 10 50 0,7 10 50 1,0 10 K n R (Pa.s) n 6,71 7,03 5,1 5,89 4,34 4,0,48 1,87 19,54 18,09 17,07 16,03 7,53 5,56 5,03,59 0,33 0,3 0,34 0,3 0,34 0,35 0, 0, 0,1 0, 0,1 χ 0,008 0,008 0,005 0,009 0,07 0,013 0,38 0,10 0,06 0,04 0,04 0,01 0,19 0,31 0,46 0,43 τ o (Pa) 0,89-1,16 0, -0,4,31 1,13 1,89 1,78 9,59 6,89 5,43 0,65 19,97 16,94 17,84,96 K (Pa.s) n n R 6, 7,7 4,88 6,13 3,16 3,44 8,69 1,98 1,86 13,6 13,39 15,56 13,78 13,74 1,50 9,68 0,34 0, 0,34 0,31 0,38 0,37 0,35 0,8 0,7 0,6 0,6 0, 0,9 0,8 0, χ 0,008 0,007 0,005 0,009 0,019 0,011 0,05 0,047 0,03 0,019 0,014 0,015 0,08 0,7 0,348 0,18
50 3,14 0, 0,18 16,0 11,76 0,8 0,114, 0, 0,1 13,16 1,66 0,6 0,07 Coeficiente de determinação (R ): R = SQR SQT = ± ( ypred ( y obs y ) y ) Qui-quadrado (χ ): χ = (y obs - y pre ) Onde: y = média amostral, SQR = Soma quadrática devido à regressão, SQT = soma quadrática total χ = y obs = Valor experimental, y pred = valor previsto pelo modelo O modelo de Herschel-Bulkley (HB) se ajustou bem aos dados experimentais, no entanto, observa-se que alguns valores de tensão residual foram negativos para CupX0,3 e, portanto, sem significado físico. Já para amostra CupX0,7 na temperatura de ºC, a tensão de cisalhamento residual foi inferior a 1, sendo este valor não significativo quando se usa geometria de cilindros concêntricos(pastor et al., 1996). O modelo de Ostwald-de-Waelle (LP), demonstrou ajuste satisfatório em todas as temperaturas, apresentando baixos valores de χ e altos valores de R. O índice de comportamento de fluxo (n), foi inferior a 1 em todas as amostras, caracterizando desta forma um comportamento não-newtoniano, corroborando com os resultados de Correia (0), ao analisar o comportamento reológico e térmico de goma xantana em suco de caju. O índice de comportamento (n) variou muito pouco com a temperatura para todas as amostras. O índice de consistência (K), diminuiu com aumento da temperatura e aumentou com a concentração de goma na polpa, concordando com Quispe (03), no estudo do comportamento reológico de suspensões de amido de amaranto. Comparando as amostras CupX0,3; CupX0,7 e CupX1%, observa-se que CupX1% apresentou menores valores de n e maiores de K, ou seja, quanto maior a concentração de goma, mais acentuado é o comportamento não-newtoniano e maior a consistência. Isto resulta do progressivo alinhamento das moléculas rígidas com a força do cisalhamento. Comportamento idêntico foi observado por Pereira et al. (05), ao analisar o comportamento reológico da polpa de maracujá aditivada. Na Figura 3.1 é apresentada a influência da temperatura no comportamento reológico da polpa de cupuaçu aditivada
Tensão de cisalhamento (Pa) CupX0.3 10ºC 50 CupX0.3 ºC Cupuacu + X0,3% CupX0.3 ºC 45 CupX0.3 ºC CupX0.3 50ºC 35 CupX0.3 ºC 5 15 10 5 Viscosidade aparente (Pa.s) 1,4 1, 1,0 0,8 0,6 0,4 0, Ajuste modelo Ostwalld-de-Waelle 10ºC ºC ºC ºC 0 0 50 100 150 0 50 0 0,0 0 1 180 0 50ºC ºC Tensão de cisalhamento (Pa) 100 Cupuacu + X0,7% 90 80 70 50 CupX0.7 10ºC CupX0.7 ºC CupX0.3 ºC CupX0.3 ºC CupX0.7 50ºC 10 CupX0.7 ºC 0 0 50 100 150 0 50 0 Viscosidade aparente (Pa.s) 3,5 3,0,5,0 1,5 1,0 0,5 0,0 0 1 180 0 Ajuste modelo Ostwalld-de-Waelle 10ºC ºC ºC ºC 50ºC ºC Tensão de cisalhamento (Pa) 100 Cupuacu + X1% 90 80 70 CupX1 10ºC 50 CupX1 ºC CupX1 ºC CupX1 ºC CupX1 50ºC CupX1 ºC 10 0 0 50 100 150 0 50 0 Viscosidade aparente (Pa.s) 4,0 3,5 3,0,5,0 1,5 1,0 0,5 0,0 0 1 180 0 Ajuste modelo Ostwalld-de-Waelle 10ºC ºC ºC ºC 50ºC ºC (a) (b) Figura 3.1 - Propriedades reológicas em função da temperatura: (a) curvas de fluxo; (b) curvas de viscosidade. Como mostra a Figura 3.1 (b), observa-se que para uma taxa de deformação fixa, a viscosidade aparente diminui com aumento da temperatura. Pode-se observar também, que a viscosidade aparente decresce com aumento da taxa de deformação em todas as temperaturas, o que comprova um comportamento não-newtoniano. Comportamento semelhante foi encontrado por Marcotte et al. (00), analisando as propriedades reológicas de vários hidrocolóides (carragena, pectina, gelatina, amido e xantana) na faixa de
concentração de 1 a 6%, dependendo do tipo de hidrocolóide, e nas temperaturas de a 80ºC. A dependência da viscosidade com a taxa de deformação para dispersões de biopolímeros, pode estar associada a zonas de junções ou áreas de interações suficientemente frágeis que podem ser rompidas e a orientação molecular na direção da tensão aplicada. Com o aumento da taxa de deformação, a habilidade para reformar as zonas de interação pode ser dificultada, resultando em uma redução de viscosidade a taxas de deformação mais altas (Jampen et al., 00). Nas amostras CupX, notou-se que o valor de n foi praticamente constante com o aumento da temperatura e decresceu com o aumento da concentração. Segundo Launay et al., (1986), o parâmetro n (Ostwald-de-Waelle) é independente da temperatura e seu valor diminui com aumento da concentração de um biopolímero em uma dispersão ou solução. Para as amostras onde o índice de comportamento (n) é constante, pode-se escrever a equação de Arrhenius (Eq. 1.3) em termos do índice de consistência (K). Os valores de energia de ativação para essas amostras são mostrados na Tabela 3.. Através do ajuste não linear do índice de consistência (K) ao modelo de Arrhenius determinou-se os valores de energia de ativação (Ea) e do parâmetro (A) para as amostras no intervalo de 10 a ºC e estes valores estão mostrados na Figura 3. 5 Indice de consistencia (Pa.s) 15 10 5 CupX1 CupX0,7 CupX0,3 80 90 0 310 3 3 3 Temperatura (K) Figura (3.) - Influência da temperatura no índice de consistência (K) Tabela 3. - Parâmetros da equação de Arrhenius por ajuste do índice de consistência (K) Amostras Ea (Kcal/g.mol) A R CupX0,3 1,93 0,78 CupX0,7 1,33,15 0,98 CupX1 0,81 6,43 0,9
Quanto maior a concentração de goma na polpa menor é o efeito da temperatura sobre as propriedades reológicas, sendo este comportamento evidenciado pelo decréscimo da energia de ativação (Ea) (Figura 3..e Tabela 3.). Isto pode ser justificado pelo fato de que, aumentando a concentração, aumenta-se conseqüentemente, também a interação polímero-polímero, inibindo a hidratação molecular com a conseqüente redução da ruptura dos agregados de polímeros, que faz com que a viscosidade seja menos sensível a temperatura (Mizrahi apud por Freitas 0). Conclusões I O modelo de Ostwald-de-Waelle (LP), adequou-se de modo satisfatório a todas as amostras, obtendo-se índices de comportamento de fluxo (n), inferiores a 1, caracterizando desta forma um comportamento não-newtoniano e do tipo pseudoplástico. Comparando as amostras CupX0,3%; CupX0,7% e CupX1%, observa-se que CupX1% apresentou menores valores de n e maiores valores de K, ou seja, quanto maior a concentração de goma, mais intensificado é o comportamento não-newtoniano e maior a consistência. O efeito da temperatura pôde ser avaliado de acordo com a equação de Arrenhius, sendo obtidos os valores de energia de ativação. A energia de ativação foi maior para menores concentrações de goma, indicando que a viscosidade aparente foi muito afetada pela temperatura nesta amostra. Agradecimentos Os autores agradecem a CPKelco Brasil S/A, CNPq, CETEM Referências Bibliográficas BASTOS, M.S.R.; GURGEL, T.E.P.; SOUSA FILHO, M.S.M. Efeito da aplicação de enzimas pectinolíticas no rendimento da extração de polpa de cupuaçu. Revista Brasileira de Fruticultura. 0, v.4, n.1, p.-4. CORREIA, D.Z. Comportamento reológico e térmico de blendas de gomas de cajueiro/xantana em suco de caju. Dissertação de Mestrado,Universidade Federal do Rio de Janeiro, 0. FREITAS, I.C. Estudo das interações entre biopolímeros e polpas de frutas tropicais em cisalhamento estacionário e oscilatório. Tese de Doutorado, UNICAMP, 0.
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